Posts Tagged Hugo Chávez

Inutilidade confessa

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 24 de outubro de 2007

Xingado de ultradireitista por Hugo Chávez, humilhado pelo governo de Cuba que vetou a entrada da comissão parlamentar brasileira, o Senado brasileiro tratou logo de reconquistar as graças de seus exigentes proprietários, derretendo-se em sorrisos sedutores e baixando ao último grau da abjeção mediante a despudorada homenagem a um sociopata assassino, odiento, covarde e autolatricamente vaidoso.

Com essa iniciativa aliás involuntariamente irônica, pois Che Guevara já se colocava a si próprio “no primeiro escalão da espécie humana” e quem quer que depois disso lhe renda graças aceita ipso facto um lugar inferior ao dele na hierarquia zoológica, a única coisa que o Senado conseguiu foi reforçar um pouco mais a tese petista que considera seriamente a hipótese da sua extinção a médio prazo.

Aqueles que esperam conquistar o coração do tirano mediante atos de subserviência não fazem senão mostrar a ele o quanto são dispensáveis.

***

Celso Lungaretti, que entrou para os anais da História Universal como prefeito de Pariquera-Açu, SP, demonstrou sua lealdade à esquerda revolucionária indo à TV delatar seus companheiros de ideologia durante o regime militar. Agora ele prova sua fidelidade aos princípios da democracia e da livre expressão exigindo o fechamento judicial dos sites conservadores na internet .

Isso é que é inteireza de caráter.

Aproveita a ocasião para classificar o jornal eletrônico Mídia Sem Máscara entre “os sites financiados por facções políticas”, mas, como não informa qual é a facção, o jornal continua sem meios de acesso ao tal financiamento, que espero seja substantivo e duradouro. Se o misterioso subsídio não aparecer logo, vou cobrá-lo do próprio Lungaretti, que como dono da Geração Editorial, editora da primorosa “História Crítica” de Mário Schmidt, tem prosperado muito no ramo da propaganda comunista, a indústria mais pujante deste país.

Que um sujeito se arrependa, depois se arrependa de ter-se arrependido, e por fim se arrependa de ambas as coisas, faz parte da miséria usual da humanidade. O que diferencia Lungaretti é que seus arrependimentos sempre o colocam a favor do lado mais vantajoso no momento, primeiro como serviçal da direita militar e agora como delator de direitistas. Por isso mesmo, ele não está de todo errado ao posar de superior a todas as ideologias. No fundo ele não serve a nenhuma: serve-se delas e nunca sai perdendo.

Com similar idoneidade, ele classifica de ficção conspiratória a minha afirmação de que os partidos membros do Foro de São Paulo dominam atualmente os governos de vários países da América Latina. Fique pois o leitor sabendo que os partidos de Lula, Kirschner, Chávez, Morales e tutti quanti não governam nada ou então não pertencem ao Foro de São Paulo, embora eles próprios digam o contrário em ambos os casos.

Normalmente, o que quer que um tipo como Lungaretti diga ou faça é inócuo como um pum de mosquito, mas, como a nota foi publicada no site do prof. Roberto Romano, que tem mais de três leitores, um deles me enviou uma cópia da coisinha, perguntando o que acho dela. Não acho nada, apenas noto que o prof. Romano, quanto mais apanha de comunistas, mais solicitamente os lisonjeia, rebaixando-se ao ponto de se fazer de megafone para o ex-prefeito de Pariqüera-Açu. É o que normalmente se chamaria de fim de carreira, mas, no caso, parece ser apenas o preço de um emprego na Unicamp. Ou talvez acumulação de méritos para uma vaga no Senado.

Aprendendo com Peña Esclusa

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 22 de outubro 2007

Os diretores e membros da Associação Comercial de São Paulo guardam, sem dúvida, boas recordações de Alejandro Peña Esclusa, ex-candidato à presidência da Venezuela, que em maio de 2006 compareceu ao Seminário “Democracia, Liberdade e o Império das Leis”, na sede da entidade, e aí faz uma impressionante exposição sobre os avanços do comunismo no continente, em especial sobre o poderio crescente do Foro de São Paulo (v. http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=4942 ).

