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Touraine, por qué no te callas?

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 19 de maio de 2008

Em recente entrevista à France-Presse, em Lima, o mundialmente célebre sociólogo francês Alain Touraine disse que “a América Latina caminha para a direita”. O argumento que ele apresentou para justificar uma afirmativa tão extravagante foi que “nenhum dos países da região fez reformas para reduzir a desigualdade”.

A ciência política nasceu quando Platão e Aristóteles distinguiram entre o discurso do agente político que quer produzir certos efeitos práticos e o discurso teorético do estudioso que quer apenas compreender a ação política. Decorridos dois mil e quatrocentos anos, ainda há quem se esforce para apagar essa distinção, de modo a que o olhar atento do filósofo não constitua obstáculo à ação política baseada na confusão e no erro. Hoje em dia esse esforço é premiado com honras acadêmicas e aplausos da mídia, constituindo mesmo tudo o que um cidadão precisa fazer para celebrizar-se como cientista político.

“Direita” e “esquerda” são termos que podem ser usados seja por um observador para descrever entidades políticas concretas, seja por essas mesmas entidades para definir-se a si próprias ou a seus adversários. Têm, portanto, três camadas básicas de significado. São, em primeiro lugar, nomes de grupos políticos atuantes, perfeitamente identificáveis. Em segundo lugar, nomeiam um conjunto de ideais e valores, reais ou fictícios, alegados para legitimar as ações desses grupos. Em terceiro lugar, e com emprego inverso, constituem o nome de vícios e crimes que cada um dos grupos imputa ao respectivo adversário. Só o primeiro desses três sentidos corresponde diretamente a uma realidade objetiva: os outros dois são expressões simbólicas de emoções e preferências subjetivas.

Deixar claro em qual desses três sentidos as expressões estão sendo usadas é um dever que incumbe até mesmo às pessoas empenhadas na pura ação política, quanto mais ao estudioso acadêmico. Confundir os significados é a obra dos demagogos e charlatães.

Na primeira das três acepções, “esquerda” é o nome das entidades que sustentam a política de Lula, no Brasil, de Hugo Chávez, na Venezuela, de Evo Morales, na Bolívia, etc. Na segunda acepção, representa o conjunto de pretextos ideológicos que legitimam essa sustentação, o mais veemente dos quais é a promessa de “reduzir as desigualdades”. Na terceira, expressa a auto-imagem desses grupos enquanto inimigos da “direita”, identificada, para fins de propaganda, como criadora e beneficiária da desigualdade.

Nos países latino-americanos presentemente governados pela esquerda, os partidos que ela denomina “de direita” — dos quais alguns se autodefinem como tal e outros não — encontram-se cada vez mais distanciados não só do poder como da mera possibilidade de alcançá-lo um dia, tal a força dos mecanismos repressivos e de controle, ostensivos ou sutis, que a esquerda dominante mobilizou contra eles.

Em segundo lugar, a esquerda latino-americana está organizada supranacionalmente, através do Foro de São Paulo e da sua bem azeitada rede de contatos, que lhe tem propiciado vitórias em cima de vitórias, enquanto os partidos de direita se limitam a reações locais e inconexas, incapazes de fazer face a uma estratégia continental unificada. Muitos desses partidos encontram-se tão debilitados que já temem ostentar o rótulo de direitistas e buscam adaptar-se ao esquerdismo triunfante por meio de toda sorte de concessões pusilânimes e mimetismos simiescos.

Mais ainda, as organizações de esquerda, apoiadas por fundações bilionárias, por organismos internacionais e pela grande mídia da Europa e dos EUA, tem hoje recursos financeiros com que nenhum partido de direita ousaria nem mesmo sonhar.

Por fim, o governo dos EUA, em vez de contrabalançar a situação ajudando os partidos latino-americanos de direita no seu próprio interesse, insiste na velha tática de buscar “conter a esquerda radical” por meio do apoio à “esquerda moderada”, ignorando solenemente a solidariedade profunda entre as duas esquerdas e ajudando a marginalizar e estrangular as poucas forças de direita e pró-americanas que possam restar no continente.

