Protecionismo e barbárie

Por José Nivaldo Cordeiro


26 de Maio de 2002

O candidato Lula tem sido pródigo em defender o protecionismo sistemático contra a concorrência internacional, prometendo imitar os governos francês e norte-americano, que usam desse instrumento episodicamente. A claque dos ignorantes aplaudiu de imediato, assim como a dos interesseiros, os ávidos por uma política industrial, como é o caso da liderança da FIESP. Estão certos? 

Evidente que não. Um exame da questão na literatura econômica vai mostrar que não há solução melhor para os países do que o livre comércio. As trocas internacionais possibilitam o enriquecimento do conjunto dos países, desde que não haja intervenção governamental, distorcendo os preços relativos. Essa verdade ficou auto-evidente desde Adam Smith.

O que os políticos fazem é enganar a sua população, confundindo privilégios particulares como se eles fossem um ganho para o conjunto da nação. Isso é falso. Quando Bush sobretaxa o aço brasileiro ele não está ajudando os EUA como nação, está na verdade prejudicando-a, pois o que de fato está fazendo é encarecer um insumo básico que terá reflexos altistas nos preços em toda a sua cadeia produtiva. Da mesma forma, o suco de laranja: ao encarecê-lo com impostos compensatórios, ele apenas está prejudicando os consumidores. Nada mais.

Em outras palavras, está tolhendo a liberdade das pessoas comprarem produtos melhores, a mais baixos preços.

Se todos os países, em simultâneo, aplicassem esse tipo de política, haveria uma crise catastrófica em escala mundial, nos mesmos moldes da crise de 1929. Protecionismo é barbárie da pior espécie, uma combinação de ignorância dos muitos e ganância de uns poucos, contra os interesses gerais. Quem “protege” o seu mercado está apenas desprotegendo a sua economia e penalizando a sua população. A verdade é exatamente o oposto do senso comum.

Retaliar esse tipo de ação, como demonstrou Alceu Garcia em um dos seus brilhantes textos, não faz sentido. Ainda é melhor política absorver os ganhos de produtividade que os mais baixos preços internacionais podem gerar para a economia interna. Um país não pode ser administrado como uma guilda medieval ou como um bloco monopolista. Em uma economia complexa como a brasileira, “proteger” qualquer setor isolado significará perda de produtividade global para o sistema como um todo. É empobrecer toda a economia.

Aqui, como em outros assuntos, Lula demonstrou o seu despreparo. Faz do lugar-comum, do preconceito do vulgo, um elemento formulador de política, violando as verdades superiores. Um país não é um grêmio sindical, mas vai ser difícil explicar a Lula Lá a diferença.

É a vanguarda do atraso e da ignorância.

Sierra maestra nos gabinetes

Por Percival Puggina

Em meados do século passado, o expansionismo revolucionário barbudo cubano acossava nossa fragilidade institucional com o espectro de uma noite dos longos punhais ou de uma quartelada imberbe. E bem que tentaram. Já haviam se movimentado em 1935 quando a ANL de Luiz Carlos Prestes, a mando do Komintern soviético, assassinou vinte e oito militares durante a fracassada Intentona Comunista. Não pensavam noutra coisa várias dezenas de organizações revolucionárias clandestinas. E tentaram, principalmente, através da tolerância do presidente João Goulart com as tropelias daquilo que ele denominava suas “bases”. O caminho para o topo ficou tão franqueado que Prestes chegou a afirmar que os comunistas já estavam no poder, só faltava tomá-lo.Existem algumas coisas que basta abrir a janela para ver. Assim, quem quiser saber o que seria o Brasil se os companheiros treinados em Moscou e Havana, espalhados em todo o país ou acantonados nas Forças Guerrilheiras do Araguaia, tivessem conquistado o poder, basta dar um pulinho até a ilha do doutor Castro ou, mais econômico, ler o livro com o mesmo nome. Muitos que hoje falam sobre democracia, e apontam, com dedo bem duro, certos desvios ocorridos durante os governos militares, teriam feito muito mais e bem pior se tivessem realizado suas intenções. Não eram e não são democratas.

