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Conforme o esperado

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 27 de maio de 2013

          

Se, com os escândalos de Benghazi, do grampo na Associated Press e da instrumentalização partidária do Imposto de Renda, pela primeira vez um pouco do verdadeiro rosto de Barack Hussein Obama está aparecendo na grande mídia, onde por anos a fio só se via a sua imagem embelezada até o limite do culto idolátrico, isso ilustra, uma vez mais, a lição dos estratagemas chineses: para que esperar o fato consumado, em vez de tentar descobrir o mal em germe, para eliminá-lo antes que produza todo um caudal de consequências nefastas?
Em 2008 o homem apresentou-se candidato à presidência sem ter uma só realização em seu currículo, sem mostrar um único documento de identidade válido e trazendo uma história de vida mais que nebulosa, repleta de ligações íntimas com agentes soviéticos, radicais islâmicos, terroristas e gangsters.
Não havia rigorosamente nenhum motivo para que alguém em seu juízo perfeito confiasse nessa criatura. Muito menos para supor que um aluno fiel e devoto de Saul Alinsky e Frank Marshall Davis fosse fazer na presidência algo de muito diferente daquilo que eles lhe haviam ensinado: corromper o Estado democrático para destrui-lo por dentro, substituindo-o pouco a pouco pelo governo tirânico de uma elite descarada, voraz e infinitamente presunçosa.
Naquele mesmo ano a colunista americana Debbie Schussel divulgou o alistamento militar grosseiramente falsificado, prova cabal de que o candidato era um criminoso chinfrim, sem qualificações para obter uma licença de porte de arma ou mesmo um emprego de balconista do Walmart. O tipo ideal, enfim, para tornar-se a gazua com que as forças inimigas planejavam arrombar as portas do sistema.
Também logo se tornou público que ele gastava rios de dinheiro para manter ocultos os seus documentos, exatamente aqueles que, ao mesmo tempo, o Congresso, Obama incluso, exigia do seu concorrente. Em 2008 já era possível perceber claramente que, quando esse indivíduo proclamava “Só quem não quer exibir a verdade é quem tem algo a esconder”, ele falava dele mesmo.
É inteiramente irracional aceitar e confirmar um sujeito desses na presidência da república, aplaudi-lo, paparicá-lo e protegê-lo por cinco anos, brandindo todas as armas da intimidação e da chacota contra os que ousem pretender investigá-lo, e depois, de repente, mostrar uma indignada surpresa ante a revelação de que durante esse tempo ele agiu precisamente de acordo com o que sua personalidade e suas origens ideológicas deixavam antever.
Afolha de serviços ostensivamente prestados por Obama à Rússia, à China, à Arábia Saudita e aos terroristas islâmicos só se compara à lista de seus erros alegadamente acidentais cometidos sempre em favor desses mesmos beneficiários. Juntas, formam uma enciclopédia da mendacidade, da traição e da indiferença psicopática aos valores morais e patrióticos proclamados de boca cheia, na voz empostada de um ator bem ensaiado.
Tudo isso é, de fato, muito impressionante. Mas, para quem quer que em 2008 conhecesse a biografia do tipo, nada disso foi surpresa. Só o foi para os que se deixaram hipnotizar, seja pelo maior blefe propagandístico de todos os tempos, seja pela ilusão da imunidade do sistema a qualquer tentativa de subvertê-lo por dentro – ilusão sem a qual o blefe jamais pegaria.
Tanto pela amplitude hiperbólica das suas promessas quanto pela ambiguidade da retórica entre sedutora e ameaçadora com que as anunciava, Obama, de fato, não deixava ao eleitor nenhuma terceira alternativa entre o fascínio embriagador e a suspeita de um projeto criminoso que soava, ao mesmo tempo, artificioso demais e torpe demais para que alguém ousasse tentar realizá-lo.
Pois bem: está realizado. O “sistema” americano não existe mais. O que hoje ocupa seu lugar é um esquema de poder centralizado que, usando os órgãos de governo como instrumentos de ataque e a mídia cúmplice como escudo defensivo, imuniza o presidente contra qualquer tentativa de obrigá-lo a cumprir as leis e a Constituição.
Nos cinco anos que se passaram desde sua primeira eleição, Obama declarou guerras sem consulta ao Congresso, duplicou a dívida americana, distribuiu dinheiro a rodo entre as empresas falidas de seus amigos, espalhou agentes islâmicos nos altos postos do governo federal, deu armas e dinheiro aos mais violentos inimigos do país, protegeu e adulou o Islã por todos os meios ao mesmo tempo que tentava expurgar os cristãos das Forças Armadas, derrubou dois governos no Oriente Médio para entregá-los ao poder da Al-Qaeda e da  Fraternidade Muçulmana e transformou o Homeland Security numa polícia armada tão assustadora que hoje os americanos, segundo as estatísticas, têm mais medo do governo que dos terroristas.
Em todos esses episódios, a simples insinuação de que ele procedia antes como um agente inimigo do que como um americano era repelida com tal violência pelos bem-pensantes, que acabava por morrer como um sussurro inaudível, abafado no fundo da internet.
Quando o ator Chris Rock exclamou do alto do palco: “Palmas para nosso Senhor e Salvador Barack Obama!”, ele expressou bem a atmosfera de adoração histérica com que uma nação, de joelhos, implorava ao governante que a ludibriasse, maltratasse e oprimisse, e jurava jamais desconfiar dele, fizesse o que fizesse.
O que pode haver de tão inesperado no fato de que, com tão excelsas garantias de impunidade, Obama  se sentisse livre para usar o Imposto de Renda como um porrete, grampear os telefones de meio mundo e jogar com as vidas de soldados e funcionários americanos como se estes  fossem peças descartáveis de um jogo banal?