Nesse panorama, a coisa mais evidente é que a esquerda, como força concreta organizada, já domina a América Latina como nenhuma outra corrente política unificada jamais dominou antes, e que as perspectivas de afastá-la do poder são cada vez mais remotas e, a curto prazo, praticamente inexistentes.

Por outro lado, é um fato histórico inegável que a esquerda, justamente nos países que dominou da maneira mais completa e incontrastada, como a URSS, a China ou Cuba, não só fez pouco ou nada para reduzir as desigualdades, como realmente as aumentou. Tanto do ponto de vista político quanto do econômico, a distância entre os privilegiados e a massa popular aí cresceu a um ponto que o cidadão comum das democracias mal pode conceber, mas que se mede em números: jamais se morreu de fome, no mundo, como se morreu nessas nações governadas por nababos revolucionários. Em matéria de fome e miséria, nada, nos países capitalistas, ou mesmo na maior parte das colônias das antigas potências européias, se compara ao que se passou na Ucrânia em 1932-33 ou na China durante o “Grande Salto para a Frente”.

Definir a esquerda pela “luta contra a desigualdade” é defini-la pelo seu discurso de auto-exaltação ideológica exclusivamente, vendendo como realidade atual e concreta o que é somente um slogan publicitário e uma promessa jamais cumprida. Isso não é ciência, é vigarice intelectual. Vigarice tanto mais intolerável quando acoplada à fraude semântica complementar e inversa que, recusando à direita o privilégio conferido à esquerda, de autodefinir-se por seus ideais nominais, a define pelos males e pecados que a esquerda lhe imputa.

Mas fazer desse truque imoral o fundamento para o diagnóstico de uma situação política concreta, saltando da mera confusão proposital de conceitos à falsificação de um estado de fato, já é ir além da pura vigarice, é abdicar da condição de intelectual e rebaixar-se ao nível dos demagogos mais chinfrins e desprezíveis.

Além de camuflar o poder da esquerda sob o falso alarma de uma guinada à direita, desviando as atenções gerais de um desastre atual e presente para um perigo remoto e fictício, o prof. Touraine transforma em propaganda esquerdista aquilo que, pela sua substância fática, só poderia e deveria ser um ataque frontal à hipocrisia das organizações de esquerda, ao já proverbial cinismo com que, uma vez chegadas ao poder, elas só se ocupam em conquistar mais poder ainda, em vez de zelar pelo bem do povo que nelas confiou.

Não, o que define a esquerda, historicamente, não é a luta contra a desigualdade. É a luta pela concentração de poder político, sob o pretexto de combater a desigualdade. Foi isso o que se viu na Revolução Francesa, na Revolução Russa, na Revolução Chinesa, na Revolução Cubana e por toda parte onde a esquerda reinou sem ser atrapalhada pela presença da maldita direita. Mesmo nas nações democráticas, onde tem adversários a enfrentar, a esquerda busca sempre aumentar por todos os meios possíveis o poder da burocracia estatal. E, como a concentração do poder político concentra também necessariamente o poder econômico – motivo pelo qual os capitalistas monopolistas ajudam sempre a esquerda, não a direita –, a esquerda mundial deve ser definida estritamente, segundo a substância da sua realidade histórica, como a força política que há pelo menos dois séculos promove a desigualdade em nome da igualdade.

Nenhum cientista social, mesmo sem o prestígo do prof. Touraine, tem jamais o direito de tomar slogans como realidades, seja para favorecer o seu próprio grupo político, seja para denegrir o adversário.

Travessia perigosa

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 12 de maio de 2008

Em seu livro America and the World Revolution (Oxford University Press 1962), transcrição de conferências pronunciadas na Universidade da Pennsylvania na primavera de 1961 (tradução brasileira pela Zahar, 1963), Arnold Toynbee escreveu:

“Se queremos evitar o suicídio em massa, precisamos ter o nosso Estado mundial rapidamente, e isto provavelmente significa que precisaremos instaurá-lo numa forma não democrática, para começar.”

