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Golpistas e vigaristas

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 14 de junho de 2007

Os blogs vão acabar matando a grande mídia, se ela não tomar jeito. É a eles que temos de recorrer quando queremos notícias genuínas em vez de fingimento bem-pensante. Já falei aqui da “Nota Latina” ( http://notalatina.blogspot.com ), que considero a melhor e quase única fonte de informações seguras sobre o movimento comunista no continente. Agora me aparece outro, http://jaelsavelli.blogspot.com/ , que não hesita em fazer, a respeito do alegado perigo homofóbico que assola o país, o cálculo comparativo que nem o governo, nem o jornalismo chique, nem os tagarelas acadêmicos e parlamentares ousaram jamais fazer, porque se o fizessem cortariam no ato sua própria língua mentirosa e falaz.

Aí vai:

1) O Grupo Gay da Bahia informa que “ entre 1980-2005, foram assassinados no Brasil 2.582 homossexuais” (fonte: http://www.ggb.org.br/assassinatos2005c.html ).

2) O governo federal informa que “nos últimos 25 anos ocorreram aproximadamente 800 mil assassinatos no Brasil” (fonte: http://www.camara.gov.br/sileg/integras/398227.pdf ).

3) O Grupo Gay da Bahia e o governo, juntos, informam que “os gays representam cerca de 14% da população brasileira: 24 milhões” (fontes: IBGE e http://www.ggb.org.br/moviment_glbt4.html ).

O leitor tenha a bondade de fazer as contas e verificar que, segundo esses dados, o número de homossexuais assassinados corresponde a 0,3 por cento do total de vítimas de homicídios no Brasil.

Ora, a comunidade que abrange 14 por cento dos brasileiros mas só 0,3 por cento dos assassinados é exatamente o contrário de uma comunidade de risco, sob o ponto de vista policial. É uma das comunidades mais seguras, mais protegidas deste país. Com razão ela se denomina “gay”: é uma das poucas que tem motivo para estar alegre numa população que vive em permanente estado de luto.

Seus líderes, porta-vozes e advogados não podem alegar ignorância desse dado, pois são eles mesmos que o publicam. Se, não obstante, insistem em apresentar essa comunidade como vítima de violência endêmica, como necessitada não só de proteção extra mais de legislação especial que lhe permita criminalizar e mandar à cadeia todos os que não gostem dela, a conclusão é óbvia: cometem fraude consciente, deliberada, com a finalidade de transformar riscos inexistentes em instrumentos para dar à comunidade gay um status social ainda mais privilegiado do que já tem.

“Privilegiado” é eufemismo. Já expliquei em outro lugar ( http://www.olavodecarvalho.org/semana/070604dc.html ) que, pela amplitude da sua área de aplicação, a lei dita “anti-homofóbica” dará à militância gay um poder repressivo e intimidatório praticamente ilimitado, transformando-a num temível instrumento de chantagem nas mãos de seus mentores e aliados no governo federal e nos partidos de esquerda.

Se, ademais, a implantação dessa monstruosidade vem por meio da mentira e do engodo, então é claro que estamos diante de uma conspiração criminosa das mais perversas, astuciosas e bem camufladas que um grupo golpista já ousou tramar contra as garantias democráticas neste país.

Debater o caso sob o ângulo moral, religioso ou sexológico é discutir o sexo dos anjos, talvez também dos demônios, das sombras do Hades e até dos ectoplasmas. É alienação completa. Pois não é de sexo, de moral ou de religião que se trata nessa lei abjeta – é de poder, e poder sem limites. Duvido muito que a maioria dos homossexuais, no entusiasmo de suas paradas carnavalescas, tenha a menor idéia, seja da perversa engenharia política a que serve, seja do engodo publicitário montado para explorar, com esse fim, seus temores e seu esprit de corps . Mas também duvido que os adversários da lei, inflamados na defesa de seus valores tradicionais, tenham a serenidade e o tirocínio para acertar o dedo na ferida. Atiçando as paixões polêmicas, desviando as atenções para a questão abstrata e extemporânea do “pró e contra o homossexualismo”, o pequeno grupo de espertalhões golpistas coloca a seu serviço, simultaneamente, duas multidões de otários.

