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Teoria da Pura Coincidência

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 16 de março de 2012

Quando surgiu um zunzum de que a avó de Barack Hussein Obama dizia ter assistido ao parto dele em Mombasa, o governo queniano mandou investigar e descobriu que, no arquivo do hospital, faltavam justamente os registros da semana de agosto de 1961 em que teria ocorrido o nascimento da criatura.

Agora, a comissão nomeada pelo xerife Joe Arpaio constatou que, nos arquivos da Imigração, onde são guardadas em microfilme aquelas fichas que os passageiros de viagens aéreas preenchem antes do desembarque, faltam as fichas das pessoas que chegaram do Quênia naquela mesma semana.

No Arquivo Nacional de Washington, a mesmíssima coisa.

E, por incrível que pareça, os registros daquele período estão ausentes, também, dos arquivos das companhias aéreas que em 1961 tinham vôos entre o Quênia e os EUA.

Ver nisso tudo algum indício de ocultação proposital é, na opinião bem-pensante, pura “teoria da conspiração”, mas tentar atribuir essa quádrupla convergência de sumiços a um acúmulo fortuito de coincidências é forçar a pobre lei das probabilidades até o último grau da inverossimilhança concebível.

Mesmo esse grau, porém, é manifestamente ultrapassado quando alguém pretende que foi também por pura coincidência que essas coincidências aconteceram não a um cidadão qualquer, nem mesmo a um presidente qualquer, mas logo àquele que recusa mostrar seus passaportes, seus registros escolares, seus trabalhos acadêmicos e outros documentos que seus antecessores sempre abriram à inspeção pública. Entre a Teoria da Conspiração e a Teoria da Pura Coincidência, a primeira, a esta altura, já se tornou muito mais razoável.

Por fim, se esse presidente exibe um certificado de alistamento militar com carimbo grosseiramente falsificado e, mandando publicar uma cópia eletrônica de sua certidão de nascimento, gasta um milhão de dólares com advogados para impedir o acesso ao original do documento, o teórico da pura coincidência, que se pretende a encarnação máxima da sanidade, já começa a parecer aquilo que sempre foi: um louco, um idiota completo ou parte interessada na ocultação do óbvio.

A experiência me ensinou que, quando a maioria bem-pensante aposta que dois mais dois são cinco, é mais prudente nadar contra a maré e ser apontado nas ruas como louco. A opinião respeitável pode ser muito respeitável, mas a matemática é mais.

Afinal, essa gente toda apostou que o Foro de São Paulo não existia, que o PT não tinha nada a ver com as Farc nem estas com o tráfico de drogas, que a ascensão do petismo acabaria com a era da corrupção na política e que a China se tornaria democrática tão logo adotasse a economia de mercado. Em todos esses casos me chamaram de louco porque eu dizia que não. E em todas essas ocasiões preferi antes ganhar a aposta sozinho do que perdê-la mal acompanhado.

Que Obama seja o “Presidente da Manchúria”, que por trás da súbita e misteriosa ascensão de um ilustre desconhecido ao comando da nação americana haja um vasto esquema de ocultação e manipulação, a maior fraude política de todos os tempos, é coisa que, no meu modestíssimo e louquíssimo entender, já nem se discute. Quem quer que ainda tenha dúvidas a respeito sofre de Síndrome do Piu-Piu em estado terminal.

Só o que resta é sondar melhor as finalidades da operação. Não posso crer, razoavelmente, que o objetivo de tão complexo, trabalhoso e arriscado empreendimento fosse apenas a conquista da presidência, nem que os planejadores da coisa imaginassem poder manter os fatos encobertos e invisíveis para sempre.

Ao contrário: a operação deve ter como objetivo último o efeito psicossocial traumático, devastador, que a revelação da fraude, mais dia menos dia, virá a ter sobre todo o eleitorado que se rendeu ao engodo com paixão e entusiasmo, cedendo à chantagem racial ostensiva, confiando cegamente nos inimigos e expondo à perseguição e à zombaria os mais sinceros patriotas. Induzir toda uma população a apostar contra si mesma, a ajoelhar-se ante o altar de um ídolo postiço com identidade falsa, é sem dúvida a vitória mais admirável que alguém já obteve no campo da guerra psicológica.