Não era uma profecia, era uma proposta. Ou melhor, era a reafirmação de uma proposta que já vinha sendo trabalhada nos altos escalões do establishment anglo-americano pelo menos desde 1928, quando Herbert George Wells publicou a primeira versão popular do plano, sob o título altamente sugestivo The Open Conspiracy. Alguns historiadores fazem o projeto remontar a finais do século XIX e apontam sua presença já entre as causas da I Guerra Mundial, mas nós não precisamos ir tão longe. Os melhores estudos sobre a vida e obra de Wells (W. Warren Wagar, H. G. Wells and the World State, Yale University Press, 1961; Michael Foot, The History of Mr. Wells, Washington DC, Counterpoint, 1995) não deixam dúvidas quanto ao papel desempenhado pelo autor de A Guerra dos Mundos na transformação de uma idéia geral num projeto político viável. Tal como Wells, Toynbee não foi apenas um intelectual, mas um ativista, colaborador íntimo do governo britânico e dos círculos globalistas. Sua obra monumental A Study of History (1939-1961) fornece a visão unificada do desenvolvimento histórico mundial, indispensável à preparação do terreno para o advento do governo mundial.

O estado mais recente de implementação dos planos traçados por esses visionários pode ser avaliado pelos seguintes parágrafos publicados no Taipei Times de 21 de fevereiro de 2006 (v. “State sovereignty must be altered in globalized era“) , aos quais nenhum comentarista político brasileiro prestou muita atenção embora seu autor fosse nada menos que Richard Haas, presidente do CFR, Council on Foreign Relations , o mais poderoso think-tank dos EUA e praticamente uma ante-sala da Presidência americana:

“Na era da globalização… os Estados têm de estar preparados para ceder algumas parcelas da sua soberania aos órgãos mundiais… Isso já está acontecendo no comércio…

“Alguns governos estão preparados para desistir de elementos de soberania para enfrentar a ameaça da mudança global do clima. Por um desses acordos, o protocolo de Kyoto, que vigora até 2012, os signatários concordam em eliminar certas emissões específicas. O que é preciso agora é uma ampliação do acordo, pela qual um número maior de governos, incluindo o dos EUA, da China e da Índia, aceitem limites às emissões e adotem padrões comuns por reconhecer que seria pior se nenhum país o fizesse.

“A globalização, portanto, implica não somente que a soberania está se tornando mais fraca na realidade, mas que ela deve mesmo se tornar mais fraca… A soberania já não é um refúgio.”

Observações:

1. O apelo sucessivo aos exemplos do comércio e da “mudança global do clima” mostra que o plano do Estado mundial tanto pode se legitimar como resposta unificada a problemas de escala internacional, quanto pode espalhar ele próprio uma onda alarmista em torno de problemas inexistentes para se legitimar por meios postiços e fraudulentos. Em 2006 o slogan “aquecimento global” ainda podia parecer um aviso de amigo. Decorridos dois anos, não só milhares de cientistas contestam abertamente esse dogma, mas até crianças de escola estão aptas a desbancar a lenda imposta ao mundo pela campanha bilionária em que brilha como supremo garoto-propaganda o ex-vice-presidente americano Al Gore (v. “Al Gore’s global warming debunked – by kids!”).

2. Os procedimentos usados para impor as reformas globalizantes contornam as vias democráticas normais por meio de decisões tomadas em discretas comissões tecno-científicas e administrativas cuja atividade o público mal pode compreender (v. “Golpe de estado no mundo“). A rapidez mesma das mudanças torna impossível ao cidadão comum perceber o sentido dos acontecimentos. A “opinião pública”, que em geral já não passa mesmo de um conjunto de impressões vagas sem grande conexão com a realidade, torna-se então um mero instrumento para a implantação de mutações que ela própria não pode nem entender nem influenciar. O programa de Toynbee surge aí realizado da maneira mais clara: o Estado mundial não suprime a democracia, mas a engole. Ela continua existindo, mas como órgão de um corpo superior que a abrange e controla sem que ela tenha disso a menor idéia.

