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Comparação

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 24 de março de 2008

Já fazia um ano que a revista Newsmax havia descoberto a ligação perigosa de Barack Obama com o pastor racista e pró-comunista Jeremiah A. Wright, Jr., quando a mídia chique por fim resolveu, timidamente, perguntar algo a respeito ao queridinho e intocável pré-candidato democrata. Daí por diante foi vexame atrás de vexame. Obama primeiro negou que conhecia as idéias do pastor, mas logo veio a prova de que sabia de tudo. Depois tentou embelezar a imagem do sujeito, mas os vídeos da pregação histericamente esquerdista e anti-americana começaram a circular pelo país inteiro. Por fim, todo mundo se deu conta de que a apresentadora Oprah Winfrey , a mais popular aliada de Obama, já havia prudentemente se afastado do pastor desde 2007, prevendo encrenca.

É uma mancha de batom na cuéca, como diria o falecido dr. Ulysses Guimarães. Não tem explicação que convença. A candidatura Obama despencou ruidosamente nas preferências do eleitorado democrata, e parece não haver guindaste que possa levantá-la. O comentarista de TV Sean Hannity, um dos que mais vigorosamente denunciaram a farsa, recebe diariamente centenas de mensagens de eleitores democratas agradecendo o aviso que os salvou do erro.

O que todos se perguntam agora, o que se discute acaloradamente na TV e no rádio é o papel feio a que tantos órgãos de mídia se prestaram, ocultando por meses a fio a história comprometedora para não manchar a reputação de seu candidato preferido. Mais do que com Obama, o público está furioso com o New York Times , a CNN, a CBS e, em geral, todo o presunçoso establishment jornalístico.

Ninguém ignora que, se o eleitorado americano costumeiramente se divide meio a meio entre democratas e republicanos, a proporção destes últimos na classe jornalística é de quinze por cento para menos – um abismo de diferença entre o público e a elite supostamente “formadora de opinião”.

O episódio Obama-Wright teve o mérito de fazer com que a consciência desse desequilíbrio ameaçador extravasasse em protestos gerais, mostrando que, com a credibilidade de Barack Obama, caiu também a da “grande mídia”, mais até do que já vinha caindo fazia mais de uma década.

Agora comparem isso com o que acontece no Brasil.

(1) Conservadores em sentido estrito inexistem nas redações. Na melhor das hipóteses há meia dúzia de socialdemocratas, que representam o máximo de direitismo permitido nesse ambiente seletíssimo, e são vistos por seus colegas como tipos anormais, tolerados apenas por formalismo jurídico.

(2) O que se ocultou na mídia brasileira não foi uma amizade espúria de um pré-candidato, mas a colaboração explícita e constante de um partido inteiro e de um presidente da República com dezenas de organizações comunistas, algumas delas envolvidas diretamente em atividades criminosas, especialmente narcotráfico e seqüestros.

(3) Esse escândalo dos escândalos não foi encoberto durante alguns meses, mas ao longo de pelo menos dezesseis anos.

(4) A grande mídia não se limitou a esconder os fatos, mas com freqüência se empenhou em negá-los explicitamente, até que o assunto se tornou objeto de atenção internacional e o muro de silêncio ruiu por si, de podre, de velho, de insustentável.

(5) O público, até agora, não deu o menor sinal de indignação ou revolta por ter sido enganado ao longo de tanto tempo. Chefes de redação, colunistas, repórteres soi disant investigativos, analistas políticos que, nos EUA, estariam totalmente desmoralizados — isto se não perdessem seus empregos nem sofressem processos judiciais –, continuam firmes nos seus postos, respeitadíssimos, bem remunerados, falando com a mesma voz de autoridade com que ludibriaram o povo durante mais de uma década e meia.

Evidentemente, esse povo já não tem mais a noção do que é imprensa livre, já nem faz mais idéia do que é o direito à informação, já se acostumou a pagar para que o enganem, já perdeu totalmente o senso da própria honra, já acha normal e justo que o façam de palhaço.

