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A História oficial de 1964

Olavo de Carvalho

O Globo, 19 de janeiro de 1999

Se houve na história da América Latina um episódio sui generis, foi a Revolução de Março (ou, se quiserem, o golpe de abril) de 1964. Numa década em que guerrilhas e atentados espoucavam por toda parte, seqüestros e bombas eram parte do cotidiano e a ascensão do comunismo parecia irresistível, o maior esquema revolucionário já montado pela esquerda neste continente foi desmantelado da noite para o dia e sem qualquer derramamento de sangue.

O fato é tanto mais inusitado quando se considera que os comunistas estavam fortemente encravados na administração federal, que o presidente da República apoiava ostensivamente a rebelião esquerdista no Exército e que em janeiro daquele ano Luís Carlos Prestes, após relatar à alta liderança soviética o estado de coisas no Brasil, voltara de Moscou com autorização para desencadear – por fim! – a guerra civil no campo. Mais ainda, a extrema direita civil, chefiada pelos governadores Adhemar de Barros, de São Paulo, e Carlos Lacerda, da Guanabara, tinha montado um imenso esquema paramilitar mais ou menos clandestino, que totalizava não menos de 30 mil homens armados de helicópteros, bazucas e metralhadoras e dispostos a opor à ousadia comunista uma reação violenta. Tudo estava, enfim, preparado para um formidável banho de sangue.

Na noite de 31 de março para 1o. de abril, uma mobilização militar meio improvisada bloqueou as ruas, pôs a liderança esquerdista para correr e instaurou um novo regime num país de dimensões continentais – sem que houvesse, na gigantesca operação, mais que duas vítimas: um estudante baleado na perna acidentalmente por um colega e o líder comunista Gregório Bezerra, severamente maltratado por um grupo de soldados no Recife. As lideranças esquerdistas, que até a véspera se gabavam de seu respaldo militar, fugiram em debandada para dentro das embaixadas, enquanto a extrema-direita civil, que acreditava ter chegado sua vez de mandar no país, foi cuidadosamente imobilizada pelo governo militar e acabou por desaparecer do cenário político.

Qualquer pessoa no pleno uso da razão percebe que houve aí um fenômeno estranhíssimo, que requer investigação. No entanto, a bibliografia sobre o período, sendo de natureza predominantemente revanchista e incriminatória, acaba por dissolver a originalidade do episódio numa sopa reducionista onde tudo se resume aos lugares-comuns da “violência” e da “repressão”, incumbidos de caracterizar magicamente uma etapa da história onde o sangue e a maldade apareceram bem menos do que seria normal esperar naquelas circunstâncias.

Os trezentos esquerdistas mortos após o endurecimento repressivo com que os militares responderam à reação terrorista da esquerda, em 1968, representam uma taxa de violência bem modesta para um país que ultrapassava a centena de milhões de habitantes, principalmente quando comparada aos 17 mil dissidentes assassinados pelo regime cubano numa população quinze vezes menor. Com mais nitidez ainda, na nossa escala demográfica, os dois mil prisioneiros políticos que chegaram a habitar os nossos cárceres foram rigorosamente um nada, em comparação com os cem mil que abarrotavam as cadeias daquela ilhota do Caribe. E é ridículo supor que, na época, a alternativa ao golpe militar fosse a normalidade democrática. Essa alternativa simplesmente não existia: a revolução destinada a implantar aqui um regime de tipo fidelista com o apoio do governo soviético e da Conferência Tricontinental de Havana já ia bem adiantada. Longe de se caracterizar pela crueldade repressiva, a resposta militar brasileira, seja em comparação com os demais golpes de direita na América Latina seja com a repressão cubana, se destacou pela brandura de sua conduta e por sua habilidade de contornar com o mínimo de violência uma das situações mais explosivas já verificadas na história deste continente.

