Por Alceu Garcia


18 de abril de 2002

Introdução

O dinheiro é parte importante de nossas preocupações e afazeres cotidianos. No dia-a-dia de cada um, porém, o “vil metal” é apenas mais um dado de realidade; sua natureza última e funções sociais não despertam nenhum interesse. As pessoas contentam-se em conseguir o din-din para pagar suas contas e está muito bom assim. O estudo da moeda em si, assunto mortalmente entendiante para quase todo mundo, é deixado para os especialistas. E é aí onde mora o perigo. Se os especialistas adotam teorias errôneas sobre o dinheiro, que servem posteriormente de esteio intelectual para a ação maliciosa do Estado nesse campo, todos nós somos gravemente afetados e lesados. Talvez não seja de todo inútil, pois, esboçar aqui – muito imperfeitamente – os rudimentos teóricos sobre a natureza e função da moeda, de maneira que os interessados possam municiar-se de conhecimento sobre um aspecto crucial de suas vidas e, com base nele, tentar defender sua propriedade do larápio-mor que, como sempre, é o governo.

Troca Direta e Troca Indireta

Em toda sociedade cedo se percebe a vantagem da divisão e especialização do trabalho, pois o esforço especializado rende muito mais do quer sua dispersão em múltiplas tarefas concomitantes. Daí decorrem naturalmente as trocas entre produtores de mercadorias específicas. Desse intercâmbio surgem razões de troca entre os diversos produtos, preços de bens em termos de outros bens, conforme as valorações de compradores e vendedores. É a troca direta, ou escambo, que tem a desvantagem óbvia de exigir dupla coincidência de fins entre comprador e vendedor, i.e., aquele que deseja vender bananas para adquirir sapatos, por exemplo, precisa achar alguém que possua sapatos e queira trocá-los por bananas. Com o passar do tempo e com a intensificação dos intercâmbios, aparecem espontaneamente certas mercadorias dotadas de grande aceitação geral, que terminam por adquirir a qualidade de meio comum de troca, ou seja, de moeda. Nasce assim a troca indireta, na qual o aludido produtor de bananas troca sua mercadoria por dinheiro e depois dinheiro por sapatos, o que facilita enormemente o comércio. A história registra os mais variados tipos de mercadoria-moeda, tais como gado (em latim, pecus, donde pecuniário), sal (daí salário), conchas, pedras, anzóis, tabaco etc. No curso do tempo o uso monetário do ouro e da prata prevaleceu, dada a raridade, divisibilidade, homogeneidade, durabilidade e facilidade de transporte e estocagem desses metais.

Essa passagem da troca direta para a indireta, que ocorreu de forma independente em quase todas as civilizações conhecidas, representa um formidável progresso social por incrementar o comércio e a acumulação de capital, que por sua vez elevam o padrão de vida geral. Por outro lado, o caminho inverso, da troca indireta para a direta, significa um retrocesso gravíssimo. O Império Romano é um bom exemplo. Da florescente economia monetária do século II D.C. involuiu para a troca direta na medida em que o governo depreciou o dinheiro para financiar os déficits decorrentes do custo colossal de seu crescente aparato burocrático. Vastos e improdutivos gastos públicos, déficit orçamentário ascendente, tributação extorsiva, inflação e controle de preços. O resultado dessa combinação algo familiar foi a destruição da economia mercantil e monetária antiga. A invasão dos bárbaros e a economia feudal autárquica e estagnada foi um conseqüência natural dessa regressão econômica.

A Natureza do Dinheiro

Dessa breve introdução pode-se deduzir que o dinheiro é toda mercadoria que adquire a propriedade de meio comum de troca, passando a intermediar os atos de compra e venda. Vale assinalar que esse atributo específico se desprende totalmente da utilidade original da mercadoria-moeda e se torna autônomo. O ouro, por exemplo, quando usado como meio de troca, além de sua qualidade original de insumo utilizado para diversas finalidades industriais (e a própria mística de metal precioso) adquire a qualidade autônoma e específica de moeda. Para visualizar melhor esse fenômeno basta comparar o ouro-moeda com o nosso atual papel-moeda. Este último praticamente não tem valor não-monetário algum, são só tiras de papel pintado. Como dinheiro, contudo, tem a mesma natureza e função que o ouro-moeda. Outra inferência fundamental é que a moeda é uma criação do mercado, ou, o que é a mesma coisa, da livre interação contratual, voluntária e mutuamente benéfica entre os indivíduos. O que equivale a dizer que o dinheiro não é uma invenção maligna de uma classe dominante exploradora ou que decorre de um contrato social político mediado pelo Estado. O controle estatal da moeda, todavia, pode resultar, e invariavelmente tem resultado, em efetiva exploração. Mas isso veremos mais à frente.

