Olavo de Carvalho

25 de outubro de 2009

Algo que pode dar uma idéia aproximada da infinitude é a quantidade de fofocas que circulam a meu respeito em listas privadas da internet. “Privadas”, é claro, apenas no sentido que a palavra tem em construção civil, já que o repasse ilimitado e a multiplicação mútua das mensagens lhes dão o alcance público de lendas urbanas, tal como, atraído pela lei da gravidade, o material particular depositado naquele utensílio corre ao encontro de seus semelhantes pela rede de esgotos, formando enormes massas excrementícias.

Como evito ingressar mesmo por instantes nesse tenebroso labirinto, o que faço quando seus respingos me alcançam aqui fora é limpá-los em público, por meio deste website ou de algum jornal, indiferente ao sofrimento que isso possa causar aos remetentes originais das mensagens que, por boas razões, prefeririam conservá-las protegidas no escurinho das tubulações onde nascem, vivem e prosperam.

O mais recente pretexto para essas manifestações psico-entéricas foi o meu artigo “Educação ou deformação?”, publicado aqui e no Diário do Comércio do dia 23 de outubro (http://www.olavodecarvalho.org/semana/091023dc.html).

O sr. Anselmo Heidrich, por exemplo (aheidrich@gmail.com), tendo digerido mal a minha afirmativa de que prescindi de receber minha aposentadoria por não gostar de receber dinheiro público mesmo quando me é devido, acreditou poder encontrar alívio trancando-se no reservado e, entre agonias gastro-espirituais indescritíveis, aí depositando este produto:

“Esse cara é um hipócrita. Olavo de Carvalho viveu parte do seu tempo de favor. A casa em que vivia em Curitiba era emprestada de um amigo não citado. Sei porque já estive lá quando participei do programa Mídia Sem Máscara.

Mesmo supondo-se que esse testemunho fosse veraz, não entendo qual a contradição entre recusar ajuda do Estado e aceitá-la de um amigo particular. Parece-me, ao contrário, que as duas condutas são bem coerentes entre si. Mas o caso é que o testemunho é cem por cento falso. A casa da R. Desembargador Vieira Cavalcânti onde morei em Curitiba foi por mim alugada da Imobiliária Cilar Ltda., segundo contrato que se encontra ainda nos arquivos da empresa, no número 1119 da mesma rua, onde o sr. Heidrich, tão pronto a imaginar capítulos supostamente vexaminosos da minha biografia, poderá verificar que os aluguéis foram pagos até o último.

Não sei onde mora o sr. Heidrich, mas sei que toda a minha convivência com ele se limitou aos seguintes lances:

1. Dei-lhe um prato de comida, porque ele estava com fome.

2. Permiti que ele escrevesse no jornal eletrônico Mídia Sem Máscara.

3. Permiti que ele aparecesse no programa Mídia Sem Máscara na TV.

4. Escrevi em sua defesa quando ele foi atacado injustamente pelo jornalista Mino Carta.

Como nunca tive com ele qualquer contato fora disso, a única explicação que encontro para o ódio renitente que ele mostra à minha pessoa é a hipótese de que talvez ele tenha ficado mortalmente ofendido com esses gestos, os quais prometo não repetir.

Linhas adiante, ele lê a minha afirmativa: “Transformar a cultura e a educação em instrumentos do Estado foi o que fizeram Stalin, Hitler, Mussolini, Mao, Fidel Castro e Pol-Pot” — e retruca: “Exato. Da mesma forma como fazem os cultos católico e protestantes em suas escolas.”

Comparações forçadas são o expediente retórico típico de adolescentes que acabam de descobrir o poder de discutir e acham que com qualquer combinação de palavras podem impressionar. Que eu saiba, as escolas católicas não têm jurisdição sobre as protestantes, nem estas sobre as judaicas, e assim por diante. Que cada uma ensine o que bem entende, sem interferir nas outras, é direito dela — e é exatamente o contrário de um controle estatal uniforme sobre todas elas. Só mesmo um cérebro de ameba para tomar uma analogia inversa como semelhança literal. Se continuar assim, o sr. Heidrich vai acabar se expelindo a si próprio no fluxo fecal, e nunca mais ouviremos falar dele. Será uma perda irreparável para a cultura universal.

