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Desprezo merecido

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 25 de janeiro de 2007

A ninguém o movimento comunista despreza mais do que ao capitalista que primeiro lhe presta serviços e depois o critica. Tudo o que o sr. Hugo Chávez disse de O Globo é absurdo, mas, de certo modo, merecido. Vinte anos lambendo os pés de intelectuais comunistas, achincalhando os militares brasileiros, mitificando Che Guevara e Fidel Castro, demonizando os EUA, patrocinando a ascensão do lulismo e ocultando a violência esquerdista no mundo não asseguram a essa organização de mídia senão o direito de continuar fazendo a mesma coisa dia após dia, docilmente, até à humilhação final. A tarimba no exercício da subserviência não autoriza ninguém a bater pezinho, de repente, só porque a doce imagem do ideal esquerdista saiu da sua embalagem de sonhos e se encarnou na roubalheira petista ou na figura grotesca e ameaçadora do sr. Chávez. O comunismo é assim. Os luminares globísticos tinham a obrigação de saber disso. O falecido dr. Roberto não cansou de avisá-los. Em vão. O Globo fez como aquela mocinha que se engraçou para cima do Mike Tyson, subiu até o apartamento do brutamontes, se agarrou com ele na cama e, na hora H, começou a se fazer de virgem pudica. Pensem o que quiserem, a senhorita vai sempre acabar alardeando virgindade na delegacia, de olho roxo. Os insultos de Hugo Chávez e a galera gritando “Rasga! Rasga” são o prêmio que o império midiático dos Marinhos leva por bajular os inimigos e boicotar os amigos.

Não, não celebro esse acontecimento, que prenunciei vezes sem fim. Schadenfreude — alegrar-se com a desgraça dos outros — não é um dos meus vícios. Espero apenas que o episódio sirva de lição para os demais empresários de mídia. Ninguém afaga o comunismo impunemente. Comunistas não aceitam submissão pela metade, murismo, negaceios. É tudo ou nada. Se você dá e toma, eles acabam com a sua raça. Até a Igreja Católica perdeu credibilidade e fiéis depois daquela orgia de afagos à esquerda no Concílio Vaticano II. O Globo, a Folha e demais jornais brasileiros não têm mais proteção divina do que o Papa. Ontem ele era a encarnação máxima da autoridade moral no mundo. Hoje leva pito de qualquer muçulmano enragé, e baixa a cabeça. A mídia brasileira não vai se sair melhor. O destampatório de Hugo Chávez é só o começo. E que ninguém espere socorro de São Lulinha. Ele não é besta de se voltar contra o Foro de São Paulo só para defender aliados de ontem, dos quais precisa cada dia menos.

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Por falar nisso, há décadas o economista cubano Armando Lago, com uns poucos auxiliares e sem as verbas milionárias que alimentam a indústria da autopiedade comunista, vem fazendo o levantamento detalhado e criterioso das vítimas do regime castrista. Elas não são menos de cem mil em Cuba e trezentos mil em outros países – Peru, Colômbia e Angola, principalmente. Perto disso, o abominado Pinochet é Madre Teresa de Calcutá e os nossos “anos de chumbo” são o diário da Poliana. Um resumo da pesquisa encontra-se no documentário “Arquivo Cuba”. Vejam em  http://www.youtube.com/watch?v=ag5XaHp-03A. No Jornal Nacional é que não vai passar.

Escolha o adjetivo

Olavo de Carvalho


O Globo, 9 de abril de 2005

Como a expressão “Católicas pelo Direito de Decidir” (CDD) aparece na mídia sem nenhuma ressalva, o leitor entende que se trata realmente de um grupo de mulheres católicas. A impressão é reforçada pelo fato de que elas ocupam um conjunto de salas do prédio da Ordem Carmelita de São Paulo, ao lado da CNBB, sob o olhar complacente de monges, padres e bispos. Mas elas não são católicas de maneira alguma: se entraram na Igreja, foi com o propósito consciente e deliberado de parasitá-la, parodiá-la e destruí-la. A CDD é o braço nacional de uma ONG mundial, a Catholics for a Free Choice, CFFC. Frances Kissling, líder da CFFC desde 1980, não poderia ter sido mais clara quanto ao objetivo da organização:

“Passei a vida procurando um governo que eu pudesse derrubar… até que descobri a Igreja Católica.”