No entanto, a historiografia oficial – repetida ad nauseampelos livros didáticos, pela TV e pelos jornais – consagrou uma visão invertida e caricatural dos acontecimentos, enfatizando até à demência os feitos singulares de violência e omitindo sistematicamente os números comparativos que mostrariam – sem abrandar, é claro, a sua feiúra moral – a sua perfeita inocuidade histórica.

Por uma coincidência das mais irônicas, foi a própria brandura do governo militar que permitiu a entronização da mentira esquerdista como história oficial. Inutilizada para qualquer ação armada, a esquerda se refugiou nas universidades, nos jornais e no movimento editorial, instalando aí sua principal trincheira. O governo, influenciado pela teoria golberiniana da “panela de pressão”, que afirmava a necessidade de uma válvula de escape para o ressentimento esquerdista, jamais fez o mínimo esforço para desafiar a hegemonia da esquerda nos meios intelectuais, considerados militarmente inofensivos numa época em que o governo ainda não tomara conhecimento da estratégia gramsciana e não imaginava ações esquerdistas senão de natureza inssurrecional, leninista. Deixados à vontade no seu feudo intelectual, os derrotados de 1964 obtiveram assim uma vingança literária, monopolizando a indústria das interpretações do fato consumado. E, quando a ditadura se desfez por mero cansaço, a esquerda, intoxicada de Gramsci, já tinha tomado consciência das vantagens políticas da hegemonia cultural, e apegou-se com redobrada sanha ao seu monopólio do passado histórico. É por isso que a literatura sobre o regime militar, em vez de se tornar mais serena e objetiva com a passagem dos anos, tanto mais assume o tom de polêmica e denúncia quanto mais os fatos se tornam distantes e os personagens desaparecem nas brumas do tempo.

Mais irônico ainda é que o ódio não se atenue nem mesmo hoje em dia, quando a esquerda, levada pelas mudanças do cenário mundial, já vem se transformando rapidamente naquilo mesmo que os militares brasileiros desejavam que ela fosse: uma esquerda socialdemocrática parlamentar, à européia, desprovida de ambições revolucionárias de estilo cubano. O discurso da esquerda atual coincide, em gênero, número e grau, com o tipo de oposição que, na época, era não somente consentido como incentivado pelos militares, que viam na militância socialdemocrática uma alternativa saudável para a violência revolucionária.

Durante toda a história da esquerda mundial, os comunistas votaram a seus concorrentes, os socialdemocratas, um ódio muito mais profundo do que aos liberais e capitalistas. Mas o tempo deu ao “renegado Kautsky” a vitória sobre a truculência leninista. E, se os nossos militares tudo fizeram justamente para apressar essa vitória, por que continuar a considerá-los fantasmas de um passado tenebroso, em vez de reconhecer neles os precursores de um tempo que é melhor para todos, inclusive para as esquerdas?

Para completar, muita gente na própria esquerda já admitiu não apenas o caráter maligno e suicidário da reação guerrilheira, mas a contribuição positiva do regime militar à consolidação de uma economia voltada predominantemente para o mercado interno – uma condição básica da soberania nacional. Tendo em vista o preço modesto que esta nação pagou, em vidas humanas, para a eliminação daquele mal e a conquista deste bem, não estaria na hora de repensar a Revolução de 1964 e remover a pesada crosta de sloganspejorativos que ainda encobre a sua realidade histórica?

De Bobbio a Bernanos

Olavo de Carvalho

Jornal da Tarde, 7 de janeiro de 1999

Este século começou com a proclamação quase universal do fim das democracias e, após uma sucessão de experiências ditatoriais com um saldo de quase 200 milhões de mortos, termina com o universal reconhecimento de que o melhor é a gente ir tratando de gostar da democracia mesmo.

Pela primeira vez na história dos tempos modernos a parte falante da Humanidade parece ter entrado num acordo. Embora ainda haja ditaduras aqui e ali, a idéia de ditadura perdeu toda respeitabilidade intelectual, e acredita-se, com platônico otimismo, que aquilo que desaparece do céu das idéias deve também desaparecer deste baixo mundo mais cedo ou mais tarde. E, embora ninguém atribua às atuais democracias a virtude da perfeição, há um consenso geral que Norberto Bobbio resumiu com uma sentença lapidar: “A única solução para os males da democracia é mais democracia.”

