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A ciência contra a razão

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 7 de janeiro de 2009

Aquilo que hoje se chama orgulhosamente de “ciência”, pretendendo-se com isso designar a instância última e suprema no julgamento de todas as questões públicas e privadas, nem é uma entidade univocamente reconhecível, nem muito menos um conhecimento que tenha em si seu próprio fundamento.

A possibilidade da existência de algo como a “ciência” repousa numa variedade de pressupostos que nem podem ser eles próprios submetidos a teste “científico”, nem muito menos fornecem qualquer base racional para dar à dita “ciência” a autoridade da última palavra não só nas questões gerais da existência humana, mas até no próprio domínio especializado de cada área científica em particular.

Só para dar um exemplo elementar, sem as palavras “sim” e “não” nenhum raciocínio lógico é possível. Nenhuma ciência pode nos dizer o que elas significam. Toda a lógica formal baseia-se nessas duas palavras, e a própria lógica formal não pode defini-las. Qualquer definição lógico-formal que se ofereça para elas será sempre puramente tautológica, nada dizendo em si mesma e baseando enfim toda a sua compreensão no apelo à experiência pessoal do ouvinte ou leitor. Se dizemos, por exemplo, que o sentido de “sim” é anuência, concordância, aceitação, etc, nada afirmamos exceto que dizer sim é dizer sim. Do mesmo modo, o “não” não pode ser definido como rejeição, impugnação, etc., pela simples razão de que o sentido dessas palavras consiste precisamente em dizer não. O único significado possível da palavra “sim” é o da responsabilidade moral integral que uma pessoa assume ao declarar alguma coisa. Essa responsabilidade, por sua vez, subdivide-se em graus que vão desde a disposição absoluta de morrer pelo que se diz até a mera aceitação provisória de uma hipótese para fins de argumentação, portanto também de refutação. O mesmo acontece com o “não”. Não há como definir essas palavras senão mediante o apelo à responsabilidade pessoal tal como aparece no autoconhecimento subjetivo. Isso quer dizer, simplesmente, que todo emprego puramente lógico-formal desses termos, amputado da sua raiz na experiência moral humana, é apenas um uso convencional e hipotético que não permite distinguir se, no fim das contas, o “sim” quer dizer “sim” ou “não” e o “não” quer dizer “não” ou “sim”.

Fenômeno idêntico acontece com inúmeros outros termos usados no raciocínio científico, como por exemplo “igualdade”, “diferença”, “causa”, “relação”, etc. Nenhuma ciência pode definir esses termos e também não o pode a metodologia científica se tomar como pressuposto a validade do conhecimento científico em vez de fundamentá-lo desde suas raízes. Podemos, é claro, fixar significados lógico-formais para essas palavras, bem como para muitas outras, mas somente como um recorte convencional operado em cima daquilo que elas significam na experiência humana responsável.

Também não teria sentido imaginar que essa dificuldade afeta apenas a expressão do conhecimento científico em palavras e não a substância mesma desse conhecimento. Ou os termos usuais da linguagem científica expressam o conteúdo mesmo e a própria estrutura do conhecimento científico, ou este último é em si um conhecimento indizível e místico cuja tradução em palavras permanece sempre externa, aproximativa e imperfeita.

Em suma, o conhecimento científico – e mais ainda aquilo que hoje se entende popularmente como tal – é uma subdivisão especializada da capacidade racional geral e tem nela o seu fundamento, não podendo julgá-la por seus próprios critérios. O que aqui se entende como “razão” não se resume também às capacidades usuais da linguagem coerente e do cálculo, pois ambas essas capacidades também não passam de especializações de uma capacidade mais básica. A razão é, em primeiro lugar, a capacidade de abrir-se imaginativamente ao campo inteiro da experiência real e virtual como uma totalidade e de contrastar essa totalidade com a dimensão de infinitude que a transcende imensuravelmente. O finito e o infinito são as primeiras categorias da razão, e não me refiro aos equivalentes matemáticos desses termos, que são apenas as traduções deles para um domínio especializado. Dessa primeira distinção surgem inúmeras outras como inclusão e exclusão, limitado e ilimitado, permanência e mudança, substância e acidente e assim por diante. Sem essa imensa rede de distinções e inclusões que constitui a estrutura básica da razão, o método científico seria um nada. É ainda mais estúpido imaginar que, uma vez formado historicamente, o método científico se tornou independente da razão e pode prescindir dela ou julgá-la segundo seus próprios critérios. É a razão, e não o método científico, que confere sentido ao próprio discurso científico, o qual por sua vez não pode dar conta dela no mais mínimo que seja. A “ciência” não pode jamais ser a autoridade última em nenhum assunto exceto dentro dos limites que a razão lhe prescreva, limites estes que por sua vez continuam sujeitos à crítica racional a qualquer momento e em qualquer circunstância do processo científico.