Peña Esclusa não era acusado de nenhum crime nem estava sob investigação. No entanto, precisou de autorização especial da Justiça de seu país para poder viajar ao Brasil. A exigência desse salvo-conduto devia-se exclusivamente à vigilância estrita que o governo venezuelano começava então a exercer sobre os inimigos reais e possíveis do presidente Hugo Chávez. O fato, na época, serviu de ilustração perfeita para as explicações que Peña Esclusa deu em São Paulo quanto à progressiva eliminação das liberdades civis e políticas sob a ditadura Chávez. Diferentemente da platéia presente àquele memorável evento, no entanto, os organizadores do “Foro Permanente pela Liberdade”, em El Salvador , terão de se contentar com o fato bruto, sem as explicações: desta vez Alejandro Peña Esclusa foi sumariamente proibido de sair da Venezuela. A vigilância, que já era abusiva e insultuosa no mais alto grau, transformou-se em controle e repressão ostensivos (v. edição de 17 de outubro de http://notalatina.blogspot.com ).

Àqueles que, diante dessa notícia, se sintam aliviados de viver no Brasil em vez de na Vanezuela, nada preciso advertir. O próprio Peña Esclusa já o fez: a ditadura Hugo Chávez não é um fenômeno isolado, é apenas a realização local, um pouco mais avançada no tempo, do plano estratégico abrangente do Foro de São Paulo, destinado a transformar todo o continente numa união de repúblicas socialistas, “reconquistando na América Latina o que foi perdido no Leste europeu”.

E àqueles que continuem achando que Lula é uma alternativa a Chávez, a resposta veio do próprio Lula em pessoa, no seu discurso de 2 de julho de 2005, décimo quinto aniversário do Foro de São Paulo, onde confessa que, já como presidente da República, interferiu ativamente na política venezuelana, ajudando a consolidar o poder daquele cachorro louco pelo qual tem afeições de pai e protetor (v. http://www.olavodecarvalho.org/semana/050926dc.htm ). Ninguém é uma alternativa para um mal que ele próprio criou e insiste em alimentar.

A única diferença entre a Venezuela e o Brasil é a seguinte. A Venezuela é o mostruário e balão de ensaio da revolução comunista latino-americana. Ela se arrisca, se expõe, para medir as reações internas e externas e transmitir ao restante do Foro de São Paulo os sinais para as devidas correções e ajustes da estratégia geral. O Brasil, ao contrário, cujo presidente foi fundador e líder máximo do Foro, é o centro vivo dessa organização, a sede do seu comando e do seu Estado-Maior. Por isso mesmo tem de ser resguardado de olhares intrusos, protegido sob uma densa camada de desconversas e camuflagens táticas, parecendo inofensivo porque é justamente a fonte essencial do perigo. Quem quer que, examinando os documentos do Foro e confrontando-os com as ações de seus líderes, não perceba isso com muita clareza, deve ser considerado um amador totalmente desqualificado para análises políticas mesmo elementares ou, ao contrário, um desinformante consciente e muito hábil a serviço da subversão continental – nos dois casos, alguém indigno de confiança. Inclui-se nessa classe a maioria dos comentaristas políticos da mídia nacional, dos analistas iluminados que pontificam na ESG e dos consultores estratégicos ao alcance do nosso empresariado. A acuidade de uma análise política mede-se pela previsão acertada do curso dos acontecimentos. Há quinze anos essas criaturas se esmeram em errar, mas sua credibilidade não parece diminuir em nada por isso.

Segundo uma reportagem do Washington Post , pesquisas recentes na área de psicologia mostram que a maior parte dos seres humanos acredita mais facilmente numa mentira coerente com as suas regras habituais de pensamento do que com uma verdade que as contrarie. Ora, nenhuma regra é mais arraigada na mente do empresariado brasileiro do que a crença otimista na estabilidade inabalável da ordem econômica que o sustenta. Por mais que os impostos subam, por mais que cresça o poder discricionário das organizações esquerdistas, por mais que propriedades rurais e urbanas sejam invadidas, queimadas, destruídas; por mais gente que morra nas ruas alvejada pelas balas dos paus-mandados das Farc; por mais que a própria atividade empresarial seja manietada e criminalizada sob o peso crescente dos controles burocráticos, há muita gente nessa classe que insiste em repetir o mantra: “Todo dia, sob todos os aspectos, tudo está indo cada vez melhor.”

Compreendo que, numa sociedade caótica, sem valores tradicionais nem muito menos alguma ordem pública fisicamente reconhecível, a segurança psicológica de tantas pessoas dependa do apego obstinado a ilusões tranqüilizantes. Mas, quando estas caem, aquela segurança vem abaixo toda de uma vez. É o pânico, a desorientação total, a inermidade absoluta ante o perigo presente. Entre a falsa segurança e o pânico, existe porém toda uma gradação possível de reações diferenciadas, cujo aprendizado é a única esperança de sobrevivência nas situações ameaçadoras. Há o estado de alerta, a atenção redobrada, a antecipação das respostas cabíveis, a preparação para as ações de emergência. Enquanto o nosso empresariado não abdicar da falsa segurança – que no fundo é medo de entrar em pânico, e já é por isso mesmo pânico disfarçado –, ele não desejará aprender a desenvolver as reações capazes de salvá-lo do assédio geral comunista que se anuncia para muito breve.