Alma de crocodilo

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 07 de março de 2008

Em contraste com a minguada votação pró-Chávez no último plebiscito, Álvaro Unibe é, dentre os governantes latino-americanos, o único que há anos se mantém, inabalável, acima dos oitenta por cento de aprovação popular, precisamente em razão do combate sem tréguas que move contra as Farc. Quem matou Raul Reyes não foi o governo Uribe: foi o povo colombiano.

Se, em compensação das suas ações militares firmes e decididas, o presidente colombiano é brando nas palavras e sempre disposto a negociar, é porque sabe que não tem contra si apenas um grupo narcoguerrilheiro e um ditador insano, mas uma poderosa organização de dimensões continentais – o Foro de São Paulo – e, mais ainda, um lobby internacional bilionário, onde todos os partidos de esquerda do mundo se aliam ao establishment “progressista” dos EUA. Os interesses que este último tem no caso não são só de ordem política, já que vem do narcotráfico boa parte do dinheiro que circula pela Bolsa de Nova York, cujo ex-presidente, Richard Grasso, tinha excelentes relações com o falecido Raul Reyes (v. Por trás da subversão). Também entram no quadro os recursos do petróleo venezuelano e os do financiador-mor da esquerda mundial, George Soros, que subsidiam inumeráveis carreiras de senadores e deputados norte-americanos. Por fim, não há como esconder que a própria OEA é hoje em dia uma espécie de circo chavista.

Falando manso para acalmar os leões, Álvaro Uribe tem conseguido sobreviver o bastante para poder pisar nas serpentes da narcoguerrilha sempre que uma delas deixa a cabeça à mostra. Segundo leio na “Notalatina” e nas mensagens de Heitor de Paola, respectivamente a melhor fonte de notícias sobre a subversão latino-americana e o melhor comentarista internacional do Brasil (ambos fora da grande mídia, et pour cause ), a cabeça de Raul Reyes veio à mostra por um descuido de Hugo Chávez, que em seguida, compreensivelmente, despejou sobre o vizinho colombiano e “los imperialistas” todo o ódio que sua própria mancada lhe inspirava (leiam tudo em http://notalatina.blogspot.com/ e www.midiasemmascara.com.br nos próximos dias).

Por outro lado, é claro que os apelos grandiloqüentes à “ordem internacional” que Uribe teria supostamente violado não têm nada de sincero: são apenas os trejeitos usuais da “guerra assimétrica”, que astutamente lança sobre um dos lados todo o peso das obrigações jurídicas e morais, enquanto ajuda o outro a camuflar a ilegalidade e imoralidade das suas ações. Quem, afinal, violou o espaço territorial alheio? O que cruzou a fronteira para caçar bandidos ou o que fornecia aos bandidos abrigo e ajuda para suas incursões criminosas no país vizinho? Amparando e armando as Farc, Equador e Venezuela vêm atacando o território colombiano há tempos, e nem uma palavra contra isso se ouviu jamais dos srs. José Miguel Insulza, Marco Aurélio Garcia e tutti quanti . É o mesmo que se passa no Oriente Médio: Israel está lá para levar bombas todos os dias, sob o plácido silêncio do mundo; ao mais mínimo sinal de revide, a “consciência jurídica internacional” cai de pau nos malditos judeus. Não há quem não tenha conhecido, na escola, um desses meninos safados que vivem batendo nos menores e, ao primeiro e tardio sinal de reação, saem lacrimejando e vão contar tudo para a professora. Alma de esquerdista é isso. Foram os esquerdistas que ensinaram os crocodilos a chorar.

Contando cadáveres

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 29 de fevereiro de 2008

Publicado na Veja desta semana, um artigo de Reinaldo Azevedo sobre os bajuladores nacionais de Fidel Castro provocou entre os referidos a clássica reação desproporcional de ódio insano, camuflado em indignação moral e vertido abundantemente em cartas à redação e e-mails ao blog do colunista. O que mais irritou os remetentes foi a comparação entre o número de vítimas da ditadura brasileira e as da cubana – quatro centenas aqui, cem mil lá, num país de população quinze vezes menor –, mostrando, pela enésima vez, que os protestos humanitários tão típicos da tagarelice esquerdista se baseiam na total inversão das proporções e numa reivindicação psicótica do direito ao genocídio abençoado.

