Olavo de Carvalho

Jornal do Brasil, 28 de fevereiro de 2008

Para os comunistas e seus bajuladores, a morte de uns 400 terroristas, durante o regime militar brasileiro, foi algo de incomparavelmente mais grave, mais revoltante, mais intolerável do que a matança de 75 milhões de civis chineses pela ditadura de Mao Dzedong, de 20 milhões de russos pelo governo soviético ou de 3 milhões de cambojanos pela quadrilha de Pol-Pot. Claro, os comunistas são diferentes de nós. Segundo Che Guevara, são “o primeiro escalão da espécie humana”. Se você mata um deles, mesmo em defesa própria, é crime hediondo. Se ele mata 100 mil de nós, desarmados e amarrados, torna-se um herói, que é como o senhor Mino Carta define Fidel Castro.

Protestando contra a comparação quantitativa entre a ditadura brasileira e a cubana, que o colunista Reinaldo Azevedo faz na última Veja, Gerald Thomas vocifera seu sacrossanto horror à contagem de cadáveres e em seguida se põe a contá-los por sua vez, acusando os militares brasileiros pela “perda da vida de milhares, digo, milhares de vidas inocentes”. Primeiro, não eram inocentes: eram guerrilheiros armados, que só começaram a morrer depois de estourar com bombas dezenas de civis (estes sim, inocentes). Segundo: não foram milhares, foram quatro centenas na mais hiperbólica das hipóteses, jamais submetida a revisão crítica. Para Gerald Thomas, números são um expediente retórico desonesto quando verdadeiros: só os falsos são argumentos honrados.

Sinceramente, já estou velho demais para continuar fingindo que indivíduos capazes de julgar seus semelhantes com um critério tão desproporcional, tão disforme, tão manifestamente iníquo, sejam pessoas normais e decentes com quem eu não tenha senão divergências filosóficas. Esses sujeitos são doentes, são sociopatas perigosos, incapazes de olhar para os discordantes sem antever, com sádica alegria, o cadáver do “inimigo de classe” girando no espeto como um frango no forno da História.

Eis alguns – só alguns – dos objetivos proclamados abertamente pelos líderes e mentores comunistas:

1. Karl Marx: extermínio de classes sociais inteiras e de uns quantos “povos inferiores” (sic).

2. V. I. Lênin: terrorismo sistemático como fórmula de governo.

3. Leon Trotsky: militarização completa do trabalho industrial e agrícola. Supressão da liberdade de escolher emprego.

4. Stálin: “Morte aos pequenos proprietários rurais. Ódio e desprezo aos que os defendem” (sic).

5. Che Guevara: Treinar os militantes para que se tornem “eficientes e frias máquinas de matar” (sic).

Notem bem: não são crueldades impremeditadas, sobrevindas no calor da batalha. São intenções declaradas.

Como é possível que alguém em seu juízo perfeito considere o comunismo um belo ideal humanitário, que um acaso infeliz desviou de seus altos propósitos?

Foi só por um desejo insano de enganar-se retroativamente a si próprios que muitos comunistas, depois da morte de Stálin, começaram a espremer seus cérebros para explicar como o regime dos seus sonhos pudera “degenerar” em tanta violência e maldade. Não era degenerescência: era a execução racional e bem sucedida de planos traçados com muita antecedência – desde Marx – e levados à prática com a frieza metódica de uma obra de engenharia.

Fidel Castro, Guevara, Pol-Pot, Lênin, Stálin, Trótski, Marx – quem quer que escreva uma só palavra em favor desses monstros é seu semelhante, distinguindo-se deles em tamanho apenas, não em qualidade. Ainda que por covardia ou falta de ocasião não venha a realizar pessoalmente seus desígnios macabros, não esconde sua admiração por quem os realiza. E depois ainda se faz de horrorizado ante quem cometeu crimes incomparavelmente menores, se é que é crime apelar à violência para deter um genocídio anunciado e já em fase avançada de execução.

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