3. Se outros fatos que tenho citado em meus artigos não o comprovassem abundantemente, o caso do Protocolo de Kyoto basta para mostrar uma coisa óbvia que muitos dos nossos nacionalistas relutam em entender: que nem os centros de comando do poder globalista se encontram no governo americano, nem os interesses do Estado global se identificam no mais mínimo que seja com os do bom e velho “imperialismo ianque”. Da Califórnia à Nova Inglaterra, da Flórida ao Oregon, ninguém ignora que curvar-se à ampliação do Protocolo de Kyoto é destruir na base a economia americana, reduzindo os EUA à condição de potência de segunda classe. Nem escapa à atenção geral o fato de que outros projetos globalistas propugnados pelo CFR, como o Tratado da Lei do Mar ou a dissolução das Fronteiras com o México e o Canadá, completariam essa destruição e fariam da nação americana um capítulo encerrado da História. Curiosamente, o mais lúcido intelectual de esquerda no mundo, Antonio Negri, já explicou e repetiu mil vezes que “Império” e “Estados Unidos” não são a mesma coisa, que o Império global em formação é supranacional não somente nos objetivos mas na sua própria constituição interna (não que Negri tenha descoberto pioneiramente alguma coisa: com pequenas diferenças, o essencial da sua concepção do Império, publicada em 2000 pela Harvard University Press sob o título Empire , já estava todo no meu livro O Jardim das Aflições , de 1996). Mas o fato de que nem mesmo a palavra de um esquerdista ilustre baste para desfazer a confusão de globalismo e americanismo já mostra que muito do nacionalismo brasileiro é antes uma forma de atavismo doentio do que um patriotismo inteligente. A linguagem cotidiana da política reflete isso: embora o único Império que existe no mundo seja aquele a que se refere Negri, no Brasil usa-se o termo “Império” como sinônimo de “Estados Unidos”, seguindo nisso a retórica comunista de Fidel Castro (v. o artigo dele ““Nuestro espiritu de sarificio y el chantaje del Imperio”, de 25 de abril). Com isso, o grande e verdadeiro Império, do qual a esquerda latino-americana é um dos principais instrumentos, fica a salvo da hostilidade pública, voltada contra uma nação em particular, a qual por ironia – mas não por coincidência – é justamente aquela que maiores obstáculos oferece às pretensões imperiais.

4. O esquema globalista apoiado pelo CFR não é o único que existe. Há um globalismo russo-chinês, consolidado no Pacto de Solidariedade de Shangai (v. “Sugestão aos bem-pensantes: Internem-se“), que atua principalmente por duas vias: o financiamento ao terrorismo e o domínio de nações inteiras por intermédio da mais formidável máquina de corrupção que já existiu no mundo. E há o globalismo islâmico, que se expande através da imigração usada como arma de guerra cultural, numa eficientíssima estratégia de ocupação por dentro. As relações entre esses três esquemas de dominação são extremamente complexas e sutis. O Pacto de Shangai, por exemplo, apresenta-se como reação de esquerda ao “globalismo imperialista”, mas na verdade não se opõe a ele de maneira alguma, e sim apenas aos EUA, ajudando portanto o globalismo a minar a resistência americana (o cacoete lingüístico brasileiro acima mencionado é amostra local desse fenômeno). O esquema islâmico e o russo-chinês podem, até certo ponto, ser vistos como concorrentes entre si, mas aí também uma rede de atenuações e ambigüidades torna proibitiva toda simplificação esquemática.

5. Nenhum país pode “enfrentar” o globalismo avassalador, mas cada um tem a obrigação de se integrar nele da maneira mais proveitosa para o seu povo, sem nada ceder dos seus interesses vitais. Para isso, no entanto, é preciso uma elite intelectual altamente preparada, capaz de orientar-se nos meandros da mais vasta e complexa mutação histórica de todos os tempos. No Brasil essa elite não existe de maneira alguma, e a presunção de que as nossas instituições de ensino “superior” possam prepará-la é tão ridícula que nem merece discussão. Nos cursos que não foram reduzidos à condição de escolinhas de militantes, predomina o praticismo econômico mais rasteiro ou então o formalismo acadêmico que só sabe raciocinar em termos de instituições e doutrinas, sem ir jamais às questões fundamentais. Que eu saiba, o único brasileiro que está preocupado em formar essa elite sou eu mesmo, mas, como os senhores não ignoram, só posso trabalhar em escala miúda, proporcional aos meus recursos, isto é, à falta de recursos. O Brasil parece destinado a atravessar esta grande e perigosa época sem compreender para onde vai nem saber quem o leva.

