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Perdedores

 

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial),26 de julho de 2007

Se os nossos liberais e conservadores quiserem tirar proveito da crescente impopularidade do governo Lula para destruí-lo na base do puro moralismo apolítico, sem vincular a corrupção petista ao esquema revolucionário continental que a origina e explica, só conseguirão um resultado: ajudar a esquerda a limpar-se na sua própria sujeira e a emergir ainda mais forte e prestigiosa da revelação dos seus crimes inumeráveis, pronta para cometê-los em dose ainda maior sob o manto da autoridade moral adquirida mediante um antilulismo de ocasião.

Habituada a um jogo tático provinciano que só cuida de imagem eleitoral e marketing – sem planos de longo prazo, sem estragégia, sem luta pela hegemonia cultural, sem visão das questões mundiais, até mesmo sem militância organizada –, nossa “direita” não pensa senão em aproveitar-se dos momentos de sorte e minar a reputação do adversário sem precisar fazer política de verdade.

Os anos finais da carreira de Antonio Carlos Magalhães deveriam bastar como ilustração do destino que aguarda uma facção política conformada a perder sempre e ainda ser acusada de “dona do poder”.

Quando todos viam no ex-governador da Bahia uma força política invencível, anunciei que o PT não precisaria de mais de cinco minutos para reduzi-lo à total impotência, só não o fazendo porque não o considerava, até então, perigoso o bastante para ter de ser removido da cena. Ao morrer, o grande cacique não tinha mais de nove adeptos na Câmara onde outrora tivera mais de duzentos.

O mesmo afirmei do sr. Paulo Maluf, cuja mais alta ambição política hoje em dia, se alguma lhe resta, é conseguir terminar seus dias fora da cadeia.

Digo agora coisa idêntica dos srs. Aécio Neves, César Maia e demais líderes antipetistas restantes. Cada um deles pode, a qualquer momento e sem a menor dificuldade, ser jogado na lata de lixo da História, sem direito a dizer “ai”. Nenhum deles tem cacife para resistir a um esforço conjugado da esquerda para destruí-lo, coisa que até agora ela só não fez porque não precisou.

O motivo dessa fraqueza congênita é mais que evidente: esses políticos e as forças que os apóiam só têm eleitores, não militantes.

Eleitor é o sujeito que dá uma forcinha ao político, durante alguns segundos, de quatro em quatro anos.

Militante é aquele que luta pelos objetivos do seu partido vinte e quatro horas por dia, que se adestra para isso e se imbui de um corpo de sentimentos de solidariedade grupal pelos quais dá a vida e oferece a morte.

A esquerda tem milhões de militantes, preparados ao longo de quarenta anos. A “direita” tem eleitores ocasionais, volúveis, dos quais muitos votaram em Lula e não hesitarão em votar em Heloísa Helena.

A esquerda faz política nas escolas, nas igrejas, nos lares, nas instituições de cultura e dentro das redações. Faz política até em consultórios de psicologia clínica e aconselhamento matrimonial, injetando fundo seus símbolos e valores nas almas fragilizadas.

A “direita” faz política em editoriais de jornal, em manobras parlamentares e em discursos eleitorais.

A esquerda, tendo conquistado a hegemonia cultural, dirige o processo como um todo. A “direita” se adapta como pode, tentando defender um votos aqui, um carguinho acolá. Isso não é disputa. É derrota mal camuflada.

Nada poderia deixar mais evidente a subserviência – ou suicídio — mental da direita do que a decisão do PFL, quando da sua mudança para DEM, de declarar-se inspirado no modelo do Partido Democrata americano – o partido de Fidel Castro, Hugo Chávez e George Soros.

Depois disso, que mais falta para admitir que, com Lula ou sem Lula, com Marco Aurélio Garcia ou sem Marco Aurélio Garcia, só a esquerda tem direito à existência neste país?

