Minha aluna e o Marcos Bagno

Olavo de Carvalho

30 de junho de 2000

Carta e comentários

Graça Salgueiro faz parte de um grupo de alunos do Recife, que se reúnem mensalmente para assistir às fitas doSeminário de Filosofia e depois me enviam perguntas por e-mail ou telefone. — O. de C.

Querido professor,

Sou amiga de longuíssima data do escritor e lingüista Marcos Bagno, a quem o senhor se refere no artigo “Quem Come Quem”. Como sua homepage é muito extensa, só recentemente li esse texto e, sendo amiga da pessoa a quem o senhor se refere, e conhecedora do livro Preconceito Lingüístico: o que é, como se faz, me senti, por uma questão de consciência, no dever de informar ao meu amigo o que se falava sobre sua obra. Fiquei estarrecida com o seu artigo, porque, na ocasião em que li o livro achei-o revolucionário (no sentido de transformador). Ocorre que o senhor enxerga o que ninguém mais viu! Seus comentários são absolutamente pertinentes e, por isso mesmo, acreditei ser importante que o autor conhecesse seus argumentos, porque essa é a tese que ele brevemente estará defendendo, no doutorado que faz na USP. Fiquei bem chateada com a resposta que ele me enviou, pois dizia que a sua opinião não contava, que o sr. era um reacionário direitista e que servia de chacota em todas as universidades. Isso me deixou triste por ele, porque mostrou não ter bom alcance de visão, além de não ter maturidade, nem humildade, para averiguar nas críticas, o que poderia melhorar a qualidade do seu trabalho. Mostrou-se bem uspiano, aquele que outrora eu via como uma das pessoas mais cultas e inteligentes que conheci.

Obs. — Não reclamemos do prof. Bagno. Ele merece até um pouco de gratidão. Não podendo refutar as críticas que fiz à sua tese, contenta-se, com exemplar modéstia, em cochichar pelos cantos no recinto fechado da universidade, bem protegido entre seus alunos, longe de mim e de um confronto que em tais condições lhe seria mais temível que a peste. Se ele reagisse em público, isto me obrigaria a desenvolver as observações casuais que fiz no meu artigo, entrando numa análise detalhada que reduziria a pó as demais pretensões científicas desse rapaz, e então eu seria, com justa razão, acusado de bater em criança. Deixemos, pois, as coisas como estão. Outro dia pensei em responder às críticas tolas que ele fizera a um projeto do deputado Aldo Rabelo em defesa da língua pátria. Mas depois admiti que não era necessário: um sujeito chamado Bagno já contém no próprio nome a indicação precisa do que deveria ir fazer.

Não fique triste, querida, pois decepções com amigos de juventude são uma fatalidade incontornável na vida de quem aprende, evolui e vê os companheiros de geração ficando cada vez mais para trás, cada vez mais burros, cada vez mais rígidos e encarquilhados naquela forma de velhice que é, de todas, a única realmente lamentável: a velhice de livre escolha. Certa vez um amigo meu, a quem a ditadura preservou da decadência obrigando-o a refugiar-se nos EUA, onde acabou casando e ficando, veio visitar a terrinha e me convidou a ir a um jantar de ex-alunos do nosso antigo colégio. “Não vá lá”, aconselhei. Ele foi. No dia seguinte estava acabrunhado com o espetáculo de decrepitude prematura que acabara por presenciar. Da infância e da adolescência devemos conservar somente o espírito — a curiosidade da primeira, a coragem da segunda —, nunca as pessoas, a não ser que elas conservem esse espírito também, mas aí já não se tratará de amigos de ontem, e sim de amigos de sempre. Curiosamente, a maior parte de meus amigos tem trinta anos a mais ou a menos que eu: meu círculo de relações divide-se numa ala geriátrica e outra pediátrica. Da minha geração sobraram só três, que estão, veja só, um nos EUA, outro na Itália, outro na China. Dos demais, pouco me importo, pois são a geração mais calhorda que este país já teve — a geração decadente por excelência, no sentido que Rosenstock dá à palavra: “Decadência é ficar acovardado por dúvidas e não ter a coragem de transmitir uma fé à geração seguinte. A decadência da geração mais velha produz a barbárie da mais jovem.” Olhe o José Serra e compreenderá o Marcos Bagno.