O objeto da razão é a experiência humana tomada na sua totalidade indistinta, só limitada pelo senso da infinitude. O objeto da ciência é um recorte operado convencionalmente dentro dessa totalidade, recorte cuja validade não pode ser senão relativa e provisória, condicionada sempre à crítica segundo as categorias gerais da razão que transcende infinitamente não só o domínio de cada ciência em particular, mas o de todas elas em conjunto.

Afinal, como se constitui uma ciência? Supõe-se que determinado grupo de fenômenos obedece a certas constantes e em seguida se recortam amostras dentro desse mesmo grupo para averiguar, mediante observações, experiências e medições, se as coisas se passam como previsto na hipótese inicial. Repetida a operação um certo número de vezes, busca-se articular os seus resultados num discurso lógico-dedutivo, estruturando a realidade da experiência na forma de uma demonstração lógica, evidenciando, ao menos idealmente, a racionalidade do real. Tudo isso é impossível sem as categorias da razão, obtidas não desta ou daquela experiência científica, nem de todas elas em conjunto, mas do próprio senso da experiência humana como totalidade ilimitada.

A experiência humana tomada como totalidade ilimitada é a mais básica das realidades, ao passo que o objeto de cada ciência é uma construção hipotética erigida dentro de um recorte mais ou menos convencional dessa totalidade. Essa construção nada vale se amputada do fundo desde o qual se constituiu. O apego à autoridade da “ciência”, tal como hoje se vê na maior parte dos debates públicos, não é senão a busca de uma proteção fetichista, socialmente aprovada, contra as responsabilidades do uso da razão.

O mais evidente sintoma disso é a facilidade, a trêfega e saltitante mudança de canal com que os porta-vozes da “ciência” transitam das atenuações relativistas e desconstrucionistas, para as quais todos os discursos são válidos de algum modo, às proclamações absolutistas de “fatos científicos” imunes a toda discussão, tão sagrados que seus contestadores devem ser excluídos do meio universitário e expostos à execração pública. O culto da “ciência” começa na ignorância do que seja a razão e culmina no apelo explícito à autoridade do irracional.

Novas obamices

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 5 de janeiro de 2009

Bill Muehlenberg, popular comentarista de mídia australiano, considerou o meu artigo “O candidato do medo” (Diário do Comércio, 24 de outubro de 2008) uma das matérias mais importantes e reveladoras publicadas sobre as eleições americanas. Seu site Culture Watch (www.billmuehlenberg.com) recomendou ainda “Milagres da fé obâmica”, publicado no Mídia Sem Máscara em 1º de novembro. Este foi discutido também no site de Melanie Phillips da revista inglesa Spectator (http://www.spectator.co.uk/melaniephillips/2570751/join-up-the-dots.thtml): atacado e defendido, acabou-se saindo muito bem. Até agora, todas as reações adversas a esses dois artigos limitaram-se aos xingamentos impotentes e a contestações de detalhe que não afetam no mais mínimo que seja o seu argumento geral.

É absolutamente inevitável que, mais dia menos dia, todos os crimes de fraude praticados por Barack Hussein Obama antes e durante as eleições venham à tona. Os de revelação mais recente são os seguintes:

1. Ao preencher o formulário para inscrição na Ordem dos Advogados (Bar Association) de Illinois, Obama declarou que nunca tinha usado nenhum outro nome além de Barack Hussein Obama. É falso. Há documentos dele com os nomes de Barry Soetoro, Barry Dunham e outros, bem anteriores ao seu ingresso naquela entidade.

2. Durante a campanha, sob suspeita de ter adquirido sua mansão num negócio ilegal com Tony Rezko, Obama declarou que nada tinha a ver com o famoso vigarista, preso por uma dúzia de crimes. Agora apareceram as cobranças de impostos daquele imóvel: não estão em nome de Obama, mas do advogado de Tony Rezko…

3. Repetidas vezes, Obama afirmou que não tinha nada a ver com a Acorn, a ONG que espalhou milhares de títulos de eleitor falsos. Agora revela-se não só que a Acorn prestou serviços à campanha de Obama, recebendo pagamentos de 80 mil dólares, mas que a firma de advocacia onde trabalhou Michelle Obama está defendendo a diretoria da Acorn num caso de desvio de verbas.

4. Com o apoio de toda a grande mídia, sem exceção, Barack Hussein Obama jurou que eram puras difamações as notícias de que ele tinha recebido educação islâmica. O vídeo reproduzido em http://www.youtube.com/watch?v=HkjFc3S21nY não deixa margem a dúvidas: Obama mentiu novamente.