O Cálculo Econômico

A própria existência de moeda, o meio comum de troca, ao permitir que todos os preços sejam expressados em uma única unidade de conta, torna possível o cálculo econômico complexo indispensável ao funcionamento racional de uma economia desenvolvida. Numa comunidade primitiva é possível um cálculo não-monetário rudimentar e empírico por parte dos agentes econômicos. Uma economia complexa, porém, não pode subsistir sem preços em moeda. O trabalho, o capital, a terra, os bens e serviços são heterogêneos. Os diversos tipos de trabalho não são redutíveis a uma “unidade de trabalho” (como o fracasso da teoria do valor-trabalho o demonstra), assim como é impossível somar siderúrgicas e ferrovias, ou ferro e petróleo. Os seus respectivos preços monetários, porém, podem legitimamente ser comparados, somados, multiplicados etc. Desse modo o cálculo aritmético ex-ante e ex-post de lucros e perdas, fundamental para uma economia desenvolvida, pode ser efetuado com eficácia. Não existiria desenvolvimento econômico sem moeda, preços monetários e a moderna contabilidade, conforme acentua Ludwig von Mises. Incidentalmente, vale recordar que sem propriedade privada não existem preços, nem cálculo econômico, nem progresso econômico.

Dinheiro e Incerteza

A impossibilidade de se conhecer o futuro é um dado de realidade inexorável. Dessa incerteza permanente deflui outra das funções da moeda, que é a de servir como reserva para contingências inesperadas. Os indivíduos tendem na medida do possível a manter saldos monetários disponíveis para emergências, em nível mais ou menos constante. A compreensão desse fenômeno é facilitada quando se contrasta a realidade perpetuamente cambiante com um estado imaginário de coisas em que não ocorrem mudanças, em que o futuro é sempre igual ao passado. Nesse caso, todas as pessoas sabem de antemão como será despendida a sua renda, pelo que não há a necessidade de se manter saldos de reservas monetárias. No mundo real isso não acontece, e as preferências pessoais por reservas de dinheiro constituem um dos pontos principais da determinação do valor da moeda.

O Valor do Dinheiro

O dinheiro é uma mercadoria sui generis, pois não é bem de consumo nem bem de capital. Demanda-se moeda para trocá-la por bens de consumo ou pelos serviços dos fatores de produção. Outro ponto peculiar é que, ao contrário de quase todos os demais bens, a sociedade não se beneficia de um aumento da quantidade de dinheiro. É um interessante paradoxo esse, pois se para cada indivíduo é em geral benéfico possuir mais dinheiro do que antes, para a comunidade como um todo o crescimento da quantidade de dinheiro é altamente prejudicial. A sociedade vista globalmente ganha se existem cada vez mais batatas, televisões, fábricas etc, uma vez que a elevação da oferta em geral reduz os preços e o poder aquisitivo do dinheiro dos indivíduos aumenta. Se há cada vez mais dinheiro, contudo, não há benefício geral algum (conquanto haja vantagens para grupos particulares em detrimento dos demais) pois isso se traduz na redução progressiva do valor da unidade monetária, bem como na descoordenação das atividades econômicas. Se não detida essa depreciação, o sistema monetário entra em colapso com terríveis repercussões sociais.