Estou lhe comentando esses fatos, embora saiba que em nada há de lhe afetar, para corroborar aquilo que penso a seu respeito. Quando lhe chamo “querido Professor” é por ter um respeito enorme pela sua condição de professor e filósofo, e por confirmar isso na prática, tomando como premissa o que o sr. fala na fita nº 3: ” O filósofo é aquele que transmite um ensinamento, dá o exemplo e exerce uma influência”. Eu venho aprendendo com os seus ensinamentos, seus exemplos e isso, de certa forma, me influencia intelectualmente. Tenho aprendido a ver com olhos mais críticos e a exercitar a lógica, tão sua íntima. Por natureza (e formação – sou psicóloga clínica de linha freudiana) sou muito analítica: analiso tudo, levanto mil hipóteses, vejo todas as possibilidades, até chegar a uma conclusão. Mas, sempre que leio um artigo seu ou assisto uma fita das aulas do Seminário, acabo com a mesma pergunta: “Por que eu não pensei nisso antes?”

Obs. – “Por que é que eu não pensei nisso antes?” é o mais alto elogio que se pode fazer a um pensador. Muito obrigado, minha querida.

Sabe aquela história do ovo de Colombo? Pois é. Fiquei assim com a fita nº 4, quando o sr. aborda a questão da Psicanálise, em que o Consciente, que é o descobridor das outras instâncias psíquicas, não é considerado na ordem das coisas. A sua interpretação é tão óbvia, tão fantástica, o sr. disseca os fatos, ponto por ponto, até chegar na raiz da questão, e por que ninguém viu isso antes? Nem o próprio Freud??? Pode rir, ou me apelidar de “a Louca do Jardim”, mas aplaudi nessa parte. Sou assim, completamente destrambelhada. Rio, choro, aplaudo quando assim tocada. Por isso mesmo fico chocada quando o chamam de raivoso, reacionário, arrogante. Não sei onde está isso tudo escondido, pois eu não consigo ver. Graças a Deus. Não estou lhe jogando confete, até porque acho isso medíocre e babaca; quando lhe digo essas coisas é por honestidade de pensamento e entusiasmo, enorme até, acreditando que o feed-back é uma coisa necessária (embora o sr. já não precise mais disso).

Obs. – “Raivoso” é óbvio que não sou. Uma das coisas que mais irritam certos fulanos é justamente sua incapacidade de me irritar, de me fazer perder o bom-humor e a desenvoltura verbal que vem dele. Não sou raivoso, mas eles adorariam que eu o fosse, pois a raiva emburrece e deixa a gente à mercê do adversário. Todo sujeito raivoso escreve naquele tom de pretensa dignidade ofendida que se infla e engrandece para impressionar e só consegue é cair no ridículo. Como eles ficariam felizes se eu lhes desse assim minha cara a tapa, como eles tão generosamente me dão as suas. Já “arrogante” vem de ab-rogare, = “exigir antes”, e designa o ator que exige aplausos antes do espetáculo. Decerto não é o meu caso, pois esperei até os 48 anos para publicar meu primeiro livro justamente para me certificar de que havia superado a ânsia juvenil de aplausos, mesmo depois do espetáculo. Quanto a “reacionário”, não é qualificativo totalmente injusto. “Reacionário” é a palavra com que os candidatos a tiranos designam aqueles que oferecem uma incômoda resistência às suas tentativas de assalto ao poder. Os comunistas usaram esse termo nos versos da “Internacional” e os nazistas na “Canção de Horst Wessel” para qualificar seus inimigos. A crença subentendida é que quem é contra eles é contra o progresso. Se o progresso consiste em botar essa gente no governo, então sou reacionário, sim, com muita honra, como o foram Nelson Rodrigues, T. S. Eliot, Jorge Luís Borges, Miguel de Unamuno, Fernando Pessoa e tantos outros cujo exemplo me inspira. Prefiro viver no passado a submeter-me a um futuro moldado por Hitler, Stalins, Castros e tutti quanti. Antes um passado vivo que um futuro morto.

