Moral e política

Por José Nivaldo Cordeiro


4 de Junho de 2002

“History is again on the move” (Toynbee).

Fazer política não é necessariamente fazer o bem. Essa verdade é tão antiga quanto a obra de Maquiavel. O grande perigo é justamente confundir os campos de ação, o da moral e o da política. No âmbito moral, temos sempre a polaridade bem e mal, opostos irreconciliáveis. Quando se projeta no jogo
político esses referenciais morais, não reconhecendo a sua especificidade, cai-se necessariamente no maniqueísmo, de tal sorte que tudo que aquilo que me é semelhante é bom e tudo que me é diferente é mau. Então é possível afirmar que quem confunde moral com política esconde em si uma inclinação
totalitária e intolerante, incapaz de conviver e aceitar o jogo democrático, ainda que disso não tenha consciência.

Quando moral e política são confundidos, ocorre o preâmbulo da ditadura e o totalitarismo.

A política, vista por sua própria especificidade, é a maneira do homem maduro percebê-la. Todos aqueles que, de alguma forma, foram tocados pelos ideais do liberalismo político, aceitam essa realidade e estão preparados para a alternância de poder e o respeito à vontade das maiorias. Só quem aceita o ideário liberal – ainda que não o saiba – é que pode conviver com
os diferentes e aceitar o governo daqueles que eventualmente venham a detestar.

Essas reflexões são obrigatórias nos tempos eleitorais que estamos a viver. Na propaganda política é perceptível o maniqueísmo, mas a propaganda em si não é nada. Mais importa o que efetivamente são as crenças dos líderes políticos. Se estes fizerem da indignação moral a base para a sua ação, não
estaremos longe dos campos de concentração e dos gulags, uma vez que eles sejam alçados ao poder. Se esses indivíduos estiverem possuídos da certeza messiânica de sua causa, então o processo democrático será para eles apenas um meio de chegar ao poder, não algo respeitável, uma conquista da
civilização que precisa ser preservada.

Ninguém poderá ter certeza metafísica maior da sua causa do que tiveram os nazistas, que obtiveram a sua primeira grande vitória em 1930, ao elegerem 107 deputados. Poucos anos depois, deu no que deu. Indivíduos messiânicos, vitoriosos nas urnas, tornam-se um perigo para os povos. Sua chegada ao
poder precede os grandes desastres.

O que vemos é que a militância de esquerda em nosso país – um pleonasmo, haja vista que desconheço qualquer militância de direita – está imbuída da sua bondade redentora, enxergando seus adversários como o seu contrário, o mal absoluto. Um exemplo dramático do que quero dizer está nos membros
vermelhos da Igreja Católica. Para eles, a conquista do Estado será a conquista do Paraíso, a redenção em vida, a chegada do Reino à Terra. Ainda domingo passado, na missa, ouvi um velho sacerdote levantar seus olhos do Livro e, sem qualquer mediação, afirmar que a culpa por haver pobres é que
há ricos e que os presentes deveriam todos buscar a igualdade. Esqueceu-se do dizer do próprio Cristo: “Pobres, sempre os tereis”.

O que dizer então dos militantes ateus dos partidos de esquerda? Fazem da militância e da ação política o seu próprio deus substituto. Serão bons, e portanto salvos, todos que concordarem com os seus preconceitos. Contrariamente, serão maus, e condenados à danação, todos os que estiverem
no campo adversário. A linguagem religiosa não é mero enfeite.

Pensando em tudo isso é que fico a imaginar como estaremos daqui a dez anos. Será que na Alemanha de 1930 alguém fez esse exercício de futurologia?

