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Perguntas proibidas

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 8 de agosto de 2011

Max Weber, quando o acusavam de exagerar em seus diagnósticos, respondia: “Exagerar é a minha profissão!” A boutade referia-se, naturalmente, à técnica dos “tipos ideais”, com que o autor de A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, ao descrever uma conduta, um sentimento, uma atitude, ampliava certos traços típicos para maior nitidez do objeto puro, isolado de diferenças e semelhanças acidentais. Mas referia-se também, mais profundamente, à missão do cientista social em geral, que tem de olhar as coisas numa escala que não é a da atualidade patente, visível nos debates públicos e na mídia popular, mas deve cavar em busca das sementes, não raro modestas e discretíssimas, onde o futuro está se gerando longe dos olhos da multidão. Se há uma coisa que nenhum estudioso da sociedade e da História tem o direito de ignorar, é que o poder dos fatores determinantes do curso das coisas é, no mais das vezes, inversamente proporcional à sua visibilidade presente. Daí o descompasso entre os respectivos “sensos de realidade” dos observadores do dia a dia, meros constatadores do fato consumado, e o do estudioso que mergulha em águas profundas para saber o que há de vir à superfície amanhã ou depois. Com o agravante de que o fato consumado só faz sentido para quem o viu crescer desde as raízes. Para os demais, tudo é surpresa desnorteante ou mera coincidência.

Mas, quando digo “cientista social”, uso o termo como um tipo ideal weberiano. Refere-se ao que os cientistas sociais deveriam fazer para merecer o título, não ao que os profissionais universitários que o ostentam estão fazendo realmente no Brasil de hoje. Estes, coitados, não conseguem acompanhar nem o fato consumado, tão presos estão aos seus esquemas mentais rotineiros, à pressão dos seus pares e ao temor de desagradar à mídia. Não ousam sequer fazer perguntas, como por exemplo: Quantos assentados do MST foram recrutados entre militantes urbanos, falsificando completamente o panorama dos “conflitos rurais”? Qual é o peso estatístico real de duzentos assassinatos de homossexuais num país que tem 50 mil homicídios por ano, mesmo sem averiguar quantos daqueles foram assassinados por seus parceiros? Quantas pesquisas sociológicas com resultado previamente estabelecido pelas fundações estrangeiras que as financiaram foram realizadas nas universidades brasileiras nos últimos anos, e quantas foram em seguida usadas como material de propaganda por ONGs e “movimentos sociais”, se não como argumento cabal para justificar leis e decretos? Quanto dos benefícios distribuídos pelo governo federal aos pobres foi pago com puro dinheiro de empréstimos, endividando as gerações vindouras para ganhar os votos da presente? Quantos crimes de morte são praticados com armas legais registradas, e quanto com armas clandestinas cuja circulação o tal “desarmamento civil” não poderá diminuir em nada? Quantas leis e decisões federais vieram prontas de organismos internacionais e tiveram seu caminho aplanado por campanhas bilionárias financiadas do exterior? Quantas delas vieram de decisões tomadas no Foro de São Paulo com anos de antecedência, em assembléias promíscuas onde terroristas, narcotraficantes e seqüestradores debatem em pé de igualdade com políticos eleitos? Se for liberado o comércio de drogas, quem terá mais chances objetivas de dominar esse mercado?

Sem fazer essas perguntas, ninguém pode compreender nada do que está acontecendo neste país, muito menos o que está para acontecer. Mas cada uma delas é um tabu. O simples pensamento de vir a formulá-las um dia já basta para fazer um profissional universitário tremer desde os alicerces, prevendo os olhares de ódio que fulminarão sua pessoa e sua carreira – ao menos ele assim o imagina – tão logo comece a falar. Sim, o brasileiro de hoje em dia – e os cientistas sociais não são exceções – é aquele sujeito valente que teme olhares e caretas como se fossem balas de canhão, que enfia o rabo entre as pernas à simples idéia de que falem mal dele, que troca a honra e a liberdade por um olhar de simpatia paternal de quem o despreza.

