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O silêncio dos tagarelas

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil, 25 de agosto de 2005

O ciclo de palestras “O Silêncio dos Intelectuais” não é, como aparenta, uma oportunidade de reflexão sobre os crimes do PT: é parte integrante da trama criminosa.

Patrocinado pelo mesmo governo que subornou metade da classe política, sua única finalidade é ajudar a elite esquerdista a lucrar com a revelação de sua própria torpeza, requentando e vendendo como novidade salvadora os decrépitos slogans, chavões e mentiras que a levaram ao poder e encobriram seus planos delituosos com a máscara da superioridade moral.

Não estranha que as estrelas maiores do espetáculo sejam as mesmas que criaram as condições culturais para a ascensão petista, nem que a mais cintilante do elenco, Marilena Chauí, rebole até à exaustão no palco da dialética para tentar suprimir o óbvio, lançando as culpas do vexame governamental sobre a política econômica do dr. Palocci, como se os crimes denunciados não viessem de mais de uma década e não tivessem nada, nadinha a ver com a velha afeição do PT por quadrilhas de narcoterroristas e seqüestradores.

O título mesmo do show é propaganda enganosa. Quando os que aparecem acusando-se de excesso de silêncio não são outros senão os gurus políticos mais tagarelas do hemisfério, presenças infalíveis em todos os debates lindamente democráticos da esquerda com ela própria, é manifesto que a confissão fingida tem por objetivo camuflar o pecado genuíno e habilitar o pecador a cometê-lo de novo, com redobrada força e ainda maior tranqüilidade de conciência.

Mesmo como discussão genérica do papel dos intelectuais na vida pública, o ciclo, a julgar pelos resumos e transcrições publicados até agora, é puro blefe diversionista, como se vê pelo seu alheamento de todos os debates sobre o assunto ocorridos fora do estreito círculo da militância esquerdista na última década. Claro: os pontos centrais desses debates têm sido a subserviência dos intelectuais de esquerda aos regimes genocidas, a obstinação patética com que negam seus crimes mesmo depois de provados com fartura de documentos e, last not least, a astúcia escorregadia com que, no empenho de fugir a um confronto com seu passado infame, apelam ao recurso extremo de dissolver os critérios mesmos da verdade e até os meios linguísticos de apreendê-la (modas como o desconstrucionismo ou o neo-relativismo foram inventadas para isso e para nada mais).

Inumeráveis livros têm sido publicados a respeito, como “Un Pavé dans l’Histoire” de Stéphane Courtois, “Tenured Radicals” de Roger Kimball, “The Twilight of the Intellectuals” de Hilton Kramer, “In Denial” de John Earl Haynes ou “Literature Lost” de John M. Ellis. Tão vasto é o impacto de obras como essas na compreensão que se tem hoje dos intelectuais na sociedade, que sua omissão num debate alegadamente focado no assunto só pode ser prova de inépcia completa, de deliberação maliciosa ou da mistura tipicamente esquerdista desses dois ingredientes. Quando alguém se mostra muito assanhado para discutir alguma coisa, ao mesmo tempo que nem cogita em obter informação atualizada a respeito, contentando-se preguiçosamente com as referências mais antigas e convencionais, é evidente que sua afetação de interesse no objeto é mero disfarce de alguma intenção não declarada. Para fins de dissimular a sujeira esquerdista sob uma aparência de preocupação intelectual séria, bastam mesmo o velho Sartre, a escola de Frankfurt, etc., enfim a ração consuetudinária do esquerdismo escolar.

Tão evidente é o oportunismo publicitário da comédia, tão patente o seu desprezo às condições requeridas para um estudo responsável do tema anunciado, que discuti-la no plano das idéias é atribuir-lhe uma dignidade que não tem. Intelectualmente, ela não significa nada. Politicamente, é de uma baixeza sem par.

Se o Brasil quer se livrar da corrupção política, deve primeiro abster-se de outorgar a intelectuais corruptores uma deferência imerecida, principalmente quando ela, como as consciências dos Delúbios, é comprada com dinheiro público.

