Posts Tagged nazistas

A cultura do genocídio

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 20 de janeiro de 2009

Desde que os exércitos aliados revelaram ao mundo os horrores dos campos de concentração nazistas, as tentativas de explicação histórica, sociológica e psicológica de um fenômeno tão inusitado e monstruoso criaram um dos ramos mais prolíficos da bibliografia universal. A cada ano que passa, centenas ou milhares de livros, teses acadêmicas e artigos em publicações eruditas e populares buscam enfrentar a questão angustiante: como e por que foi possível a uma parcela da humanidade culta rebaixar-se ao ponto de fazer da prática de crimes hediondos em massa uma obrigação legal e um mérito patriótico?

As respostas oferecidas podem ser divididas em três grupos:

(1) A corrente dominante segue uma linha inaugurada pelo Doktor Faustus de Thomas Mann, que busca as origens do nazismo no subsolo irracional e satanista da cultura alemã. A noção de que a história social e cultural da Alemanha pudesse elucidar o totalitarismo e o holocausto veio a se tornar um dogma do senso comum e a dominar, praticamente sem contestações, toda essa imensa bibliografia. A aposta nessa tese é compartilhada, em medidas diversas, pelos autores e obras mais díspares, desde produções acadêmicas respeitáveis como os estudos de Otto Friedrich, Siegfried Kracauer, Lotte Eisner, Peter Gay, Carl Schorske e as grandes biografias de Hitler por Joachim C. Fest, Ian Kershaw, Alan Bullock, até obras de cunho polêmico como The Pink Swastika, de Scott Lively e Kevin Abrams ou The Occult Hitler, de Lothar Machtan, e até mesmo especulações sobre a contribuição ocultista à formação da ideologia nazi (Nigel Pennick, Hitler’s Secret Sciences; Peter Levenda, Unholy Alliance: History of the Nazi Involvement with the Occult; Dusty Sklar, The Nazis and the Occult; Wilhelm Wulff, Zodiac and Swastika, Nicholas Goodrick-Clarke, The Occult Roots of Nazism: Secret Aryan Cults and Their Influence on Nazi Ideology etc.). O sucesso dessa linha de investigações é facilmente explicável: como o nazismo se definia a si próprio como um movimento essencialmente nacionalista, nada mais natural do que buscar suas raízes na cultura nacional que o produziu. Lendo esse material, os alemães se convenceram de que são um povo de criminosos e até hoje se desgastam em perpétuos rituais de autopurificação, que contrastam de maneira patética com a orgulhosa recusa comunista de se entregar a idêntico exame de consciência.

(2) Ao lado dessa tradição, desenvolveu-se outra que, ao contrário, procura dissolver a peculiaridade nacional do nazismo no rótulo geral de “fascismo” ou “nazifascismo”, uma noção infinitamente elástica que abarca de Hitler a George W. Bush, passando pelos líderes sionistas e pelo general Augusto Pinochet, sem esquecer o senador Joe McCarthy, a Igreja Católica, as milícias patrióticas americanas, os militares brasileiros e, de modo geral, todos os adeptos da economia de mercado (ouvi com os meus dois ouvidos um professor da USP, José Luís Fiore, exclamar: “Liberalismo é fascismo!”). Explicando o fenômeno nazista como imperialismo capitalista, esta segunda linha de investigações, fortemente subsidiada pelos escritórios de propaganda do governo soviético, é autocontraditória e desprovida do mínimo de substância intellectual que justifique um debate sério, mas, graças à rede global de organizações militantes, espalhou-se como uma peste nos meios universitários do Terceiro Mundo, daí saltando para conquistar até mesmo algum espaço na Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, tornou-se um dogma estabelecido e um dado do senso comum. Raciocinar fora dela é considerado um sintoma de doença mental ou uma prova cabal de inclinações nazifascistas. Tsk, tsk.

(3) Uma terceira linha, que subordina o conceito de nazismo à noção mais genérica das ideologias de massa, sublinhando suas semelhanças com o comunismo soviético e chinês e sondando suas origens nas fontes gerais do movimento revolucionário mundial, nunca alcançou a popularidade das outras duas, mas teve boa aceitação em círculos de estudiosos especializados graças às obras de Friedrich Hayek, Ludwig von Mises, Hannah Arendt, Norman Cohn, Eric Voegelin, Ernest Topitsch e, mais recentemente, Richard Overy.