É por isso que os processos históricos profundos, que estão mudando a face do Brasil com uma rapidez avassaladora, passam ainda despercebidos até àqueles mesmos que, arrastados na voragem de leis, decretos e portarias, perdem prestígio e poder a cada dia que passa e, iludidos por vantagens financeiras imediatas que o governo atira à sua mesa como migalhas, não ousam nem confessar uns aos outros que estão sendo jogados à lata de lixo da História.

Não vi até agora um único analista político, na mídia ou nas universidades, declarar em voz alta aquilo que, nos altos escalões do petismo e do Foro de São Paulo, todo mundo sabe: a fase da revolução cultural terminou, já estamos em plena revolução social. Explicarei isso melhor no próximo artigo.

Repressão chavista e três notas

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 14 de julho de 2010

O líder oposicionista venezuelano Alejandro Peña Esclusa foi preso pela polícia política de Hugo Chávez na última segunda-feira. Todo mundo sabia que isso ia acontecer mais cedo ou mais tarde. Só não se esperava que os agentes da ditadura chavista tivessem, como tiveram, o cinismo de plantar explosivos na casa de um político que nunca usou de violência nem mesmo verbal. O objetivo da farsa é criar uma aparência de ligação entre Peña e “organizações direitistas violentas”, que no presente cenário latino-americano se destacam sobretudo pela sua espetacular inexistência.

Alejandro Peña, que por sua militância antichavista foi recentemente alvo de homenagem por parte da Assembléia Estadual do Alabama (v. http://www.youtube.com/watch?v=VGhwsRbR0Y8), é bem conhecido do público brasileiro como conferencista sério e equilibrado, que descreve a situação política de seu país com tristeza, mas com serenidade e nem o mais mínimo sinal de ódio. Os membros da Associação Comercial de São Paulo tiveram a oportunidade de ouvi-lo explicar a estratégia revolucionária do Foro de São Paulo durante o simpósio “Democracia, Liberdade e o Império das Leis”, realizado em maio de 2006 na sede da entidade.

Não tenho a menor dúvida de que a prisão de Alejandro Peña é uma retaliação ao processo que ele move no Tribunal Penal Internacional contra o governo Hugo Chávez.

A melhor cobertura do assunto, até agora, está no blog http://notalatina.blogspot.com.

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O jornal O Tempo, de Belo Horizonte, publica em editorial estas linhas onde a malícia e a estupidez se fundem numa mistura indecomponível:

“O governo dá motivos. Entre outros, o PNDH-3 e, agora, o primeiro programa de governo da candidata Dilma Rousseff, depois substituído por um conteúdo mais digerível. O fato é que essas trapalhadas acabam por estimular a disseminação de um discurso de direita, claramente anticomunista, afirmando que o país caminha para uma ditadura. A fonte talvez esteja em alguns articulistas — como o filósofo Olavo de Carvalho — que dão curso hoje a teorias da conspiração… Não há dúvidas de que a denúncia de golpe tem muito de paranóia…”

Não há possibilidade de golpe, prossegue o jornal, porque o Brasil está sob o domínio daquilo “que o jornalista Fernando de Barros e Silva chama de condomínio ou consórcio de poder: a reunião de forças interessadas na atual estrutura do governo. Desse condomínio participam partidos, políticos, empresários, sindicalistas e funcionários do Estado, todos beneficiários de favores distribuídos pelo governo. O poder está distribuído entre tantos beneficiários que ninguém pode pretender ter a hegemonia. O condomínio é a maior garantia de que a legalidade não será desrespeitada”.

1) A surpresa atemorizada que o editorialista revela ante “a disseminação de um discurso de direita, claramente anticomunista” mostra que, na democracia como ele a concebe, todo anticomunismo é proibido. Você pode ser muito comunista, meio comunista ou um pouquinho comunista. Tudo o que esteja à direita disso é crime, e seu eventual ressurgimento, mesmo em doses mínimas, deve ser denunciado para que se possa cortar o mal pela raiz antes que cresça ao ponto de querer formar – oh, horror! – um partido direitista.

