Yearly archive for 2007

Luta desigual

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 23 de julho de 2007

O site http://juliosevero.blogspot.com, fechado por pressão de militantes gayzistas, voltou ao ar após a publicação do meu artigo “Concurso de Crimes”. O Google reconheceu o óbvio: quem é vítima de crime, como aquelas criaturas diziam ser, não vai pedir socorro a um provedor da internet: vai à polícia. A acusação lançada contra o dono do blog – “Ele quer que possamos ser currados sem que nossos agressores paguem por isso” – é a mais mentirosa e cínica que já se fez a um formador de opinião neste país. Os engraçadinhos sabiam que não podiam ir a um juiz ou delegado com uma conversa dessas. Então tentaram ludibriar o Google, mas, é claro, não deu certo.

O episódio prova, uma vez mais, que o movimento gayzista foge deliberadamente a toda discussão, que ele não quer debater com seus adversários, mas destruí-los socialmente, privá-los de seus meios de expressão, reduzi-los à condição de párias e, por fim, colocá-los na cadeia em massa, na mais espetacular onda de perseguição religiosa que já se terá visto na história nacional. É o bom e velho método leninista: falar sempre “numa linguagem calculada para despertar contra o oponente os piores pensamentos, as piores suspeitas; não para corrigir-lhe os erros, mas para destrui-lo” ( Selected Works, Vol. III, pp. 486 ss.).

Nos sites e assembléias onde se prepara a reação gayzista a seus críticos, não se vê uma só tentativa de conceber argumentos para um eventual enfrentamento dialético: só planos de assédio judicial, de boicote na internet, de assassinato moral a pretexto de “ódio”, “preconceito”, “fundamentalismo” e “homofobia”. Mas o que mais aparece, o elemento mais constante e infalível nessas discussões internas, é a proposta de vasculhar a vida pessoal dos adversários em busca de sinais de “homossexualismo enrustido” que possam ser usados em campanhas de difamação.

Nada poderia comprovar mais claramente a índole criminosa desse movimento do que a naturalidade, a quase inocência com que ali se aceita o uso de instrumentos ilícitos e supremamente perversos como armas de combate normais e decentes na luta pela hegemonia ideológica e pelo poder.

O embuste legislativo da PL-122, que define um crime e já enquadra nele antecipadamente quem quer que levante um argumento contra a consolidação da proposta em lei, é tão obviamente totalitário e cínico que o observador incapaz de perceber isso à primeira vista deve ser considerado vítima de grave deficiência mental.

A proposta não foi concebida para proteger homossexuais contra uma inexistente epidemia de violência anti- gay , mas para dar a um grupo político o poder de praticar impunemente os delitos de ultraje a culto, calúnia, difamação e injúria, criminalizando automaticamente quem quer que o acuse disso. No ataque a Júlio Severo, esse objetivo ficou mais evidente do que nunca.

No entanto, nos meios liberais e conservadores, ainda há quem veja o assunto somente pela ótica estereotipada dos “direitos dos gays ”, sem ter a menor idéia de que não se trata de assegurar direitos a uma comunidade, mas de negá-los a todas as demais. Ser “de direita” não imuniza contra a força onipresente da propaganda esquerdista. Quando um slogan , um estereótipo entra na imaginação popular, nem mesmo os fatos mais patentes, as demonstrações mais exatas, os documentos mais probantes conseguem desfazer o ilusionismo e mostrar à mente preguiçosa a realidade como ela é. Se não fosse essa mórbida tendência do cérebro humano à repetição mecânica de palavras-de-ordem, seria inexplicável que alguém continuasse vendo o movimento gayzista como “minoria oprimida”, ignorando a monstruosa desproporção de forças entre organizações de massa apoiadas pelo governo federal, por organismos internacionais e por fundações bilionárias, e os poucos indivíduos solitários que ousam enfrentá-las, sem recursos, sem apoio institucional e com minúsculo espaço na mídia.

Esse automatismo mental bloqueia a compreensão do significado e alcance das iniciativas gayzistas. Por mais que eu repita que o perigo da PL-122 não tem nada a ver com homossexualismo ou heterossexualismo, que a proposta foi calculada, isto sim, para entrar no Código Penal e destruí-lo por dentro como um vírus de computador, muitos leitores dos meus artigos a respeito continuam a forçar o seu significado, entendendo-os como batalhas de uma cruzada moralizante anti-homossexualista, da qual não participei nem participaria. Certa vez o educador Cláudio Moura Castro observou que brasileiro não lê o que está escrito: lê o que ele próprio imagina.

Na próxima coluna tentarei explicar, de novo e mais claramente, qual é o problema com o movimento gayzista e por que é um problema de poder político e não de moral sexual. Se mesmo assim não entenderem, passarei a escrever artigos com fundo musical cantado pela Cris Nicolotti.

