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Heróis do maoísmo internacional

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil, 14 de setembro de 2006

Dirijo esta carta a César Teles e sua esposa Maria Amélia, que estão processando o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra por crime de tortura. Não sei se vocês sofreram mesmo o que dizem ter sofrido no Doi-Codi. Isso deve ser investigado com todo o rigor e, se confirmado, vocês devem receber todas as compensações judiciais, morais e financeiras que lhes caibam. Até a sentença final da Justiça, tudo é hipótese e conjetura, nada mais.

Há, no entanto, alguns fatos que são certezas incontestáveis. Primeiro: na época dos crimes alegados, vocês dirigiam a gráfica do PC do B, o Partido Comunista do Brasil. Segundo: o PC do B era o partido maoísta, encarregado de legitimar, enaltecer e, se possível, expandir pelo mundo o regime mais assassino, genocida e torturador que já existiu na história humana, responsável pela morte de pelo menos 60 milhões de pessoas, o triplo do que Stalin matou na URSS ou Hitler na Alemanha. Terceiro: as torturas praticadas no Laogai – a rede de presídios políticos chineses – não consistiam apenas em choques elétricos e queimaduras com pontas de cigarros, como aquelas que vocês alegam ter padecido. Incluíam e incluem espancamentos e mutilações variadas (de mãos, braços, pés, orelhas e narizes), além de um vasto repertório de agressões psicológicas calculadas por engenheiros comportamentais para quebrar a última resistência dos mais valentes e obstinados. O quarto fato é o mais bonito de todos: as pessoas que foram submetidas a esse tratamento hediondo nem sempre o foram sob a suspeita de promover, como vocês, a violência armada a soldo de um regime inimigo. Eram acusadas de ler bíblias, de ter uma cabra escondida para dar leite a seus filhos, de comer porções de arroz além do permitido pelo governo.

Vocês ajudaram a embelezar a imagem do regime que fez essas coisas, e jamais deram o mínimo sinal de arrependimento. É absolutamente ridículo pretender que vocês sejam contra a tortura. Vocês só não gostam de sofrê-la, é claro. Mas nunca acharam ruim que os chineses a praticassem em escala superior a tudo o que a imaginação macabra de ficcionistas doentes pudesse ter inventado nos séculos anteriores. Mesmo que o coronel Ustra ou qualquer outro houvesse feito o que vocês dizem que fez, ainda seria bastante inofensivo se comparado aos comunistas chineses a cujo serviço vocês estavam na ocasião.

Moralmente, vocês — ou qualquer outro militante do PC do B que antes de acusar os crimes da ditadura brasileira não confesse os seus próprios — estão abaixo de delinqüentes comuns, que com freqüencia se envergonham do que fazem ou pelo menos não insistem em ser premiados por isso.

Talvez vocês tenham direito à sentença declaratória que exigem, ou até a indenizações. Mas não têm direito a nenhuma piedade, consideração ou respeito. Se ganharem o processo, peguem logo seu atestado de vítimas, seus diplomas de heróis do maoísmo internacional, e vão para casa rir, com o proverbial cinismo comunista, da ordem jurídica burguesa que uma vez mais terá servido de instrumento para a sua própria destruição.   

Rodízio de santidades

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil, 7 de setembro de 2006

A construção do sistema nacional de roubalheira petista não começou em 2003, nem é um desvio acidental da linha partidária. Vem do início dos anos 90. É parte integrante da estratégia de conquista progressiva do poder total, que passa pela destruição sistemática da ordem pública e pela parceria ignóbil entre partidos esquerdistas e organizações criminosas no Foro de São Paulo. Não há um só dirigente do PT ou de qualquer outro partido de esquerda que não saiba disso, nem jornalista que o ignore. Por isso mesmo conseguiram escondê-lo tão bem.

Agora que se tornou difícil continuar negando as patifarias mais espetaculares usadas para implementar o grande engodo, só resta aos mentores esquerdistas fazer aquilo que previ em março de 2004: “Se o PT cair em total descrédito…, entrará em ação o Plano B: suicidar o governo alegando que falhou porque estava muito ‘à direita’ — e aproveitar-se da oportunidade para acelerar a transformação revolucionária do país, … transferindo a militância (petista) para outra e mais agressiva organização de esquerda.” (Cf. http://www.olavodecarvalho.org/semana/040311jt.htm.)

O manifesto (publicado na Folha de terça-feira) no qual 250 picaretas acadêmicos internacionais, lulistas históricos, saem repentinamente acusando o governo Lula de “neoliberal” e pedindo votos para a Sra. Heloísa Helena, já é o plano B em ação.

