Olavo de Carvalho
Inconfidência, 02 de março de 2007
A carta de saudação enviada pelas Farc à XIII assembléia geral do Foro de São Paulo ( www.farcep.org/?node=2,2513,1) é o documento mais elucidativo dos últimos tempos. Quem não a leu não mede a estreitreza dos laços que ligam o nosso partido governante à narcoguerrilha colombiana, nem compreende o papel que o governo brasileiro desempenha na restauração do movimento comunista internacional. O miolo do texto é o seguinte parágrafo:
“Em 1990 já se via vir abaixo o campo socialista, todas as suas estruturas fraquejavam como castelo de cartas, os inimigos do socialismo festejavam (…) A desesperança se apoderou de muitíssimos dirigentes (…) É nesse preciso momento que o PT lança a formidável proposta de criar o Foro de São Paulo (…) Essa iniciativa foi uma tábua de salvação (…) Quanta razão havia, transcorreram dezesseis anos e o panorama político é hoje totalmente diferente”.
Não há um só partido filiado ao Foro que discorde dessa afirmação: realizando uma idéia original de Fidel Castro, o PT salvou da extinção o comunismo, infundindo novas forças no corpo moribundo e habilitando-o, como se proclamou na IV assembléia da organização, a “reconquistar na América Latina o que foi perdido no Leste Europeu“. Só seus adversários não querem ver isso. Têm medo de enxergar o tamanho do seu próprio fracasso.
Enquanto o Foro de São Paulo crescia, a influência dos EUA no continente definhava a olhos vistos, transferindo seus meios de ação para organismos internacionais, canalizando-os em favor dos partidos de esquerda ou contentando-se com a defesa de projetos econômicos que interessam menos à nação americana do que aos seus inimigos. Tão débil se tornou a diplomacia pública de Washington na região, que a propaganda esquerdista pôde se prevalecer da completa ignorância local quanto à realidade americana, atribuindo ao “imperialismo ianque” iniciativas que, do Texas ao Maine, ninguém ignora serem ameaças à soberania dos EUA. A Alca, por exemplo. É engraçado comparar os discursos iracundos da esquerda latino-americana contra esse “acordo imperialista” com os protestos não menos furiosos dos conservadores americanos contra esse atentado globalista aos interesses nacionais dos EUA. Alguém aí está fora de si – e não são os conservadores americanos. Mais cômico, ou tragicômico, é ver a esquerda denunciando como “ingerência americana” a presença na Amazônia de agentes do Conselho Mundial das Igrejas, que nos EUA até as crianças sabem ser uma entidade internacional esquerdista, anti-americana e financiadora de movimentos revolucionários. O primado da fantasia sobre a realidade parece que subiu às alturas de um um princípio estratégico.