Top-Top e Fuc-Fuc

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 23 de julho de 2007

Todo mundo no Brasil viu os gestos do sr. Marco Aurélio Garcia e de seu ajudante Bruno Gaspar transmitidos pela TV, cujas equivalências onomatopaicas, salvo melhor juízo, são respectivamente “top-top” e “fuc-fuc”. Não se ouve som nenhum na gravação, mas, pelo contexto, o sentido vernáculo da mímica ministerial foi aproximadamente: “Agora eles tomaram no…” – sapientíssima observação ante a qual o criativo assessor, recordando a máxima célebre do candidato interiorano, poderou, também sem palavras: “Se nóis não ó neles, ó eles em nóis”.

O Diário do Comércio pede minha opinião sobre esse interessante número de mímica, mas antes de emiti-la devo recordar alguns aspectos do governo Lula, sem cuja perspectiva o sentido daquele diálogo silencioso arriscaria tornar-se demasiado esotérico.

Em outubro de 2002, o sr. Lula disse ao jornal Le Monde que a eleição que o tornaria presidente era apenas uma farsa destinada a legitimar a tomada do poder pelas organizações de esquerda. Confirmando as palavras do líder, o sr. Garcia informou ao jornal La Nacion, em Buenos Aires, que o PT continuava firme na esquerda revolucionária: “A impressão de que o PT foi para o centro surge do fato de que tivemos de assumir compromissos que estão nesse terreno. Isso implica que teremos de aceitar inicialmente algumas práticas. Mas isso não é para sempre.”

Como toda a campanha petista se baseava exatamente na hipótese oposta, isto é, de que o candidato e seu partido tinham abjurado de toda ambição revolucionária e aderido ao culto da ordem burguesa, essas declarações já bastavam para demonstrar, acima de qualquer dúvida, que nenhum dos dois declarantes era confiável. Ou estavam mentindo para seus antigos correligionários, ou para seus novos eleitores. Dando a primeira hipótese por certa e inquestionável sem necessidade de exame, a mídia nacional inteira e os próprios adversários eleitorais de Lula decidiram abafar as entrevistas comprometedoras, que teriam bastado para destruir a candidatura petista.

Logo depois, interrogado polidissimamente pelo entrevistador Boris Casoy quanto ao risco de uma aliança Lula-Castro-Chávez, o candidato assegurou que era tudo invencionice de “um picareta de Miami” (referia-se ao escritor cubano Armando Valladares). Na ocasião, a aliança já estava combinada nas reuniões do Foro de São Paulo e nos meses que se seguiram foi consolidada sobretudo por intermédio do sr. Garcia, que, desde a renúncia de Lula à presidência do Foro, se tornou o agente de ligação entre o governo brasileiro e aquela entidade.

Pouco antes, o sr. Lula havia assinado, ainda como presidente do Foro, um compromisso de defender incondicionalmente as Farc, a narcoguerrilha colombiana, acusando de “terrorismo de Estado” qualquer coisa que se fizesse contra ela. Se o eleitor brasileiro soubesse disso, jamais votaria nessa criatura. Mas novamente a grande mídia e os supostos opositores de Lula ajudaram a varrer a poeira para baixo do tapete, escondendo não só o acordo abjeto mas a própria existência do Foro de São Paulo. Até hoje a organização política mais vasta e poderosa da América Latina é, para o público nacional, um mysterium ignotum protegido sob um véu de chumbo.

O acordo pró-Farc, obtendo facilmente e sem discussões o apoio unânime das organizações participantes do Foro, só pode ter sido tramado com muita antecedência. Nem é preciso perguntar quem o preparou. Segundo informações do site www.militaresdemocraticos.com , o futuro ministro Top-Top teve vários encontros com o comandante da narcoguerrilha, Manuel Marulanda Gomez, em Havana, sempre na presença de Fidel Castro.

Que o compromisso estava destinado a não ficar só no papel é algo que o tempo comprovou abundantemente. Os líderes das Farc continuaram a transitar livremente pelo território nacional, mesmo depois de comprovado que eram os maiores fornecedores de cocaína ao traficante Fernandinho Beira-Mar; e seus agentes em ação no Brasil jamais foram incomodados pelas nossas autoridades, mesmo depois de denunciado que davam adestramento em guerrilha urbana para os bandidos do PCC e do Comando Vermelho, contribuindo maciçamente para que a quota de brasileiros assassinados alcançasse a cifra de cinqüenta mil cadáveres anuais.

Também não é preciso dizer que qualquer membro das Farc ou de outras organizações ligadas ao Foro, se acidentalmente preso por policiais ingênuos, conta imediatamente com a máquina do partido governante para protegê-lo de perguntas incômodas, libertá-lo o mais rápido possível e mesmo brindá-lo com o estatuto de asilado político, se não com o de cidadão brasileiro.

Se o leitor percebe a dose de cinismo necessária para um governo colaborar tão assídua e fielmente com o massacre da população nacional, deve entender sem dificuldade por que esse governo não se sente nem um pouco culpado pela morte de mais algumas centenas de brasileiros, no desastre da TAM. Cada um de nós deve recordar-se de quando o então candidato Lula, perante seu opositor Geraldo Alckmin, se vangloriava da folha de realizações de seu primeiro mandato, entre as quais a reforma do aeroporto de Congonhas. Mas a idéia de que quem leva os méritos da obra deve também arcar com as culpas dos seus erros é algo que requer um mínimo de sensibilidade moral, e nada, absolutamente nada sugere que esse mínimo tenha jamais entrado nas almas coriáceas dos srs. Lula e Garcia. Não digo que eles sejam amorais. Ao contrário, têm moral até demais: têm duas, como todos os revolucionários: uma para os “companheiros”, outra para o comum dos mortais. Naquela, eles são sempre inocentes; nesta, os outros são sempre culpados.

