Olavo de Carvalho


 Zero Hora , 30 de dezembro de 2001

Há anos umas dezenas de esquerdistas espalham na internet fofocas escabrosas a meu respeito, remetem falsas mensagens em meu nome a fóruns de debates e me enviam, com regularidade, insultos seguidos de ameaças de morte, que invariavelmente respondo com os palavrões mais cabeludos que me ocorrem no momento.

Mas a esquerda não suporta provar, nem mesmo em diluição homeopática, o veneno que em doses cavalares ela serve a seus adversários. Tendo recebido exatamente um e não mais de um e-mail com ameaça de morte — uma fração insignificante da quota a mim concedida nos últimos tempos –, o deputado Aluizio Mercacante armou um forrobodó dos diabos, alertando a Polícia Federal e a imprensa. Instantaneamente, veio em seu socorro a fiel milícia jornalística, desencadeando uma onda de vociferações pejorativas contra a “extrema direita”, numa gama que ia do alarmismo apocalíptico até a ostentação de desprezo soberano, de modo que, no conjunto, se anulavam umas às outras.

O fato de que esses comentários incluíssem na militância de “extrema direita” o grupo carioca Ternuma, que não tem nenhuma atividade política e se dedica exclusivamente à reconstituição histórica do período militar segundo a ótica — como direi? — “do outro lado”, mostra que, para seus autores, a simples tentativa de questionar sua visão do passado já é, virtualmente, crime. Ninguém tem o direito de insinuar que os fatos não se passaram como a esquerda diz que se passaram.

É crime, por exemplo, dizer que a guerrilha comunista, tendo começado em 1961, não pode ser apresentada retroativamente como uma resposta desesperada ao golpe de 1964.

É crime dizer que João Goulart, tendo ocultado e repassado secretamente a Fidel Castro as provas da intervenção armada de Cuba no território nacional em 1961, se tornou culpado de alta traição e portanto, ao ser derrubado, já não era um presidente no legítimo exercício de suas prerrogativas constitucionais.

É crime dizer que o AI-5 não foi uma reação tirânica contra uma oposição pacífica e democrática e sim uma medida de emergência contra agressores armados que, àquela altura, já haviam realizado 84 atentados a bomba, ferindo e matando militares e civis.

É crime dizer que, num país que tinha então 90 milhões de habitantes, não mais de 2 mil deles foram atingidos pela repressão ao longo de vinte anos — decerto a mais branda reação que um governo de direita já opôs a uma revolução comunista armada — e que em vista disso é um grotesco exagero descrever o período militar como uma época de terror generalizado.

É crime dizer — mesmo fazendo coro a tantos esquerdistas que o confessam hoje abertamente — que nossos guerrilheiros e terroristas não lutavam pela democracia e sim pelo comunismo, modelo cubano.

É crime dizer que, ao aceitar postos nas Forças Armadas e no Serviço Secreto de Cuba, eles se tornaram funcionários e cúmplices de um regime genocida, assassino de 17 mil cidadãos cubanos.

É crime dizer que o Brigadeiro Burnier, acusado pela imprensa esquerdista de conspirar para explodir o Gasômetro do Rio de Janeiro, nunca fez nem pensou em fazer isso, quando mais não fosse porque morava ao lado do Gasômetro, e que o próprio capitão Sérgio “Macaco”, que inventou a calúnia absurda e ganhou o estatuto de herói das esquerdas por isso, terminou por desmenti-la num inquérito oficial que ninguém neste país quer divulgar.

É crime dizer que as mais altas figuras da inteligência brasileira — um Manuel Bandeira, um Gilberto Freyre, um Miguel Reale, um Augusto Frederico Schmidt, uma Raquel de Queirós, um Júlio de Mesquita Filho e até mesmo um Otto Maria Carpeaux, que depois se voltaria contra o novo regime — aplaudiram a queda do governo Goulart.

É crime desmentir, com isso, a lenda idiota que, prevalecendo-se do estereótipo fácil da pena contra a espada, apresenta o conflito de esquerda e direita, na época, como um confronto da inteligência com a força, de poetas e filósofos contra sargentões incultos.

É crime lembrar que a direita civil armada, pronta e ansiosa para matar comunistas desde 1963, foi pêga de surpresa pelo golpe militar e inteiramente desmantelada pelo novo governo, de modo que, se algum comunista chegou vivo ao fim do ano de 1964, ele deveu isso exclusivamente às Forças Armadas que agora amaldiçoa.

É crime dizer que um golpe apoiado na maior manifestação popular de toda a nossa história, não igualada nem pelas posteriores e tão celebradas passeatas em prol das “Diretas Já”, não pode, sem grave erro histórico, ser catalogado como uma conspiração da elite contra as massas populares.

É crime dizer qualquer dessas coisas, embora cada uma delas possa ser provada com testemunhos e documentos em profusão e embora não contenham nenhuma proposta política para o futuro e sim apenas descrições do passado.

É crime dizer qualquer dessas coisas, embora os esquerdistas não sejam capazes de refutá-las e se limitem a difamar e caluniar quem as diga.

É crime, em suma, tentar conhecer a História por um lado que não seja o da versão oficial. Recomendo, pois, aos leitores, que se abstenham do vício nefando da curiosidade histórica, que não façam perguntas e, sobretudo, que no decorrer do Ano Novo não visitem jamais o site http://www.ternuma.com.br. Assim não correrão o risco de chegar ao fim de 2002 com um rótulo de “extrema direita” na testa.

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