Nesse sentido, a própria revelação da verdade contribuirá para a derrocada dos EUA, criando uma crise constitucional e social num momento em que o país, em estado de estupor, estará atolado num desastre econômico sem precedentes e metido ou em vias de meter-se em mais uma guerra.

É impossível que essas linhas de conseqüência não tenham, desde o início, entrado nos cálculos dos planejadores. Quem são eles possivelmente, é o que tentarei sondar num artigo vindouro.

P. S. – Mal havia eu acabado de escrever essas palavras, quando chegou pelo http://www.wnd.com/2012/03/pravda-asks-what-happened-to-american-media/  a notícia de que o jornal oficial russo, Pravda, estava denunciando alto e bom som a conspiração geral da mídia americana para ocultar a fraude documental de Obama. Pode parecer uma ironia que as funções tradicionais respectivas do jornalismo americano e russo tenham se invertido, mas também aí, se me permitem, não há nenhuma coincidência. A mega-operação simplesmente passou à segunda fase: do ludíbrio geral está saltando para a revelação brutal de uma obviedade tanto mais desmoralizante quanto mais longamente, obstinadamente rejeitada. Os americanos, uma vez demonstrado ante a Schadenfreude da humanidade inteira o quanto é fácil ludibriá-los, fazê-los de palhaços e jogá-los contra si próprios, precisarão de muita ajuda divina para, depois de tamanha humilhação, poder conservar ainda algum espírito patriótico.

A tradição revolucionária – 2

 Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 15 de julho de 2011

Os efeitos da hegemonia revolucionária são visíveis por toda parte. Não faltam exemplos mais perto de nós. O “Plano Colômbia”, de Bill Clinton, fornecendo ajuda ao governo colombiano para o combate ao narcotráfico sob a condição de que “não tocasse nas organizações políticas”, serviu apenas para, desmantelando os antigos cartéis, dar às FARC o monopólio do comércio de drogas na América Latina, fazendo daquela incipiente organização guerrilheira uma potência de dimensões continentais e o sustentáculo financeiro do Foro de São Paulo que hoje domina doze países latino-americanos e vai rapidamente estendendo seus tentáculos por todos os outros. Ao mesmo tempo, o plano serviu de pretexto para que as mesmas FARC desencadeassem uma violenta campanha de publicidade contra a “agressão americana” personificada no mesmo plano. Dialeticamente, não há contradição nenhuma em beneficiar-se da ajuda recebida e usá-la como instrumento de propaganda contra o desastrado benfeitor. Muitos críticos do movimento revolucionário dizem horrores do “pensamento duplo” que o inspira, mas raramente entendem que por trás de uma aparente contradição lógica se esconde uma ação de mão dupla inteiramente racional do ponto de vista prático.

Por mais chocante que pareça, esse exemplo é rigorosamente nada em comparação com as grandes operações de desinformação estratégica com que o velho governo soviético conseguia — e o atual governo russo ainda consegue — fazer seus adversários trabalharem para ele, realizando integralmente o ideal de Sun-tzu, segundo o qual a mais brilhante das vitórias se obtém sem combate, moldando à distância as decisões do governo inimigo por meio de um bem calculado fluxo de informações entre verdadeiras e falsas.

Outro caso notável foi a facilidade com que a desinformação soviética, apelando à confiança dos americanos na invulnerabilidade das suas instituições democráticas e agitando na sua frente o fantasma da “perseguição marcatista” (em cuja realidade a mídia e o establishment continuam acreditando até hoje), logrou bloquear investigações decisivas sobre a penetração comunista nas altas esferas do governo de Washington, só para que quarenta anos depois a abertura dos arquivos de Moscou viesse a confirmar, tarde demais, as piores suspeitas do senador Joe McCarthy, com a única diferença de que os infiltrados não eram dezenas, como ele supunha, mas sim milhares.

Duas décadas atrás, a diplomacia chinesa, repetindo o truque que Lênin já aplicara aos investidores europeus em 1921 conseguiu convencer políticos e empresários americanos de que a abertura para a economia de mercado traria automaticamente a liberalização do regime. Mesmo após o massacre da Praça da Paz Celestial os sábios de Washington continuaram afirmando anestesicamente que “a China estava no bom caminho”. Com toda a evidência, o instrumento de desinformação utilizado no caso foi uma das crenças mais queridas dos liberais e conservadores: o nexo de implicação recíproca entre liberdade econômica e liberdade política.