2) Na verdade, não é só O Tempo que pensa assim. Praticamente toda a “grande mídia” brasileira se empenha em fazer o público aceitar uma caricatura leninista de democracia – o “centralismo democrático” – como se fosse não só uma democracia genuína, mas o único tipo de democracia que já existiu no mundo.

3) A prática da democracia leninista é exemplificada pela coexistência de eleições regulares com a total supressão do livre acesso popular a informações que o governo considere politicamente inconvenientes, como por exemplo o pacto de solidariedade PT-Farc assinado em 2001 e, de modo geral, as atividades do Foro de São Paulo em favor de organizações terroristas. Tudo o que se pode ler na mídia se resume ao esquerdismo oficial e à sua crítica de esquerda. E esta, num arremedo grotesco de independência, acusa-o do mais hediondo dos pecados: fomentar, por inabilidade, o ressurgimento da direita.

4) Se a opinião pública tem seu acesso a informações eficazmente racionado, os partidos políticos só têm espaço para fazer oposição de esquerda e, nos altos escalões, o poder está sob o domínio total de um “consórcio de beneficiados”, não existe, evidentemente, nenhuma necessidade de golpe ou ditadura, porque o golpe já foi dado e a ditadura já está em pleno funcionamento, controlando magistralmente a situação, sendo exatamente isto o que O Tempo chama de democracia.

5) Por saber disso, e por ter escrito a respeito algumas centenas de vezes, foi que, exatamente ao contrário do que diz O Tempo, não denunciei nenhum plano golpista, não sendo besta de denunciar a preparação de crimes já perpetrados.

6) O Tempo, se não é um beneficiário, é pelo menos um bajulador do consórcio. Está no poder, ou pelo menos é um penetra que se finge de convidado.

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Um partido que, em vez de declarar sinceramente a que veio, sempre entra em campo com duas alas, uma “radical” para assustar o público, outra “moderada” para acalmá-lo e recolher os lucros eleitorais do alívio (recompensando em seguida os serviços da primeira com uma pletora de verbas públicas), não é, com toda a evidência, um partido como os outros, um partido normal e legítimo: é uma máquina de engenharia social montada para ludibriar, manipular e controlar. Mas o Brasil já se acostumou tanto à alternância pavloviano-petista de choques e queijos (ou pauladas e cenouras, como dizia Bismarck), que já nem repara na diferença entre a política eleitoral sadia e a “estratégia das tesouras” – invenção de Lênin, como o centralismo democrático.

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Não acredito de maneira alguma nas estatísticas com que o MST justifica sua reivindicação de um plebiscito para limitar o tamanho das propriedades rurais, mas, só ad argumentandum, vou aceitá-las por uns minutos e ver a que conseqüências levam. Se é verdade, como alega o MST, que as pequenas propriedades produzem quase toda a comida que se consome no Brasil, aumentar o número delas será, com toda a evidência, catastrófico: só servirá para gerar um excedente de produção que não poderá ser consumido no mercado interno. Para contornar a hipótese medonha de baixar os preços até tornar inviável toda atividade agrícola, esse excedente terá de ser exportado. Mas, como os pequenos produtores não têm a mínima condição de competir sozinhos no mercado externo, eles cairão nas mãos de grandes companhias exportadoras que, com a maior facilidade, farão deles gato e sapato. Não duvido que o sonho do MST, e a motivação última da sua proposta, seja tornar-se ele próprio uma dessas companhias e controlar tudo o que os agricultores podem e não podem plantar, quanto podem cobrar pelos seus produtos, que implementos têm de usar, etc. etc. Como sempre acontece nessas ocasiões, a mais despudorada ambição de poder se oculta sob um véu de generosidade humanitária.

A revolução globalista

Olavo de Carvalho

Digesto Econômico, setembro/outubro de 2009

Para quem quer que deseje se orientar na política de hoje – ou simplesmente compreender algo da história dos séculos passados –, nada é mais urgente do que obter alguma clareza quanto ao conceito de “revolução”. Tanto entre a opinião pública quanto na esfera dos estudos acadêmicos reina a maior confusão a respeito, pelo simples fato de que a idéia geral de revolução é formada quase sempre na base das analogias fortuitas e do empirismo cego, em vez de buscar os fatores estruturais profundos e permanentes que definem o movimento revolucionário como uma realidade contínua e avassaladora ao longo de pelo menos três séculos.

