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Repressão chavista e três notas

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 14 de julho de 2010

O líder oposicionista venezuelano Alejandro Peña Esclusa foi preso pela polícia política de Hugo Chávez na última segunda-feira. Todo mundo sabia que isso ia acontecer mais cedo ou mais tarde. Só não se esperava que os agentes da ditadura chavista tivessem, como tiveram, o cinismo de plantar explosivos na casa de um político que nunca usou de violência nem mesmo verbal. O objetivo da farsa é criar uma aparência de ligação entre Peña e “organizações direitistas violentas”, que no presente cenário latino-americano se destacam sobretudo pela sua espetacular inexistência.

Alejandro Peña, que por sua militância antichavista foi recentemente alvo de homenagem por parte da Assembléia Estadual do Alabama (v. http://www.youtube.com/watch?v=VGhwsRbR0Y8), é bem conhecido do público brasileiro como conferencista sério e equilibrado, que descreve a situação política de seu país com tristeza, mas com serenidade e nem o mais mínimo sinal de ódio. Os membros da Associação Comercial de São Paulo tiveram a oportunidade de ouvi-lo explicar a estratégia revolucionária do Foro de São Paulo durante o simpósio “Democracia, Liberdade e o Império das Leis”, realizado em maio de 2006 na sede da entidade.

Não tenho a menor dúvida de que a prisão de Alejandro Peña é uma retaliação ao processo que ele move no Tribunal Penal Internacional contra o governo Hugo Chávez.

A melhor cobertura do assunto, até agora, está no blog http://notalatina.blogspot.com.

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O jornal O Tempo, de Belo Horizonte, publica em editorial estas linhas onde a malícia e a estupidez se fundem numa mistura indecomponível:

“O governo dá motivos. Entre outros, o PNDH-3 e, agora, o primeiro programa de governo da candidata Dilma Rousseff, depois substituído por um conteúdo mais digerível. O fato é que essas trapalhadas acabam por estimular a disseminação de um discurso de direita, claramente anticomunista, afirmando que o país caminha para uma ditadura. A fonte talvez esteja em alguns articulistas — como o filósofo Olavo de Carvalho — que dão curso hoje a teorias da conspiração… Não há dúvidas de que a denúncia de golpe tem muito de paranóia…”

Não há possibilidade de golpe, prossegue o jornal, porque o Brasil está sob o domínio daquilo “que o jornalista Fernando de Barros e Silva chama de condomínio ou consórcio de poder: a reunião de forças interessadas na atual estrutura do governo. Desse condomínio participam partidos, políticos, empresários, sindicalistas e funcionários do Estado, todos beneficiários de favores distribuídos pelo governo. O poder está distribuído entre tantos beneficiários que ninguém pode pretender ter a hegemonia. O condomínio é a maior garantia de que a legalidade não será desrespeitada”.

1) A surpresa atemorizada que o editorialista revela ante “a disseminação de um discurso de direita, claramente anticomunista” mostra que, na democracia como ele a concebe, todo anticomunismo é proibido. Você pode ser muito comunista, meio comunista ou um pouquinho comunista. Tudo o que esteja à direita disso é crime, e seu eventual ressurgimento, mesmo em doses mínimas, deve ser denunciado para que se possa cortar o mal pela raiz antes que cresça ao ponto de querer formar – oh, horror! – um partido direitista.

2) Na verdade, não é só O Tempo que pensa assim. Praticamente toda a “grande mídia” brasileira se empenha em fazer o público aceitar uma caricatura leninista de democracia – o “centralismo democrático” – como se fosse não só uma democracia genuína, mas o único tipo de democracia que já existiu no mundo.

3) A prática da democracia leninista é exemplificada pela coexistência de eleições regulares com a total supressão do livre acesso popular a informações que o governo considere politicamente inconvenientes, como por exemplo o pacto de solidariedade PT-Farc assinado em 2001 e, de modo geral, as atividades do Foro de São Paulo em favor de organizações terroristas. Tudo o que se pode ler na mídia se resume ao esquerdismo oficial e à sua crítica de esquerda. E esta, num arremedo grotesco de independência, acusa-o do mais hediondo dos pecados: fomentar, por inabilidade, o ressurgimento da direita.

4) Se a opinião pública tem seu acesso a informações eficazmente racionado, os partidos políticos só têm espaço para fazer oposição de esquerda e, nos altos escalões, o poder está sob o domínio total de um “consórcio de beneficiados”, não existe, evidentemente, nenhuma necessidade de golpe ou ditadura, porque o golpe já foi dado e a ditadura já está em pleno funcionamento, controlando magistralmente a situação, sendo exatamente isto o que O Tempo chama de democracia.

5) Por saber disso, e por ter escrito a respeito algumas centenas de vezes, foi que, exatamente ao contrário do que diz O Tempo, não denunciei nenhum plano golpista, não sendo besta de denunciar a preparação de crimes já perpetrados.

6) O Tempo, se não é um beneficiário, é pelo menos um bajulador do consórcio. Está no poder, ou pelo menos é um penetra que se finge de convidado.