Prepotência gay

Olavo de Carvalho


Jornal da Tarde, 18 de julho de 2002

Comentando o plano de d. Stella Goldenstein, secretária municipal do Meio-Ambiente, de oficializar como área gay o ponto de prostituição masculina no Parque Ibirapuera após lindamente remodelado com verbas públicas, o sr. Gilberto Dimenstein escreve na Folha de S. Paulo de 11 de julho:

“Numa cidade em que os homossexuais fazem as maiores manifestações públicas…, eles ainda não conseguiram uma área pública onde não se sintam ameaçados ou constrangidamente tolerados.”

É a exata inversão da realidade. Quem percorra as ruas Vieira de Carvalho e Aurora, o Largo do Arouche e imediações, bem no centro da capital, a poucos metros da redação da Folha, verá que quem ali se sente ameaçado ou mal tolerado são os não-gays. Lembro-me de ter passado pelo local em companhia de uma jovem, negra e de família humilde, moça de elevada inteligência e moralidade, que foi minha empregada doméstica e se tornou minha aluna. A infeliz, no meio do carnaval ruidoso de machos que se esfregavam espalhafatosamente, ficou aterrorizada. Num mundo dominado por aqueles gays, gente como ela seria marginalizada e reduzida à mais opressiva infelicidade. E essa gente é simplesmente o povo brasileiro, povo esforçado, religioso e sem pretensões a uma vida de gratificação sexual permanente, aspiração que está subentendida na idéia mesma de um movimento político fundado em preferências sexuais. Era esse povo que ali era escandalizado e humilhado. Também não haverá lugar para ele no jardim das delícias de d. Stella Goldenstein.

Se um heterossexual, mesmo com a desculpa da excitação genésica incontrolável, ostentasse em público um décimo do que os gays ali se permitiam em matéria de impudência e de mau-gosto, seria imediatamente preso por atentado ao pudor. Não há rua ou praça da cidade onde casais de homem e mulher possam se entregar livremente ao lúbrico agarra-agarra que ali se impõe como espetáculo obrigatório ao transeunte. Muito menos onde possam fazê-lo sob a proteção da autoridade, pronta a dar voz de prisão a quem ouse perturbar seus afazeres eróticos. O que D. Stella Goldenstein pretende conceder aos gays não é um direito: é um odioso privilégio de casta.

Não é preciso dizer que tenho horror a qualquer tipo de opressão moralista, e a coisa mais óbvia do mundo é que ninguém deve ser submetido a constrangimento por conta de preferências sexuais. Porém é igualmente óbvio que o movimento gay não reivindica o simples direito de estar livre de constrangimentos. Exige o direito de constranger a seu belprazer o restante da população, por meio de sua conduta marcada por um exibicionismo histriônico que brota menos da homossexualidade (a qual não tem por que ser menos discreta que qualquer outra afeição erótica) que de uma tática política e publicitária calculada para impor pela agressão psicológica novos padrões de comportamento e sufocar na camisa-de-força da chantagem emocional, da autovitimização fingida, qualquer reação que se esboce contra eles. O primeiro movimento a usar dessa tática foi o fascismo. E funcionou. Em poucos anos os camisas-pretas, que eram alvo de riso, tornaram-se objeto de respeitoso temor. Venceram a discriminação, discriminando o resto do mundo. É o que d. Stella pretende ajudar os gays a fazer, financiando a operação com dinheiro público, se não for detida por um súbito e improvável acesso de bom-senso. Esse acesso poderia ser induzido artificialmente na mente da Sra. secretária pela leitura de “Pink Swastika”, de Scott Lively e Kevin Abraham, que mostra as raízes da prepotência gay na afinidade e longa parceria histórica entre ideologia homossexualista e nazismo. Mas duvido que d. Stella aceite a sugestão de ler esse livro. Há coisas que uma pessoa simplesmente não quer saber. Outras pessoas, no entanto, querem. Um dos autores do livro, Kevin Abraham, quis saber por que raio os ativistas gays, quando não tinham o que responder aos seus argumentos, tratavam de sair da encrenca chamando-o de nazista — logo a ele, um judeu ortodoxo. Ele quis saber por que eles tinham essa obsessão de nazismo. Foi investigar e descobriu. Mas o que ele descobriu talvez seja horrível demais para d. Stella.

