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Meus caros críticos

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 1 de fevereiro de 2012

Dois exemplos de como se faz, no Brasil, o sério e aprofundado exame crítico das obras do Olavo de Carvalho:

Primeiro:

O economista Cláudio de Moura Castro disse certa vez na sua coluna da Veja que os brasileiros não lêem o que um autor escreve: lêem o que imaginam que ele pensou. Nada mais certo. Resta acrescentar que, não sendo eles próprios capazes de pensar senão segundo as correntes de opinião padronizadas que correspondem aos rótulos de partidos políticos, o que entendem por “interpretar” o pensamento de um autor consiste em inscrevê-lo, malgré lui, no partido que ele vagamente parece apoiar. Não raro essa genial proeza hermenêutica vem acompanhada da mimosa sugestão de que o infeliz recebe subsídios, modestos ou polpudos, do grupo político para o qual “trabalha”.

Da minha parte, já esclareci mil vezes que trabalho para o Diário do Comércio e que o faço com inteira liberdade, jamais tendo recebido da sua diretoria a menor insinuação quanto ao que devo louvar ou esculhambar nos meus artigos. Em vão. Meus dedicados intérpretes continuam tentando revelar meu empregador secreto, cada um deles repassando a informação com aquela piscadela de olho que, no seu entender, o identifica perante o mundo como detentor de valiosíssima inside information.

A hipótese mais recente, posta em circulação por alguns libertarians, é a que faz de mim um porta-voz dos neocons, não se sabe se pago a peso de ouro ou a preço de banana. O que me perguntei, ao ler isso, foi por que, com tanto amor aos neocons no meu coração, não convidei um só deles para membro do Inter-American Institute, preferindo, em vez disso, o mais feroz dos seus críticos, o prof. Paul Gottfried. Deve ter sido por esperteza, para camuflar minha filiação partidária.

Baseados nessa minha identidade ideológica, porém, os distintos não tiveram a menor dificuldade em interpretar à luz dela cada palavra que eu dissesse a respeito do que quer que fosse, confirmando circularmente a exatidão certeira do diagnóstico inicial. Assim, do fato de que eu defendesse o então presidente George W. Bush contra invencionices macabras postas em circulação no tempo do furacão Katrina, concluíram que, neocon como ninguém, eu também havia me tornado, coerentemente, “mais bushista que o próprio Bush”. Deve portanto ter sido também para fins de camuflagem que, ante a derrota republicana nas eleições de 2006, escrevi (v. http://www.olavodecarvalho.org/semana/061113dc.html):

Ninguém duvida de que o Partido Republicano pagou pelos pecados de George W. Bush, mas a rejeição nacional ao presidente tem muito menos a ver com a guerra do que com as atitudes dele com relação a gastos públicos, imigração e legislação eleitoral – e, nessas três áreas, ele não errou contra os democratas, e sim com o apoio entusiástico deles…

Mais motivo ainda para revolta o presidente deu quando violou ao mesmo tempo duas leis sagradas do conservadorismo, gastando um dinheirão do governo para aumentar a interferência estatal na educação infantil…

É ou não uma prova cabal da minha paixão mórbida por George W. Bush?

Segundo:

Você sabia que escrevo artigos para a Veja sob o pseudônimo de Ethan Edwards, o personagem de John Wayne no filme “The Searchers”?

Você sabia que sou o líder de um grupo trotsquista?

Você sabia que sou correspondente da Folha de S. Paulo em Washington, e que resido nos EUA com visto de jornalista concedido graças aos favores do sr. Frias?

Você sabia que, além dos meus próprios sites (www.olavodecarvalho.org, www.midiasemmascara.com.br, www.seminariodefilosofia.org e www.theinteramerican.org), dirijo em segredo uma rede de sites-fantasmas, simulando variedade de fontes para ocultar que tudo vem do meu cérebro maligno?

Você sabia que para produzir essa gigantesca empulhação faço uso de um software multiplicador que copiei da Atlas Foundation?

Você sabia que entre os falsos sites que criei e dos quais sou o mentor secreto estão a Folha de S. Paulo, a Veja, Instituto Millenium, De Olho na Mídia, Visão Judaica, Denny Marquesani, Luiz Gonzaga de Carvalho Neto, Instituto Olavo de Carvalho, Livraria Cultura, TFP, Padre Paulo Ricardo, José Carlos Zamboni, É Realizações, Ordem Livre, Ternuma, Unoamerica e Fuerza Solidaria?

Se não sabia de nada disso, não se sinta humilhado. Eu também não sabia. Fiquei sabendo graças ao tirocínio jornalístico do sr. Colin Brayton, um americano doido de pedra que mora em São Paulo (v. http://tupiwire.wordpress.com/2011/01/10/democracy-exportation-crosshairs-over-america-do-sul/). Ele não apenas fornece essas informações de primeira mão, como as fundamenta em vários diagramas, complicados e muito bem feitinhos, do tipo daquele que publiquei sobre o Observatório de Imprensa da USP (http://www.olavodecarvalho.org/semana/040929msm.html), com uma diferença: as parcerias que apontei não foram inventadas por mim, mas extraídas de dados do próprio site do Observatório. Infelizmente a criatividade diagramática do sr. Brayton veio tarde demais para ser consagrada nas exposições da falecida Dra. Nise da Silveira.