Quanto a você, minha querida, pode ser destrambelhada o quanto queira, mas uma coisa é certa: sou seu fã. Sua sensibilidade às nuanças do meu discurso mostra que não assiste às aulas só com a inteligência, mas com o seu ser inteiro, condição, aliás, para que a inteligência esteja lá.

Agora, tem uma coisa que eu queria lhe dizer: a qualidade das fitas (ou a pouca qualidade) tem dificultado a compreensão das palavras ditas em certos momentos, pois com a tradutora, muitas vezes ela não espera o sr. acabar de falar, de modo que nem escutamos o que o sr. diz, nem o que ela diz. Às vezes, também, o sr. põe a mão na boca, num gesto super-comum, mas abafa o som, tornando-o ininteligível. É possível minimizar essas falhas? Estou tentando transcrever as fitas, mas esses acidentes dificultam bastante. Perdoe a exigência; é que tudo isso tem sido muito importante para mim. Até quando o sr. fica no Brasil? Depois que o sr. voltar, posso continuar escrevendo? Se eu não estiver sendo chata, cansativa, inconveniente, gostava imenso que isso fosse possível, mas, por favor, me informe se isso lhe desagrada.

Obs. – Tenho muitos cacoetes que um orador profissional policiaria com mais cuidado. Não prometo livrar-me deles, pois quando estou dando aula fico tão absorvido no assunto que não noto nem se estou de braguilha aberta. O que posso e prometo fazer é solicitar que os alunos me vigiem e que o encarregado da gravação peça repetições das falas obscuras. OK? Quanto à tradutora, minha queridíssima amiga romena Iulia Baran, ela não tem culpa de ser esperta e captar meu pensamento — com notável exatidão — antes de eu acabar a frase. Em todo caso, vou pedir-lhe que ela refreie sua exuberância.

Fico no Brasil enquanto me deixarem. Ainda este ano volto à Romênia, mas por poucas semanas. Quanto às suas cartas, pode enviá-las aos montes, que muito me alegram. Mas de vez em quando fale um pouco de mal de mim, senão os Bagnos vão achar que você está recebendo uma graninha da direita internacional.

Sinto uma necessidade muito grande de comentar as minhas descobertas e, nem sempre tenho com quem. Faço isso sempre com Ronaldo, mas ele está de férias, e por isso anda meio disperso, apesar de continuarmos com o grupo e de nos vermos. Ele também tem a mesma generosidade e paciência com as minhas ignorâncias, como o senhor. Obrigada, mais uma vez, por tudo que venho aprendendo.

Obs. – Obrigado por me deixar ensinar. Em geral, quando tento fazer isso, as pessoas querem me bater.

Beijinhos – Graça Salgueiro.

Obs: – Beijões – Olavo de Carvalho. E abraços afetuosos ao Ronaldo e aos demais membros do grupo.

A ética da baixeza

Olavo de Carvalho

O Globo, 24 de junho de 2000

Anterior à definitiva adesão do autor ao ideário liberal, e ainda marcado pelas ressonâncias de sua formação marxista, “Saudades do carnaval. Introdução à crise da cultura” (São Paulo, Forense, 1972) ainda é, para o meu gosto, o melhor livro do inesquecível José Guilherme Merquior. Muitos preferem “A natureza do processo”, mas tenho tantas objeções ao triunfalismo progressista meio hegeliano, meio kantiano, aí assumido pelo autor na maturidade do seu pensamento, que prefiro ficar com a visão histórica mais trágica, frankfurtiana, que entenebrecia as meditações do jovem filósofo.

“Saudades do Carnaval” permanece, até hoje, a mais ambiciosa tentativa de situar uma “interpretação do Brasil” no quadro da história geral das “paidéias” ocidentais – os ideais educativos que vieram, de época em época, orientando e cristalizando os sucessivos esforços da nossa civilização rumo a um modelo ético habilitado a conciliar a organização prática da sociedade com as exigências da dignidade espiritual da espécie humana.

