A contracultura no poder

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 15 de março de 2010

Já observei mil vezes que no Brasil de hoje a linguagem da elite soi disant alfabetizada se reduziu a um sistema formal de pressões e contrapressões, onde as palavras valem pela sua carga emocional acumulada, com pouca ou nenhuma referência aos dados correspondentes na experiência real de falantes e ouvintes.

A mais alta função da linguagem – a transposição da realidade em pensamento abstrato e o retorno deste à realidade, como instrumento de iluminação da experiência – fica assim bloqueada, restando apenas, de um lado, a expressão tosca e direta de desejos e temores, e, de outro, a imposição de reações estereotípicas, como os comandos emitidos por um amestrador de bichos que não espera de seus amestrados nenhuma compreensão racional, apenas a obediência automática, sonsa, impensada.

As causas desse estado de coisas remontam à “contracultura” dos anos 60, sob cuja influência formou-se a mentalidade dos homens que hoje dirigem o país. Enquanto pura expressão do protesto juvenil ante um mundo complexo demais, a contracultura podia até exercer alguma função positiva, como estímulo crítico à renovação do legado milenar que legitimava, cada vez mais da boca para fora, a cultura dominante. Transmutada ela própria em cultura dominante, a onda contracultural cristaliza-se em inversão compulsiva, mecânica e burra, de todos os valores e de todos os príncípios. No prazo de uma geração, os mais altos conhecimentos, as mais ricas e delicadas funções da inteligência, os valores mais essenciais da racionalidade, da moral e das artes cedem lugar à repetição maquinal de slogans e chavões carregados de ódios insensatos e apelos chantagistas, boa somente para despertar aquela obediência servil extremada que, para maior satisfação do manipulador, se camufla sob afetaçôes de espontaneidade e até de rebeldia no instante mesmo em que tudo cede às injunções de cima. Transmutado ele próprio em estereótipo, o inconformismo torna-se o pretexto oficial do conformismo mais extremo e mais abjeto, aquele que não se contenta em obedecer, mas procura mostrar serviço, agradar, bajular.

Num primeiro momento, a única vítima é a alta cultura, que desaparece sob a glorificação do pior e do mais baixo. Logo em seguida, o sistema educacional inteiro é infectado: substituída a exigência de qualidade pela da “correção política”, o clamor dos grupos de pressão torna-se a única fonte da autoridade pedagógica, impondo novos padrões de conduta em vez das regras da gramática, da lógica e da aritmética, premiando o sex appeal em vez das boas notas e, nos casos mais escandalosos, incentivando abertamente atos criminosos sob a desculpa de que são próprios da juventude ou justas expressões de protesto contra o establishment, como se os propugnadores dessa idéia não fossem eles próprios, agora, o establishment.

Até aí, a velha elite dominante pode permanecer indiferente ao processo, que não a afeta diretamente. Pode até sentir uma ponta de satisfação malévola ao ver que os revolucionários se contentam em destruir a educação e a cultura, que para ela não significam nada, sem tocar no seu rico dinheirinho. Quando, ante a devastação revolucionária de todos os valores, o homem de posses assegura com tranqüilidade olímpica que “nossas instituições democráticas são sólidas”, o que ele quer dizer é que pouco lhe importa a destruição do mundo, desde que permaneça intacto o seu patrimônio – como se este fosse uma entidade metafísica, subsistente no vácuo, independentemente das contingências político-sociais.

Mas o passo seguinte da demolição revolucionária da sociedade já vem abalar até a falsa segurança do burguês. Isso acontece quando a geração de jovens formados sob a influência da contracultura começa a ocupar os altos postos na burocracia legislativa, fiscal e judiciária e a transmutar em estados de fato as fantasias torpes de seus cérebros meticulosamente desengonçados: diante dos feitos dessas criaturas, pela primeira vez os ricos começam a tomar ciência de que o dinheiro não é um poder em si, é apenas um símbolo provisório garantido pelo poder efetivo, o poder político, agora em mãos de pessoas que já não querem garanti-lo mais.

