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Obviedades estratégicas

 

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 6 de fevereiro de 2012

Se vocês querem algum dia ter no Brasil um movimento conservador vigoroso, apto a conquistar e exercer o poder, comecem por meditar os seguintes pontos:

1. Os grupos que dominam a política, a mídia e o mercado livreiro provêm das universidades e especialmente do movimento estudantil. A elevação dos líderes estudantis às posições de poder leva aproximadamente trinta anos. Quem domina as universidades hoje dominará o país em trinta anos.

2. Dominar as universidades não é um processo espontâneo. É o resultado de um trabalho sistemático de ocupação de espaços, de remoção dos adversários, de interproteção mafiosa e de conquista progressiva dos altos postos, que não rende frutos em menos de uma geração: mais trinta anos, que podem se reduzir a dez porque a conquista da hegemonia universitária e a formação da nova geração de estudantes não são fases estanques, mas fundidas e superpostas. O tempo necessário para a formação de um movimento político viável é, pois, de quarenta anos aproximadamente.

O acerto desse cálculo é ilustrado por exemplos inumeráveis. Data dos anos 60 o início da conquista das universidades da Europa, dos EUA e da América Latina pela “nova esquerda” inspirada na Escola de Frankfurt e naquilo que seus críticos viriam a rotular, sem muita precisão, de “marxismo cultural”. Decorridas quatro décadas, a ideologia do “politicamente correto”, do feminismo, do gayzismo, do abortismo, do racialismo e do ódio anti-ocidental e anticristão dominava, e domina até hoje, a política, a mídia e o mercado editorial em toda essa área – um terço da superfície terrestre.

3. O trabalho de conquista, primeiro das universidades, depois do poder em geral, depende de duas condições: (a) só pode ser empreendido por organizações estáveis e duradouras, capazes de esforço concentrado e sistemático ao longo de pelo menos duas gerações; (b) exige organizações que estejam firmemente decididas a realizá-lo e que vejam nele a sua obrigação mais essencial e incontornável, ao ponto de sacrificar a ele todos os seus demais interesses políticos, sociais, culturais, financeiros etc.

Em todo o planeta, há quase dois séculos, só se interessaram seriamente por esse objetivo as organizações ligadas ao movimento revolucionário mundial em todas as suas variantes internas (comunismo, nazifascismo, terceiromundismo, “nova esquerda” etc.) Nenhuma outra. Não estranha que a mentalidade revolucionária, em suas várias versões, incluindo as mais inconscientes de si próprias, tenha se tornado a chave dominante do pensamento político – e até da moralidade pública – em todo o mundo ocidental. Hoje em dia, uma nova versão do movimento revolucionário – o radicalismo islâmico – está fazendo um sério, bem organizado e bem financiado esforço para conquistar as universidades da Europa e dos EUA. Se esse esforço for bem sucedido, será impossível evitar a islamização forçada do Ocidente no prazo de uma ou duas gerações.

4. Os grupos conservadores, liberais (no sentido brasileiro), cristãos, judeus sionistas etc. têm-se limitado a opor à hegemonia revolucionária nas universidades o combate intelectual, a “guerra cultural” ou “luta de idéias”. Apostam nisso o melhor das suas forças. Mas é estratégia absolutamente impotente, pois o que está em jogo não é realmente nenhuma “luta de idéias” e sim uma luta pela conquista dos meios materiais e sociais de difundir idéias – coisa totalmente diversa. Você pode provar mil vezes que tem a idéia certa, mas, se o sujeito que tem a idéia errada é o dono das universidades, da mídia e do movimento editorial, o que vai continuar prevalecendo é a idéia errada. Basta ler revistas como New Criterion ou a Salisbury Review para notar que, em comparação com a “esquerda”, os conservadores têm hoje uma superioridade intelectual monstruosa. Nem por isso eles mandam no que quer que seja. Em política, a superioridade intelectual tem apenas um valor instrumental muito relativo. Se você não sabe usá-la para quebrar a autoridade do adversário, para tomar o cargo dele e colocar lá alguém da sua confiança, ela não serve para absolutamente nada. O movimento revolucionário já entendeu há tempos que “ocupar espaços” não é vencer debates letrados. Concentrando-se na “luta de idéias”, recusando-se nobremente a praticar a ocupação de espaços, a infiltração nos postos decisivos e o boicote aos adversários, os conservadores deixam a estes o exercício do poder e se contentam com a satisfação subjetiva de sentir que são mais inteligentes e moralmente melhores. O senso solidariedade mafiosa, então, escapa-lhes por completo. Dificilmente um conservador ou liberal chega a reitor, a ministro ou mesmo a diretor de departamento, sem imediatamente rodear-se de auxiliares esquerdistas, só para provar a si próprio (e para grande satisfação do adversário) que seu respeito pelas pessoas está “acima de divergências ideológicas”. Essa boniteza moral é fonte de tantos malefícios políticos, que chega a ser criminosa.