O documentário de Edvin Snore, The Soviet Story, que já comentei aqui e que vocês podem descarregar com legendas em português no site www.endireitar.org, traz uma poderosa confirmação à tese número 3, reduz a número 2 ao engodo publicitário que ela sempre foi e, se não impugna totalmente a número 1, debilita consideravelmente as suas pretensões a ser “a” explicação dos crimes nazistas. Ao mostrar que toda a técnica dos campos de concentração e do extermínio em massa foi inventada pelos comunistas e só tardiamente copiada pelos nazistas mediante convênio com o governo soviético, Snore faz picadinho de qualquer tentativa de atribuir a crueldade nazista a alguma causa especificamente alemã. Os fatores culturais assinalados na tese número 1 explicam a emergência de um movimento nacionalista de tipo místico e irracionalista, mas não a extensão e a brutalidade quase inimaginável de seus crimes. Afinal, movimentos de inspiração idêntica surgiram em muitas outras partes do mundo sem ter por isso recorrido sistematicamente ao genocídio como técnica de governo. O próprio fascismo italiano, com toda a rigidez fanática do seu autoritarismo, nada fez de comparável ao Holocausto, e, segundo conhecedores habilitados como Hannah Arendt e Miguel Reale, não pode nem mesmo ser enquadrado legitimamente na categoria do “totalitarismo”, de vez que o governo de Mussolini jamais tentou sequer obter o controle total da sociedade italiana e, bem ao contrário, tolerou a existência de dois poderes concorrentes: a Igreja e a monarquia. O emprego sistemático do genocídio como instrumento de governo foi invenção comunista. O que aconteceu na Alemanha foi a fusão deliberada de um imaginário de tipo nacionalista-místico com a técnica comunista de governo. Essa foi a originalidade de Hitler, até na opinião dele próprio. Ao declarar que toda a sua luta se inspirava diretamente em Karl Marx, ele não se referia, naturalmente, à mitologia patriótica do nazismo, mas à organização socialista da economia e sobretudo ao emprego sistemático do terror genocida. Hitler fundiu Mussolini com Lênin, e a parte genocida da mistura não veio do primeiro componente.

Um dos depoimentos mais importantes de The Soviet Story é o de George Watson, um professor de literatura que se especializou na pesquisa das fontes textuais do socialismo. Autor de um importante estudo sobre The Lost Literature of Socialism, que infelizmente não é citado no filme, Watson descobriu que, antes de Marx e Engels, nenhum ideólogo de qualquer espécie havia jamais proposto a liquidação de “povos inferiores” (expressão do próprio Marx) como prática deliberada e condição indispensável para a instalação de um novo regime. Nem mesmo Maquiavel havia pensado numa coisa dessas. O genocídio é criação sui generis do movimento socialista, e sete décadas se passaram antes que uma dissidência interna desse movimento desse origem ao fascismo e depois ao nazismo, que tardiamente adotou a fórmula do morticínio salvador então já posta em prática por Lênin na URSS.

A escória do mundo

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 20 de maio de 2008

“Cuanto más alto sube, baja al suelo.” (Frei Luís de León)

Vou resumir aqui umas verdades óbvias e bem provadas, que uma desprezível convenção politicamente correta proíbe como indecentes.

Todo comunista, sem exceção, é cúmplice de genocídio, é um criminoso, um celerado, tanto mais desprovido de consciência moral quanto mais imbuído da ilusão satânica da sua própria santidade.

Nenhum comunista merece consideração, nenhum comunista é pessoa decente, nenhum comunista é digno de crédito.

São todos, junto com os nazistas e os terroristas islâmicos, a escória da espécie humana. Devemos respeitar seu direito à vida e à liberdade, como respeitamos o dos cães e das lagartixas, mas não devemos lhes conceder nada mais que isso. E seu direito à vida cessa no instante em que atentam contra a vida alheia.

Nos anos 60 e 70, a guerrilha brasileira não foi nenhuma epopéia libertária, foi uma extensão local da ditadura cubana que, àquela altura, já tinha fuzilado pelo menos dezessete mil pessoas e mantinha nos cárceres cem mil prisioneiros políticos simultaneamente, número cinqüenta vezes maior que o dos terroristas que passaram pela cadeia durante o nosso regime militar, distribuidos ao longo de duas décadas, nenhum por mais de dois anos – e isto num país de população quinze vezes maior que a de Cuba. Nossos terroristas recebiam dinheiro, armas e orientação do regime mais repressivo e assassino que já houve na América Latina, e ainda tinham o cinismo de apregoar que lutavam pela liberdade.

Agora que estão no poder, enchem-se de verbas públicas e justificam a comedeira alegando que o Estado lhes deve reparações. O dinheiro do Estado é do povo brasileiro e o povo brasileiro não lhes deve nada. Eles é que devem aos filhos e netos daqueles que suas bombas aleijaram e seus tiros mataram.

Perguntem aos cidadãos, nas ruas: “O senhor, a senhora, acham que têm uma dívida a pagar aos terroristas, pelo simples fato de que a violência deles foi vencida pela violência policial? O senhor, a senhora, acham justo que o Estado lhes arranque impostos para enriquecer aqueles que se acham vítimas injustiçadas porque o governo matou trezentos deles enquanto eles só conseguiram, coitadinhos, matar a metade disso?”

Façam uma consulta, façam um plebiscito. A nação inteira responderá com o mais eloqüente NÃO já ouvido no território nacional.

É claro que os crimes que esses bandidos cometeram não justificam nenhuma barbaridade que se tenha feito contra eles na cadeia. Mas justifica que estivessem na cadeia, embora tenham ficado lá menos tempo do que mereciam. E justifica que, surpreendidos em flagrante delito e respondendo à bala, fossem abatidos à bala.