Confusão e erro

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 09 de maio de 2008

Quando o governo americano resolveu apostar em Lula como freio para as pretensões de Hugo Chávez, o resultado era mais que previsível: sob uma cortina de sorrisos tranqüilizantes estendida pelo presidente brasileiro, a esquerda revolucionária latino-americana teria campo livre para crescer e dominar mais meia dúzia de países, sem que o Departamento de Estado opusesse a isso senão alguns resmungos anti-chavistas períodicos, pro forma e totalmente inofensivos.

Escrevi que isso ia acontecer, e aconteceu.

O simples fato de que a sra. Condoleezza Rice e o presidente Bush concentrassem seus temores na pessoa de Hugo Chávez, em vez de reparar na monstruosa articulação continental de esquerda montada pelo próprio Lula no Foro de São Paulo, já manifestava uma opção preferencial pela miopia, uma necessidade obsessiva de concentrar-se num detalhe para não enxergar o todo.

O CFR, Council on Foreign Relations, foi manifestamente culpado de fomentar esse monstruoso erro de avaliação, ao emprestar sua prestigiosa tribuna para que os srs. Luiz Felipe de Alencastro e Kenneth Maxwell negassem a existência do Foro de São Paulo, numa época em que as atas das assembléias dessa organização já estavam publicadas e à diposição de qualquer estudioso honesto. Um órgão da envergadura do CFR simplesmente não tem o direito de alimentar o governo com falsa informação, pois está consciente de que sua palavra é ali ouvida com reverência e temor.

Mas agora sabemos que o erro teve uma segunda origem ainda mais escandalosa: foi o próprio Lula que em 2005 ofereceu ajuda ao governo americano para “acalmar Chávez”. O emissário escolhido para levar a oferta já constituia, pela singularidade da sua pessoa, a prova mais patente de que não havia na proposta senão o intuito de acalmar, isto sim, o governo dos EUA, para que não prestasse atenção ao Foro de São Paulo e ao crescimento do seu poder avassalador. O portador não foi outro senão o então ministro José Dirceu, cuja lealdade à ditadura cubana — e portanto ao Foro de São Paulo, que é uma extensão dela — não advem só de sua imensa dívida pessoal para com o regime que o transformou de militante de segunda classe em comandante da esquerda armada brasileira, mas deve-se também a um laço de ordem profissional, de vez que o referido é oficial do serviço secreto militar cubano (um cargo ao qual o prefixo “ex”, quando não se trata de pessoa exilada, presa ou falecida, só pode ser acrescentado a título de desinformação ou de piada).

Um indício ainda mais direto de que se tratava de presente de grego foi fornecido pelo próprio José Dirceu, ao declarar à sra. Rice, na ocasião, que não havia nenhuma ligação entre Hugo Chávez e as Farc — ligação que hoje está mais que provada e que ele então não podia ignorar de maneira alguma.

Um terceiro fator que contribui para nublar a visão que o governo americano tem da política de Lula é a presteza e alegria com que este último cede às injunções dos investidores estrangeiros, dos bancos internacionais e do globalismo em geral. Como a relação entre esses poderes e o governo americano é ambígua e nebulosa, Lula pode parecer amigo dos EUA só por ser, mais que amigo, servo do esquema globalista, ao qual não hesitou em tentar ceder um estado inteiro da federação, a título de “república indígena”, só sendo impedido de fazê-lo pela reação patriótica das Forças Armadas brasileiras. Jornalistas a serviço desse esquema vendem a imagem de que um Lula globalista é, por definição, um parceiro dos EUA. Mas, se globalismo e interesse nacional americano fossem a mesma coisa, ninguém proporia algo como o Tratado da Lei do Mar, a sujeição dos presidentes americanos ao Tribunal Penal Internacional ou a dissolução dos EUA numa “Comunidade Norte-Americana”. A confusão, neste caso, é proposital. Mas isso só deveria constituir um motivo a mais para que um presidente americano sensato jamais caísse nela.

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