Já nem falo, por óbvio demais, do Plano Nacional de “Direitos Humanos”, que assegura ao invasor a posse imediata do imóvel invadido e faz dele o juiz soberano do seu próprio crime. Igualmente perverso, e muito mais sorrateiro, o Projeto de Lei 2412 modifica os critérios para o processamento administrativo das execuções fiscais. Conforme alertou recentemente o Prof. Denis Rosenfield, “o projeto está atemorizando o setor jurídico do país e começa a mobilizar o grande empresariado. Ele simplesmente concede o direito de transferência de bens de devedores tributários para a União, excluindo o devido processo legal.” Você deve ao fisco? Ele vem e toma as suas propriedades instantaneamente, diretamente, sem precisar de uma sentença judicial para isso.

Você dirá que é inconstitucional? De que serve isso, diante da Súmula Vinculante nº. 10 do Supremo Tribunal Federal, com base na qual se sustenta a tese de que os juízes singulares não podem mais, por si, suspender a aplicação das leis ou atos normativos que lhes pareçam inconstitucionais? Inconstitucional ou não, cada lei, decreto ou portaria continuará valendo para todos os casos particulares até que o plenário do tribunal ou o STF, ao fim de alguns anos ou décadas e de uma série infindável de danos, decidam em contrário. (Aguardem uma denúncia mais completa dessa bestialidade no 35º. Simpósio de Direito Tributário, a realizar-se sob a direção do Prof. Ives Gandra da Silva Martins.)

Esse tipo de justiça hedionda não surge do nada. Ela pressupõe décadas de destruição da inteligência jurídica, substituída gradativamente por automatismos verbais politicamente agradáveis à mentalidade revolucionária. E essa substituição não ocorre antes que toda a esfera da cultura superior e da educação tenha sido infectada de contracultura. De que adianta “mobilizar o empresariado” para neutralizar este ou aquele efeito específico de um processo geral de degradação cultural ante o qual esse empresariado permaneceu neutro ou alegremente cúmplice ao longo de trinta anos? De que vale tentar enxugar uns respingos, quando a onda que os dispara já se avolumou ao ponto de submergir o território inteiro? De que vale tentar vencer uma batalha, quando já se aceitou perder a guerra?

Ou o empresariado se dispõe a combater em todos os fronts, inclusive os mais remotos do seu interesse imediato, ou pára logo com essa farsa suicida de defender no varejo aquilo que já cedeu no atacado.

Olavo de Carvalho on Communism in Latin America

Alex Newman interviews Olavo de Carvalho

The New American, March 15, 2010

Olavo de Carvalho, an author and philosopher, is renowned as one of Brazil’s preeminent thinkers. He played a leading role in exposing subversive leftist organizations like the Foro de São Paulo in his work as a writer for some of Brazil’s most influential publications. In the course of writing an article about the socialist resurgence in Latin America, I interviewed Carvalho for The New American magazine.

The New American: Could you please tell me a little bit about yourself, your background, your work, your philosophy, and what motivated you to become involved in exposing the Foro de São Paulo?