Retroativamente, o padroeiro da esquerda é jogado para a direita junto com suas culpas, a data dos delitos é transferida para 2002 e doze anos de conspiração criminosa desaparecem numa nuvem de enxofre, de trás da qual emerge puro e santo o novo objeto de devoção, veraz e autêntico como uma virgem celeste de desfile carnavalesco, esmagando sob os seus mimosos pezinhos a serpente do capitalismo malvado e ladrão.

Limpar-se na sua própria sujeira é a tática mais velha e persistente do repertório esquerdista. Não há limites para a mendacidade, a malícia, a perversidade e o grotesco da mente revolucionária. Seu único deus é o Poder, sua única moral é a da vitória a todo preço. O resto é jogo dialético para estontear o adversário.

Continuem confiando nessa gente e ela lhes roubará tudo, a liberdade, a bolsa, a vida e o último resíduo de dignidade, como roubou no Leste Europeu e em Cuba. E, se vocês acham que existe algum esquerdista mais honesto que o outro, não estão de todo errados: o antecessor é quase sempre um pouco menos canalha do que o sucessor.

***

Acabo de ler, maravilhado, o estudo que Paulo Mercadante consagrou a um herói da inteligência brasileira (Tobias Barreto, o Feiticeiro da Tribo, UniverCidade, 2006). Não sei o que admirar mais: o estilo e a erudição do autor, remanescente da espécie extinta dos grandes escritores brasileiros, ou a energia incansável com que o personagem, isolado e sem recursos no meio provinciano, luta para manter-se ao nível dos debates filosóficos do seu tempo, um dever que os intelectuais subsidiados de hoje em dia ignoram solenemente. Honrado pela mídia chique com a infalível homenagem do silêncio total, o livro só se torna, por isso, ainda mais digno de atenção.

Cadeia para a inocência

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil, 31 de agosto de 2006

Mike Whitney, um popular escritor de esquerda, está defendendo a tese de que o seqüestro dos repórteres Steve Centanni e Olaf Wiig por terroristas palestinos foi um ato justo e inteiramente legal. Seu argumento é o seguinte:

Premissa maior: Centanni e Wiig trabalham na Fox News.

Premissa menor: A Fox News é “parte integrante da máquina de guerra norte-americana”.

Conclusão: Logo, Centanni e Wiig não podem ser considerados não-combatentes.

Mas, por mais que os esquerdistas odeiem a Fox News, ela não é sequer um canal conservador. Apenas dá aos conservadores cinqüenta por cento do espaço nos debates, opondo Bill O’Reilly e Michael Moore, ou Sean Hannity e Jim Colmes. Como isso é noventa e nove por cento a mais do que a opinião politicamente incorreta tem no restante da mídia chique e cem por cento a mais do que o elevado espírito democrático da esquerda pode tolerar, a Fox foi rotulada de “extrema direita”, e agora, forçando o hiperbolismo até à demência, de organização militar a serviço do imperialismo judaico-americano.

 Assim, embora Centanni e Wiig tenham se limitado a fazer a cobertura da guerra sem xingar nem árabes nem judeus, eles entram na história como membros das tropas invasoras, podendo ser seqüestrados ou mortos sem ofensa ao direito internacional.

Houve quem reclamasse da estupidez psicótica do argumento de Whitney, mas até agora ninguém deu sinal de ter percebido o óbvio: ao distorcer monstruosamente os fatos para conceder aos terroristas o direito de matar americanos inocentes, ele forneceu baldes de conforto e auxílio ao inimigo e cometeu portanto crime de traição. O lugar dele é na cadeia.

Lá também deveriam estar, pela mesma razão, todos aqueles que, como o o ex-procurador Ramsay Clark, acusam o governo americano de “crimes de guerra” no Iraque. Segundo averiguação do Washington Post, tão suspeito de bushismo quanto eu de lulismo, o número de soldados americanos judicialmente acusados de matar civis de propósito desde o início da guerra é de exatamente 39. Milhares de olhos ferozes ciscando criminosos de guerra para jogar na cara do presidente, e a colheita é de trinta e nove em três anos de combates — a quota mais baixa já registrada em qualquer conflito militar. Se houve no mundo um governo inocente de crimes de guerra, é o governo Bush. Os que o acusam disso fazem guerra psicológica a serviço do inimigo: são uma Quinta-Coluna e, sem nenhuma figura de linguagem, parte integrante da máquina de guerra assimétrica do Hezbollah e da Al-Qaeda. Mas eles são tantos, que todas as cadeias dos EUA não bastariam para abrigá-los. Quando a impunidade geral é a solução mais cômoda, o crime se converte em lei e exige cadeia para a inocência. Rendendo-se a isso, os inocentes se tornam por sua vez culpados de entregar o país, sem luta, aos inimigos que planejam destrui-lo. Se, avessos a enxergar a deslealdade cínica de seus adversários, os conservadores continuarem tratando como debate normal de opiniões o que é de fato uma guerra civil unilateral, os EUA se tornarão uma nação de culpados – uma nação condenada.

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