O poder aquisitivo da unidade monetária, que é o seu preço em relação a tudo que é trocado por dinheiro em um dado momento, jamais é fixo ou constante. Ele sempre varia. Os fatores que governam essas variações podem se originar no “lado do dinheiro” ou “no lado dos bens e serviços”, ou ainda em ambos simultaneamente. Caso a quantidade de moeda decresça (deflação), e a produção de bens e serviços fique constante, aumente ou decresça menos do que a diminuição do dinheiro, o valor da moeda se eleva. Se a oferta de dinheiro se mantém fixa ao longo do tempo, o desenvolvimento econômico traduzido em maior quantidade de bens e serviços produzidos também acarreta uma elevação do valor da moeda (queda dos preços), que passa a comprar mais produtos do que antes. Se a quantidade de dinheiro aumenta pari passu com o aumento da produção, o “nível geral de preços” tende a permanecer constante. Vale notar, contudo, que esse “nível geral de preços” é um agregado imaginário, uma ficção estatística arbitrária. O que existem são milhões de preços específicos (determinados pela interação de oferta e procura segundo as valorações de compradores e vendedores), que podem ficar acima ou abaixo do “nível geral”. No caso da oferta de moeda crescer mais do que produção, o resultado é o declínio do valor da unidade monetária (aumento de preços) que passa a comprar cada vez menos bens e serviços. Esses dois últimos casos se traduzem em inflação, que, ao contrário do que pensa o público (desinformado por legiões de pseudo-economistas), não é um aumento geral e contínuo dos preços. Este pode ocorrer ou não, e, quando ocorre, é sempre o efeito da inflação, que é o aumento da quantidade de dinheiro em relação a um total anterior.

Outras hipóteses de flutuação do valor da moeda relacionado ao “lado do dinheiro” ocorrem quando os indivíduos elevam ou reduzem seus saldos monetários, ainda que mantido fixo o estoque de moeda. No primeiro caso, em função de circunstâncias conjunturais que engendrem pessimismo e receio, as pessoas reduzem seus gastos correntes e investimentos e deixam mais dinheiro “parado”, de modo que o valor da unidade monetária aumenta (os preços caem), pois há menos moeda sendo utilizada na aquisição de bens e serviços. Isso é o que os keynesianos denominam “entesouramento”. Na hipótese inversa, as pessoas reduzem o dinheiro em caixa e aumentam seus gastos e investimentos, sendo que mais dinheiro circula e seu valor unitário cai (os preços sobem). Esse último fenômeno pode gerar um tipo curioso e raro de inflação de preços sem aumento da quantidade de dinheiro, que ocorre quando todos os agentes econômicos se apressam em zerar seus saldos monetários a qualquer custo, livrando-se do dinheiro o mais rápido possível em troca de qualquer coisa. Mesmo com um estoque fixo de dinheiro, nesse caso os preços disparam até que simplesmente ninguém aceita mais o dinheiro. Isso aconteceu quando os americanos invadiram as Filipinas em 1944, e os filipinos, prevendo a iminente vitória ianque, se deram conta que a moeda posta em circulação pelos ocupantes japoneses logo perderia totalmente seu valor. Previsivelmente, eles se precipitaram em gastar o dinheiro japonês à toda pressa, o que gerou uma hiperinflação colossal. Esse episódio, aliás, ilustra didaticamente o fato de que o valor do dinheiro, como o de tudo o mais, depende das avaliações subjetivas individuais. A redução do fenômeno monetário à equações matemáticas, como preconizam muitos economistas, é assim inútil pois não há constantes nas ações e valorações humanas que possam se traduzir em relações matemáticas seguras.

