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Normas de redação

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 13 de janeiro de 2009

Confissões de Luiz Garcia, um dos potentados da redação de O Globo, reveladas durante um simpósio da University of Tulane, em março de 2008, por Carolina Matos, em conferência intitulada (sem ironia aparente) Partisanship versus professionalism:

“Fizemos um enorme esforço para atrair o pensamento esquerdista para O Globo. E fizemos isso em tal extensão que depois tivemos de procurar um direitista que escrevesse bem, e escolhemos Olavo de Carvalho, o que hoje lamentamos um bocado. Toda a esquerda tem acesso ao Globo: Élio Gaspari, Zuenir Ventura, Veríssimo… E também os ativistas, as ONGs. Estamos fazendo uma coisa balanceada.”

Leram? Leiam de novo. Com o maior ar de inocência, com aquela consciência limpa de quem não quer sujá-la num confronto com os próprios atos, o criador da página de opinião de um grande diário brasileiro apresenta sua noção de jornalismo balanceado, isento, equilibrado: franquear as páginas do jornal para “toda a esquerda”, um exército inteiro de editorialistas, cronistas, analistas e ongueiros, depois camuflar o partidarismo concedendo um espacinho a um – isso mesmo: um, um único – articulista de direita, em seguida reduzir um pouco mais esse espacinho e no fim ainda reclamar que o convidado, um brutamontes sem educação, ultrapassou a quota de direitice admitida. Em matéria de disfarce, isso foi tão eficiente quanto limpar bumbum de elefante com um cotonete.

Mas disfarçar era totalmente desnecessário: quem, entre as multidões, reclamaria do viés esquerdista do Globo? Brasileiro não lê jornal. Num país de 180 milhões de habitantes, a tiragem dos maiores diários, somada, mal chega a dois milhões de exemplares. A imagem que o zé-povinho tem dos jornais é a de trinta anos atrás: o Estadão ainda é os Mesquita, O Globo ainda é Roberto Marinho. Diga ao cidadão comum que O Globo é de esquerda, e ele rirá na sua cara com aquele ar de infinita superioridade que é o privilégio sublime da completa ignorância. De outro lado, o esquerdismo da mídia nacional é mais que hegemônico: é uma instituição tão antiga, tão sólida, tão tradicional e intocável que acabou por se tornar um estado natural. O jornalismo de esquerda já nem pode ser reconhecido como tal, pois há três gerações não existe um de direita que lhe sirva de contraste. A firme obediência ao programa esquerdista passa hoje como a encarnação mesma do profissionalismo idôneo, mainstream. Fanatismo, propaganda, distorção ideológica, só na coluna do Olavo de Carvalho, é claro. Pois não é que o safado teve a ousadia de contar para todo mundo que o Foro de São Paulo existia, quando a massa de seus colegas de ofício se empenhava solicitamente em ajudar essa central da subversão a crescer em silêncio? Por que ele não se limitou ao direitismo cool, educado, àquele amável direitismo de centro que festeja a eleição de Barack Obama como uma glória da democracia americana e de vez em quando até verte umas lágrimas (de crocodilo ou não) pelos terroristas mortos nos “anos de chumbo”?

Se querem entender como essa mudança aconteceu, leiam o livro de Alzira Alves de Abreu, Eles Mudaram a Imprensa (FGV, 2003). São “depoimentos de seis jornalistas que, na qualidade de diretores de redação, tiveram uma participação fundamental na reformulação ou na criação de órgãos de imprensa brasileiros nas últimas três décadas do século XX”. Dos seis entrevistados, cinco são esquerdistas. Só faltou, dessa geração de reformadores célebres, o Cláudio Abramo, que já tinha morrido. E Cláudio era um devoto de Leon Trotski. Isso, meus amigos, é a mídia brasileira. Ser esquerdista, no ambiente que esses homens criaram, não requer nem mesmo uma tomada de posição pessoal: é só você não pensar no assunto, e a força da rotina geral o arrastará insensivelmente para a esquerda sem que você tenha de assumir a mínima responsabilidade por isso.

Se Luiz Garcia parece não ter a menor consciência de que confessou uma manipulação abjeta, delituosa até, não é porque seja cínico de propósito: é porque, no meio em que ele vive, a insensibilidade moral para com os abusos do esquerdismo se tornou uma espécie de norma de redação.