Prevendo subterfúgios delirantes, advirto desde já que nem mesmo nos tempos da Inquisição a Igreja proibiu as escolas rabínicas de ensinarem judaísmo: o que ela proibia era pregar judaísmo nas escolas católicas, como os rabinos proibiam o catolicismo nas escolas deles. Só mesmo o sr. Heidrich para imaginar que as escolas religiosas se tornam iguais à ditadura Pol-Pot porque cada uma prega a sua própria religião em vez da religião vizinha. No entender dele, um time de futebol é uma organização ditatorial porque só permite que seus jogadores joguem em favor dele, não do adversário.

Para completar, o sr. Heidrich diz algumas coisas contra o ensino privado, imaginando que com isso refuta o que eu disse da escola pública. Quem quer que tenha QI superior a 12 entende que toda defesa do homeschoolingsupõe uma crítica geral ao ensino reinante, seja particular ou público, e não somente a este em especial. Aliás já escrevi o suficiente contra as escolas particulares brasileiras para que toda tentativa de me enquadrar no estereótipo “ensino público versus privado” não prove senão que seu autor é um desconversador muito chinfrim, seja por vigarice, seja por ignorância, seja por aquela síntese das duas coisas que o sr. Heidrich personifica exemplarmente.

Na mesma lista, um Carlos sem sobrenome (carbert@terra.com.br), concorre com o sr. Heidrich na sua incapacidade de montar uma comparação que faça sentido. Tendo lido a minha afirmação de que “há um crescimento proporcional direto da criminalidade infanto-juvenil à medida que se amplia a escolarização”, ele imagina que faz ironia com ela ao declarar: “Sem dúvida. É por isso que a criminalidade infanto-juvenil na Finlândia é muito maior que em Ruanda.” Meu artigo se referia a escolas brasileiras tão-somente: a ironia teria algum cabimento se nelas se desse educação finlandesa, o que infelizmente não é o caso. Parece ser muito difícil à magna inteligência do remetente compreender que um argumento contra a má educação não se volta contra a educação em geral, muito menos contra a boa. A má, quando se expande, prejudica mais gente, deforma mais mentalidades. A comparação cabível não é entre Brasil e Finlândia, mas entre Brasil e Ruanda: no Brasil há muito mais escolas e muito mais criminosos infanto-juvenis. Um pouco mais de QI e um pouco menos de presunção não fariam nenhum mal ao sr. Carlos.

Por fim, um rapaz de nome Fernando Raphael (fernandoraphaelferro@yahoo.com.br), além de dar razão aos puerilismos enfezados do sr. Anselmo Heidrich, acrescenta-lhes alguns da sua própria lavra, escritos naquele tom de superioridade fingida, forçada até o limite do desespero, que quase me leva às lágrimas diante de um complexo neurótico juvenil necessitado de compensações tão teatrais e exageradas.

Vejam:

Meu artigo: “O Estado tem também a obrigação de garantir assistência médica: deveriam então ser processados e presos os cidadãos que recorram a um médico particular, poupando aos cofres públicos uma despesa desnecessária?”

Contestação de Fernando Raphael: “A questão está mal colocada: os pais tem o direito de procurar um ‘médico’, no caso um professor, particular para educar seus filhos. Não através do homescholing, mas através das escolas particulares.”

OBS. – Se um pai tira seus filhos da escola, seja para educá-los pessoalmente, seja para entregá-los aos cuidados de um professor particular, nos dois casos está praticando homeschooling. Se, ao contrário, os inscreve numa escola particular, não está poupando despesa nenhuma aos cofres públicos, pois essas instituições se beneficiam de toda sorte de incentivos estatais provenientes dos impostos. Mal colocada é a comparação entre essas duas hipóteses e a consulta a um médico particular, que o cliente paga integralmente do seu bolso.

Meu artigo: “Por fim, o próprio Carlos Artexes Simões não percebe a monstruosidade comunofascista que profere ao declarar que ‘a escola ainda é a vanguarda do ponto de vista do conhecimento necessário para a construção de um Estado republicano’. Por que as crianças deveriam ser usadas como tijolos para a construção deste ou daquele regime político que interesse ao sr. Simões?”

Fernando Raphael: (1) “Obviamente, quando se fala em Estado republicano, não se está falando de fazer a escola servir a este ou aquele governo.”

