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O pior dos maiores

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 29 de junho de 2006

Meses atrás, por causa do vazamento da identidade de uma agente da CIA, o New York Times armou um fuzuê dos diabos, exigindo a prisão do guru presidencial Karl Rove e até o impeachment do vice-presidente Dick Cheney.

 Como a agente não estava de serviço no exterior, o vazamento não constituía nem crime, e o caso, é claro, deu em nada. Cheney continua inabalável e Rove foi dispensado de depor. A única cabeça servida na bandeja para aplacar a gritaria da “Velha Dama Cinzenta” (apelido do centenário jornal) foi a de um oficial de terceiro escalão, que, apavorado sem motivo, mentira para a Justiça.

Na longa seqüência de convulsões histéricas anti-Bush, o episódio parecia ter sido apenas mais um esforço da esquerda chique para produzir um furacão soprando por um canudinho de refrigerante.

Mas desta vez havia um detalhe extra. Enquanto simulava indignação ante o vazamento inócuo, o New York Times preparava duas operações de vazamento efetivo — não do nome de uma agente em férias, mas de informações vitais que, entregues ao inimigo, punham em risco a segurança dos EUA.

Primeiro, o jornal revelou detalhes de funcionamento do programa de vigilância telefônica de pessoas ligadas ao terrorismo. Depois, deu todo o serviço sobre uma operação ultra-secreta que vinha conseguindo penetrar as transações bancárias da Al-Qaeda. Colocou vidas e dólares dos terroristas a salvo do malvado governo americano.

Centenas de espiões infiltrados na CIA, no Pentágono e no Departamento de Estado não haviam conseguido nada de comparável. O NYT tornou-se um departamento de inteligência a serviço do inimigo, em tempo de guerra. O crime de traição não poderia ser mais evidente. A alegação de liberdade de imprensa não cola. O capítulo 18, seção 798 do Código Penal americano pune com prisão e multa “quem quer que voluntária e conscientemente comunique, torne disponível ou publique, de maneira prejudicial ao governo dos EUA, qualquer informação reservada concernente às atividades de inteligência”. Jornais e jornalistas não estão acima das leis.

Se o NYT, a despeito disso, no seu editorial do dia 24 de maio, considerou “bizarro” o apelo de congressistas a que o governo o processasse, é só porque uma longa tradição de abusos impunes o imbuiu de uma noção exagerada da sua própria grandeza inatingível. Na década de 30, o jornal ocultou propositadamente o massacre de oito milhões de ucranianos pelo regime soviético. Até hoje está exposta na sua sede a placa em homenagem ao desinformante soviético Walter Duranty, que infundiu nos seus leitores a noção de que a Ucrânia agonizante era um paraíso de paz e prosperidade. Durante a guerra do Vietnã, seus correspondentes retransmitiam fielmente ao povo americano peças de desinformação recebidas prontas dos comunistas. O repórter brasileiro José Hamilton Ribeiro, que foi correspondente no Vietnã até perder a perna na explosão de uma mina, confessou: “Todos nós, jornalistas estrangeiros, sabíamos que nossas fontes eram agentes vietcongues disfarçados. Mas fechávamos os olhos.” Desde a Guerra dos Seis Dias, o jornal tem mentido tanto contra Israel que a comunidade judaica de Nova York teve de se organizar para reprimir judicialmente as lorotas mais insuportáveis.

Durante a reunião anual do NYT, em abril, Cliff Kincaid, editor do site Accuracy in Media, espremeu o atual presidente do jornal com perguntas tão irrespondíveis sobre o jornalismo como instrumento de traição, que o herdeiro da dinastia Sulzberger acabou pulando fora do debate (v. www.aim.org/aim_report/4624_0_4_0_C/).

Seja ou não processado, o NYT já foi condenado pelo público: segundo uma pesquisa recente, só 30 por cento de seus leitores acreditam nele. E os lucros da empresa, em 2005, diminuíram dramaticamente em comparação com o ano anterior. Os jornalistas brasileiros, que ainda tomam o pior dos maiores diários americanos como uma Bíblia da profissão, correm o risco de ver a aura de prestígio do seu livro sagrado ir-se desvanecendo aos poucos, deixando no ar um rastro de enxofre.