Quanto ao sr. Dimenstein, ele também parece ter sobre este caso aquele tipo de opinião formada que se tornou imune aos fatos. De outro modo, como poderia ignorar tão solenemente o que se passa numa região central da cidade, bem ao lado do seu local de trabalho?

De Stalin a Madonna

Olavo de Carvalho

Época, 8 de julho de 2000

Invasões de terras e passeatas gays:
o que há de comum entre o discurso sobre a fome e a luxúria?

O receituário da pseudocultura contemporânea manda repetir diariamente, em doses regulares, por via oral e escrita, a fórmula-padrão segundo a qual a miséria crescente nos coloca à beira da revolução social. Muito eficaz para eleger deputados e investir de uma autoridade sacramental e profética os comentaristas de TV, essa fórmula só falha numa coisa: em descrever a realidade. Nem nossa miséria é crescente, nem a miséria crescente, onde existiu, produziu jamais revoluções.

De um lado, quase 100 milhões de brasileiros vivem hoje entre o médio, o bom e o ótimo. E se restam 8% ou 9% de indigentes, que os relatórios internacionais denunciam com falsa indignação para nos infundir culpa e vergonha, isso prova apenas que uma nação poderosa e criativa conseguiu tirar da miséria, nas últimas quatro décadas, 30% de sua população – uma realização maior que a de todos os New Deals e Planos Qüinqüenais conhecidos.

De outro lado, revoluções não acontecem nunca em países de economia declinante, nem são jamais efeitos da pobreza. Elas ocorrem quando uma prosperidade ascendente se junta a uma excessiva centralização do poder.

Essa mistura é explosiva: a expansão do aparato administrativo, jurídico e educacional sustentado por impostos altos cria uma nova classe de burocratas e intelectuais e, dando-lhes um poder crescente, desperta neles a ambição do poder ilimitado. É justamente essa classe, a principal beneficiária da situação, que faz as revoluções. Quando descobre que não precisa mais respeitar fortunas, prestígios ou tradições, que agora pode fiscalizar, multar, atemorizar, acusar, denunciar, chantagear, ela já não se contenta com isso: quer prender, saquear, fuzilar.

Foi assim na França, na Rússia, na China, em Cuba. As revoluções são a revolta dos novos predadores contra suas vítimas, que nunca são dóceis o bastante. Quem estranha que a esquerda nacional seja composta essencialmente de funcionários públicos e de letrados em vez de proletários é quem não sabe que todas as esquerdas revolucionárias foram assim. As esquerdas proletárias são reformistas, prudentes, conservadoras.

Mas, se isso mostra a falsidade da fórmula que mencionei acima, mostra também por que a miséria, apesar de declinante, se torna a cada dia mais vistosa. A miséria é a única justificativa moral razoável para virar o mundo do avesso. Quando ela diminui, o discurso legitimador das revoluções perde o gás.

Urge, portanto, alardeá-la. Se ela acabar, não sobrarão para ser explorados pelo discurso revolucionário senão pretextos menores, postiços, fúteis: brigas de marido e mulher, insatisfações sexuais, picuinhas de raça, enfim, toda a bobajada residual com que as rodas de intelectuais revolucionários, nos países ricos, suprem sua extraordinária falta de assunto. Mas nem a miséria acabou, nem estamos tão longe do Primeiro Mundo que não possamos sonhar com luxinhos.

Por isso nossos intelectuais revolucionários hesitam, oscilando entre o estilo João Pedro Stedile e o estilo Marta Suplicy, entre Stalin e Madonna, entre invasões de terras e festas gays: não sabem se exigem pão para quem tem fome ou uma apoteose de luxúria para quem tem tudo.

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