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Pensando com a cabeça de George Soros

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil (Caderno de Domingo), 1o de outubro

O maior financiador da campanha pela liberação das drogas é George Soros, que também subsidia organizações pró-terroristas e desarmamentistas (uma combinação maravilhosa) e nutre a modesta ambição de tornar-se o presidente informal do mundo. Já comprou terras na Bolívia, onde, uma vez retirados os entraves legais, terá tudo para ser o maior fornecedor de matéria-prima para as Farc.

As idéias de um sujeito tão importante merecem atenção, porque, além de manda-chuva, ele é filósofo e orgulha-se de ter sido aluno de Karl Popper. Como Popper estudou tanta lógica que jamais lhe sobrou tempo para aprender a aplicá-la ao mundo real, é compreensível que seu discípulo pense com a cabeça do pênis e chegue a conclusões como esta: “Não vencemos a Al-Qaeda. Assim o demonstrou o recente complô para explodir aviões comerciais em pleno vôo, frustrado pelo desvelo das autoridades de inteligência britânicas…”. Ou seja: a prova de que os terroristas estão à solta é que eles foram presos. Para cúmulo, foram presos pela inteligência britânica, a mesma que, com a informação sobre as armas de destruição em massa escondidas por Saddam Hussein, provocou a decisão anglo-americana de invadir o Iraque – uma prova de que os ingleses sabem resolver esses assuntos sem guerra.

Siga os raciocínios do senhor Soros e ele fará do seu cérebro um bloco de cimento, impenetrável a qualquer estímulo intelectual mais sutil do que uma marretada. Então, você estará pronto para admitir que a melhor maneira de acabar com a praga das drogas é vendê-las legalmente, como se vendem exemplares da Bíblia, produto proibido em alguns países. Se o senhor Soros já existisse no tempo da Revolução Russa, Lênin e Stalin não precisariam ter matado tantos cristãos para erradicar o cristianismo: bastaria que pusessem à venda milhões de Bíblias a preço de banana, na Praça Vermelha, como o senhor Soros sugere fazer com a cocaína colombiana na Praça XV do Rio de Janeiro. Hitler poderia copiar a fórmula, imprimindo exemplares da Torá bem baratinhos, e logo não sobraria um só judeu na Alemanha. Quanto sangue correu porque o mundo não conhecia a sabedoria de George Soros!

Há idéias que persuadem não pela razoabilidade, mas precisamente pela estupidez. Combater o consumo de drogas por meio da liberação é tão inteligente quanto defender-se da tentação do adultério comendo a mulher do vizinho três vezes por semana, no intuito de tornar-se imune aos encantos das demais esposas dos arredores. Pode-se também suprimir o homossexualismo dando o traseiro por aí até que ele se torne insensível.

Liberar as drogas é dar estatuto de empresa legal ao império global do narcotráfico, anistiando os milhões de crimes cometidos no curso da sua construção, que incluem seqüestros, assaltos, abuso de menores, homicídios e genocídios. É tirar do subterrâneo os bandidos mais perversos de todos os tempos e fazer deles uma nova classe dominante, mais poderosa, mais cínica e mais adestrada na prática do mal do que todas as anteriores. Não é difícil juntar os pontos. Os campeões liberacionistas no Brasil são parceiros políticos das Farc e têm com elas um projeto de poder destinado a conquistar todo o continente. A liberação, por si, bastaria para realizar esse projeto integralmente, da noite para o dia. Quem defende a idéia com plena consciência dessa implicação é um criminoso cujo lugar é na cadeia e não em debates decentes. Quem o faz sem essa consciência é um bobão – um discípulo de George Soros.

Loucuras americanas

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 20 de abril de 2006

A ONG  “Parents and Friends of Ex-gays and Gays” foi expulsa da convenção annual da Associação de Conselheiros Educacionais da Virginia por distribuir dois folhetos considerados inaceitáveis naquele ambiente familiar: num deles, pessoas que tinham abandonado as práticas homossexuais informavam que outros homossexuais podiam fazer o mesmo; no outro, uma transexual arrependida advertia contra os riscos das cirurgias de mudanças de sexo. Enquanto isso, entidades dedicadas a ensinar as práticas homossexuais às crianças de escola participavam livremente da convenção, convidadas pela própria Associação organizadora do evento.