O sr. Brayton também jura que nunca falei para as platéias do Hudson Institute e da America’s Future Foundation e de outras entidades americanas, embora as fotos e documentos comprobatórios dessa minha atividade constem do currículo extensivo publicado no meu site (http://www.olavodecarvalho.org/english/life-and-works.html).

Ele afirma ainda que meu livro Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão foi plagiado de Schopenhauer, sem explicar o que poderia haver de plágio numa tradução comentada, com clara distinção entre os trechos do autor e os do comentarista.

Nós quem, cara pálida?

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 28 de agosto de 2008

A pergunta decisiva do índio Tonto, que de tonto não tinha nada, vem irresistivelmente à minha memória sempre que me vejo exposto àquela retórica global e retumbante, tão usual hoje em dia, que, tomando da palavra na primeira pessoa do plural, fala em nome da platéia universal sem ter-lhe pedido a mínima autorização para isso.

Da minha parte, tomo os maiores cuidados para não abusar da palavra “nós”. Restrinjo o seu emprego aos casos em que a coletividade referida é claramente identificável e as generalizações que faço a respeito dela podem ser verificadas (ou contestadas) empiricamente. A moda geral, no entanto, é eludir essas precauções, deixando o significado do pronome vago e indefinido o bastante para sugerir, mui modestamente, que o orador é a consciência da espécie humana.

Ao celebrar seus quarenta anos de existência e anunciar entusiasticamente para 2 de setembro o seminário comemorativo “O Brasil que queremos ser”, a revista Veja dá por subentendido que os sonhos de cada brasileiro coincidem com os dos distintos palestrantes, entre os quais no entanto pelo menos um, o advogado Márcio Thomaz Bastos, evoca antes uma imagem de pesadelo.

Também não entendo por que o colunista Cláudio de Moura Castro, que escreveu na própria Veja alguns dos melhores artigos sobre educação já publicados neste país, foi posto para coordenar o debate sobre Meio Ambiente, enquanto o painel de Educação foi deixado aos cuidados de pessoas que nunca educaram ninguém e que, na melhor das hipóteses, só podem falar do assunto desde o ponto de vista econômico. Ninguém, na verdade, exceto eu e mais dois ou três, verá aí nada de anormal. Desde que me conheço por gente, só se discute a educação brasileira sob esse ângulo, como se o conteúdo, a filosofia e os valores embutidos no processo pedagógico não fossem problema nenhum. De fato, parece que não são: tudo a respeito já está decidido há décadas e ninguém pode questionar a autoridade pontifícia dos Paulos Freires, das Emílias Ferreros, dos Celestins Freinets, dos Levs Vigotskys e outros manipuladores comunistas cujas teorias são, no entanto, a causa direta e principal não só da imbecilização maciça das crianças brasileiras, mas também, por isso mesmo, das imensas perdas econômicas impostas ao país por essa organização criminosa que é o Ministério da Educação.

Sob esse aspecto, aliás, há um detalhe interessante. A revista Veja vem denunciando com veemência a doutrinação comunista disseminada nas escolas brasileiras, e com isso presta um louvável serviço de saúde pública. Mas seria mais louvável ainda se, no seu empenho saneador, começasse por admitir a parcela de culpa que, na produção desse descalabro, coube à própria Editora Abril. Durante décadas as revistas da Fundação Victor Civita, “Escola” e “Sala de Aula” – depois unificadas sob o nome de “Nova Escola” – foram instrumentos essenciais para o endeusamento dos educadores comunistas e a adoção das suas técnicas e preceitos idiotizantes pelo sistema nacional de ensino. Trabalhei nas duas e sei do que estou falando. Um debate sério sobre educação deveria começar pelas idéias orientadoras, pois são estas que moldam as ações e, em última análise, geram as conseqüências devastadoras que os testes internacionais de avaliação de estudantes não cessam de assinalar.

Falando em idéias, alguns exemplares delas constam do site de apresentação do seminário (www.veja40anos.com.br), elucidando de antemão o espírito da coisa. Vejam por exemplo esta definição da “tarefa do jornalismo”, produzida por Washington Novaes e encarregada de inspirar o painel sobre “Imprensa”:

Sem ampliar o acesso à informação, a sociedade não terá como construir formatos de viver ‘sustentáveis’, que enfrentem as duas grandes questões do nosso tempo: mudanças climáticas e padrões de produção e consumo insustentáveis, incompatíveis com a capacidade de reposição da biosfera planetária… É preciso ver quais são ou serão os impactos; como evitá-los ou minimizá-los; como atribuir os custos a quem os gera. Essa é a tarefa do jornalismo.”

