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Ato de guerra

Olavo de Carvalho


Época, 15 de setembro de 2001

Certas explicações do crime não são explicações: são parte do crime.

“Doravante não distinguiremos mais entre os terroristas e aqueles que os protegem”, afirmou o presidente George W. Bush diante dos atentados de terça-feira passada.

Há quatro maneiras de proteger um grupo terrorista. Há os Estados que o armam ou abrigam, há os organismos de fachada que o encobrem, há as fortunas legais ou ilegais que o subsidiam, e, “last not least”, há os “formadores de opinião” que dão respaldo à agressão armada mediante operações de desinformação e guerra psicológica.

As três primeiras formas de colaboração requerem contato direto com os autores do crime, mas a quarta, por definição, é de natureza expansiva e evanescente. Uma pequena equipe pode conceber as palavras-de-ordem e as falsas informações mas elas não podem ser espalhadas a não ser por meio de uma rede de ajudantes informais, na qual os colaboradores mais periféricos, indivíduos aparentemente insuspeitos, sem ligação conhecida com os centros de decisão, se limitem a ecoar as ordens sem perguntar de onde vieram. Dos dirigentes aos militantes, dos militantes aos “companheiros de viagem” e destes aos meros idiotas, as fórmulas ditadas pelo comando se propagam em círculos concêntricos segundo uma progressão controlável e, até certo ponto, quantificável. Organizar e acionar esse tipo de operação é uma técnica bem desenvolvida. Todos os regimes e partidos totalitários se empenharam em instalar centros de formação de profissionais da área, sobretudo a partir da década de 30, quando as redes de desinformação soviética montadas por Karl Radek se expandiram formidavelmente entre intelectuais ocidentais graças ao gênio maligno de Willi Münzenberg.

As pessoas envolvidas nas formas mais diretas de proteção aos autores das explosões de terça-feira estão decerto longe do Brasil na Ásia, na Europa e até nos EUA. Mas a rede de desinformação e guerra psicológica não poderia deixar de estender-se até aqui.

Antes de chegar ao chão o último tijolo do World Trade Center, um enxame de “especialistas” e “analistas internacionais”, todos notoriamente simpáticos ou filiados a movimentos de esquerda, já acorreu aos canais de TV e às páginas de jornais para:

1. Atenuar a má impressão de um crime monstruoso, legitimando-o como “conseqüência natural” da intransigência e do militarismo do governo Bush.

2. Ressaltar além de toda a medida a “vulnerabilidade” dos EUA, contrastando-a com a imagem do poder econômico norte-americano.

A primeira dessas coisas é desinformação, a segunda é guerra psicológica.

De um lado, há uma década os EUA não fazem senão recuar e desarmar-se, reduzindo seus estoques de armas atômicas para um quinto das reservas russo-chinesas e cedendo à ONU parcelas cada vez mais decisivas da sua soberania. É verdade que George W. Bush está reagindo contra isso. Mas uma operação complexa como a de terça-feira não poderia ser improvisada nos meses que se seguiram à posse do novo presidente. O ataque não veio em reação às atitudes enérgicas de Bush, mas, muito antes disso, foi planejado para aproveitar as complacências suicidas da administração Clinton. E aproveitou.

De outro lado, não há sistema defensivo imaginável que possa prevenir ataques terroristas do tipo que se viu em Nova York e Washington. Se eles acontecem nos EUA e não na China, em Cuba ou no Iraque, é simplesmente porque só regimes ditatoriais treinam fanáticos para operações “kamikaze”. Não há portanto nenhuma vulnerabilidade em especial a ressaltar no caso. Apregoá-la é mentira calculada para desacreditar os EUA, mostrando-os como país rico e fraco, de modo a transmutar, na alma dos povos, a admiração em inveja rancorosa e o temor em ódio agressivo.

Essas duas opiniões, repetidas na nossa mídia com uniformidade exemplar, não são interpretações ou explicações de um ato de guerra: são parte integrante dele. Seus divulgadores não se distinguem, moralmente e talvez nem politicamente, dos planejadores e executores da operação assassina.

 

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