Relendo o JB

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 26 de julho de 2007

Em 26 de dezembro de 1994 publiquei neste mesmo jornal o artigo “Bandidos e Letrados”, que hoje pode ser lido no meu website. Começa assim:

“ Entre as causas do banditismo carioca, há uma que todo o mundo conhece mas jamais é mencionada, porque se tornou tabu: há sessenta anos os nossos escritores e artistas produzem uma cultura de idealização da malandragem, do vício e do crime. Como isto poderia deixar de contribuir, ao menos a longo prazo, para criar uma atmosfera favorável à propagação do banditismo?

“De Capitães da Areia até a novela Guerra sem Fim , passando pelas obras de Amando Fontes, Marques Rebelo, João Antônio, Lêdo Ivo, pelo teatro de Nelson Rodrigues e Chico Buarque, pelos filmes de Roberto Farias, Nelson Pereira dos Santos, Carlos Diegues, Rogério Sganzerla e não sei mais quantos, a palavra-de-ordem é uma só, repetida em coro de geração em geração… Humanizar a imagem do delinqüente, deformar, caricaturar até os limites do grotesco e da animalidade o cidadão de classe média e alta… eis o mandamento que nossos artistas têm seguido fielmente, e a que um exército de sociólogos, psicólogos e cientistas políticos dá discretamente, na retaguarda, um simulacro de respaldo ‘científico’.”

E por aí vai. Eu gostaria de escrever algo mais atual, mas não posso. Só tenho três detalhes a acrescentar:

Primeiro: É preciso trocar “banditismo carioca” por “banditismo nacional”. O Rio já não é a capital nacional do crime. Divide essa honra com uma dúzia de cidades dominadas pelo narcotráfico e pelas gangues armadas, treinadas e orientadas pelas Farc. O país inteiro tornou-se um matadouro. Cinqüenta mil brasileiros morrem assassinados a cada ano, e quem quer que ouse insinuar que a polícia deveria usar a força contra os assassinos é chamado de nazista.

Segundo: Os intelectuais iluminados continuam fomentando o banditismo, mas já não o fazem só por meio de livros, filmes e novelas. Subiram ao poder e agora têm meios de ação mais eficientes: criam leis, tomam decisões de governo, têm à sua disposição o aparato inteiro do Estado para espalhar o caos e administrá-lo em proveito próprio.

Terceiro: Na época, eu não sabia da existência do Foro de São Paulo, onde os partidos legais de esquerda planejam, em estreita parceria com organizações de narcotraficantes e seqüestradores, o futuro catastrófico do Brasil e do continente inteiro. Quando soube, dois anos depois, entendi imediatamente que nada no panorama nacional de confusão e violência crescentes nascia das causas sócio-econômicas impessoais usualmente alegadas para explicá-lo. Toda a tagarelice universitária e jornalística nesse sentido, invariavelmente obra de intelectuais de esquerda comprometidos até à medula com o esquema do Foro, era — e é ainda — um vasto sistema de camuflagens calculado para encobrir uma estratégia criminosa de proporções jamais vistas nesta ou em qualquer outra parte do mundo.

Mesmo com a visão parcial que eu tinha do assunto ao escrevê-lo, meu artigo de 1994 era um alerta. Não foi ouvido, como este também não será.

Luta desigual

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 23 de julho de 2007

O site http://juliosevero.blogspot.com, fechado por pressão de militantes gayzistas, voltou ao ar após a publicação do meu artigo “Concurso de Crimes”. O Google reconheceu o óbvio: quem é vítima de crime, como aquelas criaturas diziam ser, não vai pedir socorro a um provedor da internet: vai à polícia. A acusação lançada contra o dono do blog – “Ele quer que possamos ser currados sem que nossos agressores paguem por isso” – é a mais mentirosa e cínica que já se fez a um formador de opinião neste país. Os engraçadinhos sabiam que não podiam ir a um juiz ou delegado com uma conversa dessas. Então tentaram ludibriar o Google, mas, é claro, não deu certo.

