Sérgio Alberto de Castro

17 de agosto de 2001

Sérgio Alberto de Castro, coronel da reserva do Exército Brasileiro, enviou a esta homepage a contundente análise das contradições do monopólio estatal das armas de fogo, que abaixo reproduzimos. Dado o cerco publicitário que protege contra todo argumento adverso o novo dogma globalista imposto aos brasileiros, a internet se torna o único meio de difundir o pensamento de quem diverge do establishmentcínico e ditatorial. Agradeço ao Cel. Castro pela coragem e pertinência das suas observações. — O. de C.

A lei estadual em vigor e a lei federal proposta por FHC ao Congresso, ambas proibindo a venda de armas de fogo ao público, complementam lei anterior que restringe o porte de armas. Na prática agora será impossível ao cidadão não só portar como possuir uma arma de fogo, mesmo em casa, para sua defesa pessoal.

À primeira vista, ainda ecoando a intensa campanha promovida pela mídia e pelas auto-intituladas “organizações representantes da sociedade civil” (1), parece que a intenção governamental é meritória. Assim sendo, todo homem de bem deveria aplaudir as referidas medidas. Não obstante essa presumível boa intenção, há pessoas que têm o péssimo hábito de pensar e, caso alguém pense um pouco, logo fica claro que por trás das boas intenções existe um conjunto de monstruosidades. Vamos a elas.

Comecemos pelo conceito de violência. Violência — o que todos querem combater — é um substantivo. É necessário, pois, adjetivá-lo, ligá-lo a uma situação concreta e determinada, para que adquira sentido de valor, de certo e errado. Assim sendo, dizer que “devemos combater a violência”, de forma genérica, significa igualar em valor moral ações completamente distintas. Quando, no nobre dever de educar um filho, sua mãe o coloca de castigo ou lhe dá uma palmada, está cometendo uma violência. Quando um policial, arriscando a vida, trava um tiroteio com bandidos, pratica um ato violento. Da mesma forma, quando um exército faz a guerra a um agressor. Apesar de violentas, todas essas ações são meritórias, inspiradas no altruísmo, cujo ponto mais alto é arriscar sua vida por outrem (2). Da mesma forma, quando um facínora espanca ou mata alguém, estupra uma mulher, ou assalta um cidadão, comete violência. Creio, porém, que o valor moral da ação é completamente diferente, pois trata-se de ações criminosas.

Essa generalização, a violência sinônimo de crime, é a primeira monstruosidade. Torna iguais o mérito e a torpeza.

Ressaltada essa pequena diferença — o valor moral —, fica evidente que o que deve ser combatido é o crime. Curiosamente, nenhuma fundação Viva Rio, nenhum formador de opinião, nenhum dirigente político se refere a combater o crime (os últimos às vezes falam em combater o “crime organizado” e os “crimes dos colarinhos brancos”), todos porém são unânimes em falar de “combater a violência”. Esta é a segunda monstruosidade.

Por que, será que são obtusos? Não, a resposta é simples. Vamos a ela.

A resposta está no conceito de que o crime seria conseqüência da injustiça, da desigualdade social. Ou seja, a priori o criminoso, definido como pobre, preto, pardo etc. etc., ao cometer o crime só o faz porque é uma vítima da sociedade. Assim sendo, ele, de criminoso, passa a vítima. Por sua vez, a vítima original (o assaltado ou o seqüestrado) é definido como um membro da classe dominante, ou seja, ele é um “criminoso de classe”, aquele que se beneficia com a injustiça social. Assim, nada mais justo do que o crime cometido, que na verdade não é crime, mas sim justiça social (3). Esta é a terceira monstruosidade.

É claro que a tese “crime conseqüência da desigualdade social” é falsa, o que se pode demonstrar facilmente, porém não é o caso. Basta lembrar que, se verdadeeira, a Índia, a China, o Irã, entre muitos outros países, seriam habitados por criminosos, o que é falso. Da mesma forma, os pobres brasileiros seriam todos criminosos, o que também é falso. De fato, a criminalidade se distribui igualmente por todas as camadas da população — o que varia é o tipo de crime, por exemplo: pobre não comete “crime de colarinho branco”.

