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A capa e a espada

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial), 21 de dezembro de 2007

Nos dias que se seguiram ao 11 de setembro, a mídia mundial fez um barulho dos diabos alertando contra a suposta onda de ódio anti-islâmico que estaria assolando os EUA. A base factual da notícia eram seiscentas e poucas queixas de “discriminação” apresentadas à polícia americana. Nenhuma delas envolvia morte, agressão, nem mesmo demissão de emprego: os atos mais violentos consistiam em insultos, a maioria em meras palavras ambíguas interpretadas ex post facto em sentido discriminatório.

Mas desde então várias dezenas de cristãos já morreram nos EUA – e alguns milhares nos países comunistas e islâmicos — em ataques homicidas motivados por ódio anticristão explícito e documentado, sem que em nenhum desses casos a grande mídia européia e americana (da nacional nem falo) consentisse sequer em usar a expressão “crime de ódio” para descrever o ocorrido.

Mutatis mutandis , nem um único caso de agressão a homossexuais comprovadamente motivada por excesso de zelo cristão foi jamais citado para dar fundamento à mentira sórdida de que as convicções religiosas do povo brasileiro estão colocando em risco a vida da comunidade gay .

Mas, exatamente como em Columbine – aquele episódio que Michael Moore falsificou por completo –, a investida assassina contra a Igreja New Life do Colorado foi obra de um jovem homossexual intoxicado de idéias anticristãs, e ai de quem ouse insinuar que a ideologia gayzista ou a campanha furibunda dos Dawkins e Hitchens contra a fé religiosa têm alguma responsabilidade nisso. Em geral, nem mesmo padres, bispos e pastores ousam ver aí alguma relação de causa e efeito.

No caso específico da New Life, o cuidado da grande mídia brasileira em impedir que os fatos induzam a conclusões reacionárias chegou ao requinte de falsificar a identidade da heroína do episódio, Jeanne Assam, apresentando-a como “agente de segurança” para atenuar o escândalo de que uma cidadã comum, com uma Beretta 92, salvasse da morte certa mais de cem pessoas ameaçadas por Mathew Murray e se tornasse assim uma heroína dos grupos de autodefesa cristã e dos americanos armados em geral. Mas Jeanne não é profissional de segurança, licenciada para portar arma na Igreja em função do seu emprego. É apenas uma fiel cristã que se ofereceu para zelar pela vida de seus irmãos, voluntariamente, gratuitamente, assumindo para isso a responsabilidade de andar armada. Se para isso teve de obter da polícia uma licença especial, foi pela simples razão de que leis criminosamente idiotas proíbem o porte de armas em igrejas, escolas, clubes, shopping centers, etc., tornando esses locais o alvo preferencial e indefeso para tipos como Mathew Murray, Cho Seung Hui ou Tim McVeigh (um anticristão, um antibranco e um anticapitalista).

Em 25 de julho de 1993, Charl van Wyck também não trabalhava de segurança. Era apenas um fiel que assistia ao culto quando a igreja de St. James, na África do Sul, foi atacada por terroristas com granadas e tiros de fuzil AK-47. Onze pessoas morreram, mas muitas mais teriam morrido se van Wyck não estivesse armado e, com disparos do seu 38, não pusesse os atacantes em fuga. Ele conta sua experiência no livro “Shooting Back: The Right and Duty of Self Defense”, que se tornou um best seller no seu país.

No momento em que escrevo estas linhas, a comunidade cristã no mundo está ameaçada por perigos incalculavelmente maiores que a loucura avulsa – ainda que ideologicamente induzida — de um Murray ou de um Cho Seung Hui. Na Coréia do Norte, uma nova onda de prisões e execuções de fiéis, em plena época do Natal, suscita apelos desesperados que a grande mídia, especialmente no Brasil, sufoca por completo (v. Martyrdom awaits North Koreans on Christmas). Ao mesmo tempo, do outro lado do mundo, a prefeitura de Okkahoma anuncia que seus funcionários serão proibidos de celebrar o Natal no local de trabalho, o shopping center Pembroke Pines na Flórida veta os presépios e cenas natalinas em geral nas suas instalações, e jornais populares como “USA-Today” soltam artigo em cima de artigo para proclamar que não existe nenhuma guerra cultural anticristã, que é tudo invenção de paranóicos como Bill O’Reilly.