O Kerensky brasileiro e a Revolução de Outubro tupiniquim

Por Paulo Diniz

Nos conturbados meses que seguiram-se a deposição do Czar, um governo liderado pelo socialista Alexander Kerensky foi estabelecido na Rússia.
Cheio de boas intenções, mas completamente equivocado na essência de suas propostas, o governo Kerynsky escancarou de vez as portas do poder para os bolcheviques de Lênin, na chamada “Revolução de Outubro”. A catástrofe que se seguiu, embora não tenha decorrido unicamente da inépcia de Kerensky, poderia ter sido impedida por ele.
Decorridas várias décadas do desastre, e guardadas as devidas proporções, eis que surge o nosso “Kerenksy”, o senhor Fernando Henrique Cardoso, e as eleições de outubro estão com ar de serem a “nossa” Revolução de outubro.
Com suas políticas esquerdistas e estatizantes, FHC está pavimentando cada vez mais o caminho do poder para Lula e seu grupo de socialistas e comunistas. Aliás, parece que Fernando Henrique Cardoso está mesmo é trabalhando para que o PT vença as próximas eleições, e não o pífio candidato do governo, o Sr. José Serra.
Para muitos, a política do presidente é inatacável, em virtude de suas “preocupações com o social”. De forma arrogante, os representantes do governo federal apresentam as estatísticas do que consideram “sucesso” do governo FHC. Assim, a criação de inúmeras políticas assistencialistas demagógicas é transformada em “preocupação com o social”; a destruição da educação pública, como aconteceu em São Paulo, transformando as escolas em creches, com a total quebra de autoridade dos professores (que são agredidos diariamente), impedindo a punição de alunos indisciplinados, com promoção automática dos mesmos, é “preocupação com o social”. Tolher as atividades da polícia, durante sete anos, de todas as formas possíveis também é uma “preocupação com o social”. Também deve ser uma “preocupação com o social” pagar indenizações milionárias para ex-terroristas, ampliar de forma imensa a carga tributária, e conceder financiamento estatal para emissoras de TV em ano de eleições. Gradualmente, os socialistas do Sr. FHC impuseram leis e comportamentos que “amaciaram” os brasileiros, tornando-os conformados com essa situação, onde o cidadão, sem que muitas vezes sequer perceba isso, só serve para pagar impostos e ser alvo da criminalidade, delegando poderes cada vez maiores ao “Pai de todos”, o Estado, para que este crie leis para interferir na vida das pessoas de forma danosa.
O próprio presidente já declarou que governo é isso mesmo: o Estado deve tomar impostos e redistribuir renda. O que o nosso “Kerensky” “esqueceu” de dizer é o que isso realmente significa: o Estado toma recursos dos poucos que ainda podem produzir, e dá algumas migalhas aos miseráveis, através das políticas assistencialistas, ficando com a maior parte para sustentar suas próprias estruturas, falidas e incompetentes.
Que tal se a diminuição de impostos para incentivar a produção, redução dos gastos do governo, e a proteção para a livre iniciativa, estivessem entre as propostas de algum dos presidenciáveis?
Ou então, menos presença do Estado na vida das pessoas, de todas as formas possíveis, exceto onde ele, Estado, tem obrigação de participar? Desnecessário dizer que, pelo retrospecto do PSDB, tal situação só por milagre. Se o governo for do PT, então, isso é impossível.A solução, para variar, deve mesmo ser AUMENTAR, ainda mais, os impostos, como, aliás, já insinuou o candidato do PT. Só resta saber o que acontecerá quando a “galinha dos ovos de ouro” (o contribuinte brasileiro) tiver sido “morta”. De onde o governo vai tirar a “derrama” que tem sustentado a periclitante estabilidade econômica brasileira?
Entretanto, para muito esquerdistas, inclusive dentro do governo, isso não é o bastante; ao contrário: é necessário socializar mais e mais. A partir dessa perspectiva, tornou-se muito difícil, senão impossível, qualquer candidato não-esquerdista pensar em vencer uma eleição presidencial. Aliás, pelo que ocorreu com a governadora do Maranhão, vai ser difícil para um candidato que não seja de esquerda até mesmo disputar eleições.
E é com esse pano de fundo que o candidato do PT avança rapidamente. Mais uma vez Lula volta ao cenário político nacional como alternativa da extrema-esquerda ao poder (sim, extrema-esquerda, pois a esquerda já está no governo).
