Olavo de Carvalho

Diário do Comércio (editorial),12 de julho de 2007

Muitos antipetistas se admiram, se espantam e se indignam ante o fato repetidamente comprovado de que as denúncias de corrupção, por mais que se avolumem, mal chegam a abalar a estabilidade do governo ou a arranhar a reputação do presidente.

Se tivessem lido meus artigos de dois, de três, de quatro anos atrás não veriam nesse fenômeno o menor motivo de estranheza.

Há tempos venho explicando – para ouvidos moucos, aparentemente — que denúncias de corrupção, por si mesmas e isoladas assepticamente de todo combate ideológico, nada podem nem poderão jamais contra Lula, contra o PT ou contra qualquer organização de esquerda.

O motivo é simples.

Toda acusação de ordem ética ou legal ressoa na alma popular conforme a escala de valores reinante na sociedade. Essa escala determina a interpretação que o público há de fazer dos fatos revelados, a reação emocional que se seguirá e, portanto, a direção das conseqüências políticas possíveis.

A escala de valores é função da cultura, isto é, dos sistemas simbólicos imperantes, condensados no imaginário popular, nas comunicações de massa e na linguagem dos debates públicos.

Ora, a esquerda nacional, com o PT à frente, não só criou e desencadeou o ciclo de “combate à corrupção” iniciado no começo dos anos 90, mas teve o cuidado de preparar o ambiente cultural para isso, de tal modo que os valores de moralidade, integridade e transparência fossem associados a símbolos e emoções francamente anticapitalistas, posando sempre o Estado intervencionista como o herói justiceiro e os interesses privados como a raiz de todos os males. Foi um trabalho de muitas décadas, cujos frutos começaram então a ser colhidos – e não pararam de ser colhidos até hoje.

O resultado final, transcorrida uma década e meia, é que hoje é impossível voltar contra o establishment esquerdista uma corrente de ódio anticorrupção do qual ele próprio tem todo o controle psico-social e ideológico.

Crimes praticados por petistas, por mais numerosos e revoltantes que sejam, jamais comprometem o poder do partido, pois nunca aparecem como frutos da estratégia esquerdista de dominação, e sim como “traições” a um fundo ideológico que permanece intacto e puro na imaginação popular. Cada petista que delinqüe aparece como um renegado que “passou para a direita”.

A esquerda fez das denúncias de corrupção uma arma ideológica. Quanto mais denúncias se acumulem, mesmo contra a própria esquerda, mais sai reforçada a ideologia dominante.

Só há um meio de fazer com que a massa asquerosa dos crimes petistas se volte contra seus verdadeiros autores: é inverter o signo das denúncias, exibindo os delitos como partes integrantes da estratégia revolucionária esquerdista, que é o que de fato são.

Mas para isso é preciso haver uma direita disposta a travar a guerra ideológica em vez de padecer atônita os seus efeitos sem nem saber de onde vieram. E a direita que existe, por incultura, covardia e falsa esperteza, tem preferido apegar-se às puras denúncias de corrupção justamente para não ter de arcar com a responsabilidade de uma guerra ideológica.

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