O Conselho Nacional dos Bispos dos EUA também foi muito claro: “A CFFC não merece reconhecimento nem apoio como organização católica.”

Não pensem que o Conselho disse isso por estar repleto de direitistas e reacionários. A CFFC gabava-se de ter “estreitos vínculos” com os bispos esquerdistas de Chiapas, México. Mas eles mesmos, em pastoral de julho de 1991, declararam: “Se essas mulheres apóiam o aborto legalizado, temos de afirmar com máxima clareza que isso anula sua pretensão de ser católicas. Elas se excomungaram a si próprias, colocaram-se fora da Igreja”.

O primeiro escritório da CFFC foi na Planned Parenthood Foundation, dona da maior cadeia de clínicas de aborto nos EUA, e uma de suas principais financiadoras foi a Sunnen Foundation, que lutava para que o Estado, arrogando-se a autoridade dos antigos imperadores romanos em matéria religiosa, forçasse a Igreja Católica, por lei, a mudar sua doutrina quanto ao aborto. A Sunnen foi também patrocinadora do famoso processo “Roe versus Wade”, apresentado como um caso de estupro, que em 1973 resultou na legalização do aborto nos EUA. Passadas três décadas, a suposta vítima pediu pessoalmente a revisão do processo, confessando que não sofrera estupro nenhum mas fora subornada pelos líderes abortistas para declarar isso no tribunal. O caso agora está de volta na Suprema Corte. Toda a história do abortismo é uma história de fraudes.

A atividade da CFFC segue meticulosamente a regra de Antonio Gramsci: não combater a Igreja, mas apossar-se de suas estruturas, esvaziá-las de seu conteúdo espiritual e utilizá-las como instrumento para transmitir a mensagem anticristã.

Mas o mal que essa organização faz à Igreja, infiltrando-se nela para corroê-la desde dentro, não se esgota em puro maquiavelismo político. Quando digo que o catolicismo da CFFC é uma paródia intencional, não estou usando de uma figura de linguagem, mas descrevendo um fato: o primeiro ato público da organização, tão logo inaugurada em 1970, foi sagrar sua fundadora, Patricia F. McQuillan, como “Papisa Joana I”, numa cerimônia realizada nas escadarias da catedral de São Patrício em Nova York. Como se isso não bastasse, a revista do movimento, Conscience, está repleta de declarações de satanismo explícito, como por exemplo versos ao “doce nome de Lúcifer, lírico, santo”, ou esta ode ao ídolo bíblico Baal: “Do solo onde semeou o trigo novo, Baal levanta-se. Num grito de exaltação, rejubilamo-nos: o Senhor ergueu-se, está sentado novamente no trono. Ele reina. Aleluia!”

Em contraste com a ternura kitsch desses louvores ao Príncipe das Trevas, Kissling e outras líderes da CFFC já se referiram ao Papa João Paulo II como “raivoso”, “insensível”, “perigoso”, “fanático”, “hipócrita”, “mentiroso”, “pernicioso”, “cruel”, “mesquinho” e “obsessivo”, entre outras dezenas de adjetivos. Incorrerei em crime de injúria se usar um desses adjetivos, um só, para qualificar a autoridade religiosa que acolhe paternalmente devotas satanistas e se acumplicia com seus feitos anticristãos? Pois bem, o leitor que escolha. João Paulo II nunca mereceu nenhum deles. Mas o clérigo que estende sua proteção mesmo indireta e sutil sobre o satanismo para que seja oferecido aos fiéis como catolicismo merece pelo menos alguns.

 

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