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Um partido que, em vez de declarar sinceramente a que veio, sempre entra em campo com duas alas, uma “radical” para assustar o público, outra “moderada” para acalmá-lo e recolher os lucros eleitorais do alívio (recompensando em seguida os serviços da primeira com uma pletora de verbas públicas), não é, com toda a evidência, um partido como os outros, um partido normal e legítimo: é uma máquina de engenharia social montada para ludibriar, manipular e controlar. Mas o Brasil já se acostumou tanto à alternância pavloviano-petista de choques e queijos (ou pauladas e cenouras, como dizia Bismarck), que já nem repara na diferença entre a política eleitoral sadia e a “estratégia das tesouras” – invenção de Lênin, como o centralismo democrático.

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Não acredito de maneira alguma nas estatísticas com que o MST justifica sua reivindicação de um plebiscito para limitar o tamanho das propriedades rurais, mas, só ad argumentandum, vou aceitá-las por uns minutos e ver a que conseqüências levam. Se é verdade, como alega o MST, que as pequenas propriedades produzem quase toda a comida que se consome no Brasil, aumentar o número delas será, com toda a evidência, catastrófico: só servirá para gerar um excedente de produção que não poderá ser consumido no mercado interno. Para contornar a hipótese medonha de baixar os preços até tornar inviável toda atividade agrícola, esse excedente terá de ser exportado. Mas, como os pequenos produtores não têm a mínima condição de competir sozinhos no mercado externo, eles cairão nas mãos de grandes companhias exportadoras que, com a maior facilidade, farão deles gato e sapato. Não duvido que o sonho do MST, e a motivação última da sua proposta, seja tornar-se ele próprio uma dessas companhias e controlar tudo o que os agricultores podem e não podem plantar, quanto podem cobrar pelos seus produtos, que implementos têm de usar, etc. etc. Como sempre acontece nessas ocasiões, a mais despudorada ambição de poder se oculta sob um véu de generosidade humanitária.

Sun-Tzu às avessas

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 13 de julho de 2010

Talvez seja preciso estar na América Latina para enxergar este fenômeno e crer nos próprios olhos: o fracasso econômico do socialismo e o desmantelamento da URSS não debilitaram no mais mínimo que fosse o movimento comunista. Transmutado, reorganizado, investido de novas estratégias de uma complexidade e sutileza alucinantes, ele avança com passo mais seguro que nunca, subjugando nação após nação, consolidando seu domínio nos organismos internacionais, nos órgãos de mídia, nas instituições de alta cultura e no sistema judiciário até mesmo dos países que mais valentemente se opunham ao comunismo uma década e meia atrás. O mais impressionante de tudo foi a rapidez com que cacoetes mentais e critérios automáticos de julgamento criados por ideólogos comunistas para desmantelar a cultura adversária se impregnaram, com força hipnótica, nos círculos de “formadores de opinião” em todo o Ocidente, erigindo uma formidável barreira de preconceitos paralisantes contra qualquer veleidade de anticomunismo. Em menos de quinze anos, cada item do programa comunista, com nome apenas levemente alterado, se impôs ao mundo como um dogma inatacável, sacrossanto, imbuído da autoridade moral de tudo julgar e condenar sem poder jamais ser ele próprio submetido a exame. O simples ato de denunciar a origem comunista desses slogans e chavões é estigmatizado como prova de fanatismo ou paranóia. Mesmo homens que jamais desejariam vê-los postos em prática se esmeram em protegê-los dos ataques da “extrema direita”, termo redefinido para abranger tudo o que esteja à direita do centro – um centro que se move cada vez mais para a esquerda.

Investida do privilégio do inomeável, a ação comunista torna-se invisível e onipresente ao ponto de poder com a maior facilidade debitar seus próprios crimes na conta do adversário, induzindo-o a lutar contra si mesmo no momento em que ele mais precisaria reunir forças para resistir ao ataque. Em muitos países do Ocidente, a investida islâmica, apoiada e municiada pelos comunistas, desencadeou uma onda de ódio, não ao Islam, mas à religião em geral e, para cúmulo de absurdo, especialmente à cristã, fazendo com que muitos povos reneguem a única tradição religiosa que jamais possuíram, a única que poderia restaurar seu senso de unidade cultural sem o qual toda resistência se mostra impossível. Essa reação autodestrutiva não é, decerto, espontânea. Como já se repetiu tantas vezes na História, um exército de liberais “progressistas”, embriagado de abstratismo doutrinal e cego ante a realidade histórica concreta, se aproveita da confusão do momento para tentar novamente destruir seu desafeto de sempre, sem querer ver que, com isto, só fomenta a derrota geral e o advento de uma tirania que, com toda a certeza, estará nos antípodas de todo liberalismo. Sun-Tzu ensinava que o segredo da vitória é conhecer o adversário e conhecer-se a si mesmo. Com a ajuda dos “progresistas”– por desgraça, os dominadores absolutos da mídia ocidental –, o front comunista-islâmico logrou fazer com que o adversário o ignore e se ignore a si mesmo, ao ponto de querer furar alegremente os próprios olhos na véspera da batalha decisiva.

