DUNNING-KRUGER QUATRO CRUZES

Neste país onde os homens de cultura universal se contam nos dedos de um maneta, existem, em compensação, milhares de especialistas em alguma coisinha, que vêem na exiguidade mesma do seu horizonte de consciência a fonte de uma autoridade intelectual quase sublime. Com base nela, adoram corrigir detalhes ínfimos das minhas obras com o orgulho triunfal de quem as houvesse reduzido a pó de cabo a rabo, mais ou menos como o caçador que, espremendo um dos três mil carrapatos que habitam o corpo de um alce, imaginasse ter matado o alce inteiro; ou como o adolescente que, tocando sua punhetinha no banheiro, acreditasse ter comido a Nicole Kidman.
Um desses, sob o nome de Marcelo Cipolla, do qual nada sei além da vaga noção de que andou comendo uma ex-esposa minha numa época em que a nossa separação judicial já tinha quase a idade dele, informa a um estupefato mundo que sou um ignorante em assuntos islâmicos, que ninguém me deveria dar crédito nessa área em vez de confiar-se às legítimas autoridades na matéria, como por exemplo ele próprio, condição que ele prova pela autoria de um livro que, infelizmente, ainda não está escrito nem muito menos publicado.
Quando em 1986 recebi da Universidade de El-Azhar – o mais importante centro teológico do mundo islâmico – um prêmio pelo meu livro sobre a exegese simbólica de alguns episódios do Corão, e quando logo em seguida fui reconhecido como um estudioso sério de assuntos islâmicos por islamólogos de fama mundial como Seyyed Hossein Nasr, Martin Lings e William Stoddart, a referida autoridade em islamismo tinha nove anos de idade.

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