Olavo de Carvalho: Notwithstanding having been a leftist militant as a teenager, I lost any interest in politics after severing my ties with the Left when I was 20 years old in 1969. From that time on, until I was 38, I worked as a text editor for newspapers and magazines and dedicated my free time to the study of philosophy, literature, cultural history, ancient esoteric traditions, and comparative religion. Though I delivered an occasional lecture here and there, I was happy to live as an anonymous scholar, perfectly unknown to public opinion and academic circles. It was only in the late ’80s that my attention was drawn to the ongoing destruction of high culture in Brazil, and I started to take notes on the alarming stupidities that were published in ever growing quantities by very influential Brazilian opinion makers, both academic and journalistic. Bit by bit I grasped the political factors that had generated that state of affairs, and in 1993 I wrote a book, The New Age and the Cultural Revolution, about the overtaking of higher education by the communist militancy, which was not at all interested in high culture, but only in gaining political power and profiting from the general dumbing down of Brazilian students. In 1995 I wrote The Garden of Afflictions, a study on the evolution of the idea of “Empire” in the West, since the times of Julius Caesar to the advent of the New World Order…. The following year I collected my notes about Brazilian cultural decay and published them under the title of The Collective Imbecile, … leading some big newspapers to hire me as a weekly political columnist…. Meanwhile, I had founded an electronic newspaper, Mídia Sem Máscara (“Unmasked Media”), that intended to correct the most flagrant distortions of the news published by the big media…. In 2005, as I was getting tired of receiving weekly death threats from leftist maniacs, I found it was a good idea to accept a job as a Washington foreign correspondent that was offered to me by a traditional Brazilian business newspaper, the Diário do Comércio (“Business Daily”), and here I am living in Virginia with my family. I love to be here, because Americans, though already infected by the neo-communist virus, are not yet so stupid as Brazilians have become.

TNA: To what extent has the leftist movement gained power in Latin America? What factors led to this resurgence and how was it possible?

Carvalho: Communist and pro-communist parties rule about a dozen Latin American countries today. This fact, by itself, is enough to prove that the “end of communism,” proclaimed by the Right soon after the fall of the Soviet Union, is a myth. World communism was never only an appendix of the USSR. It actually created the USSR, not the other way around. It existed a century before the Russian Revolution and continued to exist after the nominal extinction of Soviet power. What made the resurgence of communism easier — not only in Latin America, but around the world — was the cowardly timidity of Western right-wingers who, instead of taking the opportunity of the fall of the USSR to punish the communists for their crimes, chose instead a policy of “extending them a hand,” as if asking for their pardon for having defeated them, and offering them all sorts of aid, enabling them to reappear with a new or attenuated identity, even protecting them from being called “communists” (the fashionable euphemism is now “populism”). I believe that this absurd surrender of the winners was also stimulated by powerful globalist circles, whose interest in establishing worldwide bureaucratic controls converges with the objectives of the communists. The number of billionaire companies which came to openly contribute to leftist parties is enormous. I call “meta-capitalists” the individuals and groups which grew so wealthy with the market economy that they can’t stand anymore being at the mercy of the free market and seek, instead, to control everything, supporting bureaucracy instead of capitalism. Meta-capitalists are natural allies of the communists.

An event that clearly symbolizes this union of apparent adversaries was the tributes paid to Lula, the Brazilian President, who in the same week was honored by the World Economic Forum in Davos, for his conversion to capitalism, and by the São Paulo Forum, for his allegiance to communism. The contradiction is only apparent. At the World Social Forum in Porto Alegre, which for public opinion embodies the opposite of the Davos Forum, the main demand was for a greater control over the world economy by big international organizations. Nobody there asked for shutting down the IMF or the World Bank, what they wanted was the integration of “civil society” — i.e., the World Social Forum — into those organizations. Many European NGOs [non-governmental organizations] which participate in the World Social Forum have a seat at the meetings of the World Bank and other international organizations. The “ideological” contrast serves only as propaganda. What we have is a gigantic symbiosis of all globalist and statist forces around the world.

TNA: How have the Foro de São Paulo and its members managed to become so influential? How can they be stopped?

Carvalho: The São Paulo Forum, created by Luis Inacio Lula da Silva and Fidel Castro in 1990 with the goal of regaining in Latin America what had been lost in Eastern Europe, is the strategic command of the communist and pro-communist movement in the continent. Its membership includes over 100 legal political parties as well as criminal organizations of drug traffickers and kidnappers, such as the FARC (“Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia”) and the Chilean MIR (“Movimiento de Izquierda Revolucionaria”). Legal parties cover up the activities of criminal groups, and these provide undercover financial resources to legal parties…. During 16 years big media and the establishment, in Latin America and in the United States, refused to touch upon the subject, handing to the strategists of the communist revolution the protection of silence. Some of them, such as the expert in Brazilian affairs at the Council on Foreign Relations, Kenneth Maxwell, even openly denied the existence of the Forum, though by that time I had already published, in my electronic newspaper Mídia Sem Máscara, the complete official proceedings of its annual meetings, which revealed with total clarity the scope of its ambitions and goals.