Sindicato de raposas

Olavo de Carvalho

O Globo, 27 de novembro de 2004

O novo best seller de Bernard Goldberg, Arrogance. Rescuing America from the Media Elite (Warner, 2004), será tão ignorado no Brasil quanto o anterior, Bias. A CBS Insider Exposes How the Media Distort the News (Regnery, 2002). Será tão ignorado quanto os cento e tantos livros que documentaram, nos últimos anos, a transformação da mídia americana numa máquina de propaganda esquerdista. Uma diferença entre os EUA e o Brasil é que lá esse assunto pode ser discutido, aqui não.

A denúncia das repetidas mentiras do New York Times, da CBS e do beautiful people de Hollywood gerou uma poderosa reação popular sob a forma da rede de blogs e programas de rádio que desmascararam o farsante Dan Rather, furaram o balão de Michael Moore e neutralizaram o efeito Soros na eleição presidencial.

No Brasil, até mesmo os sites tipo media watch, que deveriam contrabalançar o esquerdismo dos jornais e da TV, são organizações esquerdistas subsidiadas por organismos internacionais, ONGs milionárias e dinheiro público de universidades e ministérios. Não há um que escape à regra, não há um que faça jus à “independência” que todos alegam pomposamente. Sua única função é impor a discussão interna da esquerda como Ersatz do pluralismo, levando a farsa até o ponto em que o público se acostume à idéia de que excluir as opiniões antipáticas é a condição natural e óbvia de um debate democrático. Já não é mais uma raposa tomando conta do galinheiro. É o sindicato das raposas organizado para que nenhuma galinha escape à sua vigilância. Nunca, fora dos países comunistas e fascistas, se viu tão maciça uniformidade. Todos os espaços foram ocupados, todas as brechas preenchidas, todas as possibilidades de contestação genuína eliminadas ou substituídas eficazmente por disputas menores entre os sócios do clube.

Nos EUA, Rather perdeu o emprego, a vendagem dos grandes jornais caiu assustadoramente, o New York Times foi obrigado a se desdizer muitas vezes. Aqui, o autor de calúnias assombrosas contra as Forças Armadas é cumulado de prêmios e os mentirosos mais notórios são incensados como guardiões da probidade jornalística, enquanto a simples exigência de um confronto equitativo é condenada como fanatismo de direita e prova cabal de “intolerância”. As palavras, neste país, já não significam nada.

Mas não é só o debate jornalístico dos EUA que se tornou inacessível ao público nacional. Nenhuma opinião que venha dos conservadores americanos tem aqui o direito de se expor com suas próprias palavras: só aparece na versão expurgada e deformante que convém aos objetivos da esquerda. O motivo é óbvio: a superioridade intelectual da direita americana, a solidez de seus argumentos, a alta seriedade moral que a inspira têm de ser ocultadas a todo preço para sustentar a lenda de que a cultura e a civilização foram derrotadas por caipiras analfabetos. Os sabujos locais de George Soros, da Comunidade Européia, da ONU e da China executam o serviço com uma dedicação admirável, se bem que nem todos possam gabar-se de fazê-lo de graça.

O que não se pode negar é que eles próprios sofrem os efeitos do processo. Imunizados contra qualquer perigo de contestação séria, não precisam duvidar de si mesmos, examinar criticamente o que escrevem, prestar satisfações aos fatos, à lógica à moral. Podem trapacear e fantasiar o quanto queiram. O resultado é a atrofia completa do seu senso crítico, a substituição de sua minguada inteligência por um excesso de arrogância insensata.

Um figurão das redondezas andou recentemente alardeando a pesquisa (furadíssima) que culpava as tropas americanas pela morte de cem mil iraquianos. Contestado pela aritmética elementar, saiu-se com a desculpa de que a gravidade do caso não era afetada pela quantidade maior ou menor de vítimas — como se não tivesse sido ele mesmo o primeiro a apelar ao argumento da quantidade.

Como discutir com um sujeito desses? Aristóteles já ensinava que é loucura debater com gente sem princípios.

