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O queridinho da elite global

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 12 de junho de 2008

Nada mais significativo do retardamento mental brasileiro do que a insistência mecânica, repetitiva, psicastênica, no mote: “Estarão os EUA maduros para aceitar um presidente negro?” A chantagem psicológica embutida nessa pergunta é tão óbvia, tão grosseira, tão primária (“ou você vota em Obama ou confessa que é racista”), que por aqui até mesmo os mais devotos porta-vozes do candidato democrata procuram evitá-la, deixando-a para jornaizinhos de estudantes e grupos de esquerda sem a mínima expressão eleitoral. Tomando como modelo o discurso desses jornaizinhos, a “grande midia” nacional revela todo o seu provincianismo, a sua radical incapacidade de superar os slogans anti-americanos mais bobocas dos anos 50.

Afinal, por que os americanos deveriam, só para provar “maturidade”, eleger presidente o representante de uma comunidade étnica que mal chega a doze por cento da sua população? No Brasil, os negros e afrodescendentes são quase metade do contingente demográfico, e nunca um deles foi comandante das Forças Armadas nem ministro das Relações Exteriores. Nem mesmo candidato à presidência. Em Cuba jamais houve sequer um ministro negro, mas o estoque de negros nas prisões é um dos mais altos do mundo.

O que singulariza o sr. Barack Obama e explica a onda de badalação em torno dele não é a cor da sua pele, nem a soma de seus duvidosos talentos. Alan Keyes – meu candidato, se eu votasse nas eleições americanas – é duas vezes mais preto que ele, mil vezes mais culto e dez mil vezes mais honesto, e nem por isso deixou de ser boicotado ao ponto de ter de sair do Partido Republicano e lançar-se como candidato independente. Embora tenha considerável apoio entre os conservadores, foi excluído de todos os debates e jamais aparece na “grande mídia”.

As diferenças específicas do sr. Barack Obama são as seguintes:

1. Desde William Z. Foster e Earl Browder, que na década de 40 concorreram pelo Partido Comunista e tiveram votações irrisórias, Obama é o esquerdista mais radical que já se apresentou a uma eleição presidencial americana.

2. Ele apóia todas as medidas globalistas voltadas à destruição da soberania americana. Os círculos globalistas devolvem a gentileza, financiando-o generosamente.

3. Ele é o primeiro candidato presidencial que se apresenta com uma biografia nebulosa, contraditória e, a rigor, incompreensível, sendo menos uma pessoa historicamente identificável do que um amálgama de lendas e subterfúgios capaz de se amoldar às projeções mais desencontradas que a imaginação do eleitor possa lançar sobre ele. É, em toda a extensão do termo, uma figura construída, um fantoche.

4. Ele é o primeiro candidato presidencial americano que jamais teve um emprego produtivo. Só trabalhou como ativista. É um comedor de subsídios por natureza, e não espanta que seu programa de governo consista essencialmente de quatro coisas: aumentar impostos, elevar as despesas estatais até às alturas da catástrofe pura e simples, estrangular a indústria americana por meio de mais leis restritivas e bloquear sob lindos pretextos ecológicos a exploração de petróleo, tornando os EUA ainda mais dependentes da OPEC.

4. O círculo de proteção erigido em torno dele pela grande mídia é tão sólido que mesmo sucessivamente desmascarado pelas mentiras tolas que profere e pela revelação de suas ligações com toda sorte de terroristas e vigaristas, ele continua sendo tratado como alma pura e santa. Tal como Lula, ele foi adotado pela elite globalista e investido do dom da impecância eterna, imune à sujeira da sua vida real, que todo mundo conhece mas que é proibido levar em conta. O manto de proteção estendido sobre ele chega mesmo ao Brasil, onde até um colunista supostamente conservador como Ali Kamel canta louvores ao candidato com base tão-somente nas suas intenções declaradas, abstraindo, como se fossem zeros à esquerda, toda a sua atividade anterior e os inumeráveis trechos francamente racistas dos seus dois livros.

5. Somado a essas qualidades, o fato de ser negro é somente um detalhe útil, que não precisa nem deve ser explorado muito abertamente. A chantagem é tanto mais eficiente quanto mais sutil.

O fim de uma longa farsa

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 1o de fevereiro de 2007

O ex-chefe da espionagem romena, Ion Mihai Pacepa, confessou recentemente que a onda de acusações ao Papa Pio XII, que começou com a peça de Rolf Hochhuth, O Vigário (1963), e culminou no livro de John Cornwell, O Papa de Hitler (1999), foi de cabo a rabo uma criação da KGB. A operação foi desencadeada em 1960 por ordem pessoal de Nikita Kruschev. Pacepa foi um de seus participantes diretos. Entre 1960 e 1962 ele enviou a Moscou centenas de documentos sobre Pio XII. Na forma original, os papéis nada continham que pudesse incriminar o Papa. Maquiados pela KGB, fizeram dele um virtual colaborador de Hitler e cúmplice ao menos passivo do Holocausto (leiam a história inteira aqui).

Foi nesses documentos forjados que Hochhuth se baseou para escrever sua peça, a qual acabou por se tornar o maior succès de scandale da história do teatro mundial. O dramaturgo talvez fosse apenas um idiota útil, mas Erwin Piscator, diretor do espetáculo e aliás prefaciador da edição brasileira (Grijalbo, 1965), era um comunista histórico com excelentes relações no Kremlin e na KGB. Muito provavelmente sabia da falsificação.