The Forum can only be stopped if the legal political parties in its membership are taken to court for the criminal activities covered up and protected by the organization. Brazilian President Lula, who chaired the Forum for 12 years, signed in 2001 an agreement of full support to the FARC, the same organization which provides training and military assistance to criminal gangs in Rio de Janeiro and São Paulo, such as the PCC (“First Command of the Capital”) and the “Red Command,” which kill tens of thousands of Brazilian citizens every year. When FARC or MIR agents are arrested in Brazil, immediately Lula’s [Workers’] Party, the PT [Portuguese: Portido dos Trabalhadores], acts to free them. What is this if not complicity in crime? … Meanwhile, communist militants keep securing positions in the judiciary, so that as time goes by any lawsuit brought against this alliance of leftists and criminals becomes ever more unlikely to succeed.

TNA: What role have the Brazilian government and Lula in particular played in expanding the leftist movement’s power in Latin America? Is Lula a radical leftist, a moderate, or somewhere in between? What do his policies -indicate?

Carvalho: Lula’s ideological convictions don’t really matter, because they don’t even seem to exist. What exists is his loyalty to his cohorts in the militancy and to the commitments he made to the entities of the São Paulo Forum, which, if unfulfilled, would bring against him all the Latin American Left, leaving him without any support, not even from the Right, which is by now so weak that its support is worthless. A mediocre man doesn’t act out of convictions, but according to the objective pressures of his group of reference. It’s a waste of time to ask whether he “is” a true communist within himself or not. Within Lula there is only emptiness and meanness, but around him there is a well-organized structure of revolutionary power which he serves well and will never stop serving.

Foreign observers let themselves be impressed (or pretended to do so) by Lula’s “orthodox” economic policy and therefore concluded that he had changed his ideology. This is total nonsense. Lula only adopted these policies so that he would not have to fight two fronts simultaneously. Following the example of Lenin’s “New Economic Policy,” he sought to appease foreign investors while consolidating the power of leftist organizations in internal politics (using copious amounts of public money to finance them), and boycotting the Right in such a way that it is not able, as he himself recently declared, even to present its own candidate in the upcoming presidential elections [in October]. This will be the third presidential election without any right-wing candidate. As soon as it felt that the control of the Left over the country had been consolidated, the ruling party threw off its mask of moderation and began to propose radical measures such as state control over the media, the right of leftist organizations to invade and take rural properties as they see fit, etc.

TNA: Do you see the leftist resurgence as a monolithic threat under central control or rather as a splintered movement with various factions? Why? Assuming they exist, who are the leaders?

Carvalho: Throughout history the revolutionary movement has never depended on monolithic control to be able to grow and prosper. Even during the period of Soviet hegemony, the expansion of communism coexisted perfectly well with the deep internal dissent that separated the Soviets from the Chinese and from the radicalism of Latin America guerrillas. In the last dec-ades, the communist movement has perfected even more its capacity to deal with a variety of internal dissidences, using them as camouflage and as instruments to adapt itself to local situations. The linear party hierarchy, which had always been more an appearance than a reality, has been totally replaced by a flexible organization of “networks” connected via the Internet…. In Latin America, the leadership of the revolutionary movement still belongs to the founders of the São Paulo Forum: Lula, Marco Aurélio Garcia, Ricardo Kotscho, and others.

TNA: What role have Hugo Chavez and Venezuelan Petrodollars played in this resurgence? Is the Cuban government an important player?