Após três investidas anteriores Lula, ao que tudo indica, vai conseguir atingir o sucesso e vencer a disputa para a presidência da República, quem sabe ainda no primeiro turno, apoiado em uma bem orquestrada campanha de publicidade, onde é “vendido” como um “moderado” aberto ao diálogo com todas as forças políticas.
Dessa vez, ao contrário das ocasiões anteriores, o candidato do PT está sabendo esconder muito bem sua total falta de preparo para ocupar o maior cargo da nação, bem como o extremismo de inúmeras correntes que formam o Partido dos Trabalhadores.
Descontado esse aspecto, meramente cosmético, teriam ocorrido mudanças, por exemplo, entre as forças que tradicionalmente apóiam o candidato Lula? Creio que a resposta é um sonoro NÃO.
Alguns exemplos disso são palpáveis, como o fato dos petistas prosseguirem dando todo apoio ao movimento radical MST, que é apresentado como legítimo representante dos trabalhadores rurais, mas na verdade, é uma milícia que recebe terroristas internacionais, como os narco-traficantes das FARC e utiliza a violência, como demonstram as suas ações. Aliás, as atividades do MST contam com o apoio velado do “Kerensky” de Brasília, notório por financiar o movimento com dinheiro do contribuinte, e nunca pedir um prestação de contas do que é feito com ele.
O PT também continua defendendo a submissão da sociedade ao crime, como atestam as investidas insistentes de comissões dos direitos humanos contra a polícia, sempre que essa reprime a criminalidade com um pouco mais de energia (o que está ficando raro hoje em dia). Exemplo recente disso foi dado pelo Sr. Hélio Bicudo, que ao invés de cuidar dos negócios do município de São Paulo, do qual, para quem não sabe, é vice-prefeito, preferiu criticar de forma totalmente irresponsável uma operação policial contra criminosos num pedágio em uma rodovia paulista. Como aqui no Brasil essas entidades estão totalmente desmoralizadas, porque, via de regra, defendem SOMENTE MARGINAIS, elas apóiam-se cada vez mais em organismos internacionais, sobretudo da ONU, com suas propostas de submissão nacional aos interesses de grupos políticos e econômicos internacionais.
Também é necessário descobrir, exatamente, o que pretende o PT no governo, ou melhor, como tenciona implantar o seu plano de governo (ou seria carta de intenções?). Mas a julgar pela equipe econômica de Lula, é bem possível que a idéia de imposto de renda com alíquota de 50% se torne realidade.
Mas o “fôlego de gato” do candidato petista também se deve ao incansável trabalho de inúmeros esquerdistas que militam na mídia e no ministério público, que escondem de todas as formas possíveis o ranço totalitarista e os desmandos do partido, e tratam de lançar lama nos adversários reais ou prováveis do PT.
Por exemplo: qual emissora de televisão está dando cobertura aos rumos que o governo neo-estalinista do Rio Grande do Sul está tomando, ou do desgoverno da prefeita de São Paulo? Para se ter uma idéia de como anda o governo da capital paulista, existe um projeto na câmara dos vereadores, de autoria da prefeita, prevendo a contratação de estrangeiros para trabalhar na prefeitura. Quem sabe, os petistas pretendam contratar algumas centenas de “assessores” cubanos, colombianos (das FARC, obviamente), ou alguns dos inúmeros militantes esquerdistas europeus e norte-americanos desocupados, para ajudarem no “governo popular” de São Paulo?
E nas relações internacionais, o que será que o PT propõe? Aproximação com países “democráticos” e “modernos” como a China e Índia, com aqueles “pilares econômicos e democráticos” da América Latina, Cuba e Venezuela?
Infelizmente, caso o PT chegue ao governo, salvo um grande engano, o Brasil pode se preparar para perder pelo menos uma década economicamente. Isso se o país não se tornar uma Colômbia ou Angola em grande escala. E o pior, como lembrou de forma apropriada o advogado Alceu Garcia em um artigo recente, é que não teremos nem a opção de fugirmos de bote para Miami, como fazem os cubanos.
E enquanto a casa estiver “caindo”, assim como aconteceu com o Kerensky russo, o nosso “Kerensky brasileiro”, quem saber, estará desfrutando de uma “sofrida” temporada no exílio, quem sabe na sua amada França.

