Leituras

Noronha II

Olavo de Carvalho

22 de julho de 1999

Chegam-me avisos temerosos, advertindo que o Noronha é grandão. É isso! Cresceu demais, coitado, o cérebro atrofiou. E, como D. Quixote, que ficou maluco de tanto ler romances e se persuadiu de que era cavaleiro andante, o Noronha leu muito Paulo Roberto Pires e agora acha que é editor da minha homepage.

O pensamento vivo de Luiz Noronha

Olavo de Carvalho

21 de julho de 1999

Apenas algumas horas depois de entrarem na minha homepageos avisos sobre as Picuinhas comunistas e sobre o Pires, recebi um telefonema de um sr. Luiz Noronha, que tinha lido esses avisos e estava fulo da vida. Aos berros, ele me informou as seguintes coisas (transcrevo-as literalmente, até aonde minha memória alcança):

1ª Quem manda no Segundo Caderno de O Globo é ele. Foi ele quem designou o Pires para fazer a resenha dos Ensaios Reunidos.

2ª Ele, Luiz Noronha, não reconhece em mim autoridade bastante para reclamar do que quer que ele faça publicar no Segundo Caderno.

Diante de tão significativas declarações, sugeri ao Sr. Noronha que as escrevesse e assinasse, em vez de berrá-las pelo telefone.

— Não escrevo nada!, respondeu.

E, tendo desligado o telefone após mais algumas manifestações de cortesia que foram respondidas à altura, nada mais disse nem lhe foi perguntado.

São poucas e breves, portanto, as amostras que nos restam do pensamento vivo de Luiz Noronha. Se bem as compreendi, passo a tirar delas as conseqüências lógicas inescapáveis, que traduzem, na medida em que o pode o discurso humano, o fundo abissal desse pensamento:

1ª Se foi o sr. Noronha quem mandou o Pires escrever o que escreveu, das duas uma: ou ele deu essa ordem com plena consciência de que o Pires era um notório desafeto meu, já denunciado publicamente por ter feito uma resenha desonestíssima de O Imbecil Coletivo, ou então deu a ordem sem saber nada e com total inocência. No primeiro caso, faltou à mais elementar ética jornalística. No segundo, mostrou que não sabe em quem manda, exercendo portanto sua autoridade às cegas sobre um caderno do qual nem sequer leu os números anteriores.

2ª O sr. Luiz Noronha não admite que eu escreva em minha própria homepage sem que ele me conceda autoridade para tanto.

Uma vez compreendido o sentido das duas declarações, respondo, à primeira, que, se atribuí ao Pires a culpa de designar-se a si mesmo para uma tarefa que eticamente lhe era imprópria, foi porque, então, eu ignorava que o Pires tivesse um chefe. Agora sei e, portanto, corrijo: o Pires tem, sim, uma desculpa. Ele não fez porque quis. Fez porque o Noronha mandou. As coisas ficam assim melhores para o Pires no Juízo Final, inclusive tendo em vista o desconto devido aos que, neste vale de lágrimas, já pagaram parte de seus pecados agüentando um Noronha nas costas.

Quanto à segunda, respondo ao sr. Noronha: vá dar ordens ao Pires, e olhe lá, que já é demais para a sua competência. Por escandaloso que isto pareça a um sujeito tão ávido da glória de mandar, a minha homepage não está sob a jurisdição de Noronha nenhum, e ela existe justamente para assegurar que, mesmo num país infestado de Noronhas, ainda pode subsistir, via internet, um pouco daquela liberdade de expressão que dia a dia vai desaparecendo da mídia impressa.

Picuinhas comunistas

Olavo de Carvalho

17 de julho de 1999

Durante vinte anos a obra ensaística de Otto Maria Carpeaux ficou esquecida, abandonada às traças pela máfia esquerdista que o grande crítico tanto ajudara em vida. De repente, esse tesouro é desenterrado por um estranho, por alguém que além de não ser membro do Clube já mostrou seu total desprezo a essa entidade, cuspindo na reputação sacrossanta de alguns de seus diretores. É o escândalo. De norte a sul do país um brado de alerta percorre as fileiras da instituição:

— Roubaram-nos o Carpeaux!

— Quem foi?

O mensageiro baixa os olhos:

— Foi… “a direita”!

Horror! Horror! Horror! Que fazer?, pergunta o secretário-geral, José Stálin Lênin da Silva. Descer o cacete não é possivel — dialetiza —: não podemos criticar quem faz o que seria nossa obrigação. Silenciar? Não podemos: seria deixar para a direita o domínio do espaço aéreo. Por fim, fazendo uso do centralismo democrático, ele mesmo responde, enunciando a linha justa:

— Celebrar a descoberta, omitindo o descobridor.

Assim, anos de pesquisas, setecentas e vinte notas de rodapé e uma introdução de oitenta páginas — o primeiro estudo abrangente que se fez da obra de Carpeaux, com dados inéditos e questões jamais perguntadas — desaparecem das folhas dos jornais, como se nunca tivessem existido. Nada podendo falar contra — porque, raios nos partam, o negócio está bom mesmo —, o melhor é não falar nada. Para não caracterizar juridicamente a falta de todo crédito (pois aí já seria dar a cara para apanhar), o nome de Olavo de Carvalho constará na ficha técnica, em letras miúdas, junto com a data e o preço do exemplar. Nem uma palavra sobre ele no corpo dos textos.

— E isso ainda tem uma vantagem: badalamos as editoras e assim as jogamos contra ele. E, se ele reclamar, diremos que é vaidade ofendida.

Um risinho de auto-lisonja percorre a assembléia: “Ai, como somos maquiavélicas!” Respingos de satisfação molham algumas calcinhas.

A linha justa já foi levada à prática na Folha de S. Paulo de 4 de julho. Agora, em O Globo do dia 17, em matéria assinada pelo velho Pires, o Pires propriamente dito — aquele mesmo d’O Imbecil Coletivo —, escolhido para a tarefa precisamente por não poder ter isenção para falar de quem, em público e sem qualquer contestação, já o chamou de mentiroso.

Aguardam-se as manifestações de fidelidade do JB, de Veja, de Isto É e das demais células.

O mais curioso do caso é a desenvoltura com que esses comunistas consideram o Carpeaux coisa sua, esquecendo a brutal campanha de difamação que, orquestrada por Dalcídio Jurandir, Oswald de Andrade e o futuro dissidente Carlos Lacerda, moveram contra o escritor tão logo ele desembarcou no Brasil. O episódio é brevemente relatado na minha Introdução, e acaba de ser relembrado ao meu editor, José Mário Pereira, por Moacir Werneck de Castro, um dos participantes da operação, hoje aparentemente envergonhado dela, não sei se moralmente ou apenas politicamente, como é de praxe entre comunistas.

O leitor brasileiro não sabe que está sendo enganado, que cada página dos grandes jornais do país é calculada, controlada e censurada pela direção comunista que se apossou dessas publicações, cujos proprietários, atemorizados pelo apoio ostensivo do governo Clinton à esquerda brasileira, tentam salvar a pele ficando caladinhos e puxando, quando podem, o saco de seus seqüestradores.

O leitor brasileiro ainda imagina viver num país onde há liberdade de imprensa.

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