Mas os tempos mudaram. Hoje, os caminhos para a tomada do poder são mais sutis. Basta continuarem a fazer o que vêm fazendo: infiltrar-se nas organizações dedicadas à cultura, nas redações dos jornais, nas comunidades religiosas; pregar a tolerância para com quaisquer movimentos que afrontem o Estado de Direito; e insinuar-se nas escolas, cursinhos e universidades para ali promover aberta e persistente pregação (dizia-me ainda hoje um estudante que, no seu pré-vestibular, os professores se dedicam muito mais à pregação ideológica do que aos conteúdos). Antonio Gramsci plantou na Itália e colheu no Brasil.

Se mesmo assim não funcionar, está sendo calçado o sapato para um outro e mais sinistro passo, que será dado com a conquista, lenta mas determinada, do Poder Judiciário. Por esse caminho, no Brasil de hoje, é perfeitamente possível fazer uma revolução sem precisar se incomodar com o estampido das armas. Pergunto: não é objetivo de toda revolução emascular o direito legislado para dar vigência à sua ideologia? Ora, uma caneta é mais silenciosa e mais eficiente do que um fuzil. E um gabinete com ar condicionado, bem mais confortável do que as encostas de Sierra Maestra. Mas o resultado pode ser o mesmo.

Serra e Rita

Por José Nivaldo Cordeiro


24 de Maio de 2002

Dificilmente a candidatura oficial vai se livrar das piadinhas ensejadas pelo cacófato derivado da junção dos nomes. Serra, de fato, irrita, os amigos e os adversários. Mas, como diria o Dr. Jung, personalidade é destino e somos o que somos. E como nada é por acaso, o cacófato também não é, revelando um pouco mais do candidato.Para além das armadilhas da língua portuguesa, entretanto, importa mais avaliar o impacto político e eleitoral da escolha da vice da chapa do PSDB. Salvo a previsível guerra dos dossiês, que certamente acontecerá, pareceu-me uma escolha consistente. As pesquisas revelavam a menor força da candidatura Lula junto ao eleitorado feminino, que ficou um tanto órfão com a desistência da Roseana Sarney. A deputada Rita Camada certamente será um elemento a atrair considerável contingente desses votos.

Vice não manda, já diz o ditado popular. Alguém conhece alguma rua como nome de vice? Ele só é importante quando o titular, por qualquer motivo, fica impedido de exercer o poder. Enquanto vice, não é lá grande coisa em política.

Dessa forma, a deputada será mais uma garota-propaganda do que mesmo uma aglutinadora de forças políticas. Até onde a imprensa noticiou, as diversas facções que formam o PMDB não ficaram muito felizes com a escolha. A convenção do Partido não será um mero convescote dominical. Como se diz no popular, o bicho vai pegar. Pior ainda porque ela sempre integrou a ala oposicionista do Partido. A lógica, em política, nunca foi linear e esse acontecimento só confirma o truísmo.

De qualquer modo, penso que os estrategistas da candidatura acertaram. Era a melhor escolha. Qualquer um que fosse o escolhido geraria algum tipo de resistência e essa pelo menos agregou em termos eleitorais. Para ser perfeita só se fosse oriunda de Minas ou de São Paulo. Mas nada é perfeito. Nem Rita.

O problema colocado agora para a dupla Serra e Rita e decolar nas pesquisas eleitorais, deslocando-se do embolado segundo pelotão. Se isso não acontecer rapidamente, a candidatura corre sério risco de ser cristianizada. Quem pode esquecer o que aconteceu com o saudoso Ulysses Guimarães? Não basta controlar a máquina partidária e o Executivo para ser bem sucedido nas urnas, ainda mais numa eleição de corte plebiscitário, como a que se avizinha.

É esperar para ver.