Por isso não creio ser tão difícil interpretar a cena filmada indiscretamente pela janela do ministro. O diálogo silencioso não dá uma indicação precisa de quem são os tais “eles”, subentendidos nos gestos de de Top-Top e Fuc-Fuc. Uns dizem que é a TAM, outros que é a mídia em geral, outros que são os partidos de oposição. Mas a suspeita que não me sai do pensamento é que somos todos nós – os brasileiros em geral, os profanos, os pecadores, os não iniciados no sacerdócio petista.

Surpreendido em flagrante, o ministro Top-Top não se deu por achado: tratou de fazer-se ele próprio de escandalizado, improvisando ex post facto uma bela embromação para tentar dar um sentido de alta moralidade à sua performance . Nada mais lógico, no governo chefiado por um homem isento de pecados. Mas parece que nem todos na administração petista chegaram tão alto nos mistérios da impecância eterna. Em contraste com a cara-de-pau ministerial, Fuc-Fuc, por sua vez, nada disse nem lhe foi perguntado. Recolheu-se a uma discrição tumular. Suponho que ainda esteja trancado no banheiro, hostil a qualquer contato humano. Pela primeira vez na história da mídia universal um assessor de imprensa, cujo serviço é falar, transcendeu duplamente a comunicação verbal: primeiro mostrou que podia ser eloqüente com gestos sem palavras, e depois mais eloqüente ainda sem palavras nem gestos.

Concurso de crimes

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 19 de julho de 2007

Um grupo de militantes gayzistas conseguiu tirar do ar o site http://juliosevero.blogspot.com. O método foi despejar sobre o Google uma tempestade de denúncias contra o autor do blog , o escritor Júlio Severo, acusando-o de pregar a violência contra os homossexuais. “Ele quer que sejamos massacrados, que não tenhamos direito de defesa”, esbraveja um dos incitadores do ataque na comunidade Orkut usada como QG da iniciativa: “Ele quer que possamos ser currados sem que nossos agressores paguem por isso.”

A acusação é manifestamente falsa. Qualquer um que leia o blog sem lentes deformantes percebe isso. Severo limita-se a opor ao homossexualismo os argumentos da moral cristã, que não manda currar ninguém. Desafio a militância gayzista a mostrar onde ele teria afirmado que os homossexuais devem poder ser submetidos a tal violência sem direito à proteção das leis. Se ele tivesse feito isso, os enfezadinhos não precisariam reunir-se às centenas e pedir socorro ao Google. Bastaria um deles ir à delegacia mais próxima e acusar o escritor de apologia do crime (artigo 286 do Código Penal): ele pegaria no mínimo três meses de cadeia.

Como sabem que não têm razão para isso, preferiram montar a trama caluniosa cuja má fé, esta sim, pode ser provada, denunciada na Justiça e punida na forma da lei.

A lei, e não artigos de jornal, deve responder a esses canalhas. Eles podem discordar de Júlio Severo o quanto queiram (eu mesmo discordo com freqüência), mas ele não cometeu crime nenhum. Eles é que cometeram contra ele os delitos definidos nos artigos 240 e 251 do Código Penal: difamar e escarnecer publicamente de um cidadão por causa da sua fé religiosa. Somaram a isso o delito previsto no artigo 138: falsa imputação de crime. Como para esse fim se reuniram em bando e agiram organizadamente, incorrem também no artigo 288, formação de quadrilha.

A pretexto de defender-se de um crime imaginário, cometeram pelo menos quatro crimes reais, cujas provas o Orkut fornece em abundância.

Júlio Severo, em represália à sua cruzada moralizante, já teve sua vida social e profissional totalmente destruída. É o mais discriminado e perseguido dos brasileiros. Ele não pode, sozinho, enfrentar um gigantesco movimento de massas subsidiado por fundações bilionárias, que, ao fazer-se de vítima acuada por um adversário solitário e pobre, já mostra uma desonestidade monstruosa, cínica, perversa.

As entidades cristãs – todas elas — têm o dever estrito de reunir-se não só para defender Júlio Severo, mas para punir o concurso de crimes que se armou contra ele. Espero que o façam antes que o estelionato jurídico da PL-122 consagre esses crimes como direitos da comunidade gayzista. O raciocínio kafkiano subentendido na acusação ao escritor é que toda tentativa de oposição à proposta “anti-homofóbica” já incorre no crime que ela define. Preparem-se, pois, senhores parlamentares cristãos: votem contra essa geringonça e ela os punirá por isso. Essa lei derrubará, de um só golpe, todo o Estado de direito neste país. Foi calculada para isso, e bem calculada.

Veja todos os arquivos por ano