Não sei se Jeanne Assam está sabendo dessas coisas, nem se leu o livro de van Wyck. Mas leu decerto o Evangelho de Lucas, capítulo 22, versículo 36, onde Jesus ordena aos apóstolos: “Aquele que não tem espada, venda sua capa e compre uma.”

O sentido do versículo é claro: a defesa armada do rebanho é obrigação estrita dos pastores, dos sacerdotes e de cada fiel. Aquele que foge a essa responsabilidade é indigno da confiança da comunidade cristã. Neste momento, nenhuma outra mensagem de Natal pode ser mais oportuna.

Cadeia para a inocência

Olavo de Carvalho


Jornal do Brasil, 31 de agosto de 2006

Mike Whitney, um popular escritor de esquerda, está defendendo a tese de que o seqüestro dos repórteres Steve Centanni e Olaf Wiig por terroristas palestinos foi um ato justo e inteiramente legal. Seu argumento é o seguinte:

Premissa maior: Centanni e Wiig trabalham na Fox News.

Premissa menor: A Fox News é “parte integrante da máquina de guerra norte-americana”.

Conclusão: Logo, Centanni e Wiig não podem ser considerados não-combatentes.

Mas, por mais que os esquerdistas odeiem a Fox News, ela não é sequer um canal conservador. Apenas dá aos conservadores cinqüenta por cento do espaço nos debates, opondo Bill O’Reilly e Michael Moore, ou Sean Hannity e Jim Colmes. Como isso é noventa e nove por cento a mais do que a opinião politicamente incorreta tem no restante da mídia chique e cem por cento a mais do que o elevado espírito democrático da esquerda pode tolerar, a Fox foi rotulada de “extrema direita”, e agora, forçando o hiperbolismo até à demência, de organização militar a serviço do imperialismo judaico-americano.

 Assim, embora Centanni e Wiig tenham se limitado a fazer a cobertura da guerra sem xingar nem árabes nem judeus, eles entram na história como membros das tropas invasoras, podendo ser seqüestrados ou mortos sem ofensa ao direito internacional.

Houve quem reclamasse da estupidez psicótica do argumento de Whitney, mas até agora ninguém deu sinal de ter percebido o óbvio: ao distorcer monstruosamente os fatos para conceder aos terroristas o direito de matar americanos inocentes, ele forneceu baldes de conforto e auxílio ao inimigo e cometeu portanto crime de traição. O lugar dele é na cadeia.

Lá também deveriam estar, pela mesma razão, todos aqueles que, como o o ex-procurador Ramsay Clark, acusam o governo americano de “crimes de guerra” no Iraque. Segundo averiguação do Washington Post, tão suspeito de bushismo quanto eu de lulismo, o número de soldados americanos judicialmente acusados de matar civis de propósito desde o início da guerra é de exatamente 39. Milhares de olhos ferozes ciscando criminosos de guerra para jogar na cara do presidente, e a colheita é de trinta e nove em três anos de combates — a quota mais baixa já registrada em qualquer conflito militar. Se houve no mundo um governo inocente de crimes de guerra, é o governo Bush. Os que o acusam disso fazem guerra psicológica a serviço do inimigo: são uma Quinta-Coluna e, sem nenhuma figura de linguagem, parte integrante da máquina de guerra assimétrica do Hezbollah e da Al-Qaeda. Mas eles são tantos, que todas as cadeias dos EUA não bastariam para abrigá-los. Quando a impunidade geral é a solução mais cômoda, o crime se converte em lei e exige cadeia para a inocência. Rendendo-se a isso, os inocentes se tornam por sua vez culpados de entregar o país, sem luta, aos inimigos que planejam destrui-lo. Se, avessos a enxergar a deslealdade cínica de seus adversários, os conservadores continuarem tratando como debate normal de opiniões o que é de fato uma guerra civil unilateral, os EUA se tornarão uma nação de culpados – uma nação condenada.

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