5. A luta pela ocupação de espaços pode comportar uma parte de debate político-ideológico, mas tem de ser uma parte bem modesta. O essencial não é vencer as “idéias” do adversário, mas o próprio adversário, pouco importando que seja por meios sem qualquer conteúdo ideológico explícito. Trata-se de ocupar o seu lugar, e não de provar que ele está do lado errado. Isso se obtém melhor pela desmoralização profissional, pela prova de incompetência ou de corrupção, pela humilhação pública, do que por um respeitoso “debate de idéias” que só faz conferir dignidade intelectual a quem, no mais das vezes, não tem nenhuma.

Uma nação de extremistas

Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 12 de abril de 2007

Já se tornou prática geral da nossa mídia, quase uma norma de redação, carimbar como “extremista de direita”, sugerindo a conveniência de excluí-lo do debate decente, quem quer que se oponha ao abortismo, à eutanásia, à lei da mordaça gay , ao desarmamento civil, ao neo-racismo anti-racista e a outros itens do cardápio jurídico-moral servido às nações pelos autonomeados governantes do mundo.

Acontece que, segundo vêm mostrando repetidamente as pesquisas do Datafolha, a maioria do povo brasileiro se inclui precisamente nessa categoria. Mais de sessenta por cento dos nossos compatriotas vêem com mal disfarçada hostilidade os novos padrões de conduta que o governo, os jornais, a TV, o cinema e as escolas lhes querem impor como normativos e obrigatórios.

Em contrapartida, se somarmos todos os jornalistas, intelectuais, ativistas, ongueiros, empresários, banqueiros, políticos e burocratas que escolhem as opiniões aprovadas e condenadas, não obteremos um por cento da população nacional. Vamos portanto entrando num novo tipo de democracia, em que uma elite minúscula, montada no poder do dinheiro, do ativismo e da propaganda, marginaliza e criminaliza a maioria, sempre a pretexto de libertá-la das trevas da ignorância e conduzi-la ao paraíso da igualdade, da não-discriminação e dos direitos humanos.

A diferença é que essa minoria se reúne, se adestra, se organiza, suga e junta recursos, ocupa espaços, acumula poder e age sem parar. A maioria, amorfa e dispersa, a tudo assiste, boquiaberta e passiva, às vezes desejando reagir mas sem saber nem por onde começar.

A minoria não aceita contradição. Quando frustrada nas suas exigências, entende isso como recuo tático provisório, voltando à carga depois de algumas semanas. A maioria, justamente porque percebe a absurdidade das pretensões minoritárias, apega-se à esperança suicida de que tudo seja uma moda passageira, sem saber que se trata de uma estratégia abrangente preparada ao longo de mais de setenta anos sob o patrocínio de algumas das maiores fortunas do universo e calculada para desembocar na utopia de Herbert George Wells: o “mundo planejado”. Embora os preparativos para essa maravilha sejam abertos, públicos e fartamente documentados, convencionou-se que mencioná-los é “teoria da conspiração”, rótulo infamante que ninguém quer atrair sobre si.

Para completar, a minoria ambiciosa é totalmente desprovida de escrúpulos, não hesitando em falsificar estatísticas em massa, suprimir os fatos adversos, calar pelo boicote e pela intimidação as vozes discordantes e paralisar o adversário por meio de chantagem emocional, fazendo-se de vítima perseguida e clamando por socorro policial cada vez que ouve a palavra “mas”. A maioria, apegada aos resíduos de uma civilização milenar, ainda acredita estar diante de pessoas razoáveis e cordatas, das quais é possível obter concessões mediante argumentação e diálogo. Anestesiada por essa crença ilusória, vai ela própria fazendo concessão em cima de concessão, até o dia em que nada mais lhe restará para conceder, porque tudo lhe terá sido tomado.

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