Só para dar um exemplo ilustre, o historiador Crane Brinton, em seu clássico The Anatomy of Revolution, busca extrair um conceito geral de revolução da comparação entre quatro grandes fatos históricos tidos nominalmente como revolucionários: as revoluções inglesa, americana, francesa e russa. O que há de comum entre esses quatro processos é que foram momentos de grande fermentação ideológica, resultando em mudanças substantivas do regime político. Bastaria isso para classificá-los uniformemente como “revoluções”? Só no sentido popular e impressionista da palavra. Embora não podendo, nas dimensões deste escrito, justificar todas as precauções conceptuais e metodológicas que me levaram a esta conclusão, o que tenho a observar é que as diferenças estruturais entre os dois primeiros e os dois últimos fenômenos estudados por Brinton são tão profundas que, apesar das suas aparências igualmente espetaculares e sangrentas, não cabe classificá-los sob o mesmo rótulo.

Só se pode falar legitimamente de “revolução” quando uma proposta de mutação integral da sociedade vem acompanhada da exigência da concentração do poder nas mãos de um grupo dirigente como meio de realizar essa mutação. Nesse sentido, jamais houve revoluções no mundo anglo-saxônico, exceto a de Cromwell, que fracassou, e a Reforma Anglicana, um caso muito particular que não cabe comentar aqui. Na Inglaterra, tanto a revolta dos nobres contra o rei em 1215 quanto a Revolução Gloriosa de 1688 buscaram antes a limitação do poder central do que a sua concentração. O mesmo aconteceu na América em 1786. E em nenhum desses três casos o grupo revolucionário tentou mudar a estrutura da sociedade ou os costumes estabelecidos, antes forçando o governo a conformar-se às tradições populares e ao direito consuetudinário. Que pode haver de comum entre esses processos, mais restauradores e corretivos do que revolucionários, e os casos da França e da Rússia, onde um grupo de iluminados, imbuídos do projeto de uma sociedade totalmente inédita em radical oposição com a anterior, toma o poder firmemente resolvido a transformar não somente o sistema de governo, mas a moral e a cultura, os usos e costumes, a mentalidade da população e até a natureza humana em geral?

Não, não houve revoluções no mundo anglo-saxônico e bastaria esse fato para explicar a preponderância mundial da Inglaterra e dos EUA nos últimos séculos. Se, além dos fatores estruturais que as definem – o projeto de mudança radical da sociedade e a concentração do poder como meio de realizá-lo –, algo há de comum entre todas as revoluções, é que elas enfraquecem e destroem as nações onde ocorrem, deixando atrás de si nada mais que um rastro de sangue e a nostalgia psicótica das ambições impossíveis. A França, antes de 1789, era o país mais rico e a potência dominante da Europa. A revolução inaugura o seu longo declínio, que hoje, com a invasão islâmica, alcança dimensões patéticas. A Rússia, após um arremedo de crescimento imperial artificialmente possibilitado pela ajuda americana, desmantelou-se numa terra-de-ninguém dominada por bandidos e pela corrupção irrefreável da sociedade. A China, após realizar o prodígio de matar de fome trinta milhões de pessoas numa só década, só se salvou ao renegar os princípios revolucionários que orientavam a sua economia e entregar-se, gostosamente, às abomináveis delícias do livre mercado. De Cuba, de Angola, do Vietnã e da Coréia do Norte, nem digo nada: são teatros de Grand Guignol, onde a violência estatal crônica não basta para esconder a miséria indescritível.

Todos os equívocos em torno da idéia de “revolução” vêm do prestígio associado a essa palavra como sinônimo de renovação e progresso, mas esse prestígio lhe advém precisamente do sucesso alcançado pelas “revoluções” inglesa e americana que, no sentido estrito e técnico com que emprego essa palavra, não foram revoluções de maneira alguma. Essa mesma ilusão semântica impede o observador ingênuo – e incluo nisso boa parte da classe acadêmica especializada – de enxergar a revolução onde ela acontece sob a camuflagem de transmutações lentas e aparentemente pacíficas, como, por exemplo, a implantação do governo mundial que hoje se desenrola ante os olhos cegos das massas atônitas.