Graças ao caso Blagojevitch, Obama tornou-se o primeiro presidente eleito dos EUA a ser interrogado pela polícia já antes da cerimônia de posse. E o promotor Patrick Fritzgerald – o mesmo do caso Valerie Plame, donde se vê que o sujeito não age por preferência partidária – já anunciou que pretende em breve espremer Obama quanto aos negócios ilícitos com Tony Rezko.

Anúncio do fim

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 1 de janeiro de 2009

Se fossem apenas previsões em sentido estrito, as especulações do cientista político russo Igor Panarin quanto ao futuro dos EUA não mereceriam mais atenção que um palpite de turfista. Mas, exatamente como aquelas de Arnold Toynbee que comentei em outro lugar (http://www.olavodecarvalho.org/semana/080512dc.html), elas não são previsões: são o resumo de um plano já em avançada fase de execução. Nenhum estudioso em seu juízo perfeito se arriscaria a fazer prognósticos tão detalhados com base em puras tendências econômicas gerais. Se Panarin é levado a sério pelo Kremlin, é porque o Kremlin sabe do que ele está falando. Suas profecias só merecem respeito porque preparam aquilo que anunciam. Discuti-las como teoria é divertimento ocioso: ou a elite americana faz algo de prático para frustrá-las, ou trata logo de inventar algum pretexto elegante para relax and enjoy diante da ocupação estrangeira.

Panarin prevê a decomposição dos EUA a partir de 2010, com a subseqüente divisão do território em seis regiões separadas, sob o domínio da China, da Rússia, do México, da União Européia, do Canadá e do Japão (v. http://online.wsj.com/article/SB123051100709638419.html). Não há espaço aqui para analisar cada um desses casos, mas, só para dar dois exemplos, a China, pretendente à posse de toda a costa oeste segundo Panarin, e o México, virtual herdeiro de nove Estados entre a Flórida e o Novo México, já desfrutam, nos EUA, de uma liberdade de ação que nenhuma potência concede usualmente a nações estrangeiras. Vinte e tantos anos de demolição sistemática da indústria americana em favor de seus concorrentes chineses – verdadeiro protecionismo às avessas –, acabaram por fazer do consumidor americano o principal sustentáculo da economia chinesa, transmutando investimentos em débitos e ajuda econômica em ritual de auto-imolação. A política de favorecimento unilateral inaugurada por Richard Nixon e levada à perfeição por Bill Clinton deu enfim o resultado previsível: mais até do que a velha URSS, que só cresceu às dimensões de potência ameaçadora graças ao auxílio recebido dos EUA, a China tornou-se, para usar a expressão clássica de Anthony Sutton, “o melhor inimigo que o dinheiro podia comprar”. Somem-se a isso a tolerância suicida ante a espionagem chinesa, a superioridade da China na produção de armas nanotecnológicas capazes de paralisar a nação adversária em poucas horas (v. as colunas de Lev Navrozov em www.newsmax.com) e, last not least, a hegemonia cultural do anti-americanismo na Califórnia, e verão que Panarin não está tão maluco quanto parece. Quanto ao México, tem o privilégio de fomentar livremente movimentos de secessão em vários Estados do Sul, sob o olhar complacente do governo americano, que, com toda a certeza, se tornará ainda mais complacente na gestão Obama, de vez que o novo presidente apóia e é apoiado por “La Raza”, organização militante que advoga a expulsão dos “gringos” e a ocupação da área pela autoridade mexicana.

Com cáustica ironia, Panarin lembra que em vão o povo americano espera milagres de Barack Obama: os milagres não virão.

Obama é, na verdade, o presidente menos qualificado que já houve para defender a integridade e a soberania dos EUA. Amplamente beneficiado por ajudas estrangeiras ilegais, vulnerável a toda sorte de chantagens pelo seu passado nebuloso, suas ligações comprometedoras e seus documentos falsificados, Obama foi posto no poder por quem sabe que pode destrui-lo com duas cuspidas. E foi posto lá precisamente por isso. Ele está bem protegido de seus inimigos, mas totalmente à mercê de seus protetores. Contra estes, ele não pode defender nem sequer a si próprio, quanto mais ao país inteiro.

Quanto àqueles que festejam antecipadamente o fim dos EUA, talvez não lhes ocorra, por falta de imaginação, a suspeita de que um mundo dominado pela Rússia e pela China não conhecerá outro regime político senão o russo e o chinês.

Não obstante, desejo a todos um Feliz Ano Novo, seja isto lá o que for.

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