Digo a mais ambiciosa, e não necessariamente a mais séria, porque em seriedade é igualada por sua precursora imediata, “Desenvolvimento e cultura. O problema do estetismo no Brasil”, de Mário Vieira de Mello (São Paulo, Nacional, 1963), a qual, sem tomar esse tema geral por seu objeto explícito, muito fez avançar a sua compreensão ao destacar, na formação da mentalidade das nossas classes letradas, em vez da herança dos grandes ideais ético-pedagógicos, a influência predominante de uma hipnose estética contraída de Jean-Jacques Rousseau, pseudo-ideal educativo que ainda hoje contamina de um viés teatral, posado e desrealizante o grotesco debate “ético” em que se deleita uma “ntelligentzia” microcéfala.

A importância vital dessas duas obras para nós hoje em dia reside precisamente no fato de que, na ausência de uma visão dos modelos superiores de conduta que fundaram a nossa civilização — para não falar das outras — , toda discussão ética tende a se perder em casuísmos e oportunismos de uma baixeza incomparável, invertendo no fim todos os valores e consagrando como exemplos de honradez e quase santidade os politiqueiros mais mesquinhos, os agitadores mais brutais, as estrelas mais ocamente vaidosas do “show business”.

Que de início todas as esperanças se depositassem sonsamente na promessa de “passar o Brasil a limpo” mediante CPIs e cassações, repetindo com signo ideológico inverso as Comissões Gerais de Inquérito do regime militar, mostra apenas a pressa indecente com que um descarado revanchismo, apostando na falta de memória popular, lança mão das armas cujo uso condenava em seus adversários. Mas que, passados doze anos de escândalos, perseguições, demissões e “impeachments”, sem outro resultado visível senão a multiplicação das denúncias e a fixação do país num estado crônico de desprezo a si mesmo, ainda haja quem insista em que “o problema do Brasil é a impunidade” e em que tudo se resolverá com novos acréscimos de ferocidade na autodestruição das instituições, eis um fenômeno que denota, nas nossas classes falantes, já não apenas a recusa obstinada de aprender com a experiência, já não apenas a confiança cega nas virtudes da oratória selvagem, mas, positivamente, uma visceral desonestidade e uma falta completa de amor ao Brasil.

Não existe ética, não existe moral onde não existe amor à verdade, e não existe amor à verdade onde não existe a paciência de buscá-la. Quando os intelectuais abandonam toda investigação séria para consagrar-se à tarefa auto-assumida de “fazer história”, de moldar o mundo à sua imagem e semelhança, de derrubar governos e inventar sociedades, a consciência geral se rebaixa ao nível dos cabos eleitorais e dos incitadores de desordens. Nesse momento, dizia Eric Voegelin, os personagens mais desprezíveis e caricatos, que numa situação normal seriam votados ao esquecimento ou ao ridículo, adquirem súbito relevo como encarnações literais e rasas dos caprichos da multidão enfurecida que, na desorientação geral, se afirmam como um “Ersatz” do bem e da justiça.

Já observei que, em outras épocas, “líder popular” era uma pessoa de extração social humilde que, por seus méritos e esforços pessoais, se elevava acima de seus pares sem perder o elo de fidelidade com o meio de origem. Hoje, ou é um diplomado que se disfarça de proleta, imitando o vestuário e a fala dos pobres (o que é no mínimo um desrespeito), ou é algum filho do acaso, que, vindo de baixo e desfrutando à larga de seu novo padrão de vida, insiste em conservar e alardear com orgulho sua condição originária de pessoa de poucas letras, choramingando sua exclusão do ensino “elitista” e promovendo a identificação, altamente difamatória, da pobreza com a ignorância.

Esses tipos são hoje exibidos à multidão como modelos de vida humana, para a edificação de nossas crianças. Em torno deles, um círculo de intelectuais bajuladores consagra-os como personificações máximas do gênio popular brasileiro. Deprimente e aviltante, esse fenômeno reflete, nas gentes acadêmicas, a perda completa da orientação no universo dos valores e da história.