O critério distintivo suficiente para eliminar todas as hesitações e equívocos é sempre o mesmo: com ou sem transmutações súbitas e espetaculares, com ou sem violência insurrecional ou governamental, com ou sem discursos de acusação histéricos e matança geral dos adversários, uma revolução está presente sempre que esteja em ascensão ou em curso de implantação um projeto de transformação profunda da sociedade, se não da humanidade inteira, por meio da concentração de poder.

É por não compreenderem isso que muitas vezes as correntes liberais e conservadoras, opondo-se aos aspectos mais vistosos e repugnantes de algum processo revolucionário, acabam por fomentá-lo inconscientemente sob algum outro de seus aspectos, cuja periculosidade lhes escape no momento. No Brasil de hoje, a concentração exclusiva nos males do petismo, do MST e similares pode levar liberais e conservadores a cortejar certos “movimentos sociais”, na ilusão de poder explorá-los eleitoralmente. O que aí escapa à visão desses falsos espertos é que tais movimentos, ao menos a longo prazo, desempenham na implantação da nova ordem mundial socialista um papel ainda mais decisivo que o da esquerda nominalmente radical.

Outra ilusão perigosa é a de crer que o advento da administração planetária é uma fatalidade histórica inevitável. A facilidade com que a pequena Honduras quebrou as pernas do gigante mundialista mostra que, ao menos por enquanto, o poder desse monstrengo se constitui apenas de um blefe publicitário monumental. É da natureza de todo blefe extrair sua substância vital da crença fictícia que consegue inocular em suas vítimas. Com grande freqüência vejo liberais e conservadores repetindo os slogansmais estúpidos do globalismo, como por exemplo o de que certos problemas – narcotráfico, pedofilia, etc. – não podem ser enfrentados em escala local, requerendo antes a intervenção de uma autoridade global. O contrasenso dessa afirmativa é tão patente que só um estado geral de sonsice hipnótica pode explicar que ela desfrute de alguma credibilidade. Aristóteles, Descartes e Leibniz ensinavam que, quando você tem um problema grande, a melhor maneira de resolvê-lo é subdividi-lo em unidades menores. A retórica globalista nada pode contra essa regra de método. Ampliar a escala de um problema jamais pode ser um bom meio de enfrentá-lo. A experiência de certas cidades americanas, que praticamente eliminaram a criminalidade de seus territórios usando apenas seus recursos locais, é a melhor prova de que, em vez de ampliar, é preciso diminuir a escala, subdividir o poder, e enfrentar os males na dimensão do contato direto e local em vez de deixar-se embriagar pela grandeza das ambições globais.

Que o globalismo é um processo revolucionário, não há como negar. E é o processo mais vasto e ambicioso de todos. Ele abrange a mutação radical não só das estruturas de poder, mas da sociedade, da educação, da moral, e até das reações mais íntimas da alma humana. É um projeto civilizacional completo e sua demanda de poder é a mais alta e voraz que já se viu. Tantos são os aspectos que o compõem, tal a multiplicidade de movimentos que ele abrange, que sua própria unidade escapa ao horizonte de visão de muitos liberais e conservadores, levando-os a tomar decisões desastradas e suicidas no momento mesmo em que se esforçam para deter o avanço da “esquerda”. A idéia do livre comércio, por exemplo, que é tão cara ao conservadorismo tradicional (e até a mim mesmo), tem sido usada como instrumento para destruir as soberanias nacionais e construir sobre suas ruínas um onipotente Leviatã universal. Um princípio certo sempre pode ser usado da maneira errada. Se nos apegamos à letra do princípio, sem reparar nas ambigüidades estratégicas e geopolíticas envolvidas na sua aplicação, contribuímos para que a idéia criada para ser instrumento da liberdade se torne uma ferramenta para a construção da tirania.

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