Mas será essa a fórmula de um consenso ou a fórmula de um problema?

Em primeiro lugar, que é “mais democracia”? Um liberal acha que é menos intervenção do Estado na economia; um social-democrata acha que é mais proteção do Estado aos pobres e desamparados. Assim, não apenas se reedita o velho confronto de capitalismo e socialismo, ambos com o nome de democracia, mas se chega no fim a um beco sem saída, porque para realizar a primeira alternativa é preciso ampliar o controle estatal da vida privada (no mínimo para que o Estado desprovido de seu fardo econômico adquira novas funções que legitimem sua existência), e para realizar a segunda é preciso aumentar os impostos e inflar a burocracia estatal até paralisar a economia e tornar os pobres ainda mais desamparados.

Em segundo lugar, há boas razões para duvidar que “mais democracia” seja ainda democracia. A democracia não é como um pão, que cresce sem perder a homogeneidade: à medida que ela se expande, sua natureza vai mudando até converter-se no seu contrário. O exemplo mais característico – mas não o único, certamente – é o que se passa com a “democratização da cultura”. Num primeiro momento, democratizar a cultura é distribuir generosamente às massas os chamados “bens culturais”, antes reservados, segundo se diz, a uma elite. Num segundo momento, exige-se que as massas tenham também o direito de decidir o que é e o que não é um bem cultural. Aí a situação se inverte: oferecer às massas os bens de elite já não é praticar a democracia: é lançar à cara do povo um insulto paternalista. As camadas populares, afirma-se, têm direito à “sua própria cultura”, na qual a música rap pode ser, eventualmente, preferível a Bach. A intelectualidade entrega-se então a toda sorte de teorizações destinadas a provar que os bens superiores antes cobiçados pela massa não têm, no fim das contas, mais valor do que tudo o que a massa já possuía antes de conquistá-los. E, quando enfim a antiga diferença entre cultura de elite e cultura de massas parece restabelecida sob o novo e reconfortante pretexto da relatividade, os intelectuais ficam mais revoltados ainda, ao descobrir que todos os bens, equalizados pelo universal relativismo, se transformaram em puras mercadorias sem valor próprio: Bach tornou-se fundo musical para anúncios de calcinhas e o rap, com a venda de discos, gerou uma nova elite de milionários, cínicos e prepotentes como a elite mais antiga jamais teria ousado ser. Idêntico processo repete-se nos domínios da educação, da moral e até mesmo da economia, onde cada nova leva de beneficiários do progresso se apega a seus novos privilégios com uma avareza e uma violência desconhecida das elites mais velhas: o fascismo surgiu entre as novas classes médias criadas pela democracia capitalista, e a Nomenklatura soviética, a mais ciumenta das classes dominantes que já existiu neste mundo, nasceu da ascensão de soldados e operários na hierarquia do Partido.

Em terceiro lugar, vem talvez o perigo mais grave: um consenso em favor da democracia só é promissor em aparência, porque a democracia, por definição, consiste em prescindir de todo consenso. Democracia não é concórdia: é uma maneira inteligente de administrar a discórdia. E o clamor universal por “mais democracia”, na medida mesma em que se afirma como um consenso, já dá sinais de não poder suportar nenhuma voz discordante.

Assim, há razões para temer que, se o século 20 começou pedindo ditaduras e terminou por exigir a democracia, o novo século acabe por seguir o trajeto precisamente inverso. Afinal, dizia Bernanos, a democracia não é o oposto da ditadura: é a causa dela.