O passado no presente

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 12 de julho de 2010

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Uma coisa que não tem o menor cabimento é chamar Dona Dilma Roussef de “ex” terrorista. Mesmo num exército regular, o número dos militares que entram em combate é mínimo em comparação com a maioria espalhada em serviços de administração, intendência, comunicações, inteligência, comando, estado-maior etc. Numa organização terrorista ou guerrilheira, esse círculo de retaguarda é ainda maior, dado que as atividades propriamente militares são aí reduzidas ao mínimo necessário para produzir os efeitos políticos ou publicitários desejados. Por isso Lênin chamava aos atentados terroristas “propaganda armada”, subentendendo uma articulação eficiente com a “propaganda desarmada”, a qual, por sua própria natureza, exige recursos humanos muito mais vastos, estendendo-se por toda a sociedade e ramificando-se numa diversidade impressionante de organizações auxiliares e formas de atuação que podem ser bem indiretas e sutis, mas nem por isso menos decisivas.

Uma organização terrorista compõe-se de todos esses serviços, e não só dos seus agentes destacados para funções de combate. Hoje em dia, a maior organização terrorista do continente não são as Farc, nem o ELN, nem o MIR chileno: é o Foro de São Paulo, que os coordena e lhes dá o suporte político sem o qual suas ações armadas não teriam a menor eficiência. Dona Dilma Roussef, como líder de um partido que foi o fundador e mentor do Foro de São Paulo, é com toda a evidência membro de uma organização terrorista e deve prestar contas não só do seu “passado”, mas das suas ações presentes que dão respaldo, às vezes nada indireto, aos crimes dessa organização. Neste preciso momento, centenas de prisioneiros políticos sofrem opressão e torturas em Cuba; milhares de seqüestrados apodrecem nas prisões da Farc, enquanto o dinheiro do narcotráfico continua fluindo para essa e outras organizações sobre as quais o Foro de São Paulo estende a sua ignominiosa proteção. As ações armadas das quais Dona Dilma possa ter participado três décadas atrás, por vergonhosas que sejam, são nada, rigorosamente nada, em comparação com a infinidade de crimes dos quais seu partido é acobertador e cúmplice hoje em dia. Mas muitos políticos na chamada “oposição” – palavra que não se pode grafar sem enfáticas aspas – recusam-se até mesmo a dizer que essa mulher “foi” terrorista. Remetem seus crimes ao tempo pretérito e ainda os atenuam sob o manto do esquecimento forçado. O que é preciso dizer alto e bom som é que todo líder ou colaborador do Foro de São Paulo é membro de uma organização terrorista, e o é não só no mais dramático dos tempos presentes como também no sentido eminente de aí exercer função de liderança em vez de de ser apenas um tarefeiro armado, um esbirro sob ordens de outrém, um brutamontes encarregado de fazer o que lhe mandam.

Toda e qualquer hesitação em lembrar o “passado” de Dona Dilma é mais que covardia: é colaboração ativa com a continuação ampliada desse passado, que hoje toma o nome de Foro de São Paulo. Os que se sujam nessas afetações de uma polidez abjeta não estão branqueando um passado, estão acobertando os crimes do presente. Tanto que a expressão “Foro de São Paulo” raramente ou nunca se ouve das suas bocas. Podem ter a certeza: os líderes da organização contam com essa ajuda prestimosa, que nunca lhes faltou. No conjunto, a política brasileira – da governista à menos governista — segue fielmente, servilmente a estratégia do Foro de São Paulo.

São os mentores dessa estratégia, e não seus executores físicos, os maiores terroristas do continente. Entre as ações brutais do tarefeiro armado e as sutilezas da liderança intelectual e política, vai toda a diferença que medeia entre a mão e o cérebro, entre o corpo e a mente. Hoje em dia, os bandoleiros das Farc não são senão a epiderme, a casca da subversão latino-americana. O miolo, o cerne, está nos altos escalões do Foro de São Paulo, sem cuja visão estratégica de conjunto e sem cujo respaldo político as atrocidades da narcoguerrilha se diluiriam numa pasta de inocuidades sangrentas, não mais eficazes, politicamente, do que uma estatística de crimes passionais.

Longe de terem se afastado das atividades criminosas, os políticos de esquerda que hoje brilham no Foro de São Paulo foram da periferia delas para o centro, da base para o topo. Antes de inocentá-los, perguntem: quantos judeus Adolf Hitler matou pessoalmente? Nenhum. Quantas ordens de execução ele assinou com sua própria mão? Nenhuma. Aparentemente, ele não “matou” judeu nenhum. Só criou a política que os matou. Mas é isso, precisamente, o que se chama genocídio. Por definição, ninguém pratica genocídio no varejo, matando pessoalmente um por um. Genocídio é crime de gabinete. Por que então modificar capciosamente a definição de terrorismo, designando com essa palavra somente as ações físicas dos paus-mandados e não o conjunto do plano que as tornou possíveis? Por esse critério, Hitler seria inocente da morte dos judeus, e só cabos e sargentos dos campos de concentração levariam a culpa. Hitler é tão inocente do extermínio dos judeus alemães quanto os líderes do Foro de São Paulo são inocentes dos crimes das Farc.

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