 

De onde vem a guerra

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 15 de setembro de 2005

Neste momento há três e não mais de três grandes planos de guerra em andamento no mundo. Vêm sendo montados há tanto tempo, com tão vasta mobilização de recursos e já em estágio tão avançado de implementação, que só mudanças repentinas do cenário mundial, bastante improváveis aliás, podem talvez impedir que mais cedo ou mais tarde sejam levados às últimas conseqüências.

O primeiro deles é a investida da China contra Taiwan, antecipada por manobras navais intimidatórias e destinada a suscitar uma resposta americana, justificando então um ataque chinês ao território dos EUA. Para isso Beijing acumula armas atômicas e nanotecnológicas em escala apocalíptica, enquanto os EUA, burguesmente confiantes numa ridícula estratégia de apaziguamento comercial, fazem cortes e mais cortes nos seus orçamentos militares (prova inequívoca de intenções belicosas, não é mesmo?). Leiam Hegemon: China’s Plan to Dominate Asia and the World, de Steven W. Mosher (Encounter Books, 2000) e procurem no Google os artigos de Lev Navrozov  e J. R. Nyquist.

O segundo é o cronograma islâmico em sete etapas (estamos na segunda) para estabelecer um califado global até o ano 2020 . Foi divulgado pelo jornalista jordaniano Fouad Hussein em entrevistas com os principais líderes terroristas — a começar pelo orquestrador do caos iraquiano, Abu Musab al-Zarqawi — publicadas no livro A Segunda Geração da Al-Qaeda (em árabe). Um resumo encontra-se no jornal australiano The Age (v. http://www.theage.com.au/news /war-on-terror/alqaeda-chiefs -reveal-world-domination -design/2005/08/23/112456286165 4.html?oneclick=true ). Tal como no caso anterior, o ponto principal desta estratégia é suscitar conflitos locais que desencadeiem uma resposta americana e então usá-la como pretexto legitimador para um ataque aos EUA.

O terceiro está bem aqui pertinho. A adoção oficial da doutrina de “guerra do povo” do  general vietnamita Giap para a militarização da sociedade (v. http://www.olavodecarvalho.org /semana/041226zh.htm ), a implantação da Nova Lei Orgânica das Forças Armadas que transforma essa doutrina em realidade, a presença de mais de vinte mil soldados cubanos na Venezuela e de tropas da Venezuela nas Farc – tudo isso torna evidente, na análise do ex-chefe da Casa Militar da presidência venezuelana, vice-almirante Mario Iván Carratú Molina, a lógica militar de Hugo Chávez: agressão conjunta à Colômbia por forças da Venezuela, de Cuba e das Farc para suscitar uma reação de Washington e então mobilizar a América Latina inteira contra os EUA (v. http://www.noticierodigital .com/forum/viewtopic.php?p =168913#168913 ).

A mídia brasileira oculta esses planos como ocultou, por mais de uma década, o Foro de São Paulo. Mas, como os três convergem na meta de induzir os EUA a um combate multilateral, paralisando-os ao mesmo tempo por meio de cobranças morais e diplomáticas das quais seus agressores já estarão automaticamente dispensados (tal é a regra da “guerra assimétrica”: v. http://www.olavodecarvalho.org /semana/040520fsp.htm ), é claro que não podem entrar em ação aberta sem a adequada preparação psicológica do ambiente em todos os países envolvidos, inclusive o Brasil. Por isso é que já pululam, nos nossos jornais, comentários que alertam contra a eventual reação defensiva americana, chamando-a antecipadamente de “invasão imperialista” e apresentando-a como se fosse o lance inicial das hostilidades, sem causas nem antecedentes exceto a pura maldade ianque.

Os autores desses artigos, fora algumas exceções que o termo leninista “idiota útil” resume com precisão, são militantes do Foro de São Paulo, agentes de influência formados nos serviços de inteligência comunistas ou indivíduos que sintetizam essas duas belas qualidades. Não são repórteres narrando o que viram ou analistas tentando compreender o mundo. Seus escritos estão fora da definição de “jornalismo”. São propaganda e desinformação no sentido mais estrito e profissional dos termos. Fazem parte do esforço de guerra.