Fora da lei

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 23 de outubro de 2008

Venceu dois dias atrás o prazo para Barack Obama contestar a lista de declarações apresentada a um tribunal da Pensilvânia pelo advogado democrata Philip J. Berg. De acordo com o artigo 36 do Código de Processo Civil americano, a falta de resposta equivale a uma admissão de que as declarações são verdadeiras. Legalmente, portanto, Obama confessou que nasceu no Quênia, que não é cidadão americano nato e que não tem o direito de se candidatar à presidência.

O Comitê Nacional Democrata, acionado no mesmo processo e sujeito ao mesmo prazo, também admitiu, por omissão, que escolheu Obama sem verificar sua nacionalidade e que a candidatura dele é inválida.

Verifiquem em www.obamacrimes.com, o site de Philip J. Berg.

Só falta agora o juiz R. Barclay Surrick emitir a sentença declaratória confirmando o vencimento do prazo e as conseqüências judiciais disso para a candidatura Obama. Philip Berg ingressou na corte hoje, quarta, com um pedido de julgamento sumário para esse fim.

A candidatura Obama parece portanto estar fora da lei há dois dias, e nem uma palavra a respeito saiu nos maiores jornais e canais de TV. É uma barragem idêntica à que protegeu Luís Inácio Lula da Silva contra a revelação de seus compromissos com o Foro de São Paulo – com quatro diferenças: (1) As conseqüências, em escala mundial, da farsa midiática nos EUA são de gravidade incomparavelmente maior que a do ocorrido no Brasil. (2) No Brasil não houve ninguém com a dose de testosterona de Philip J. Berg para furar o bloqueio na Justiça; (3) No Brasil o bloqueio de notícias sobre o Foro de São Paulo foi total, só rompido por mim na minha coluna de O Globo – logo suprimida pela nomenklatura, é claro –, enquanto nos EUA o processo movido por Berg teve alguma divulgação no rádio, em jornais regionais e na internet, isto é, nas parcelas da mídia não dominadas pelo establishment esquerdista. (4) O apoio do eleitorado americano a Obama nem de longe se compara à quase unanimidade da devoção nacional a Lula: embora dispondo de recursos financeiros esmagadoramente superiores aos do adversário, embora imunizado contra a revelação dos fatos pela grande mídia, e embora use de todos os meios lícitos e ilícitos para impor sua invencibilidade absoluta – incluindo intimidação e agressões físicas, chantagem racial e farta distribuição de títulos de eleitor falsos –, Obama está, na média das últimas semanas, com apenas quatro ou cinco pontos percentuais acima de McCain.

No dia em que venceu o prazo de contestação no processo Berg versus Obama, o jornalista Andy Martin abriu na Suprema Corte do Havaí um processo pedindo que seja divulgada pela Justiça a certidão original de nascimento de Barack Obama. Instantaneamente, Obama suspendeu sua campanha eleitoral e viajou às pressas para o Havaí, alegando urgência de visitar sua avó doente. O curioso, no caso, é que a avó já tinha saído do hospital uma semana antes, sem que durante o período de sua internação Obama mostrasse a menor pressa de visitá-la. Martin é um tipo folclórico, com fama de litigante compulsivo, mas isso não torna menos temível para Obama a eventualidade de ter de exibir no Havaí o documento que ele se esquivou de mostrar ao tribunal da Pensilvânia (v. meu artigo em http://laiglesforum.com/2008/09/28/322/). Uma cópia da petição de Martin pode ser lida em http://citizenwells.wordpress.com/.

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Mensagem que recebi de um amigo americano:

“Até a metade de 2006, com seis anos de gestão Bush na presidência, a confiança dos consumidores no mercado era alta, a gasolina custava US$ 2,19 o galão, a taxa de desemprego não passava de 4,5 por cento e a Dow Jones atingiu um recorde de 14 mil pontos positivos. Então o eleitorado quis ‘mudança’ e deu aos democratas a maioria nas duas casas do Congresso. Passado um ano e meio, a confiança no mercado caiu, a gasolina subiu para quase cinco dólares o galão, os lucros de ações caíram em doze trilhões de dólares, o desemprego subiu para 5,5 por cento e por toda parte há famílias sendo postas para fora de suas casas por falta de pagamento. Os americanos quiseram ‘mudança’, e certamente a obtiveram. Quanto mais ‘mudança’ será que eles agüentam?”