Mas isso não é nada. David Parker, pai de um garoto de seis anos, foi preso por protestar contra as aulas de homossexualismo que seu filho era obrigado a freqüentar numa escola pública de Lexington, Massachusetts. Passou a noite na cadeia e, levado à corte no dia seguinte, recebeu uma reprimenda do juiz, por desacato à autoridade, ao reclamar que a polícia não lhe havia permitido consultar seu advogado. O governador do Estado, Mitt Romney, fez um pronunciamento em favor de Parker, mas nos EUA o executivo não tem o mínimo poder sobre os tribunais. O processo continua rolando.

No mesmo Estado, Brian Camenker e Scott Whiteman, diretores da “Parents Rights Coalition”, gravaram e denunciaram as sessões de uma conferência, promovida pelo Departamento Estadual de Educação e a Tutts University, na qual estudantes de doze anos, trazidos em ônibus de várias escolas públicas, estavam recebendo instrução quanto à delicada prática do “fist fucking” — penetração anal com a mão fechada, até o antebraço. Denunciado nos programas de TV de Alan Keyes, Bill Bennett e Sean Hannity, o caso provocou revolta entre as famílias americanas, mas adivinhem quem está sendo processado? A srta. Margot Abels, militante da “Gay, Lesbian, Straight Education Network”, responsável pelas eruditas explicações dadas às crianças? Que nada! Os acusados são Camenker e Whiteman, por “atentado contra a liberdade de expressão” da srta. Abels. 

 Ao longo dos últimos trinta anos, os movimentos esquerdistas vieram “ocupando espaços” na Justiça americana. Juízes que se arvoram em legisladores, usando interpretações forçadas do texto legal para criar situações revolucionárias, são hoje uma praga nos EUA. Ninguém sabe o que fazer com eles. Há movimentos organizados tentando reverter o estado de coisas, mas substituir os magistrados levaria décadas, e até lá o mal que eles podem fazer é incalculável. Transformar uma geração inteira de meninos americanos em joguetes nas mãos de adultos pervertidos é o mínimo que se pode prever. O beautiful people de Hollywood tem contribuído ativamente para esse resultado, glamurizando tipos como Alfred Kinsey, o charlatão (e pedófilo nas horas vagas) que enganou metade do país entrevistando criminosos sexuais sobre suas práticas eróticas e depois alardeando as respostas como se viessem da população média.

O Brasil imita, de longe, esses trejeitos simiescos de uma sociedade que por tolerância excessiva para com seus inimigos acabou por se tornar inimiga de si própria. Imita de longe, mas, por isso mesmo, com devoção mais crédula e integral. O que mais impressiona, na comparação entre os EUA e o nosso país, é a pujança da reação conservadora à decadência planificada, lá, e aqui a subserviência geral, o silêncio cúmplice, mesmo das autoridades religiosas, empenhadas em salvar antes o PT do que as almas.

Intelectualmente, os conservadores americanos já podem se considerar vitoriosos, tal o estado de atrofia do pensamento esquerdista reduzido à macaqueação de seus próprios slogans dos anos 60. Socialmente, o seu poder de organização e de ataque, sobretudo entre os religiosos, cresce dia a dia. É politicamente que eles não estão muito bem, pois o Partido Republicano e o governo Bush não refletem adequadamente suas expectativas. A ascensão do senador George Allen, do governador Mitt Romney e sobretudo o crescimento de uma nova geração de republicanos negros e chicanos – um fenômeno que a mídia chique oculta por todos os meios possíveis – parecem anunciar grandes mudanças num partido que, se quiser continuar em cima do muro, vai cair.     