O sucesso dos mais espetaculares ardis de desinformação estratégica postos em prática pelos governos revolucionários seria, no entanto, impossível sem a hegemonia cultural e psicológica de que o movimento revolucionário desfruta em escala mundial. Hegemonia cultural significa ser o controlador dos pressupostos embutidos no pensamento do adversário, de tal modo que o trabalho dos agentes envolvidos numa operação concreta de desinformação estratégica se reduz ao mínimo. Quando o agente de desinformação trabalha num ambiente já antecipadamente preparado pela hegemonia cultural, ele pode controlar facilmente as reações do adversário sem precisar abusar dos expedientes usuais da espionagem que tornariam a sua ação mais visível, mais material. Por isso o velho Willi Münzenberg chamava essas operações de “criação de coelhos”: basta juntar um discreto casal de bichinhos e contar com a propagação automática dos efeitos esperados. Uma ação clássica do tipo “medidas ativas” pode ser investigada e denunciada pelos meios usuais dos serviços de inteligência, mas uma operação fundada em prévia hegemonia cultural pode tornar-se tão evanescente que qualquer tentativa de denunciá-la acabe assumindo as aparências da mais louca “teoria da conspiração”. Por isso é que Antonio Gramsci qualificava a influência do partido revolucionário, quando escorada na hegemonia cultural, de “um poder onipresente e invisível”. Tanto mais invisível quanto mais onipresente.

Enquanto o movimento revolucionário se move com a destreza alucinante de uma dialética capaz de absorver e aproveitar todas as contradições, as elites ocidentais, nominalmente liberais ou conservadoras, se apegam a uma lógica linear de tipo positivista que, quando não encontra um elo material de causa e efeito escancaradamente visível, acredita que nada está acontecendo.

Os filósofos escolásticos ensinavam que, para agir, é preciso antes existir. A existência, por sua vez, pressupõe unidade e continuidade. Um ser dividido em pedaços, desprovido de vida unitária, não é de maneira alguma um ser: é uma ilusão fantasmal que se agita no ar por instantes, deixando livre o espaço histórico para a ação do ser genuíno.

Não há nenhum exagero em dizer que o movimento revolucionário mundial é a única força política que conta para alguma coisa na história do mundo. Enquanto seus adversários não o perceberem como unidade, nada poderão contra ele. Lutando contra uma de suas alas, acabarão servindo a alguma outra, como tem acontecido invariavelmente. No fim das contas, toda a política mundial corre o risco de acabar se reduzindo a um leque de conflitos internos do movimento revolucionário. Se e quando isso acontecer, não será excesso de pessimismo anunciar o início de mil anos de trevas.

Horror e insensibilidade

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 22 de junho de 2009

Na década de 60, as organizações de esquerda tinham de se esforçar muito para conseguir recrutar dez militantes entre cada cem ou duzentos jornalistas. A lei que tornou obrigatório o curso universitário para o exercício da profissão mudou isso completamente, entregando sucessivas gerações de jovens desmiolados à guarda de doutrinadores e recrutadores bem capacitados. A conversão maciça da classe jornalística ao esquerdismo tornou possíveis fenômenos como o da ocultação geral do Foro de São Paulo e a farsa da eleição presidencial de 2002, um arranjo entre partidos de esquerda, com exclusão de toda oposição possível, celebrado cinicamente pela mídia nacional em peso como uma apoteose da livre concorrência democrática.

O STF fez muito bem ao eliminar a pérfida exigência do diploma, armadilha maquiavélica que rebaixou a qualidade dos nossos jornais e reduziu sua credibilidade ao ponto de que hoje eles não vendem mais exemplares do que o faziam nos anos 50, quando a proporção de analfabetos em nossa população era imensamente maior.

