Olavo de Carvalho
Diário do Comércio, 13 de julho de 2010
Talvez seja preciso estar na América Latina para enxergar este fenômeno e crer nos próprios olhos: o fracasso econômico do socialismo e o desmantelamento da URSS não debilitaram no mais mínimo que fosse o movimento comunista. Transmutado, reorganizado, investido de novas estratégias de uma complexidade e sutileza alucinantes, ele avança com passo mais seguro que nunca, subjugando nação após nação, consolidando seu domínio nos organismos internacionais, nos órgãos de mídia, nas instituições de alta cultura e no sistema judiciário até mesmo dos países que mais valentemente se opunham ao comunismo uma década e meia atrás. O mais impressionante de tudo foi a rapidez com que cacoetes mentais e critérios automáticos de julgamento criados por ideólogos comunistas para desmantelar a cultura adversária se impregnaram, com força hipnótica, nos círculos de “formadores de opinião” em todo o Ocidente, erigindo uma formidável barreira de preconceitos paralisantes contra qualquer veleidade de anticomunismo. Em menos de quinze anos, cada item do programa comunista, com nome apenas levemente alterado, se impôs ao mundo como um dogma inatacável, sacrossanto, imbuído da autoridade moral de tudo julgar e condenar sem poder jamais ser ele próprio submetido a exame. O simples ato de denunciar a origem comunista desses slogans e chavões é estigmatizado como prova de fanatismo ou paranóia. Mesmo homens que jamais desejariam vê-los postos em prática se esmeram em protegê-los dos ataques da “extrema direita”, termo redefinido para abranger tudo o que esteja à direita do centro – um centro que se move cada vez mais para a esquerda.
Investida do privilégio do inomeável, a ação comunista torna-se invisível e onipresente ao ponto de poder com a maior facilidade debitar seus próprios crimes na conta do adversário, induzindo-o a lutar contra si mesmo no momento em que ele mais precisaria reunir forças para resistir ao ataque. Em muitos países do Ocidente, a investida islâmica, apoiada e municiada pelos comunistas, desencadeou uma onda de ódio, não ao Islam, mas à religião em geral e, para cúmulo de absurdo, especialmente à cristã, fazendo com que muitos povos reneguem a única tradição religiosa que jamais possuíram, a única que poderia restaurar seu senso de unidade cultural sem o qual toda resistência se mostra impossível. Essa reação autodestrutiva não é, decerto, espontânea. Como já se repetiu tantas vezes na História, um exército de liberais “progressistas”, embriagado de abstratismo doutrinal e cego ante a realidade histórica concreta, se aproveita da confusão do momento para tentar novamente destruir seu desafeto de sempre, sem querer ver que, com isto, só fomenta a derrota geral e o advento de uma tirania que, com toda a certeza, estará nos antípodas de todo liberalismo. Sun-Tzu ensinava que o segredo da vitória é conhecer o adversário e conhecer-se a si mesmo. Com a ajuda dos “progresistas”– por desgraça, os dominadores absolutos da mídia ocidental –, o front comunista-islâmico logrou fazer com que o adversário o ignore e se ignore a si mesmo, ao ponto de querer furar alegremente os próprios olhos na véspera da batalha decisiva.