OBS. – Não falei em governo, mas em regime. Ou a escola deixa os estudantes livres para discutir as vantagens e desvantagens dos vários regimes, ou lhes impõe o regime existente como o único aceitável. No primeiro caso, a escola não é republicana nem monárquica, nem pró-comunista nem pró-capitalista. No segundo, é uma central de propaganda. Tertium non datur.

Fernando Raphael (2): “Se o regime fosse monárquico, certamente o formato da escola seria diferente.”

OBS. – Não. Simplesmente não. Mesmo sem contar que não há uma aritmética monárquica e uma republicana, a possível mudança de conteúdo de duas ou três matérias histórico-sociais em particular não pode modificar em nada o “formato da escola”. Qual a diferença de “formato” entre as escolas da Dinamarca, da Suécia, da Espanha, da Inglaterra, e as da França, da Itália ou de qualquer outra república? De onde esse sujeito tirou tamanha enormidade?

Fernando Raphael (3): “A escola serve sim, ao contrário do que diz o Olavo, para moldar o cidadão a vida republicana. Para ensinar o hino nacional, o hino a bandeira, o nome do presidente, do governador, e dizer quais os 27 estados que compõem a nação. Ensinar quais foram os presidentes, e quais os caminhos que foram trilhados para a construção do regime republicano.”

OBS. – Essas informações, se dadas com a objetividade que se espera de uma escola, não implicam nenhuma adesão ao regime vigente, apenas a constatação da sua existência, que uns podem considerar adorável, outros abominável, sem que isto afete em nada o conteúdo das informações. Se você perguntar a Dom Bertrand de Orleans e Bragança qual a letra do hino nacional, quais os nomes do presidente e dos governadores e quais Estados compõem a nação, as respostas dele serão iguais às de qualquer republicano alfabetizado. Esse conhecimento é indispensável tanto a quem adore o regime republicano quanto a quem pretenda substituí-lo por outro regime.

Fernando Raphael (4): “Esta é uma das funções da escola, inclusive garantindo a perpetuação deste regime a partir de sua aceitação pelas novas gerações.”

OBS. – Com isso voltamos ao item 1. Se a escola deve “garantir a perpetuação do regime”, não pode permitir que ele seja discutido democraticamente. Se o permite, corre o risco de que os estudantes venham a preferir outro regime. Quer dizer: ou a escola permite pensar, ou impõe o pensamento prêt-à-porter. Ou educa, ou manipula. Não há terceira alternativa.

Meu artigo: “Não sabe ele (o sr. Carlos Artexes Simões) que há um crescimento proporcional direto da criminalidade infanto-juvenil à medida que se amplia a escolarização?”

Fernando Raphael: “Este é o argumento mais bovino que ele poderia usar: por acaso há algum estudo que comprove uma relação de causa e efeito entre escolarização e delinquência juvenil?”

OBS. – Sim, há. Há muitos. O fato de que o sr. Fernando Raphael os desconheça não os suprime da existência, ao contrário do que ele supõe no seu solipsismo de ignorante. Tão ignorante que, nada sabendo a respeito, imagina que a única possibilidade de estabelecer essa correlação seria “colocar lado a lado os índices de crescimento da escolaridade com os índices de criminalidade”, sem as mais mínimas precauções de metodologia estatística. Nenhuma correlação de índices, é claro, significa nada sem a conexão causal concreta, e esta, no caso, não é dada por nenhum cálculo estatístico, e sim pela indução direta e indireta ao comportamento anti-social nos programas educacionais, pelo efeito corruptor da pressão dos colegas, pelo uso generalizado das escolas como pontos de venda de drogas, etc. etc. Só depois de elucidados esses fatores o estudo estatístico passa a fazer sentido, mas não há um só pesquisador da área que desconheça isso e que precise ser instruído a respeito pelo sr. Fernando Raphael. Este não é capaz de conceber nem mesmo que os estudos sobre o assunto existam, quanto mais que seus autores tenham inteligência suficiente para pensar no que ele não pensou. É próprio do imbecil imaginar que aqueles a quem ele desconhece são ainda mais imbecis do que ele (o homem inteligente, ao contrário, tende sempre a apostar na inteligência alheia, até obter provas que a desmintam). Não sou caridoso ao ponto de fornecer ao sr. Fernando Raphael uma bibliografia pronta, que ele teria a obrigação de haver pesquisado antes de afirmá-la inexistente, mas sugiro-lhe apenas começar pelos livros de Charlotte Yserbit, John Taylor Gatto, Jean-Paul Brighelli e outros, onde ele encontrará mais indicações de fontes, se é que precisa delas para continuar tão burro e presunçoso quanto é. Sugiro também uma conversa com o prof. Luís Faria, que começou a estudar o assunto desde uma época em que o sr. Fernando Raphael não existia nem sob a forma de espermatozóide.