No entanto, a simples eliminação desse instrumento de seleção ideológica não basta para garantir que um pluralismo de verdade venha a reinar na nossa imprensa. Há meios de controle mais sutis e eficientes do que a imposição legal direta. No seu livro The True Story of the Bilderberg Group (Chicago, Independent Publishers Group, 2009), o jornalista espanhol Daniel Estulin mostra como essa plutocracia globalista, empenhada na construção de uma ditadura mundial, conseguiu se manter oculta desde 1954 até pelo menos 1998, estigmatizando como “teoria da conspiração” qualquer tentativa de revelar sua existência: seus componentes simplesmente compraram todos os grandes jornais e redes de TV dos EUA e da Europa. Isso determinou uma mudança mais profunda das funções do jornalismo do que a maioria da população pode ainda conceber. Como o objetivo da elite globalista é derrubar a economia americana e implantar em cima de seus escombros um novo sistema com moeda mundial unificada, impostos globais e administração burocrática planetária, as notícias, na quase totalidade da mídia, já não são selecionadas por nenhum critério de importância objetiva, mas pelo serviço que prestem à programação mental das multidões, de modo a fazê-las aceitar passivamente mudanças drásticas que em condições normais suscitariam explosões de ódio e revolta. A supressão e a manipulação tornaram-se gerais e sistemáticas, ao ponto de atentar diariamente contra a dignidade da inteligência humana e de transformar os mecanismos eleitorais da democracia num mero jogo de aparências.

Quando a elite globalista faz eleger presidente dos EUA um desconhecido, proibindo por todos os meios qualquer investigação séria da sua biografia e reprimindo por toda sorte de ameaças a exigência de que ele apresente seus documentos pessoais, é claro que a noção de “transparência” se transformou numa utopia inalcançável e está instaurado o império do segredo. Quando o indigitado mata um mosquito, compra um cachorro ou brinca de “dama por um dia” nos jardins da Casa Branca, de mãos dadas com a digníssima, o fato é noticiado com imenso alarde em todos os jornais e noticiários de TV, mas até atos oficiais do seu governo, quando arriscam criar alguma resistência, são omitidos por completo ou publicados com discrição que beira o silêncio.

O mesmo acontece com inúmeras notícias de importância histórica mundial que, se reveladas, teriam o dom de despertar as multidões do torpor hipnótico que as imobiliza e incapacita. Dificilmente o leitor encontrará nas páginas dos jornais, tão cuidadosamente foi escondida, a notícia de que Kaing Guek Eav, ex-diretor do sistema de prisões no regime comunista do Camboja, confessou ter mandado assassinar sistematicamente milhares de crianças, filhas de prisioneiros políticos, para que não tentassem vingar seus pais depois de crescidas (v. http://br.reuters.com/article/worldNews/idBRSPE55705320090608). Nada ilustra melhor a natureza do comunismo. Essas crianças não foram mortas acidentalmente por bombas durante uma guerra. Se o fossem, e as bombas fossem americanas, estariam em todas as primeiras páginas como provas da maldade capitalista. Como foram assassinadas deliberadamente, e o foram pelo simples crime de ser crianças, é preciso abafar o horror para que, no mínimo, as massas continuem na ilusão do equivalentismo moral entre os países comunistas e os EUA.

Do mesmo modo, as vítimas das FARC e do terrorismo latino-americano em geral, brasileiro inclusive, são meticulosamente excluídas do noticiário, proibidas de entrar no círculo da piedade humana e esquecidas, por fim, como meros dejetos acidentais indignos de atenção.

Enquanto isso, a mídia inteira considera normal e aceitável publicar palavras como estas do Dr. Emir Sader: “Há personagens com uma tal estatura histórica que, independente dos adjetivos e de todos os advérbios, ainda assim não conseguimos retratá-los em nada do que podemos dizer ou escrever. O que falar de Marx, que permaneça à sua altura? O que escrever sobre Fidel? … O Che é um desses personagens cósmicos.”

Num rápido manejo de teclado, criminosos desprezíveis, mentores de Pol-Pot, são elevados às alturas sublimes do indizível, do inefável, do transcendente à linguagem humana. Será exagero chamar isso de idolatria psicótica? Mas mesmo os que não apreciam o comunismo aceitam essa monstruosidade em nome da “diversidade de idéias”, como se a matança deliberada de crianças fosse uma idéia, uma hipótese, um mero jogo acadêmico.

A longa convivência com essas enormidades, forçada diariamente pela mídia, dessensibiliza as consciências e as torna incapazes de perceber qualquer diferença entre a santidade e o crime, entre a virtude e a abominação. Na mesma medida e pela mesma razão, a estatura moral das sociedades democráticas vai baixando, e, com a ajuda de milhões de emires sáderes, os Ches e Pol-Pots se aproveitam disso para ostentar mais um pouco da sua infinita superioridade moral, anjos de bondade que pairam no céu, longe do “inferno capitalista”.

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