Democratizando o extremismo

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 20 de fevereiro de 2012

 

Leiam em http://www.fas.org/irp/eprint/rightwing.pdf . O relatório do Departamento de Segurança Interna dos EUA (Homeland Security) sobre o “extremismo de direita” é exemplo claríssimo de uma velha tática ditatorial: alertar contra um perigo hipotético, improvável ou inexistente para justificar a adoção de controles repressivos reais e imediatos.

Desde logo, um movimento, um partido, um grupo, não pode ser definido como “extremista” ou “moderado” somente com base no diagnóstico que ele faz da realidade. O extremismo, assim como a moderação, só começa quando do diagnóstico se passa a alguma proposta de ação, a alguma estratégia pelo menos genérica e abstrata. Por exemplo, se alguém diz que o capitalismo se baseia na exploração dos pobres pelos ricos, não se pode deduzir daí que ele pregue a destruição violenta do regime, ou muito menos que a esteja planejando. Uma mesma descrição de um estado de coisas é compatível com muitas propostas de ação diferentes, ou até com a recusa de oferecer propostas. O crítico do capitalismo pode achar, por exemplo, que o regime deve ser mudado pacificamente e por via democrática. Ou pode achar que o capitalismo, por pior que seja, é ainda preferível às outras alternativas. Pode até achar que não há nada a fazer, que a exploração dos pobres é um destino inelutável da humanidade.

O Homeland Security ignora essas distinções elementares e começa a carimbar os cidadãos com o qualificativo infamante de “extremistas” simplesmente com base na visão que eles têm da realidade, no modo como eles enxergam o que está acontecendo.

Ao longo de todo o relatório, não se vê uma menção sequer a alguma proposta de ação política radical ou violenta dos “extremistas de direita”. Estes são assim nomeados porque não gostam da administração Obama, porque acham que a imigração ilegal é um perigo para o país, porque são contra algum programa de “proteção às minorias” ou contra as legislações de controle de armas e, last not least, porque acreditam que há um governo mundial em formação, arriscando debilitar a soberania americana.

São puros delitos de opinião, dissociados de qualquer plano, veleidade ou sonho de ação concreta, seja “extremista”, seja mesmo “moderada”. Por esse critério, nenhum americano conservador escapa da classificação de “extremista”. Quais, então, devem ser vigiados e, eventualmente, presos? Onde toda uma faixa da população está criminalizada a priori, o governo está livre para selecionar os suspeitos conforme as conveniências políticas do momento. A política anti-extremista do Homeland Security começa a se parecer com a legislação fiscal e trabalhista do Brasil, calculada para colocar na ilegalidade todos os empresários, sem distinção, de modo que, nas diversas contingências da política, o governo se sinta à vontade para escolher quais lhe convém prender ou deixar à solta.

A única ação a que o relatório alude por alto não é política: consiste em comprar armas e munições. O próprio governo federal estimula o povo a fazer isso, na medida em que se recusa a agir decisivamente contra a imigração ilegal e, por outro lado, anuncia a cada momento novas medidas restritivas contra a posse de armas pelos cidadãos. Essa conduta oficial induz cada americano a imaginar o que será da sua família quando sua casa for invadida por ilegais armados e ele não tiver sequer um 38 para se defender. O resultado é uma corrida às lojas de armas, que o mesmo governo, então, aponta como sinal de extremismo galopante. Como, porém, o relatório admite que o impulso de se armar é crescente não só entre os “extremistas” mas também entre os “cidadãos honestos”, resta a pergunta: como distinguir estes daqueles? O próprio relatório fornece a resposta, ao menos implicitamente: é preciso cruzar os critérios, articulando a compra de armas ao perfil de opinião. Se você compra um Smith & Wesson calibre 22 e é contra o governo, você é um extremista. Se compra um fuzil-metralhadora, mas é obamista devoto, está fora de suspeita.

Qualquer semelhança com a política nazista, que reprimia a posse de armas pelos cidadãos comuns mas favorecia a emissão de licenças para os membros e simpatizantes do Partido, é mera coincidência, não é mesmo? Ou vocês são por acaso “teóricos da conspiração”, portanto suspeitos de extremismo?

Para tornar as coisas um pouco mais sombrias, o presidente aprovou em 31 de dezembro passado, aproveitando a distração geral de fim de ano, um decreto que permite ao governo prender e manter preso indefinidamente, sem processo nem habeas corpus, qualquer suspeito de terrorismo (v. http://thinkprogress.org/security/2011/12/31/396018/breaking-obama-signs-defense-authorization-bill/?mobile=nc). Com aquele seu típico ar de candura no qual só mentes demoníacas enxergariam uma ponta de malícia, Obama assinou o decreto ao mesmo tempo que prometia não permitir sua aplicação. As mentes demoníacas começaram a perguntar: “Então por que aprovou em vez de vetar?”, mas ainda não obtiveram resposta.

Como o Homeland Security inclui na lista de suspeitos virtuais de terrorismo quem quer que estoque alimentos para mais de uma semana (o que no temor geral de uma crise já virou epidemia), está claro que, uma vez carimbado como extremista, basta o sujeito fazer uma compra mais fornida no Walmart para sofrer um upgrade no catálogo, passando à categoria de terrorista. Para metade da população americana, vai ser difícil escapar dessa. É claro que o governo não vai prender todo mundo. Vai prender, e manter na cadeia indefinidamente, quem bem lhe interesse.

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