Fernando Raphael: “Sem recorrer a métodos sofisticados, basta ir a um presídio e perceber que há mais presidiários com baixa escolaridade que presidiários com alta escolaridade.”

OBS. – Oh, que belezinha! Se o de que estamos falando é criminalidade infanto-juvenil e não adulta, é claro que o assunto é a educação elementar e média, não superior. Se digo que a educação fornecida às crianças as induz ao crime, responder que as universidades não fazem o mesmo não é de maneira alguma uma resposta, nem mesmo bovina. É um peido mental na melhor das hipóteses. E por acaso não há mais presidiários com alguma escolaridade elementar do que sem escolaridade nenhuma? Esta pergunta teria ocorrido automaticamente ao sr. Raphael se ele compreendesse o que acabava de escrever.

Fernando Raphael: “E se a deliquência infanto-juvenil aumenta a medida que cresce a escolaridade, olhando um mesmo grupo, o que se tem é o fato de que crianças de 7 anos têm menos meios que cometer crimes que adolescentes de 14 anos.”

OBS – Uai, e as crianças de quatorze anos não têm mais escolaridade que as de sete? E entre os “meios de cometer crimes” não se conta a rede de relações formada nas escolas? Será que a única diferença entre uma criança de sete e a de quatorze anos é o maior desenvolvimento biológico? Não se incluem aí os hábitos culturalmente adquiridos (bons e maus), os valores e contravalores introjetados, o acesso a novas informações e novos meios de ação, etc.? E a educação não conta para nada em tudo isso? Usar a idade biológica como argumento contra a hipótese de que a escolarização induza ao crime é um tiro no pé, ou melhor, no pseudópodo.

Fernando Raphael: “O Olavo de Carvalho certa vez, numa de suas aulas, disse que a criminalidade tinha crescido no século XX por causa da universalização do ensino. Citou o exemplo dos EUA. Claro, que ou ele é muito burro, ou é um canalha, já que este argumento é impossível de se provar, dado o fato de que não existiam estatísticas sobre criminalidade antes do século XX, e que não havia sequer estatísticas antes do século XX.

OBS. – Já que não lê livros, ele poderia consultar pelo menos uma fonte mais apropriada à mentalidade da sua geração. Lê-se na Wikipedia: “Some scholars pinpoint the origin of statistics to 1662, with the publication of Natural and Political Observations upon the Bills of Mortality by John Graunt.[7] Early applications of statistical thinking revolved around the needs of states to base policy on demographic and economic data… The scope of the discipline of statistics broadened in the early 19th century to include the collection and analysis of data in general…”

Mesmo que eu tivesse usado algum argumento impossível de provar (coisa que não fiz), isso não faria de mim nem burro, nem canalha, visto que não há provas de uma infinidade de argumentos usados legitimamente em ciência e filosofia. O que, sim, faz de um burro um canalha, e de um canalha um burro, é escrever num tom de certeza superior sobre um assunto que se desconhece por completo, e ainda xingar quem o conhece.

Na sua ânsia louca de dizer algo contra mim, o infeliz apela até a pretextos mutuamente excludentes.

Comparem:

Alegação A: “Outra coisa: ele não tem curso superior. Eu acho que isso faz muita falta pra ele, porque ele não consegue, por exemplo, discutir sem partir pra ignorância.”

Alegação B: “Nunca fui achincalhado por ele como o Constantino ou o Cristaldo, por exemplo. Na verdade, nem desejo sê-lo. O Olavo tem um grande conhecimento de retórica, que ele usa abundantemente em seus textos, contra seus detratores”

Como poderiam essas duas alegações ser igualmente verdadeiras? Ou sou um despreparado que não consegue responder a um argumento sem partir para a ignorância, ou sou um temível dominador da ciência da argumentação. Ou atemorizo o menino pela destreza de raciocínio, ou pela grosseria inculta. Pelas duas coisas ao mesmo tempo, não posso. Esse milagre, só quem pode realizá-lo é o Olavo de Carvalho mítico que assombra a imaginação do sr. Fernando Raphael.