Candura fingida

Olavo de Carvalho

Jornal da Tarde, 3 de junho de 2004

“A opinião pública vem se firmando como ator capaz de redirecionar o cenário político”, afirma a escritora Rosiska Darcy de Oliveira em artigo recentemente publicado, no qual tenta induzir os brasileiros a pressionar o eleitorado americano para que vote em John Kerry, o candidato preferido da Coréia do Norte, do Vietnã, do Hamas, da Al-Qaeda e dos militares chineses. O exemplo que ela aponta aos nossos compatriotas vem da Espanha. Não da Espanha heróica e desbravadora do século XVI. Nem mesmo da Espanha nobremente suicida da Guerra Civil. Vem daquela outra Espanha passiva, acovardada, sonsa e desprezível — súbita reencarnação da “España miserable” de Antonio Machado –, que, hipnotizada pela articulação sinistra das bombas assassinas com uma bem planejada blitzkrieg midiática, se lançou de joelhos ante a voz de comando do terrorismo internacional. “Nas eleições espanholas após o atentado terrorista de Madri, em vinte quatro horas, usando celulares e a rede da internet, os eleitores falaram entre si, desmontaram a farsa oficial veiculada pela grande mídia e tiraram do poder o primeiro-ministro que enganara a nação.”

É um dos parágrafos mais cínicos e mentirosos que tenho lido na imprensa nacional. Dona Rosiska pretende fazer-nos crer que a rede de ONGs bilionárias, muitas delas comprovadamente associadas com a estratégia terrorista, que planejam e direcionam o fluxo de informações na mídia internacional, não existe, não age, não influencia coisa nenhuma. Em lugar dela, aparece o personagem anônimo e impessoal chamado “opinião pública” ou “os eleitores”, o qual, miraculosamente, se arregimenta, se articula, se organiza por iniciativa espontânea e, em vinte e quatro horas, está pronto para a ação unitária destinada a mudar o curso dos acontecimentos. Se essa mudança ocorre no sentido desejado e planejado pelos terroristas, se ela realiza milimetricamente o projeto exposto com meses de antecedência em comunicados internos da Al-Qaeda, isto é apenas mais uma coincidência que vem se somar à inocente conjunção de acasos. E, se essas duas linhas de força convergem por sua vez para engrossar a corrente de vociferações anti-americanas dominante na grande mídia de Madri, de Paris, de Berlim e de Nova York, isto não só acontece igualmente sem premeditação alguma, mas também não constitui objeção a que Dona Rosiska pinte o empreendimento todo como uma heróica reação de cidadãos independentes e inermes contra a onipotência do “sistema” organizado e rico.

Como se o “sistema” não consistisse precisamente na parceria dos organismos internacionais com a grande mídia e a organização da militância radical na cerrada malha de ONGs ativistas que cobre todo o planeta e num instante faz ecoar suas palavras-de-ordem em todas as redações, segura da uniformidade das opiniões no dia seguinte.

Como se a mesma mídia que Dona Rosiska finge denunciar não tivesse tido um papel de destaque na condução “espontânea” das massas para a genuflexa rendição à prepotência dos terroristas.

Como se a existência e funcionamento das “redes” fossem totalmente desconhecidos, como se não fossem objetos de uma detalhada bibliografia acadêmica, como se na mesma internet não circulasse desde 1996 uma obra como The Advent of Netwar , de John Arquilla e David F. Ronfeldt ( http://www.rand.org/publications/MR/MR789/ ).

Como se o oceano de dinheiro público e privado que engorda essa máquina infernal de propaganda pudesse ser ocultado dos leitores e já não estivesse bem exposto aos olhos de todos em sites como http://www.activistcash.com .

Como se a própria dona Rosiska, desde os tempos em que servia ao mestre manipulador Paulo Fre ire até a época mais recente em que passou a brilhar nos altos círculos do “beautiful people” nacional e internacional, não tivesse feito toda a sua carreira dentro e sob a generosa proteção desse sistema, ignorando portanto candidamente a existência dele e não tendo, pobrezinha, outra maneira de explicar os resultados espetaculares de suas ações globais senão o apelo pueril a uma hipótese mágica.

Nunca a realidade foi tão simetricamente invertida, nunca a astúcia sagaz dos manipuladores se camuflou sob tão cândida inocência. Compreendo que Dona Rosiska faça tanto sucesso hoje em dia. Seu discurso é um resumo vivo do modelo brasileiro de honestidade intelectual.

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