Três notinhas da semana

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 19 de dezembro de 2014

Se abrir relações diplomáticas e comerciais com uma ditadura comunista pudesse fomentar a liberdade, a China seria hoje uma democracia. Obama repete o erro criminoso de Richard Nixon, adquirindo para os EUA “o melhor inimigo que o dinheiro pode comprar”. Em poucos anos, Cuba será uma potência econômica e militar invejável, sem democratizar-se no mais mínimo que seja – excetuada, é claro, a hipótese de uma revolução popular, que é exatamente o que o governo americano tenta evitar mediante a tábua de salvação atirada in extremis a uma ditadura moribunda.
Além do Brasil e das Farc, o Foro de São Paulo terá agora mais um patrono bilionário: os EUA, por intermediação de Cuba.
Os políticos conservadores e os refugiados cubanos em Miami podem se esforçar para dar outro rumo ao encadeamento das causas e efeitos, mas isso será como colocar rédeas num dragão.
Ao apoiar a iniciativa do governo Obama, o Papa Francisco prova mais uma vez sua completa falta de discernimento político.
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Um dos dogmas mais básicos – e mais psicóticos – da mentalidade revolucionária nas últimas quatro ou cinco décadas é que não existe “natureza humana”: o bicho-homem não tem instintos, não tem programação genética, é uma folha em branco, uma tábua rasa: tudo o que ele faz e pensa é imposto por “estereótipos culturais”. Estes, por sua vez, não surgem da experiência acumulada das gerações, mas são “instrumentos de dominação” criados pela maldita classe dominante.
Se você acredita que é macho só porque nasceu macho, ou fêmea só porque nasceu fêmea, está muito enganado(a). Foi o “aparato de reprodução da ideologia burguesa” que vestiu em você esses modelitos odiosos para que você não percebesse que seu pênis pode ser um sinal de feminilidade e sua vagina uma prova de macheza acima de qualquer suspeita.
Nem precisa perguntar: Sim, a ciência já demonstrou que isso é uma fraude das grossas. E sim, os mesmos que brandem a teoria da “tábua rasa” contra os papéis tradicionais de homem e mulher saem gritando, cinco minutos depois, que o homossexualismo é genético e que tentar mudar um homossexual é crime. Isto é: você não nasce homem nem mulher, mas nasce homossexual. Perguntar como você pode sentir atração por pessoas “do mesmo sexo” sem ter sexo nenhum é homofobia.
Há ainda aqueles que exigem acesso aos banheiros femininos para os transexuais e ao mesmo tempo berram que “é preciso acabar com os estereótipos de macho e fêmea”. Mas o que faz de um transexual um transexual senão o fato de que, nascido num sexo, ele copia os estereótipos do outro? E é preciso ser cego para não notar que a conduta feminina de um transexual é ainda mais estereotipada que a das mulheres.
Um documentário recente (Ver aqui) mostrou que na Noruega, o país onde a legislação é a mais igualitária do mundo para homens e mulheres, as pessoas continuam a buscar as profissões que correspondem ao “estereótipo” do seu sexo, com frequência estatística até maior do que o faziam antes de oficializado o discurso equalizante. Os fanáticos da “tábua rasa” dizem que elas fazem isso por pressão da sociedade, mas elas insistem que não: as mulheres escolhem cuidar de bebês, e não de automóveis, porque querem e não porque mamãe mandou. Mas os iluminados acreditam que essas pessoas não têm autoridade para dizer o que querem: quem tem são eles.
É essa a mentalidade por trás de milhares de leis psicóticas com que cérebros lesados impõem a sua deformidade à população, proibindo a saúde mental como se fosse um crime.
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Está aberta a temporada de caça ao deputado Jair Bolsonaro. Na verdade, sempre esteve, não sendo essa portanto a razão pela qual volto ao assunto. A razão é que agora os tiros vêm da mais inesperada das direções: a coluna do Reinaldo Azevedo. E vêm com aquela persistência inflexível do atirador que não aceita como troféu senão a completa destruição do alvo ou, na mais branda das hipóteses, a sua definitiva humilhação pública.
Numa de suas últimas postagens, o colunista da Veja firmou sua posição: ou o sr. Bolsonaro pede desculpas à sua colega Maria do Rosário, ou merece ter seu mandato cassado. Cassar o mandato de Maria do Rosário? Nem pensar.
Já disse, e reafirmo, que sou amigo do Reinaldo Azevedo e não deixarei de sê-lo por causa de uma opinião errada, depois de tantas certas e valiosas que ele já publicou. Mas esta de agora é tão errada, tão absurda, tão indefensável, que eu falharia ao meu dever de amizade se não alertasse o colunista para a injustiça que comete e o vexame a que se expõe.
Que a resposta do sr. Bolsonaro à sra. Maria do Rosário foi “uma boçalidade”, como a qualifica Reinaldo Azevedo, é certo e ninguém duvida. Mas o sr. Bolsonaro a pronunciou em resposta, não a “outra boçalidade”, como pretende Azevedo, e sim a uma falsa imputação de crime, que é por sua vez um crime. Reinaldo Azevedo exige que a boçalidade seja punida e o crime fique impune.
Como todo debatedor teimoso que se empenha na defesa do indefensável, Reinaldo se vê forçado a apelar a expedientes argumentativos notavelmente capciosos que, em situações normais, ele desprezaria.
Um deles é proclamar que a resposta do sr. Bolsonaro a Maria do Rosário transforma o estupro em uma “questão de mérito”. Quer dizer, pergunta Reinaldo, que, se Maria do Rosário merecesse, Bolsonaro a estupraria? Isso é deformar as palavras do acusado para lhe imputar uma intenção criminosa. Na verdade, Bolsonaro disse: “Se eu fosse um estuprador…” O restante da frase, portanto, baseia-se na premissa de que ele não o é, e só pode ser compreendido assim. Reinaldo parte da premissa inversa para dar a impressão de que o deputado fez a apologia do estupro. Com isso, ele endossa o insulto lançado pela deputada Maria do Rosário e usa essa premissa caluniosa como prova de si mesma. Raciocinar tão mal não é hábito de Reinaldo Azevedo, mas, como se sabe, o ódio político move montanhas: montanhas de neurônios para o lixo.
Pior ainda: tendo recebido centenas de objeções sensatas e racionais na área de comentários do seu artigo – inclusive as minhas –, ele não responde a nenhuma, mas tenta dar a impressão de que toda a oposição à sua versão dos fatos vem de “seguidores de Bolsonaro”, exemplificados tipicamente nos signatários de uma petição raivosa que exige a demissão do colunista de Veja. Fui ver a petição, e sabem quantos signatários tinha? Sete e não mais de sete (talvez agora tenha oito ou nove). Ao fazer desses sete os representantes da maioria que não pedia cabeça nenhuma, Reinaldo procedeu exatamente como os repórteres pró-petistas que, na massa de dezenas de milhares de manifestantes anti-Dilma, pinçaram cinco ou seis gatos pingados adeptos da “intervenção militar” para criar a impressão de que a manifestação era essencialmente golpista.

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