Costa-Gavras, o diretor que em 2001 lançou a versão cinematográfica da peça, decerto cabe com Hochhuth na categoria dos idiotas úteis. Mas o mesmo não se pode dizer de John Cornwell, que mentiu um bocado a respeito das fontes da sua reportagem, dizendo que havia feito extensas investigações na Biblioteca do Vaticano, quando as fichas da instituição não registravam senão umas poucas e breves visitas dele. Cornwell é vigarista consciente. O conteúdo da sua denúncia já estava desmoralizado desde 2005, graças ao estudo do rabino David G. Dalin, The Myth of Hitler’s Pope, publicado pela Regnery, do qual o público brasileiro praticamente nada sabe até agora, pois o livro não foi traduzido nem mencionado na grande mídia. Com a revelação das fontes, nada sobra de confiável na lenda  do “Papa de Hitler”, que, no Brasil, graças à omissão da mídia e das casas editoras, tem campo livre para continuar sendo alardeada como verdade pura. Da Grijalbo nada se pode esperar. É tradicionalmente pró-comunista e nem sei se ainda existe. Mas a Imago, editora de O Papa de Hitler, parece ser honesta o bastante para reconhecer sua obrigação moral de publicar o livro do rabino Dalin. Noto, de passagem, que eu mesmo, quando li a denúncia de Cornwell, acreditei em tudo e cheguei a citá-la em artigo. Que Deus me perdoe.

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Elogiado em San Salvador pela sua fidelidade inflexível ao movimento comunista, homenageado na mesma semana em Davos pela sua conversão ao capitalismo, o presidente Luís Inácio Lula da Silva parece ser o  maior enigma ideológico de todos os tempos. Porém ainda mais admirável é a recusa geral da mídia em notar o paradoxo e pedir explicações ao personagem. O cérebro nacional tornou-se tão lerdo e apático que já aceita sem reagir as informações mais desencontradas, a tudo aquiescendo com indiferença bovina e uma reconfortante sensação de normalidade.

Miséria humana

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 28 de dezembro

No Observatório da Imprensa desta semana, um sr. Jorge M. L. Lima nega a existência do Foro de São Paulo, chamando-o de “entidade mítica”. Publicada no momento em que o próprio site oficial do PT anuncia a 13ª. assembléia geral do Foro e em que o presidente de San Salvador confirma pessoalmente a vinda de Raúl Castro para o encontro (v. http://www.pt.org.br/site/noticias/noticias_int.asp?cod=46918 e http://www.diariocolatino.com/nacionales/detalles.asp?NewsID=14928), a nota é um exemplo vivo do estelionato cultural que hoje em dia se pratica impunemente no Brasil com o rótulo de “jornalismo”. Mais edificante ainda é que esse lixo seja publicado num site que se arroga as funções de fiscal da idoneidade jornalística alheia.

De passagem, o sr. Lima reclama contra a presença de um artigo meu na Playboy – sem nem de longe mencionar o assunto ali abordado – e, após assegurar que compra a revista por causa dos artigos e não das mulheres, resmunga que nenhuma destas jamais lhe deu nem dará. Tem certeza, sr. Lima? Nem em pensamento? Nem na solidão do banheiro onde o senhor deposita o melhor da sua produção intelectual?

Como todo bobão tem outro mais bobão que o admira, nos comentários a essa matéria fecal um cidadão de nome Geraldo Galvão Ferraz protesta, indignado, que a publicação daquele meu artigo vai contra a liberdade de expressão anteriormente cultivada pela revista. Já nem digo que isso é cinismo. Acredito na sinceridade do panaca, na sua candura tocante. Ele acha mesmo que a liberdade de expressão consiste em negar voz e voto aos discordantes. Eu seria o último a tentar fazê-lo compreender que há algo de errado nessa idéia. Minhas ambições pedagógicas não voam tão alto.

É digno de nota que, da grande mídia, meus detratores já desapareceram por completo. Os que ainda cochicham estão espalhados em sites da internet e sobretudo em listas de discussões, que só por alguma ocasional inconfidência chegam ao meu conhecimento. É todo um zunzum subterrâneo, quase inaudível, mas persistente e obstinado, todo ele composto de incongruências bárbaras, invencionices assombrosas, tolices grotescas ditas com infinita presunção e uma pose de dignidade verdadeiramente patética.

O que mais admiro nessas mensagens é, de fato, a pose. Seus autores sabem que não suportariam cinco minutos de discussão comigo sem ser reduzidos a um mutismo humilhante, exatamente como aconteceu com seus gurus e mentores, mil vezes mais inteligentes e preparados. Que é que fazem então? Escondem-se. Protegidos pela distância, empinam seus narizinhos e, ante alguma platéia adolescente que ignore tudo de mim e deles, falam da minha pessoa afetando desprezo olímpico, às vezes num tom de familiaridade insolente para dar a impressão de que são meus íntimos, e assim auferem os lucros fáceis de uma vitória simulada, isenta de riscos, com a vantagem extra de parasitar um pouco da minha reputação já que não podem destruí-la de todo.

O fato de que tantos sujeitos biologicamente adultos busquem reconforto psicológico nesse tipo de fingimento pueril dá uma medida do abismo de miséria humana em que o país mergulhou.

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