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Não deixem de ler Cuba: A Tragédia da Utopia, de Percival Puggina (Literalis Editora, Porto Alegre, literalis@terra.com.br).

Máscara e rosto da direita

Olavo de Carvalho


Zero Hora, 2 de maio de 2004

O Fórum da Liberdade é a única arena de debates verdadeiramente democrática que existe neste país – muito diferente dos festivais de autopromoção esquerdista que o dinheiro público espalhou por toda parte.

O décimo-sétimo, do qual participei em abril na PUC de Porto Alegre, foi o maior e o melhor de todos, talvez por ter sido realizado em ambiente universitário, tradicional feudo esquerdista que pela primeira vez teve a oportunidade de ver liberais e conservadores em pessoa e não pelas lentes deformantes do preconceito estabelecido.

Ao longo de quase trinta anos de ininterrupta “ocupação de espaços”, sem defrontar-se com a mínima resistência, a esquerda conseguiu até mesmo o prodígio de inventar uma direita para seu uso próprio, constituída de banqueiros vorazes e velhos políticos corruptos, oportunistas e sem nenhuma crença política identificável, mas dotados do physique de rôle apropriado para encobrir, com suas panças grotescas, o rosto da direita autêntica, hoje quase desprovida de porta-vozes políticos e constituída tão-somente de intelectuais marginalizados pelo patrulhamento gramsciano, estudantes oprimidos pela inquisição “politicamente correta” e empresários estrangulados pelo fisco. Tão grande é a força hipnótica dos estereótipos, que nem o fato mesmo de aqueles banqueiros e políticos constituírem um dos mais fortes esteios do establishment petista impede que a opinião pública, bem amestrada pelo jogo pavloviano da propaganda oficial, continue a encará-los como a personificação mesma do capitalismo, assim facilmente associado ao mal. É nessa condição que eles vêm servindo de Judas em sábado de aleluia, desviando para sua própria testa as pauladas destinadas ao governo e babando-se de prazer no desempenho desse ofício abjeto.

Para desmontar essa farsa, nada melhor do que a direita subir ao palco e mostrar-se ao público, desalojando os fantoches pré-fabricados que a astúcia esquerdista pôs no seu lugar para desmoralizá-la.

Não há quem, ouvindo um Eduardo Gianetti da Fonseca, um Denis Rosenfield, uma Ruth Richardson, um Daniel Piza, não perceba de imediato três realidades que vêm sendo sistematicamente ocultadas: (1) que o pensamento pró-capitalista é, do ponto de vista intelectual, esmagadoramente superior ao esquerdismo estabelecido; (2) que o liberalismo nada tem a ver com o estereótipo “neoliberal” que a esquerda inventou para encenar vitórias fáceis sobre um adversário fictício; (3) que ser conservador é lutar pela conservação de valores morais e da liberdade, não de privilégios e mamatas – um “conservadorismo” típico, isto sim, dos marionetes a serviço do governo federal.

É para tornar essas realidades patentes que existe o Fórum da Liberdade. Ele cumpre esse papel com honra e brilho incomuns, e para mim tem sido uma alegria poder contribuir de algum modo para o seu sucesso.

Se algo fosse possível fazer para torná-lo melhor ainda, eu sugeriria duas coisas.

Primeira, o Fórum tem de ser levado para outros Estados da federação. O mérito do empreendimento é gaúcho, mas seus benefícios devem estender-se a todos os brasileiros.

Segunda: que o temário, ainda bastante concentrado nos tópicos econômico-administrativos, seja estendido para abranger a estratégia de dominação esquerdista nos seus aspectos político, cultural e criminal. Sei que isso é explosivo, mas a insistência nos assuntos econômico-administrativos pode legitimar uma impressão de normalidade da situação político-social, contribuindo involuntariamente para dar credibilidade à mentira esquerdista imperante. Expor e denunciar a ação revolucionária do “Foro de São Paulo”, coordenação do movimento comunista no continente, responsável por todos os descalabros que hoje atormentam este país, é obrigação de todos os que a conheçam. Ainda há tempo de fazer isso. Mas há cada vez menos tempo.

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