Olavo de Carvalho

31 de outubro de 2009

Se até agora não ofereci ao sr. Carlos (carbert@terra.com.br) a refutação detalhada que ele exige com tão fogosa veemência, foi por cinco motivos:

1. Por que devo responder por extenso a um sujeito que nem mesmo assina o próprio nome por extenso, escondendo-se por trás de um vago apelativo “Carlos”, que não tenho nem como saber se é um pseudônimo? A mim me parece que quem deseja um debate franco não começa por desaparecer do palco e enviar bilhetinhos de longe.

2. Toda argumentação que se preza tem uma ordem, uma estrutura, uma hierarquia, de modo que, respondidos os pontos centrais, o resto está automaticamente comprometido. Com sua ridícula exigência de transcrição integral, o sr. Carlos confessa que seu escrito tem, ao contrário, uma consistência homogênea, amebiana, onde cada parte pode ser amputada sem danificar o conjunto. Não creio, porém, que ele tenha razão nisso: se ele não percebe ordem e estrutura no seu escrito, eu percebo alguma. Ao responder aos trechos essenciais, creio ter cumprido a minha parte do serviço, tal como, na sua crítica ao meu artigo sobre a previdência, ele mesmo cita um parágrafo isolado e passa a criticá-lo: deveria eu acusá-lo de “pinçador” por isso? Lamento, mas não consigo ser tão palhaço quanto os srs. Carlos e Heidrich.

3. Em escritos jornalísticos, que têm um espaço predeterminado, nenhum crítico jamais transcreve na íntegra o artigo criticado, pois se o fizesse não sobraria lugar para o artigo crítico. A única exceção é a do direito de resposta, que nem Carlos nem Anselmo Heidrich têm, visto que eles tomaram a iniciativa de me atacar, não eu a eles.

4. Num site da internet, o espaço é mais livre, mas a transcrição integral de mensagens como as dos srs. Carlos e Heidrich me traz o seguinte dilema: elas vêm escritas num português tão medonho que não sei se as corrijo, maquiando os remetentes para lhes dar uma boa aparência que não têm, ou se publico a coisa como está, emporcalhando o meu site e expondo-me à acusação, já tantas vezes apresentada, de que tiro proveito de indefesos semi-analfabetos, usando-os como sacos de pancadas.

5. Na maior parte dos casos, especialmente neste do sr. Carlos e no do sr. Heidrich, uma refutação linha por linha seria coisa de um sadismo sem par, desnecessária e cruel. Não compreendo o desejo incontido que o sr. Carlos sente de sofrer semelhante vexame, mas, como ele insiste, vou tentar satisfazer à sua ânsia masoquista. Só não posso lhe dar o que ele pede tudo de uma vez: tenho de subdividir a desgraça em capítulos. Começo, pois, pelo último bilhete que ele enviou à sua lista de discussões. Espero, apenas, que no meio da operação ele não venha choramingar pedindo para sair.

Claro,Anselmo, já lhe disse que o Olavo só vai levar a seu site as partes que lhe convém.Suponha que,por acaso e milagre,um dos fulanos respondesse,constrangido,” Professor,confesso que disse isso mesmo ao Anselmo.” O que acha que o Olavo escreveria? nada.

Belo raciocínio invertido. A validade dos testemunhos que mostrei é refutada com base na conjetura de que eu não os mostraria se dissessem o contrário do que dizem. Em vez de o fato refutar a hipótese, a hipótese é alegada contra o fato. Não digo que o sr. Carlos faça isso por malícia consciente: ele é mentecapto demais para ter consciência da própria malícia.

Segunda inversão: Pela ordem, quem teria a obrigação de sustentar a acusação com testemunhos seria o sr. Heidrich, de modo que, com justiça, o argumento do sr. Carlos se aplica a ele, não a mim, e neste caso não seria mera conjetura gratuita, seria uma verdade óbvia: se o sr. Heidrich não apresentou testemunhos, foi porque sabia que não confirmariam a acusação.

No mundo maravilhoso do sr. Carlos, quem age mal não é o acusador que acusa sem provas: é o acusado que se defende com elas. E a prova de que o acusado age mal ao mostrar provas é que não as mostraria se não as tivesse…

Se eu quisesse destruir de vez a reputação do sr. Carlos, nada precisaria dizer contra ele: bastaria apontar a naturalidade ingênua com que ao proferir essa monstruosidade ele acredita ter apresentado um “argumento”, sem notar que, em vez disso, apresenta mesmo é um sintoma clínico.

As observações sobre as besteiras que escreveu sobre a “Bolsa presídio” também ele não cita,porque não tem como contestar.

Ao contrário, já as contestei e não tive a menor dificuldade em fazê-lo, de tão bobas que eram. Como não tenho tempo para dedicar com exclusividade a listas de discussões, aproveitei para transformar a contestação em artigo enviado ao Diário do Comércio, para ser publicado nos próximos dias. Calma, sr. Carlos, não precisa ter chilique: por caridade, omiti o seu nome.

Há um princípio de comunicação:o que não chega aos ouvidos,não existe.

Sim, por exemplo o nome completo de alguém que finge entrar em campo de peito aberto no instante mesmo em que se esconde por trás de um pseudônimo.

Quanto ao Fernando,desculpe a franqueza,Olavo fingiu reconhecimento para expo-lo como um troféu.Não censuro sua atitude de retratar-se,fez o que seu coração e cabeça mandaram,e da maneira mais honesta possível. Mas a desnecessária transcrição integral do mea culpa,com todos as expressões de reverência, atribuindo-se defeitos que não tem,escritos num momento de comoção,não foi para lhe engrandecer,mas para exibir uma cabeça cortada.Bastaria uma discreta referência a seu pedido de desculpas,ou a transcrição de um trecho.

Uai, se até quando mostro provas no mundo real sou acusado de sonegá-las no mundo hipotético do sr. Carlos, de quê não me acusaria este se eu afirmasse ter recebido um pedido de desculpas mas não o provasse com o respectivo documento integral? O sr. Carlos, obviamente, é incontentável na sua sanha de tudo inverter. Até o meu elogio rasgado à atitude do sr. Fernando Raphael ele interpreta como tentativa de humilhar o pobre remetente. Mas a loucura do sr. Carlos tem método: duvido que ele leve sua mania inversiva ao ponto de interpretar esta minha mensagem de hoje como um elogio à sua pessoa. Sem querer jogar contra ele um de seus tópoi prediletos, não vejo como escapar à conclusão de que ele só inverte o que lhe convém inverter.

Mas mudemos de assunto. Perdemos tempo com muito pouco.

Não adianta querer fingir indiferença olímpica, sr. Carlos. A paixão feroz com que você e o Heidrich escrevem a respeito revela antes que este assunto é um dos mais importantes das suas vidas. Tão importante que não param de solicitar para ele a minha atenção extensiva, não se contentando com respostas breves.

[Continua]

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