A taxa de juros

Por José Nivaldo Cordeiro


3 de Junho de 2002

O site do Professor Ricardo Bergamini
(www.angelfire.com/sc3/ricardobergamini) é daqueles imperdíveis para quem estuda a economia brasileira. Ele tem sistematicamente acompanhado a conjuntura econômica e os grandes números dos dois Governos FHC, colocando no site as suas preciosas conclusões. É, claro, um economista crítico com
relação ao governo e também não poderia ser diferente: quem enxerga os números sabe que as coisas não andam bem no Brasil.

Um dos pontos de destaque da sua análise é a determinação da taxa de juros do mercado. Para ele, é inútil tentar reduzir a taxa de juros na ponta do tomador privado apenas pela redução da taxa básica. Esta última só interessa para o próprio governo, na medida em que, para cada ponto percentual de redução da mesma, a taxa de mercado sofre contração de apenas 0,04%, segundo seus cálculos.

A fato objetivo é que, pelo mecanismo do depósito compulsório, o governo se apropria de grande parte do dinheiro disponível para crédito, de sorte que pouco sobra para o mercado privado. A taxa básica média para o governo está em torno de 18% a.a., enquanto que a taxa média para o mercado é de 59,42%
a.a., sem considerar os impostos, taxas e demais custos do serviço bancário. As lideranças empresariais melhor fariam se lutassem para reduzir essa intervenção indevida no mercado de crédito, que coloca pesada cunha para os tomadores finais. A taxa básica pouco importa para as empresas. Por impedir o desenvolvimento de um sistema de crédito sadio, praticando o
quase monopólio da dívida, o que vemos é a economia minguar. Na verdade, os brasileiros (pessoas físicas e jurídicas) se dividem em dois grupos. De um lado, os que são superavitários e sócios do governo na massa tributária. Vivem felizes, cobrando elevados juros do devedor monopolista. Do outro, os
que, por qualquer motivo, são obrigados a tomar recursos emprestados, ao custo de mercado. Esses vivem asfixiados financeiramente e freqüentemente apresentam problemas de solvência. Em outras palavras, quebram ou vêem seu
nome sujo na praça, sendo automaticamente excluídos do sistema de crédito. A culpa é única e exclusiva do Estado, que impede o desenvolvimento econômico através de um dos seus mecanismos naturais, que é o crédito.

Se o leitor tiver em conta que os brasileiros já pagam uma brutal carga tributária, que cresce sistematicamente a cada ano, irá perceber o verdadeiro horror econômico em que estamos metidos: o governo brasileiro simplesmente impede que a prosperidade aconteça. Quem está desempregado e
sem crédito no mercado sabe quem é o autor das suas desgraças. Aqueles que, por algum motivo, vêem os seus sonhos de crescimento fracassarem, sabe quem os seqüestrou.
Da mesma forma, o desempenho frustrante da balança comercial só tem um responsável: o governo e sua voracidade fiscal e creditícia. O mercado internacional não paga o sobrecusto governamental embutido nos preços dos
produtos. Então, caro leitor, dá para imaginar o grande engano que é apoiar plataformas políticas que pugnam precisamente por aumentar a intervenção governamental no processo econômico. É suicídio.