Batendo com duas mãos

Olavo de Carvalho


Jornal da Tarde, 24 de dezembro de 1998

O único tema importante deste fim de século, e por isto mesmo o mais ausente da imprensa brasileira, é o governo mundial que está se formando não sei se sob as nossas barbas ou sobre as nossas cabeças, e do qual a globalização financeira, tão falada, não é senão meio e instrumento. Tenho tentado, em vão, introduzir uma visão mais abrangente desse assunto nas páginas dos nossos jornais, encontrando neles (com a honrosa exceção do JT ) aquela resistência típica do cérebro cansado que, não sabendo como processar uma informação nova, se nega a recebê-la.

Uma brecha no muro da indiferença burra foi aberta por Arnaldo Jabor, na sua coluna de 11 de novembro em O Globo , onde ele denuncia o Multilateral Agreement on Investment (MAI) como um golpe fatal na autonomia dos Estados nacionais. Mas não sei se devo cumprimentar o colunista pela sua sensibilidade de perceber o fato novo ou lamentar que o tenha interpretado segundo os velhos cânones do nacionalismo de esquerda, os quais nunca ajudaram a compreender nada e não é agora que vão começar a ajudar.

O MAI, explica Jabor, é um acordo internacional que “dá poderes totais às corporações mais fortes do mundo (leia-se G-7), para processar os países signatários (leia-se ‘emergentes’) por qualquer política governamental que possa prejudicar seus lucros”. A informação é perfeita. Perfeita é também a previsão das conseqüências: o MAI “será assinado pelos Estados nacionais, mas é todo talhado para acabar com o poder dos mesmos Estados nacionais”.

O absurdo é que, sabendo de tais coisas, Jabor não consiga equacioná-las senão nos termos do consagrado esquema neoliberalismo versus social-democracia, com a ênfase na voracidade pirata do primeiro e nas virtudes salvíficas da segunda. Ele se mostra escandalizado, com efeito, de que tamanho acréscimo do poder das empresas sobre os Estados ocorra justamente na hora em que, prenunciando dias melhores, ia “renascendo a preocupação de se instalar um ‘novo keynesianismo’ global contra a voracidade financeira, preocupação ostensiva até de homens como Alan Greenspan, diretor do FED”. O keynesianismo, para os que não sabem, é uma doutrina que, sem chegar a abolir o capitalismo, favorece o fortalecimento do papel do Estado na economia – uma tendência sintética que hoje ressurge com o nome de “terceira via”, e na qual Jabor acredita residir toda a esperança nacional de sair da paralisia patrimonialista sem cair vítima “da fome cega do capitalismo corporativo”.

Desse ponto de vista, a globalização do poder é idêntica a neoliberalismo (liberdade total para as empresas) e oposta à social-democracia (controle da economia privada pelo Estado). Assim, embora enfatizando nominalmente a novidade absoluta do acordo e rejeitando com veemência os argumentos globalistas que vêem nele apenas a inócua implementação de práticas jurídicas já existentes, Jabor acaba por reduzir o episódio a mais um capítulo da velha luta entre o imperialismo capitalista e o esquerdismo nacionalista. Dificilmente alguém poderia com mais eficácia neutralizar aquilo que afirma.

O esquema neoliberalismo-social-democracia, bem como sua pretensa síntese ou “terceira via”, não apenas não permite compreender nada, como foi posto em circulação precisamente para que ninguém compreendesse nada. Foi posto em circulação pelos mesmos poderes que conceberam o MAI, aos quais serve de areia para jogar nos olhos da imprensa. Os homens que dirigem o mundo não são neoliberais nem social-democratas, e aliás não teriam chegado aonde chegaram se não tivessem passado anos estudando a teoria e a técnica do chamado “gerenciamento de conflitos”, justamente para aprender a controlar o fluxo dos acontecimentos mediante o jogo de oposições em cuja realidade aparente se deleita, se embasbaca e se confunde a imprensa do Terceiro Mundo, como um sapo hipnotizado pela serpente.