Incapaz de notar uma contradição tão substantiva e flagrante, ele demonstra uma sensibilidade doentia para enxergar contradições onde elas não existem:

“As críticas dele ao ateísmo, são incoerentes com os elogios que ele faz a diversos autores, dentre os quais Von Mises.”

Qual a incoerência aí, porca miséria? Quem quer que combata o ateísmo é então obrigado a negar as virtudes mais óbvias de todos os autores ateus e agnósticos? Isso não seria coerência, seria rigidez obsessiva, fanatismo doente. O sr. Fernando Raphael não conhece a diferença entre as duas coisas, e me condena pelo delito de conhecê-la.

Agora vamos ao que interessa.

Meninos como esse Fernando, ou Anselmo, são frutos da mesma educação criminosa que denunciei no meu artigo. Não podem enxergar o problema, porque são partes e sintomas dele.

Desde logo, não sabem escrever. Heidrich nunca ouviu falar de regência preposicional, Raphael não consegue colocar as vírgulas no lugar e não sabe sequer o que é uma crase. É ridículo imaginar que, sem o domínio adequado do idioma, alguém pode ter acesso à alta cultura. Um dos sinais mais patentes de incultura é a propensão ou hábito de crer que a boa escrita é apenas um adorno exterior, alheio à qualidade do pensamento. Dante explicava que a gramática é a estrutura material do pensamento expresso. Se você não apreende sequer a estrutura material, como vai orientar-se nas abstrações da lógica, nas sutilezas psicológicas da retórica? A incompreensão dos argumentos que lêem, a incapacidade de discernir os níveis de predicação, de orientar-se na passagem de uma categoria a outra e até de perceber a diferença entre um argumento e uma alusão abreviada são traços que se repetem praticamente a cada linha das mensagens de Raphael e Heidrich.

Que pessoas tão obviamente mal formadas se aventurem a opinar nas grandes questões da cultura superior e ainda se atrevam a fazê-lo num tom de desprezo olímpico que até mesmo eruditos tarimbados evitam adotar exceto em casos extremos, eis aí um grave sinal de alienação, de falta de consciência da verdadeira posição que ocupam na hierarquia das capacitações intelectuais. Essa posição é muito baixa, mas ou eles não sabem disso, ou, sabendo-o e não suportando sabê-lo, buscam compensar essa constatação deprimente mediante a afetação de uma superioridade que não têm. Se fossem os únicos a fazer isso, seriam doentes de histeria. Como esse tipo de fingimento histérico se tornou endêmico na juventude falante, são apenas sinais dos tempos, índices sociológicos de uma época em que tudo se tornou burla, histrionismo, palhaçada.

Um dos sintomas mais claros de fingimento histérico é a necessidade compulsiva de inventar lorotas, na vã esperança de assim reforçar sua posição no debate. O sr. Heidrich inventou a história da casa de Curitiba, o sr. Raphael, além de adulterar o sentido de várias citações que faz, assegura, com ares de certeza, que minhas críticas a Hegel (aliás menções passageiras) foram copiadas de um filósofo inglês, que ele não nomeia e o qual não tenho a menor idéia de quem seja. Não satisfeito com essa performance, inventa um capítulo inteiro da minha biografia imaginária:

“Pra mim, a socialização exercida pela escola é necessária sim… O Olavo de Carvalho, segundo ele mesmo diz, não passou pela escola. Ficou anos em casa, porque sofria de uma doença. Veja o esquisitão no qual ele se tornou.”

Estive doente, sim — do nascimento até os sete anos de idade. Sarei precisamente em tempo de ir para a escola. A doença não me privou de um só dia de aula, de modo que, se me tornei um esquisitão, não foi sem alguma ajuda do establishment escolar.

Por que esses garotos mentem tanto? Como não enxergam o ridículo a que se expõem com essas confissões explícitas de vigarice? Como não percebem que o apelo a tais baixezas desmascara instantaneamente sua pose de superioridade? Que maior prova se poderia exigir de que não se enxergam, de que não têm o mínimo da maturidade intelectual e moral necessária às discussões em que se metem?

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