Juntando-se a generalização conceitual, a definição incorreta e o conceito de “crime social”, teremos, obviamente, a impossibilidade de qualquer ação contra o crime por parte do Estado. Senão vejamos:

1. Combater a violência é também combater a ação policial. Em um tiroteio, caso haja uma vítima inocente, a responsabilidade é sempre da polícia, não dos facínoras que não se renderam quando acuados pelos policiais.

2. Como se combate a “violência “, o combate ao crime deixa de existir como tal, pois estaria implícito.

3. Como o criminoso (bandido) é “vítima social”, não há por que combater o crime, é sim necessário e suficiente “mudar a injusta estrutura social do Brasil ” (ou criar outra utopia qualquer).

Esta é a quarta monstruosidade.

Há, contudo, um outro aspecto. Mesmo sendo o acima exposto o pensamento dos nossos líderes, legisladores, ativistas civis, etc. etc., fica meio feio não fazer nada (FHC disse isto, em outras palavras, a O Globo). Assim sendo, tomou-se a iniciativa brilhante: proibir, aos homens de bem, o porte e a posse de armas de fogo. Digo homens de bem, porque os facínoras, dada a sua própria natureza facinorosa, não cumprem leis, logo, não são atingidos por elas. Era, porém, necessário justificar tal abominação sob uma capa lógica e positiva. Isto foi feito com o seguinte raciocínio:

1. As armas de fogo matam.

2. Se você tiver uma arma de fogo e resistir a um facínora, será morto e sua arma, além de inútil, será usada por outro facínora.

3. Logo, se você não tiver uma arma, o facínora não o matará.

É evidente que a argumentação é falsa, como se demonstra a seguir:

1. Arma de fogo não mata, quem mata é quem a usa, da mesma forma que uma faca, um porrete, as mãos, etc. Quem mata é um ser vivo, não um instrumento.

2. Alguém que resiste, armado, a um facínora, pode também matá-lo, salvando assim sua vida, o que é o mais elementar direito humano.

3. O raciocínio aludido atribui ao facínora a virtude da clemência. Ao homem de bem, no papel de vítima, caberá a passividade. Será assaltado, espancado, etc. etc., porém poderá não ser morto, visto não resistir e, por conseguinte, poder despertar a compaixão do facínora. É possível que, após uma sodomização prazerosa, a vítima sinta até amor pelo facínora, talvez a sexóloga Suplicy saiba explicar isso.

Esta é a quinta monstruosidade.

Finalizando, há o aspecto político-institucional. É presumível que todos saibam que a primeira obrigação do Estado, sua própria razão de existir, é propiciar segurança para o cidadão contra agressões locais e vindas do exterior. Como, por motivos diversos, inclusive os apresentados anteriormente, atualmente o Estado não cumpre esta função, torna-se necessário torcer a realidade, impedindo, até, que os homens de bem busquem se defender. Isto seria a confirmação do fim do Estado Brasileiro. Assim, o mais elementar direito dos seres vivos, uma atitude que todo animal, da barata ao elefante toma se atacado, que é resistir ao ataque de predadores, é negada aos brasileiros. Sendo ilegal ter uma arma, aquele que quiser resistir ao agressor terá de fazê-lo com as mãos nuas, sendo obviamente morto. Para não ser, terá de ser passivo e covarde. A obrigação de ser covarde é a sexta monstruosidade que está implícita na legislação que FHC levou ao Congresso, com o apoio de Garotinho, Viva RioMotoboy, Dr. Gregori etc., etc.

Só resta, para concluir, que passe a ser obrigatório que nossas casas fiquem abertas , sem chaves ou cães. Que estacionemos com os carros abertos e com as chaves na ignição, que portemos, também obrigatoriamente, cem reais para serem cedidos ao primeiro excluído que os exigir. Bem como que nossas filhas e mulheres se exponham, já de antemão, para ser violentadas por pobres meninos carentes que as desejam e não são correspondidos. Com este adendo à nova lei, a violência termina e FHC será um estadista.

Notas

(1) Para mim, e para o conceito de República, quem representa a sociedade civil é o Congresso, para isso seus membros são eleitos. Não é, nem pode ser um ou vários grupos de ativistas autopromovidos. Isto é dever único dos parlamentares.

(2) Assim era ao longo de 5.000 anos de história, pode ser que agora seja diferente.

(3) A origem desse conceito está nos literatos russos do séc. XIX e no conceito marxista da luta de classes

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