Orgulho nacional

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 07 de junho de 2007

Enquanto o público não tira os olhos da Venezuela, o totalitarismo esquerdista avança em outros pontos da América Latina sem ser notado, usando meios menos espalhafatosos mas nem por isto menos cínicos e brutais que os de Hugo Chávez.

No Equador, o deputado Luís Fernando Torres divulgou um vídeo que mostrava o ministro da Economia, Eduardo Patiño, tramando com investidores uma negociata para lucrar com os juros da dívida externa. Que aconteceu ao ministro? Nada. Mas Torres teve seu mandato cassado por “crime de sedição” junto com outros 56 deputados que o apoiavam. Se isso não é um golpe de Estado, não sei o que é. O próprio Chávez não teve peito para destruir a oposição com um ataque tão direto e mortífero. No dia seguinte, o presidente Correa, para impedir que o deputado recorresse a tribunais internacionais, solicitou que a Justiça o proibisse de sair do país. Enquanto os juízes, envergonhados, protelavam a decisão, Torres veio a Washington, sem dinheiro nem para o hotel, pedir socorro à Comissão de Direitos Humanos da OEA. Vã esperança. A OEA é uma sólida fortaleza do comuno-chavismo. O Equador foi jogado aos cães, e ninguém está nem ligando.

Porém o único esquema esquerdista que tem métodos infalíveis para se assegurar do poder total é o brasileiro. Ele não precisa temer protestos populares, porque tem o monopólio absoluto das agitações de rua. Nem os políticos de oposição, porque antes mesmo de chegar ao governo já havia destruído a maioria deles pela técnica do denuncismo e emasculado ideologicamente os restantes. Não precisa temer a Igreja, porque, seguindo a receita de Antonio Gramsci, já se apossou dela como um íncubo, sugando-lhe a alma e transformando-a num megafone da propaganda comunista. Não precisa temer o empresariado, cuja única expectativa de sobreviver ao assédio do fisco é beijar as mãos do Partido-Estado. Não precisa temer a mídia, já que ela se sujou tanto para ajudá-lo a ocultar a trama do Foro de São Paulo por 16 anos, que perdeu todo vestígio de autoridade moral e hoje o máximo que se permite é a obediência incompleta, a subserviência camuflada sob surtos esporádicos de ranhetice pro forma. Não precisa temer as pressões de fora, porque a fidelidade canina ao esquema globalista da ONU lhe garante as afeições do establishment europeu e americano. Não precisa temer as Forças Armadas, porque já dissolveu numa bem dosada poção de calúnias e seduções a antiga fibra anticomunista dos militares e porque tem o domínio estratégico do território através das organizações de massa, articuladas com as gangues de criminosos locais e com as Farc.

Nem as denúncias de corrupção, mil vezes mais volumosas e graves do que aquelas que atingiram os governos passados, o abalam no mais mínimo que seja. Só servem para demonstrar a impotência das leis, de novo e de novo, até desmoralizá-las por completo. Mesmo na hipótese remota de o atual presidente ser um dia submetido a impeachment, a esquerda continuará no comando, pela simples razão de que não tem nenhum concorrente, exceto – cum grano salis – os tucanos, os quais já facilitaram ao máximo a esquerdização do país quando estavam no governo e o farão novamente se para lá voltarem. A social-democracia, afinal, nunca teve outra razão de existir senão usurpar o lugar da direita e legitimar a ascensão da esquerda revolucionária mediante um arremedo de resistência, esvaziado, profilaticamente, de todo sentido ideológico.

Os poucos hiatos restantes no sistema de controle totalitário vão sendo preenchidos por meios indiretos, suaves, insensíveis, sob pretextos os mais variados e insuspeitos em aparência, ludibriando magistralmente a opinião pública que a tudo se submete por incapacidade de perceber o esquema como um todo.

Comparados à esquerda brasileira, astuta, racional, paciente, fria, segura de si, Chávez, Correa ou Morales são apenas amadores. De uma coisa o nosso país pode se orgulhar: de ser governado pelos mais hábeis vigaristas políticos do continente.

Veja todos os arquivos por ano