Contra esses números que falam por si, o beautiful people fidelista reagiu em massa mediante argumentos que, somados, se resumem a dois, o primeiro enunciado pelo diretor teatral Gerald Thomas, o segundo pelo tom geral das mensagens. Esses argumentos são: (1) O colunista escreve essas coisas porque está insatisfeito sexualmente; (2) Contar cadáveres não vale. Dessas duas premissas, o cérebro coletivo daquela entidade ruminante tirava a seguinte conclusão: Demitam esse desgraçado.

Como essa investida grotesca imita outras tantas das quais eu mesmo já fui alvo e aliás pelas mesmíssimas razões, permito-me aqui acrescentar ao artigo de Reinaldo Azevedo três observações que, numa discussão séria do assunto – coisa que não se pode esperar de um Gerald Thomas e similares –, jamais deveriam ser esquecidas:

1. Quando os comunistas e seus amantes protestam contra a contagem de cadáveres, alegando que a quantidade não vem ao caso, eles o fazem porque sabem que seu partido é o recordista mundial de homicídios em massa. Abstraída a quantidade, os crimes do comunismo ficam parecidos com os de qualquer outra ditadura ou mesmo com os efeitos de erros acidentais ou de catástrofes naturais, camuflando sua fisionomia hedionda no confortável anonimato das generalidades. Reinserido no panorama o fator quantidade, o comunismo, como já afirmei, matou mais gente do que duas guerras mundiais, somadas a todas as ditaduras de direita, epidemias e desastres aéreos do século XX. É natural que os advogados de cliente tão ruim tenham de apagar da sua folha corrida o traço distintivo que faz dele aquilo que é: o mais temível flagelo que já se abateu sobre a espécie humana.

2. No exame da violência estatal, as comparações quantitativas são não apenas legítimas, mas indispensáveis e obrigatórias. Sem a quantidade, fica impossível distinguir entre homicídio e genocídio, entre crimes contra a pessoa e crimes contra a humanidade. Fazer abstração do fator quantitativo, como os esquerdistas invariavelmente fazem nessas discussões, é abolir toda a legislação internacional de direitos humanos, à qual no entanto eles mesmos apelam quando lhes convém, reduzindo-a a mero instrumento de propaganda.

3. No caso específico do Brasil e de Cuba, não se trata de uma comparação entre governos quaisquer, nem mesmo entre violência estatal “de direita” e “de esquerda”, mas da comparação entre dois exércitos em combate: de um lado, o Estado brasileiro; de outro, a guerrilha internacional planejada, comandada e subsidiada pelo governo cubano. Em todas as discussões do tema na mídia nacional, os guerrilheiros do MR-8, da ALN ou da VAR-Palmares são sempre apresentados como puros dissidentes internos, quando na verdade faziam parte de um organismo político-militar supranacional, a OLAS, Organização Latino-Americana de Solidariedade – antecessora do Foro de São Paulo –, que obedecia estritamente ao comando estratégico de um governante estrangeiro, o ditador Fidel Castro. Ora, num confronto entre um Estado e uma força militar fundada no exterior, a única possibilidade de uma tomada de posição moral responsável é examinar quem começou as hostilidades e qual dos lados representava a alternativa mais razoável e humana. Que a iniciativa agressora partiu de Fidel Castro, é coisa que ninguém tem o direito de ignorar desde que a historiadora Denise Rollemberg – insuspeita de direitismo – demonstrou que a guerrilha nordestina de 1963 já era subsidiada pelo governo cubano, sendo portanto uma fraude completa explicar a eclosão do terrorismo no Brasil como reação ao golpe militar que sobreveio meses depois. Quanto ao segundo fator, a contagem das vítimas de um regime e do outro – quatro centenas de guerrilheiros em comparação com cem mil civis desarmados – fornece o dado essencial para o julgamento justo da situação. O Brasil foi agredido por uma força comandada do exterior, orientada pelo regime mais brutal e homicida do continente. Que na resposta nacional houve excessos e que eles devem ser investigados e punidos, ninguém jamais duvidou. Mas a reação em si, tanto quanto o uso da violência militar para implementá-la, foi inteiramente justa, necessária e moralmente obrigatória. Só mentalidades deformadas pelo culto autolátrico da santidade esquerdista podem negar uma verdade tão patente.

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