O episódio prova, uma vez mais, que o movimento gayzista foge deliberadamente a toda discussão, que ele não quer debater com seus adversários, mas destruí-los socialmente, privá-los de seus meios de expressão, reduzi-los à condição de párias e, por fim, colocá-los na cadeia em massa, na mais espetacular onda de perseguição religiosa que já se terá visto na história nacional. É o bom e velho método leninista: falar sempre “numa linguagem calculada para despertar contra o oponente os piores pensamentos, as piores suspeitas; não para corrigir-lhe os erros, mas para destrui-lo” ( Selected Works, Vol. III, pp. 486 ss.).

Nos sites e assembléias onde se prepara a reação gayzista a seus críticos, não se vê uma só tentativa de conceber argumentos para um eventual enfrentamento dialético: só planos de assédio judicial, de boicote na internet, de assassinato moral a pretexto de “ódio”, “preconceito”, “fundamentalismo” e “homofobia”. Mas o que mais aparece, o elemento mais constante e infalível nessas discussões internas, é a proposta de vasculhar a vida pessoal dos adversários em busca de sinais de “homossexualismo enrustido” que possam ser usados em campanhas de difamação.

Nada poderia comprovar mais claramente a índole criminosa desse movimento do que a naturalidade, a quase inocência com que ali se aceita o uso de instrumentos ilícitos e supremamente perversos como armas de combate normais e decentes na luta pela hegemonia ideológica e pelo poder.

O embuste legislativo da PL-122, que define um crime e já enquadra nele antecipadamente quem quer que levante um argumento contra a consolidação da proposta em lei, é tão obviamente totalitário e cínico que o observador incapaz de perceber isso à primeira vista deve ser considerado vítima de grave deficiência mental.

A proposta não foi concebida para proteger homossexuais contra uma inexistente epidemia de violência anti- gay , mas para dar a um grupo político o poder de praticar impunemente os delitos de ultraje a culto, calúnia, difamação e injúria, criminalizando automaticamente quem quer que o acuse disso. No ataque a Júlio Severo, esse objetivo ficou mais evidente do que nunca.

No entanto, nos meios liberais e conservadores, ainda há quem veja o assunto somente pela ótica estereotipada dos “direitos dos gays ”, sem ter a menor idéia de que não se trata de assegurar direitos a uma comunidade, mas de negá-los a todas as demais. Ser “de direita” não imuniza contra a força onipresente da propaganda esquerdista. Quando um slogan , um estereótipo entra na imaginação popular, nem mesmo os fatos mais patentes, as demonstrações mais exatas, os documentos mais probantes conseguem desfazer o ilusionismo e mostrar à mente preguiçosa a realidade como ela é. Se não fosse essa mórbida tendência do cérebro humano à repetição mecânica de palavras-de-ordem, seria inexplicável que alguém continuasse vendo o movimento gayzista como “minoria oprimida”, ignorando a monstruosa desproporção de forças entre organizações de massa apoiadas pelo governo federal, por organismos internacionais e por fundações bilionárias, e os poucos indivíduos solitários que ousam enfrentá-las, sem recursos, sem apoio institucional e com minúsculo espaço na mídia.

Esse automatismo mental bloqueia a compreensão do significado e alcance das iniciativas gayzistas. Por mais que eu repita que o perigo da PL-122 não tem nada a ver com homossexualismo ou heterossexualismo, que a proposta foi calculada, isto sim, para entrar no Código Penal e destruí-lo por dentro como um vírus de computador, muitos leitores dos meus artigos a respeito continuam a forçar o seu significado, entendendo-os como batalhas de uma cruzada moralizante anti-homossexualista, da qual não participei nem participaria. Certa vez o educador Cláudio Moura Castro observou que brasileiro não lê o que está escrito: lê o que ele próprio imagina.

Na próxima coluna tentarei explicar, de novo e mais claramente, qual é o problema com o movimento gayzista e por que é um problema de poder político e não de moral sexual. Se mesmo assim não entenderem, passarei a escrever artigos com fundo musical cantado pela Cris Nicolotti.

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