Carvalho: Hugo Chavez is only a scarecrow that the Latin American Left waves before the world to distract the attention away from the São Paulo Forum, which is the true strategic command of the Latin American revolution. Cuba and Venezuela are important as shelters for terrorists and drug traffickers. In Venezuela and other Spanish-speaking countries ruled by the São Paulo Forum, there is strong and organized opposition, while in Brazil all that is left is the Left itself, which controls the scene absolutely.

TNA: How significant and deep are the ties of leftist leaders and political parties to terrorism and crime?

Carvalho: In Brazil, federal judge Odilon de Oliveira gathered proofs showing that FARC’s narco-guerrillas … control a large chunk of local criminality. As a result, he became the most persecuted man in Latin America and now has to live as a prisoner in his own office, not being able even to go out to visit his family…. The FARC also provide guerrilla training for the militants of the “Landless Movement” (MST), an ironic name because that entity is one of the biggest landowners in Brazil today. The MST invades farms, destroys produce and equipment, sends away the (true) workers, and is invariably rewarded for its actions, receiving enormous sums of federal monies and the property of the invaded farms. Even more ironically, the main factor for Brazil’s economic success is the productivity of its big farms…. As for the Cuban government, its connections to drug trafficking have been proved several years ago in the book The Mafia from Havana: The Cuban Cosa Nostra…. The same connections exist with the Venezuelan government, as demonstrated by a report of the U.S. Congress from July 2009…. In Brazil, the alliance between the FARC and local criminal gangs has made it absolutely impossible to control crime activity. Nowadays, some 50,000 Brazilians are murdered every year. Instead of repressing the gangs that produce this insanity, the government grants them territorial autonomy and is even cynical enough to propose, as a remedy, disarming the honest population.

TNA: To what extent and in what way is the U.S. government involved in the region?

Carvalho: For several decades now, the attitude of the American government in the area has been ambiguous, to say the least. Bill Clinton’s Plan Colombia only offered economic and military aid to the Colombian government on the explicit condition that … criminal organizations of a political nature be preserved [from] any damage. The result was that the old cartels were destroyed and the FARC became the absolute rulers of drug trafficking in the continent. In reality this kind of “war on drugs” is a war that favors the Left against Latin America. The Department of State is well informed about the São Paulo forum and its Brazilian leadership. When it supports Lula under the pretext that he is “a moderate,” in contrast with the “radical” Hugo Chavez, it is actually camouflaging the real danger so that it may grow sheltered from the sight of any intruder.

TNA: What role are multilateral and supranational institutions like ALBA, MERCOSUR, the Andean Community, and UNASUR playing in all of this? Could the integration process be used to eventually absorb all of Latin America under authoritarian control?

Carvalho: All these organizations were created under the inspiration of the idea of free trade, and there were even some people who saw in them a sign of formidable capitalist progress. However, we now understand that free trade is a double-edged sword, which can also be used to dissolve national sovereignties and to build upon their rubble a new structure of supranational power. Many political analysts who only look at things from an economic point of view fail to notice such danger. They imagine that the expansion of commercial ties is by itself a vaccine against communism…. Well, in today’s Latin America, the Left practically has the monopoly of political action in its hands, and indeed this is so much so that all those organizations you have mentioned — all of them — are being used for the creation of a kind of Union of Latin American Socialist Republics.

TNA: How serious is the threat of this resurgence? What do you see happening in both the near future and the long run?

Carvalho: There is no unified answer that applies to all Latin America. The situation is different in each country. For example, however unbelievable it may seem, there is a strong and organized resistance against the rise of neo-communism in Venezuela. Colombia, likewise, is a remarkable center of resistance. On the other hand, nowhere else has the Right been so utterly destroyed as it has been in Brazil, which is, for this very reason, the headquarters of Latin American revolution. When former Venezuelan presidential candidate Alejandro Peña set up UnoAmerica (Association of Democratic Organizations of the Americas), the only international organization devoted to fighting communism, he found no difficulty in obtaining effective support in most of the Spanish-speaking countries, but he has always had great difficulties finding support in Brazil…. In other countries, however, the Left is not so culturally hegemonic, which has made possible the organization of an effective and strong anti-communist action. From this point of view, then, Venezuela is in a better situation than Brazil, for if in the former country, the Right has been oppressed, in the latter it has already died, being now necessary to create a new Right out of nothing. In this sense, American political analysts are always getting it all backwards: They are alarmed at Venezuela and do not understand that the headquarters of the revolution is in Brazil.

