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Monstruosa e abrangente estratégia

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 11 de janeiro de 2008

Um artigo da Tribuna da Imprensa, significativamente reproduzido no site do Ministério da Ciência e Tecnologia ( Países da Amazônia tentam se unir) informa que um acordo militar entre Brasil e Venezuela já vem sendo negociado sigilosamente desde há um ano e meio. Segundo o articulista, Carlos Newton, o acordo parece ter sido inspirado pelo desejo de “proteger a Amazônia” contra os riscos iminentes representados pela Declaração dos Povos Indígenas, assinada em setembro de 2006, bem como por um suposto plano do governo britânico, denunciado pelo Daily Telegraph um mês depois e ecoado com grande alarde pela Folha de São Paulo em 10 de outubro daquele ano, que visava à completa privatização da Amazônia para evitar o desmatamento e combater as emissões de gases-estufa. Comentando a matéria da Folha, o site esquerdista http://outraglobalizacao.blogspot.com alertava que a proposta inglesa podia ser “apenas a ponta de um iceberg “. Na verdade, ela encobriria um plano maligno para manter a hegemonia dos EUA mediante mudanças na matriz energética mundial.

As premissas implícitas das interpretações apresentadas nessas matérias são as seguintes:

1) O esquema globalista ecológico-indigenista é um instrumento a serviço dos EUA.

2) A esquerda latino-americana, personificada no caso pelos governos do Brasil e da Venezuela, é o baluarte da resistência patriótica ao esquema globalista.

Ambas essas premissas são comprovadamente falsas. De um lado, o conflito aberto entre o interesse nacional americano e as ambições globalistas são hoje o tema essencial de preocupação nos círculos conservadores americanos (A leitura do livro de Jerome Corsi, The Late Great U.S.A., WND Books, 2007, e consultas periódicas ao site http://www.sovereignty.net/ bastariam para tirar qualquer dúvida quanto a esse ponto). De outro lado, o governo petista e a esquerda nacional como um todo têm se notabilizado pela sua extrema subserviência às exigências do globalismo ecológico e indigenista (v. por exemplo Os amigos da onça ). O pacto militar Lula-Chávez – materialização final de um eixo cuja existência a esquerda nacional inteira negava como “invencionice imperialista” (v. Desculpe, Dr. Menges ) – não se destina às finalidades que alega, mas apenas a prestar serviço ao globalismo, usando as forças militares nacionais como instrumento para a política anti-americana que é o item principal do cardápio globalista. Complementando magistralmente o lance, o Sistema Nacional de Mobilização (Sinamob) acena às Forças Armadas com a possibilidade de aumentos substanciais do orçamento militar à custa de desapropriações maciças que ameaçam transformar o país, do dia para a noite, em uma república socialista.

Trata-se, evidentemente, de um plano integrado, abrangente e complexo, destinado a alcançar em breve tempo, e todos de uma vez, vários objetivos da revolução latino-americana:

1) Unificar militarmente Brasil e Venezuela.

2) Colocar as Forças Armadas nacionais a serviço da revolução continental.

3) Fortalecer o esquema globalista mediante a debilitação do seu principal adversário, o poder nacional americano.

4) Transformar legalmente a propriedade privada em concessão provisória do Estado, revogável ao menor sinal de ameaça à “segurança nacional”.

Ignorando tudo dessa monstruosa iniciativa estratégica, muitos dos nossos liberais e conservadores preferem continuar com seus ataques minimalistas a detalhes fiscais e administrativos do governo petista, e acham que são temíveis.

Desproporção monstruosa

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 03 de janeiro de 2008

A ordem de prisão emitida por um juiz italiano contra participantes da “Operação Condor” é a prova mais evidente de que o assalto contínuo à honra dos militares latino-americanos não é um aglomerado casual de “revanchismos”: é uma operação estratégica montada em escala internacional para atemorizar, desfibrar e subjugar as Forças Armadas do continente, colocando a serviço da revolução lulo-chavista o que reste delas no fim de um longo rosário de humilhações.

Essa operação articula-se, por oposição dialética, com a penetração de simpáticos e risonhos intelectuais de esquerda nos meios militares, de modo que a pressão de fora seja complementada desde dentro pela oferta de acomodações sedutoras, que os mais sonsos interpretam como sinal de reconciliação genuína. Estender a mão a quem se arroga o direito de mordê-la é mover guerra assimétrica contra si próprio. Tal é a principal atividade bélica em que o governo esquerdista deseja adestrar as nossas Forças Armadas.

A aberração mais chocante da política mundial é que, depois de extensamente revelados os crimes contra a humanidade praticados pelos regimes comunistas, não só seus autores tenham sido poupados de prestar contas, mas seus cúmplices nas democracias ocidentais continuem tendo espaço para brilhar na política, nas cátedras e no show business e passar pitos na sociedade livre, como se fossem modelos de santidade.

Mesmo o nosso regime militar não teve a coragem de acusar os comunistas pela cumplicidade ativa com governos genocidas, limitando-se a persegui-los por atos locais de terrorismo, isto é, a combater não o horror em si, mas apenas um de seus métodos.

A impunidade absoluta que o comodismo do establishment ocidental garantiu a esses celerados fez com que, em vez de se envergonhar de seus crimes, eles ganhassem redobrada confiança na lindeza de seus feitos hediondos, organizando-se para fazer o “longo braço da revolução” cair como um raio sobre quem quer que tenha cumprido o dever de combatê-los.

