Leituras

Pauteiro da USP

30 de junho de 2001

Não suporto mais ser o pauteiro não remunerado do Departamento de Filosofia da USP. Anuncio o lançamento de O Jardim das Aflições, a Editora da USP marca para o mesmo dia o de Entrevistas com Filósofos Brasileiros. Lanço uma Biblioteca de Filosofia pela Editora Record, dona Marilena Chauí solta uma coleção com o mesmo nome pela Editora da Unesp. Coloco na minha Biblioteca uma obra sobre Aristóteles, ela também põe uma na sua (tirando da gaveta, às pressas, uma tese de Oswaldo Porchat que durante 34 anos ninguém sentiu urgência de publicar). Fundo o Instituto Brasileiro de Humanidades, a USP vem atrás com seu Curso de Humanidades, anunciando pomposamente que é o primeiro do país.

Até quando vai durar essa palhaçada? Se não sabem o que fazer, se para posar de pioneiros têm de correr no encalço do que fingem desprezar, por que não largam de hipocrisia e se inscrevem logo como alunos do meu Seminário de Filosofia?

Olavo de Carvalho

Nota sobre o livro de Marie-France James

Olavo de Carvalho

27 de junho de 2001

         Aos que ainda se interessem pelo episódio Fedelli, informo que da p. 305 do livro de Marie-France James, Ésotérisme et Christianisme Autour de René Guénon (Paris, Nouvelles Éditions Latines, 1981) constam as seguintes palavras:

         “Au nombre des habitués du Caire [i. e., freqüentadores da casa de René Guénon], rappelons le Sheikh Abdel Razel, professeur de Philosophie Mussulmane, Martin Lings, un certain Paterson, universitaire anglais islamisé sous le nom de Sheikh Abu Bakr... Parmi les guénoniens de passage, signalons dejà l’explorateur Marco Pallis, accompagné du fils de Ananda K. Coomaraswamy...”

         Na verdade o Seikh Abu Bakr não era “un certain Paterson”, mas o próprio Martin Lings, este sim um autêntico “universitaire anglais islamisé”.

         A identidade de Lings é novamente trocada na foto de capa, só que desta vez ele aparece como Titus Burckhardt. Para tornar as coisas ainda mais confusas, alguém com o nome de Burckhardt, mas que não me parece ser ele de maneira alguma, aparece na foto da p. 129 ao lado de Frithjof Schuon e Jean-Albert Cuttat.

         Obviamente a autora não conheceu Lings ou Burckhardt nem mesmo por fotografias, embora na época em que ela escreveu o livro o sr. Lings fosse um nome bem conhecido nos círculos acadêmicos europeus, como diretor da Seção de Manuscritos Orientais do Museu Britânico, e Burckhardt fosse um renomado editor de livros de arte.

         Outro personagem mencionado no parágrafo, o sr. Marco Pallis, teria podido, se consultado, desfazer todos esses erros. Como encontrá-lo? Fazendo o que eu próprio fiz quando precisei de uma informação dele: simplesmente pedi seu número à telefonista de Londres e falei com ele. É quase inverossímil que alguém empenhado numa investigação séria sobre o círculo de René Guénon no Cairo tivesse se omitido de tomar precaução tão elementar. O sr. Pallis era a pessoa mais gentil do mundo, e um homem capaz de perder horas ao telefone com um desconhecido do Terceiro Mundo não teria decerto se negado a receber uma pesquisadora acadêmica européia.

         Mais obrigatório ainda a um pesquisador católico seria consultar o filho de Ananda K. Coomaraswamy, o dr. Rama P. Coomaraswamy, citado pela srta. James como freqüentador, junto com Pallis, da casa de René Guénon no Cairo. O dr. Rama é um conhecido teólogo que nas décadas de 70 e 80 lecionou num seminário católico no Estado de New York e publicou vários artigos de polêmica anticonciliar. Por trás da ferocidade polêmica de seus livros, era um tipo bastante simpático e acessível, que sem nada saber de mim me recebeu em sua casa de New Haven em 1986 e teria feito o mesmo pela srta. James se ela consentisse em procurá-lo.

         O que me espanta na srta. James é que, tão meticulosa ao informar-se sobre os meios católicos franceses, que constituíam apenas o pano de fundo da sua narrativa, ela fosse tão desleixada ao tratar do círculo de René Guénon, que era o próprio miolo do assunto.

         Tal é o motivo pelo qual, desde o ponto de vista puramente historiográfico, e independentemente do que se pense pró ou contra René Guénon, julgo que o livro da srta. James não deve ser tomado às pressas como fonte confiável de informações a respeito.

E-mail enviado a Alberto Dines em 27 de junho de 2001

Prezado Alberto Dines,

Num artigo recente do Observatório da Imprensa você escreveu que o Dr. Ronald Levinsohn, “como não sabe pensar nem sabe escrever, paga aos que pensam e escrevem para ele. Mesmo que o façam canhestramente. Um deles é o Goebbels brasileiro, filósofo da nova direita tupiniquim, ex-marxista radical, cujo sonho é trabalhar para Sílvio Berlusconi mas, por enquanto, resigna-se em escrever para dois veículos do Grupo Globo.” E, linhas adiante:  “Levinsohn & Cia. acusam-me de ‘perseguir’ aqueles que no JB me substituíram. Idiotice tamanha só pode partir do parvo ilustrado, o Goebbels redivivo.”

Algumas pessoas dizem que o personagem aí aludido sou eu – ou pelo menos, aquele que você imagina que eu seja. Descontada a adjetivação infamante, sintoma neurótico que deixo de analisar porque a vida mental de Alberto Dines não é assunto de meu interesse, a descrição, em alguns pontos objetivos, confere com a minha pessoa: sou de fato o único filósofo “de direita” (digamos assim), ex-marxista, que escreve para dois veículos do Grupo Globo.

Não havendo outro que se encaixe simultaneamente em todas essas categorias, é razoável supor que sou de fato eu o sujeito a quem você atribui, entre outras lindas qualidades, a de autor de escritos difamatórios contra a sua pessoa, supostamente encomendados e pagos pelo Dr. Ronald Levinsohn.

O fato é que você está redondamente enganado. Nunca participei das polêmicas do Dr. Levinsohn, nunca escrevi uma só linha a pedido (muito menos a mando) dele ou de qualquer outro diretor da UniverCidade. Especialmente, nunca escrevi nem disse uma só palavra contra você. Não sou nem poderia ser o autor das enormidades que você me atribui e, pior ainda, nem sequer as tinha lido até agora. Só fiquei sabendo delas porque alguém me alertou por e-mail e, incrédulo, fui conferir no Observatório da Imprensa. E lá estavam, acompanhadas de um revide pelo menos tão insano quanto elas próprias.

Devo supor que o mestre do jornalismo esqueceu o dever elementar de informar-se antes de me acusar? Ou que, ao contrário, mentiu de propósito contra um inocente?

Nenhuma dessas duas hipóteses é boa para você, mas prefiro apostar na primeira. Continuarei apostando nela pelas próximas 48 horas. Se até lá você não se retratar publicamente, admitindo que nada sabe de qualquer envolvimento meu na querela Levinsohn-Dines, serei obrigado a recorrer à Justiça, para resguardar o meu direito de não ter minha reputação manchada por efeito de um bate-boca do qual, até agora, eu ignorava tudo, rigorosamente tudo.

Olavo de Carvalho

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