Comédia de erros

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 11 de março de 2010

Ainda estou à espera de que os “formadores de opinião” no Brasil mostrem algum sério interesse em estudar o projeto de nova civilização planetária, já em avançado estágio de implementação, sem cujo conhecimento extensivo é absolutamente impossível uma compreensão até mesmo rudimentar dos assuntos sobre os quais, não obstante, eles pontificam diariamente ante a platéia entorpecida e crédula que os sustenta.

O futuro da humanidade está sendo decidido numa esfera de discussões que paira muitas léguas acima das cabeças desses cavalheiros. A multiplicidade desnorteante das questões imediatas que aparecem fragmentariamente na mídia só adquire alguma unidade e sentido quando vista na escala da mudança não apenas política, mas civilizacional, propugnada pelos altos círculos globalistas.

“Civilizacional” significa centrado nos valores e símbolos gerais que moldam a conduta humana, e não nas fórmulas políticas incumbidas de diversificar sua implantação nas várias partes do mundo conforme a variedade das situações locais e o equilíbrio do conjunto. Só aí se revela com plena nitidez a coerência do apoio dado pela elite globalista a movimentos políticos, sociais e culturais aparentemente incompatíveis entre si.

O caso da União Européia ilustra o que estou dizendo. A rapidez com que, contra a vontade expressa dos povos, a soberania das nações no Velho Continente está sendo suplantada por esquemas supranacionais de governo é algo que não se poderia atingir nunca por meio da propaganda direta e unilinear. É preciso um complexo empreendimento de engenharia social, jogando com forças mutuamente contraditórias, saltando sobre a capacidade perceptiva das massas e dirigindo sutilmente o curso das coisas por meio do controle do fluxo de informações, hoje em dia o mais aprimorado e anestésico instrumento de governo. Como o processo é concebido e manejado por cientistas sociais do mais alto calibre, compreendê-lo desde fora, isto é, por meio de mera investigação em livros e sem acesso direto aos círculos decisórios, requer uma amplitude de horizonte intelectual muito além do que é acessível à média dos analistas acadêmicos e jornalísticos. A grande mídia, especialmente, não é o lugar apropriado para a discussão objetiva do assunto porque, unificada em escala quase planetária pela fusão das empresas de comunicação, ela é hoje nada mais que uma ferramenta de controle social, tendo abdicado da sua antiga variedade e assumido a condição de agente comprometido, incompatível com a de observador idôneo.

Até a década de 60, quando alguém apelava ao “tribunal da opinião pública mundial”, sabia que usava de uma figura de retórica, designando um ente abstrato dotado de existência meramente hipotética, o bom e velho “auditório universal” da retórica clássica. Hoje esse tribunal existe materialmente: é a unidade maciça da mídia mundial, cuja homogeneidade de critérios de julgamento em todas as áreas da vida – política, moral, cultura, educação, até mesmo etiqueta – salta aos olhos de quem quer que folheie diariamente as páginas dos principais jornais das Américas e da Europa.

Que essa opinião não coincida com a da população majoritária (e não coincide mesmo), não afeta em nada a eficácia do procedimento, de vez que, mesmo com popularidade diminuída, a grande mídia conserva o monopólio dos canais soi disant “legítimos” de comunicação, podendo facilmente tapar os rombos internéticos no bloqueio de notícias indesejáveis mediante acusações de “teoria da conspiração”, “extremismo”, “impolidez”, “falta de credibilidade” ou mesmo, contra todas as evidências quantitativas, “irrelevância”.