A mídia consagra a inversão, qualificando, por exemplo, de “operário” o terrorista italiano Libero Giancarlo Castiglia, de “seqüestro” a sua prisão pelas autoridades brasileiras (aliás não confirmada).

Ora, mesmo descontadas suas atividades na guerrilha do Araguaia, que não eram de natureza filantrópica, Libero Castiglia era um militante do PC do B. Sabem o que isso significa, na escala real das coisas? A simples existência do PC do B é um escândalo que brada aos céus, tanto quanto o seria a de um partido nazista ou de uma filial brasileira da Al-Qaeda. Membro devoto de uma rede internacional de apoio ao comunismo chinês, esse partido é co-responsável pelos crimes da ditadura mais sanguinária e genocida que o mundo já conheceu, cujo rol de vítimas não fica, segundo os estudos mais recentes, abaixo da cifra de setenta milhões de pessoas (v. Reevaluating China’s Democide to be 73,000,000).

Qualquer agressão que seus membros tenham sofrido, por mais condenável que seja em si mesma, é um nada em comparação com a crueldade sem fim que eles nunca cessaram de promover e legitimar (v. uma pequena amostra em La prisión de Jilin usa “camas mortales” para torturar a practicantes de Falun Gong) e pela qual não deram jamais o menor sinal de arrependimento.

Não tem sentido investigar com tanta dedicação delitos menores enquanto se lança um véu de esquecimento sobre os maiores. O senso das proporções não é um simples componente da Justiça. É a própria Justiça.

Três lições inesquecíveis

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 15 de novembro de 2007

O espetáculo reconfortante da humilhação pública do sr. Hugo Chávez foi um dos mais instrutivos das últimas semanas. Com ele aprendemos três lições: sobre o que é democracia, sobre o que é um rei e sobre como funciona (ou não funciona) a cabeça de um revolucionário. A primeira delas devemos ao presidente José Luis Zapatero, a segunda a Juan Carlos de Bourbon, a terceira ao próprio sr. Chávez.

(1) Ao exigir o respeito devido ao seu antecessor José Maria Aznar, que ali fôra ofendido por um orador insolente, o sr. Zapatero mostrou a diferença – que nem sempre há, mas deveria haver — entre esquerda democrática e esquerda revolucionária. Esta última acredita que seus projetos sociais são tão sublimes que fazem dela “o primeiro escalão da espécie humana”, como dizia Che Guevara, condição que a autoriza a ignorar solenemente os deveres morais e legais que pesam sobre as pessoas comuns e a investe do direito de mentir, trapacear, roubar e matar ilimitadamente em nome das belezas imaginárias de um futuro hipotético. Já a esquerda democrática, consciente da fragilidade das idéias humanas, pode lutar pelos seus projetos com entusiasmo, mas sabe que eles valem menos do que a regra do jogo em que concorrem com os do adversário. Para o revolucionário, só o que importa é modificar a sociedade – se não a natureza humana — de maneira integral e irreversível, passando por cima de tudo e de todos. O democrata, de direita ou de esquerda, sabe que nenhuma mudança introduzida por um governo é tão inquestionavelmente boa que deva a priori estar vacinada contra a possibilidade de que o governo seguinte a reverta. Zapatero mostrou que, na ordem democrática, ninguém tem a última palavra.

(2) Um rei não é um governante. É o comandante vitalício das Forças Armadas, o garantidor da autoridade dos governos sucessivos, o guardião de uma ordem que permanece enquanto os políticos passam. Com sua inesperada intervenção, o rei Juan Carlos não entrou no mérito do assunto em debate. Apenas garantiu, contra a insolência de um monólogo ditatorial histérico, o direito do seu chefe de governo à palavra. Não faltarão na mídia brasileira desinformantes cínicos o bastante para tentar impingir ao leitor um relato invertido, fazendo de Chávez o indiozinho indefeso, oprimido pela prepotência do colonizador. Mas a seqüência das imagens mostra claramente que foi Chávez o primeiro a oprimir o interlocutor, só se detendo, atônito, ante a entrada em cena de uma personalidade mais forte. Se as palavras dessa personalidade foram exemplarmente abruptas e cortantes, isso só mostra que não é próprio da função real tagarelar, mas tapar a boca dos tagarelas que se arrogam o monopólio da fala.

(3) Quanto ao sr. Hugo Chávez, fazendo diante da reprimenda aquela expressão inconfundível de perplexidade e medo, mostrou algo que há anos venho dizendo: todos esses líderes revolucionários, a começar por Fidel Castro, pelos chefes das Farc e pela multidão dos nossos terroristas indenizados por seus próprios crimes, são indivíduos fracos, covardes, frouxos, bons para atirar em manifestantes desarmados ou para matar pelas costas adversários desprevenidos, mas incapazes de qualquer ato de genuína coragem, que por definição é sempre um ato solitário. Valentes diante dos holofotes ou fortalecidos pela proteção de uma rede internacional de cúmplices, tão logo se vêem abandonados à própria sorte só o que sabem fazer é implorar como Che Guevara: “Não me matem! Não me matem!” Mostra-me os teus heróis e eu te direi quem és.

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