Deuses de ocasião

Olavo de Carvalho


O Globo, 2 de julho de 2005

“Quando os homens já não acreditam em Deus, não é que não acreditem em mais nada: acreditam em tudo.” Se essa observação de G. K. Chesterton já não tivesse sido comprovada milhares de vezes, bastaria a experiência brasileira das últimas semanas para mostrar sua veracidade. Quanto mais este país renega a fé cristã que esteve nas raízes da sua formação, com tanto mais crédulo entusiasmo se entrega ao culto de ídolos de ocasião, e quanto mais se avilta na adoração do desprezível menos força tem para arrepender-se e mudar de rumo quando uma nova divindade postiça e impotente, seguindo o caminho das anteriores, o decepciona pela enésima vez. Ao contrário: cada desilusão sucessiva não só reforça a propensão idolátrica, mas a torna ainda mais tolerante para com a inépcia dos deuses, mais pronta a fabricar desculpas para as lacunas da sua onipotência e as manchas do seu véu de santidade. Por esse caminho, as relações entre a alma devota e seu objeto de culto chegam à completa inversão: já não é a criatura que vive da misericórdia divina, é a divindade pecadora e criminosa que se alimenta do perdão humano, não recebido como um dom da graça, é claro, mas extorquido como um dever, como um imposto, de tal modo que o fiel, quanto menos recebe de seu deus, mais se sente obrigado a lhe dar em profissões de fé e atos de sacrifício, numa espécie de masoquismo teológico.

Tal é, com efeito, o deus da “teologia da libertação”. A única entidade imaterial e transcendente em que os doutores dessa escola acreditam é aquela força a que chamam “processo revolucionário”, lei suprema que, a seu ver, governa o curso da história. Mas é uma lei que funciona às avessas. Ao contrário do Deus bíblico, cuja credibilidade advém do cumprimento de Suas promessas, ela jamais precisa cumprir as suas. A autoridade de que desfruta ante os fiéis assenta-se no próprio rastro de crimes e fracassos que constitui até o momento o único legado do processo revolucionário na URSS, na China, no Vietnã, na Coréia do Norte ou em Cuba. Esse aparente paradoxo explica-se pela dialética do prejuízo intolerável: quanto maior a dose de sacrifício inútil, tanto mais dificultoso admitir que foi inútil. Tanto maior, por isso, a necessidade compulsiva de redobrar indefinidamente a aposta perdida, reafirmando a fé contra os fatos em escala de progressão geométrica. O credo quia absurdum, que em Agostinho era uma figura de retórica, torna-se aí um preceito literal, o dogma constitutivo da igreja revolucionária.

Não espanta que, numa cultura intoxicada desse dogma ao ponto de já não poder reconhecê-lo como tal mas apenas obedecê-lo como impulso inconsciente, as esperanças do povo acabem se voltando para personagens cada vez menores, mais desprovidos de real valor e das condições mais mínimas para honrar a confiança neles depositada.

Quando, mais de uma década atrás, o sr. Herbert de Souza foi aceito pelas classes letradas como a máxima encarnação da virtude e um candidato à beatificação, tomei isso como indício de um embotamento da sensibilidade moral coletiva, incapaz de distinguir entre um santo e um mero estrategista esperto, cujo único mérito era o de ter ensinado a esquerda a sugar o prestígio das entidades caritativas em vez de acusá-las de instrumentos da classe dominante.

Os anos que se seguiram confirmaram esse diagnóstico, quando uma nação quase inteira apostou na moralidade superior de um partido cuja improbidade e malícia, no entanto, eram claramente visíveis no teor mesmo das suas discussões internas e na rede de suas alianças criminosas internacionais, alianças que ora ele ocultava sob negações peremptórias, ora adornava com um manto de subterfúgios dourados, sem que a mídia cúmplice consentisse em notar, sequer, a duplicidade do discurso, prova inequívoca da mentira.

Por isso, agora, que toda a indigência moral desse partido veio à tona, não é impossível que o esplendor mesmo da sua feiúra ofusque a visão popular, produzindo, após o choque passageiro das más notícias, uma restauração da confiança inicial jamais merecida.

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