Em todos os casos, jamais o controle da mentalidade pública se faz pela propaganda unilinear de uma idéia ou proposta, mas pela moldagem dos conflitos e debates, concentrando o foco da atenção midiática em duas ou três correntes padronizadas de opinião, cujo confronto levará a resultados previsíveis, e atirando ao limbo das “fofocas de internet” as opiniões alternativas, não enquadráveis no enredo premeditado.

Por exemplo: quem rastreie as fontes de apoio midiático, financeiro e político dos movimentos mais em voga na América Latina descobrirá que a elite globalista ajuda, ao mesmo tempo, a esquerda radical associada à narcoguerrilha colombiana e, de outro lado, a multidão de tagarelas iluministas – socialdemocratas, liberais, libertarians, etc. –, que, como solução para o conflito violento entre governos e narcotraficantes, advogam a descriminalização das drogas sem declarar, ou às vezes até sem perceber, que a consagração do narcotráfico como negócio decente transmutará imediatamente as FARC não só em super-mega-empresa capitalista, mas também em movimento partidário legítimo, entregando-lhe de bandeja a vitória política que, na verdade, tem sido o único objetivo de seus empreendimentos belicosos.

Em 1970, a descriminalização da maconha nos EUA pelo governo Nixon provocou instantaneamente um crescimento de um para vinte no consumo da erva, ao passo que, com a retomada da política repressiva de 1979 a 1994, o número de usuários de maconha baixou de 23 milhões para menos da metade – e o de cocainados, de 4,4 milhões para um terço disso (v. http://findarticles.com/p/articles/mi_m1272/
is_n2622_v125/ai_19217183/?tag=content;col1
). A mentalidade iluminista, é certo, nutre amor sem fim por princípios democráticos abstratos que com freqüência a levam para longe da realidade, mas nem isso bastaria para explicar que, em nome desses princípios, ela chegasse, como chegou, ao absurdo de proclamar que a guerra ao narcotráfico é um fracasso e a liberação reduzirá o consumo de drogas. Para obter esse resultado, para fazer com que pessoas razoavelmente inteligentes e sem simpatias comunistas colaborassem às tontas com o objetivo estratégico máximo da esquerda continental, foi preciso algo mais: a moldagem prévia do debate, baseando-se na premissa tácita de que mencionar os aspectos políticos do narcotráfico era indecente, tornou impossível perceber que a guerra ao narcotráfico só fracassou naquelas regiões, entre as quais o Brasil, nas quais se travou de mãos atadas (ou não se travou de maneira alguma) graças ao compromisso político de não fazer dano às FARC, controladoras quase monopolísticas do comércio de drogas no continente. Incapazes de articular a defesa abstrata do livre mercado com a consideração dos fatores estratégicos, políticos e militares concretos, a “direita” acaba trabalhando para a “esquerda”, que por sua vez trabalha para a elite globalista. E esta, quando se vê pintada em pasquins da esquerda ignorante ou mendaz como encarnação máxima do “imperialismo americano”, pode sempre, entre risos de satisfação, convocar os liberais e libertarians para que a defendam em nome do “livre mercado”.

Visto com a devida elevação e amplitude, o curso das coisas na América Latina mostra-se lógico e previsível como um projeto de engenharia, que no fim das contas é o que ele é. Visto de baixo e no varejo, na escala microcéfala dos debates de mídia e da política do dia-a-dia, é uma comédia de erros, uma gritaria de loucos no pátio de um hospício. Mas nem todos os loucos são loucos mesmo. Como na peça de Peter Weiss, A Perseguição e Morte de Jean Paul Marat tal como Encenada pelos Internos do Asilo de Charenton sob a Direção do Marquês de Sade, alguns são profissionais, encarregados de puxar o coro dos malucos dóceis para abafar as reclamações dos indóceis.