Se o globalismo que vai arrasando os Estados nacionais é monopólio dos neoliberais e imperialistas, da “direita” em suma, como se há de explicar que a esquerda, em toda parte, lute pela uniformização mundial de direitos (como por exemplo os do trabalhador imigrante), a qual resulta em golpear os Estados nacionais mais fundo – e mais baixo – do que estes foram atingidos pelo MAI? Também não tem aí explicação o fato de que, desejando deter a globalização, a esquerda fomente por toda parte ressentimentos raciais que, integrando os ressentidos na grande comunidade mundial da sua raça, os transforma ipso facto em fatores debilitantes de qualquer união nacional possível. E muitíssimo menos se explicaria racionalmente, na perspectiva jaboriana, a mobilização histérica das esquerdas em favor de um ecologismo global que, por definição, não pode ser administrado autonomamente pelos Estados nacionais, e que, aplicado ao Brasil, já resultou em entregar a ONGs estrangeiras o controle de regiões mais extensas do que alguns Estados da Federação, sem encontrar oposição senão entre os militares, tradicionais bêtes noires da fantasia esquerdista.

Não, não: o globalismo não é neoliberal, pela simples razão de que não é one way . É um movimento de mão dupla, que tanto debilita os poderes nacionais pela apologia do livre comércio e da abolição das fronteiras, quanto o faz pela disseminação de insatisfações e reivindicações esquerdistas que, não podendo ser atendidas na escala dos Estados, terminam por subjugar as nações ao despotismo branco das organizações supranacionais.

Dos esquerdistas que colaboram para esse fim, somente uns poucos o fazem com plena consciência, e destes não posso dizer em público o que penso.

Podem ser facilmente identificados pelo teor ecológico, futurista e vagamente esotérico (“Nova Era”) do seu discurso. Nomeei um deles, semanas atrás, numa nota publicada na revista República , da qual me permito recordar um trecho:

“No folclore midiático brasileiro, ‘esquerda’ ainda significa aquele velho complexo de progressismo e nacionalismo que se opunha às multinacionais. Mas essa esquerda não existe mais: todos os seus remanescentes se tornaram servidores das causas neo-esquerdistas (negros, gays, aborto, etc.) calculadas para debilitar os Estados nacionais e favorecer o poder global.

Todos servem a um novo senhor, parasitando o prestígio do velho – uns por ingenuidade, outros por excesso de esperteza. Por enquanto ainda iludem a opinião pública e talvez a si mesmos. Mas, aos poucos, todos, sem exceção, irão perdendo as inibições, tirando as máscaras e declarando, alto e bom som, quem são e a que vieram. Com sua entrevista em Veja de 26 de agosto, o dr. Leonardo Boff tornou-se o pioneiro desses globalistas neo-assumidos: ‘O mundo – declarou ele – vai ao encontro de uma grande crise, e a saída será a criação de uma central de gerenciamento planetário.’ Que o advento desse tremendo poder central terá algo como a glória e o prestígio de uma nova revelação religiosa, é algo que também o sr. Boff não esconde: ‘Segundo ele, afirma Veja , os empresários andam com uma fome imensa de espiritualidade e estão atentos para a necessidade de uma nova ordem mundial.’ Governo mundial e Nova Ordem: é o paraíso espiritual do FMI.”

Quanto aos outros, que colaboram às tontas e por mera incapacidade de escapar do esquema dualista, a estes digo apenas que está na hora de acordar, de perceber que as causas e bandeiras nada significam apenas pelas belas palavras do seu enunciado abstrato (direitos, igualdade, humanismo, etc., etc.), mas pelo esquema concreto de poder no qual se enquadram como lances de uma estratégia bem complicada, na qual o bem é às vezes calculado precisamente para gerar o mal.

Muitos se gabam de ter superado o esquematismo esquerda-direita, mas continuam presos numa versão mais sutil do mesmo esquema, que é o confronto progressismo-reacionarismo. O futuro deste país depende de que essas pessoas, entre as quais estão algumas de nossas melhores cabeças e alguns corações sinceros, se dêem conta finalmente de que nenhum poder é uniformemente progressista ou reacionário, mas que todas as ambições políticas justas ou injustas, neste mundo, sempre se realizaram dosando espertamente uma coisa e a outra e batendo, em suma, com duas mãos.

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