Levado pelo discurso insano de acadêmicos semiletrados, o Brasil desgarra-se do eixo do mundo, errando num espaço sem fundo onde todas as proporções se embaralham, onde os juízos morais mais óbvios suscitam escândalo e onde o disforme e o obscuro se tornam a medida de todas as coisas.

Eis o motivo pelo qual é urgente retomar os estudos que foram iniciados por José Guilherme Merquior e Mário Vieira de Mello. Ou aprendemos a encaixar as aspirações brasileiras no quadro de critérios éticos universalmente válidos — pois este era o problema que os atormentava –, ou logo não conseguiremos conceber moralidade mais alta que a do delator ressentido que, entre uivos de ódio cívico, envia seus desafetos à guilhotina.

A nação contra o crime, ou: primor de inocuidade

Olavo de Carvalho

Época, 24 de junho de 2000

O Plano Nacional de Segurança Pública divide-se em medidas irrelevantes e decisões suicidas

Metade dos itens que o presidente da República destacou ao anunciar seu plano de combate à criminalidade não tem nada a ver com criminalidade.

Ninguém pode ser contra a iluminação de periferias e favelas, mas bilhões de watts ligados não me farão ver que dano ela poderá trazer às gangues que ali exercem seu poder em plena luz do dia.

Centros de esporte e lazer inseridos num plano de combate ao crime subentendem a teoria – do eminente psicólogo doutor Leonel Brizola – de que as pessoas se dedicam a matar seus semelhantes porque não têm onde jogar futebol.

Preenchimento de vagas em repartições ou providências gerais sob o nome de “modernização” e “reaparelhamento” são medidas cíclicas, independentes do aumento ou do decréscimo do número de crimes.

A impressão que me fica é que o governo simplesmente ciscou idéias esparsas que já estavam para ser adotadas em vários campos e, diante da comoção nacional com a pletora de crimes, as reuniu às pressas sob a enfática denominação geral de Plano Nacional de Segurança Pública.

O plano só abandona o campo da perfeita inocuidade para entrar no das decisões temerárias e virtualmente suicidas, das quais duas são atordoantes. Proibir o registro de armas é o mais formidável incentivo já recebido pelo comércio ilegal desses instrumentos. A utilização direta das Forças Armadas no combate ao crime é ela própria um crime, que arrisca desmantelar o que resta dessas instituições.

Devotado a minhas funções de análise e crítica, odeio dar palpites na busca de soluções, mas a confusão na área de segurança já chegou a tal ponto que não resisto ao impulso de sugerir algumas coisas. Por exemplo: em vez de rebaixar as Forças Armadas a elemento auxiliar das polícias, o governo deveria restaurar imediatamente a Inspetoria-Geral das Polícias Militares, que serviu para inibir significativamente a corrupção policial. Em vez de proibir o comércio de armas, seria preciso incentivá-lo, condicionando a concessão do porte ao compromisso do usuário de submeter-se a treinamento especializado para servir, quando convocado, de auxiliar em operações policiais em sua área de residência. Isso disseminaria entre os cidadãos o senso de responsabilidade pessoal pela segurança pública, além de afastar da tentação das armas os ineptos e despreparados.

Acho que essas idéias podem ser úteis. Mas podem estar erradas, e aliás não são o essencial. O essencial e certo depende de nós, jornalistas, escritores, intelectuais, professores, artistas – os gerentes do imaginário coletivo e dos valores que movem a História. Se cada um de nós não fizer um exame de consciência, distinguindo em palavras e ações o que é desejo sincero de combater o banditismo e o que é intuito camuflado de incentivá-lo para em seguida fazer dele um pretexto de crítica pérfida, uma arma para a derrubada das instituições e para a instauração de nossas lindas utopias, nós nos tornaremos, se é que já não somos, uma poderosa causa secreta da ascensão imperial do crime. E nenhum plano policial nos impedirá de, para cada bandido preso, espalhar mais dez ou 20 pelas ruas.