A justiça de Nero

Olavo de Carvalho

O Globo, 24 de julho de 2004

Quando pessoas supostamente ofendidas pelas palavras de um articulista se reúnem para mover um processo contra ele, pode ser que tenham intenção legítima. Quando, porém, planejam a instauração simultânea de milhares de processos separados, então o intuito, claramente, é o de arruinar a vida do réu, paralisar pelo terror quem pense como ele e, sobretudo, pressionar a opinião pública. No caso do bombardeio de ações judiciais arquitetado pelo movimento gay contra Dom Eugênio de Araújo Sales, a Defensoria Homossexual de São Paulo não esconde seu propósito de utilizar a justiça como instrumento de coação. “Na Argentina esse procedimento funcionou muito”, afirma um dos promotores da iniciativa: “Os grupos escolhiam cerca de cinco inimigos (julgados ‘homofóbicos’) e abriam processos dizendo-se pessoalmente ofendidos. Isso fez o Legislativo enxergar a comunidade como um grupo muito bem articulado para prejudicar a imagem dos políticos e do país.” Não se trata, pois, de uma legítima reparação de danos, e sim de um ato publicitário destinado a chantagear um terceiro.

Mas isso não é tudo.

O que Dom Eugênio escreve é o que está na Bíblia, é o que a Igreja vem repetindo há dois mil anos e o judaísmo há cinco mil. São idéias que educaram a espécie humana e criaram civilizações inteiras. Ele não inventou nada disso e não aderiu a isso por diversão nem cobiça. Aderiu porque acreditava que as lições da Bíblia eram para o bem da humanidade, que justificavam uma vida de esforços ascéticos e o supremo sacritífio do celibato.

Já seus detratores falam em nome do que? Do homossexualismo. Que é homossexualismo? É uma “opção”, como eles mesmos dizem, um modo entre outros de obter gratificação sexual. Afeição entre indivíduos do mesmo sexo não configura homossexualismo. Este só entra em cena quando ao menos um dos envolvidos vê o corpo do outro como objeto de desejo e sonha em entregar-se com ele a práticas homoeróticas. Mesmo supondo-se que essas práticas sejam perfeitamente decentes, ninguém pode alegar que se dedica a elas por abnegação, por idealismo ou por qualquer outra razão meritória. Ninguém faz essas coisas para dar de comer aos pobres, amparar os aflitos, socorrer os doentes ou dar aos moribundos a esperança da ressurreição – ninguém as faz por aquelas razões que levam um ser humano a tornar-se padre, rabino, pastor. Faz porque acha gostoso, e ponto final. E toda escolha de gosto implica, como corolário incontornável, a liberdade de não gostar. A liberdade de achar ruim, feio e repugnante aquilo que os homossexuais acham bom e lindo e delicioso. Por definição, o que é objeto de desejo para um pode ser motivo de repulsa para outro. Querem ver?

“Um nojo. Uma aberração. Me dá vômito. Por que não vão fazer isso em outro lugar? Não vim aqui para ver uma coisa dessas.” Se você dissesse isso de dois barbudos vistos aos beijos e afagos num shopping center , diante de velhinhas e crianças, não escaparia de ser denunciado como criminoso. No caso citado, não há perigo de que isso aconteça: colhi essas palavras num site de homossexuais, proferidas contra as travestis e transexuais que pretendiam — audácia! — ser admitidas no recinto sacrossanto das saunas gays , ofendendo a delicada sensibilidade visual dos homossexuais ortodoxos. Comentando a disputa, o sr. Luiz Mott, do Grupo Gay da Bahia, afirma que ambos os lados são “igualmente respeitáveis”. A expressão de repulsa, como se vê, é uma atitude decente quando brota da preferência sexual. Se vem de convicções morais ou do amor a Deus, é um crime.

Por absurda que seja essa situação, ela não é uma novidade na História. No tempo de Nero e Calígula, as diversões homossexuais dos imperadores estavam sob a proteção da lei, enquanto o cristianismo e o judaísmo mal eram tolerados.

Esse padrão de julgamento ainda não é instituição no Brasil, mas o critério moral que o inspira já é dominante na nossa cultura. Quando uma nova moral se dissemina entre as classes letradas, tornar-se lei é apenas questão de tempo. Ainda viveremos sob a justiça de Nero.

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