Mas eles não acham isso. Acham que foi um crime intolerável o Estado ter armado uma tocaia para matar o chefe deles, Carlos Marighela, confessadamente responsável por atentados que já tinham feito várias dezenas de vítimas inocentes; mas que, ao contrário, foi um ato de elevadíssima justiça a tocaia que montaram para assassinar diante da mulher e do filho pequeno um oficial americano a quem acusavam, sem a mínima prova até hoje, de “dar aulas de tortura”.

Durante a ditadura, muitos direitistas e conservadores arriscaram vida, bens e reputação para defender comunistas, para abrigá-los em suas casas, para enviá-los ao exterior antes que a polícia os pegasse. Não há, em toda a história do último século, no Brasil ou no mundo, exemplo de comunista que algum dia fizesse o mesmo por um direitista.

Sim, os comunistas são diferentes da humanidade normal. São diferentes porque se acham diferentes. São inferiores porque se acham superiores. São a escória porque se acham, como dizia Che Guevara, “o primeiro escalão da espécie humana”.

Eles têm, no seu próprio entender, o monopólio do direito de matar. Quando espalham bombas em lugares onde elas inevitavelmente atingirão pessoas inocentes, acham que cumprem um dever sagrado. Quando você atira no comunista armado antes que ele o mate, você é um monstro fascista.

Por isso é que acham muito natural receber indenizações em vez de pagá-las às vítimas de seus crimes.

Quem pode esperar um debate político razoável com pessoas de mentalidade tão deformada, tão manifestamente sociopática?

Um comunista honesto, um comunista honrado, um comunista bom, um comunista que por princípio diga a verdade contra o Partido, um comunista que sobreponha aos interesses da sua maldita revolução o direito de seus adversários à vida e à liberdade, um comunista sem ódio insano no coração e ambições megalômanas na cabeça, é uma roda triangular, um elefante com asas, uma pedra que fala, um leão que pia em vez de rugir e só come alface. Não existiu jamais, não existe hoje, não existirá nunca.

Fariseu hipócrita

Olavo de Carvalho


Diário do Comércio (editorial) , 14 de dezembro

O uso pejorativo da palavra “raça” para designar um grupo não racial é o inverso de um insulto racista, pois deprecia os elos raciais que o racismo, por definição, exalta. A expressão é pejorativa precisamente porque reduz a afinidade política, espiritual ou cultural entre os membros de uma comunidade a um mero parentesco biológico, como se se tratasse de um grupo de galinhas ou macacos. A intenção sarcástica se anularia automaticamente a si mesma se o falante, pensando como racista, considerasse a identidade racial um elo superior e não inferior àqueles que de fato unem o grupo. A expressão só é pejorativa porque não é racista. Qualquer pessoa que saiba ler tem de entender isso num relance, sem precisar nem pensar.

Já expliquei isso dias atrás, mas agora notei que os detratores do sr. Jorge Bornhausen, além de lhe atribuir uma intenção racista incompatível com o sentido mesmo das suas palavras, ainda a explicam reiteradamente pela origem racial e geográfica do senador catarinense, fomentando o preconceito contra os imigrantes germânicos e contra um Estado da federação e cometendo assim eles próprios, da maneira mais inequívoca, o crime de racismo. Raramente a receita de Lênin, “xingue-os do que você é, acuse-os do que você faz” foi posta em prática de maneira tão exemplarmente literal.

Se o senador não os processar por isso, deixando fora da cadeia esses deliqüentes, terá se rebaixado à condição de cúmplice passivo de seus próprios difamadores, além de cometer a injustiça de punir só o primeiro deles e deixar à solta a multidão de seus cúmplices, que nem têm como aquele a escusa da emoção momentânea, já que escrevem em parceria, após longas deliberações coletivas.

Penso aqui num deles em especial, o sr. Dalmo Dallari. Escrevendo no Jornal do Brasil do dia 9, esse jurista de palanque afirma que o sr. Bornhausen, ao designar seus inimigos petistas como “raça”, agiu “bem ao estilo dos nazistas quando se referiam aos judeus”. Mentira suja. Os nazistas jamais atacaram o povo judeu por ser uma raça, mas por não ser da raça deles. Nenhum nazista, aliás nenhum racista de qualquer filiação, jamais depreciou a identidade de raça enquanto tal. Fazê-lo seria deixar ipso facto de ser racista. E chega a ser comovente que esse coroinha intelectual do untuoso demagogo Dom Paulo Evaristo Arns, tendo feito carreira na ostentação de catolicismo, rotule de nazista o mesmo giro semântico utilizado por Jesus para qualificar seus discípulos relapsos de “raça de víboras”.

Mas não pensem que a hipocrisia desse fariseu desprezível se contente com isso. No meu próximo artigo comentarei mais dois ou três feitos dele que igualam ou superam os do próprio marquês de Sader.

Veja todos os arquivos por ano