Traduzido do seu estilo alusivo e escorregadio para o português claro, o parágrafo diz o seguinte:

1) O clima da Terra está mudando catastroficamente por culpa da ação humana.

2) O principal vilão é o maldito capitalismo americano (“padrões de produção e consumo insustentáveis”).

3) A solução é, naturalmente, o imposto global obamiano (“atribuir os custos a quem os gera”), que estrangulará a economia americana e, mediante mera decisão burocrática, transferirá o poder dos EUA para o governo mundial instalado na ONU.

4) A tarefa do jornalismo consiste em lutar para que isso aconteça.
É uma maravilha. A maneira mais óbvia e tradicional de sonegar uma informação é fazer de conta que ela não existe e saltar direto para a conclusão que ela impugna, fingindo que essa conclusão jamais foi contestada por ninguém. Washington Novaes só inova ao dizer que isso é “ampliar o acesso à informação”. Normalmente, onde há uma questão controversa, cabe aos jornalistas informar ao público a substância das opiniões em confronto, para que ele as julgue por si. Para Washington Novaes, ampliar o acesso à informação consiste em dar sumiço à controvérsia, fazendo como se uma das idéias imperasse sozinha sobre o horizonte do pensamento humano. Por mais que Novaes aprecie a explicação do aquecimento global inventada pelo IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), resta o fato incontornável de que ela foi subscrita por 2.500 indivíduos, muitos deles meros funcionários da ONU alheios a estudos climatológicos, e imediatamente rebatida por um abaixo-assinado de 17.000 cientistas de profissão, em nada se assemelhando portanto a um consenso científico universal, diante do qual não restasse aos jornalistas senão sacramentá-lo com um unânime e altissonante “Amém”.
Pelo menos dois documentários ilustram o que estou dizendo: “The Great Global Warming Swindle” (“A Grande Patifaria do Aquecimento Global”), produzido pelo Canal 4 da TV inglesa, e “Global Warming or Global Governance?” (“Aquecimento Global ou Governança Global?”), da Sovereignity International. Em ambos a tese da origem humana do aquecimento global é não só contestada, mas denunciada como uma fraude proposital. Uma das provas mais eloqüentes é que o ex-presidente americano Al Gore exibe por toda parte um gráfico da evolução comparativa das emissões de CO2 e do aumento da temperatura global ao longo de 400 mil anos, daí concluindo triunfalmente que o primeiro desses fenômenos causa o segundo. Toda a credibilidade dessa conclusão advém de um pequeno detalhe: Gore mostra as duas curvas separadamente. Quando as superpomos, verificamos que as elevações de temperatura não se seguem aos aumentos emissões de CO2, mas os antecedem. O espertinho simplesmente trocou a causa pelo efeito.

Esconder a controvérsia e ao mesmo tempo fazer-se de bem intencionado apóstolo da “ampliação do acesso à informação” é trapaça, evidentemente. Mas as fraudes cientificas seriam impotentes se não secundadas pelas fraudes jornalísticas que lhes dão credibilidade popular. Essa é a missão do jornalismo segundo Washington Novaes.

Mas ele não está sozinho nisso. Outra frase inspiradora, no site do seminário, vem do economista Sérgio Besserman Viana:

O desenvolvimento atual não é sustentável. As próximas décadas serão de profundas transformações econômicas, sociais, políticas e no pensamento humano, tendo como eixo a construção da sustentabilidade nas relações da humanidade com os limites do planeta.”

Al Gore não diria isso melhor. A quarentona Veja, ao mesmo tempo que desanca o comunismo na educação, parece ter subscrito alegremente o programa do burocratismo ecológico global, o qual nada mais é senão um upgrade pós-soviético do bom e velho plano comunista do Estado mundial controlador de tudo.

Lembro-me de, nos anos 70, ter lido numa revista cultural brasileira um ensaio de Jack Jones com o título “O conservacionismo, uma ideologia pós-marxista?” Naquela época, em que o ecologismo ainda atendia pelo nome de “conservacionismo”, essa transmutação do comunismo já era nítida para qualquer estudioso atento. Entre os atuais “formadores de opinião” no Brasil, ela ainda continua invisível ao ponto de que a mera sugestão da sua existência é repelida como “teoria da conspiração” – objeção ao alcance de qualquer cérebro atrofiado ao qual tenha chegado notícia de um filme com esse título.

O painel sobre Imprensa poderia salvar do inevitável mergulho na nulidade o seminário de Veja, se Reinaldo Azevedo fosse ali designado para enfrentar o ex-ministro Márcio Thomaz Bastos na questão do controle estatal da mídia. Veja preferiu desperdiçar o valente colunista, colocando-o na posição desconfortável e paralisante de mediador.

Dito isso, aproveito a ocasião para discordar radicalmente do meu notável colega quando ele diz, no vídeo de apresentação do seminário, que “o Brasil tem uma das melhores imprensas do mundo”. Se tivesse, a coluna do próprio Reinaldo seria desnecessária, pois ela existe precisamente para dizer o que o resto da mídia não diz, isto é, quase tudo o que interessa.

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