Bancos, Moeda e Crédito

Originariamente os bancos eram casas de depósito de moeda (ouro e prata) que emitiam certificados de depósito à vista para os clientes cobrando uma pequena taxa pelo serviço. Esses certificados passaram a circular mais do que a própria moeda, por razões de segurança e conveniência, e se tornaram substitutos de moeda. Como a moeda (ouro e prata) praticamente não era sacada em quantidades significativas, as casas bancárias ficaram tentadas a emitir certificados além da correspondência exata com a moeda depositada, emprestando a juros esses papéis sem lastro. Assim, se fulano depositava 100 unidades de moeda-ouro no banco x, este emprestava, digamos, 50 a sicrano cobrando juros, abrindo uma conta sujeita à retirada por cheque para sicrano. Desse modo, de 100 unidades de moeda-ouro originárias havia agora 150 unidades de papel-moeda existentes. Se fulano e sicrano decidissem resgatar seus certificados de moeda-ouro ao mesmo tempo, o banco ficaria com um passivo descoberto de 50 unidades de moeda-ouro. Dessa maneira os bancos podem criar moeda via crédito, inflacionando o meio circulante. Trata-se de fraude pura e simples, vez que os bancos e os beneficiários do crédito inflacionário estão ganhando alguma coisa em troca de coisa nenhuma. O dinheiro surge do nada. Trata-se de uma violação do direito de propriedade dos donos do dinheiro-metal. Esse processo pode ser barrado por normas jurídicas baseadas no princípio geral do dever de não causar dano, obrigando-se os bancos a operar com reservas de 100%, i.e., proibindo-os de criar moeda via crédito inflacionário. Ademais, em um mercado desimpedido, o banco que inflaciona logo se vê em dificuldades na medida em que suas emissões além das reservas são depositadas em outros bancos e na compensação a posição descoberta do banco “espertalhão” é revelada. Longe de ser solucionado, contudo, o problema foi agravado pela intervenção estatal no mercado monetário, como se verá a seguir.

Governo e Moeda

Se o dinheiro é uma antiga criação do mercado, a interferência do estado nesse campo é quase tão antiga quanto. Inicialmente os governos assumiram a tarefa de garantir a pureza do metal e o seu peso, apondo seu selo nas moedas. Os particulares levavam o ouro e a prata puros a uma oficina estatal que as transformava em moedas, cobrando uma pequena taxa pelo serviço (senhoriagem), as devolvia aos proprietários e o dinheiro passava a circular. Porém, não demorou muito para que o aparelho coercitivo estatal fosse posto a serviço dos políticos e seus clientes, em detrimento dos cidadãos comuns. O governo começou a falsificar o dinheiro misturando ouro e prata com metais baratos de um lado (aumentando a quantidade nominal de dinheiro para financiar seus gastos com uma crescente burocracia parasitária) e mantendo o valor nominal das moedas por outro lado, exigindo que o mercado não descontasse a depreciação. É claro que o resultado foi a inflação de preços e a destruição do sistema monetário.

Nos tempos modernos o mesmo processo se sofisticou bastante, malgrado a finalidade tenha permanecido a mesma: exploração. O aparecimento dos bancos, da moeda-papel e da moeda-escritural (simples magnitudes contábeis) criaram oportunidades para os governos roubarem mais do que nunca. Longe de editar leis que obrigassem os bancos a operar com reservas de 100%, os governos intervieram no mercado financeiro associando-se a (ou criando) certos bancos pseudo-privados, aos quais outorgavam privilégios como monopólios territoriais e de emissões de notas, suspensões de pagamentos, obrigatoriedade dos bancos particulares manterem depositados neles as suas reservas, administração dos fundos públicos etc. Essas instituições privilegiadas, como o Banco da Inglaterra, foram os protótipos dos atuais bancos centrais. O objetivo último desse processo é o de politizar totalmente o dinheiro, retirando do mercado, isto é, de nós, o poder de criar moeda. Para tanto foi necessário destruir o padrão-ouro internacional. Na vigência deste, a moeda mundial era o ouro, sendo as moedas nacionais vinculadas ao metal em uma paridade fixa. As notas bancárias nacionais podiam ser convertidas em ouro a qualquer tempo por qualquer um que assim o desejasse, bastando exigir dos bancos a troca das notas pelo ouro correspondente. Como tudo o que é humano, o padrão-ouro não é perfeito. A quantidade de moeda aumenta na medida em que mais ouro é descoberto e monetizado. Subsiste, pois, inflação que beneficia os mineradores. A grande vantagem, porém, é que a criação da moeda fica fora do alcance dos políticos e seus amigos. O estoque de moeda-ouro aumenta na medida em que os custos de mineração compensam a obtenção do metal, isto é, quando se gasta menos ouro na mineração do que se extrai da terra. Mas se o dinheiro é apenas papel, não há custo quase nenhum na sua impressão, e há menos custo ainda na criação contábil de dinheiro, de maneira que os governos podem inflacionar o meio circulante em escala sem precedentes. Outro ponto positivo era o freio imposto à políticas inflacionárias dos estados nacionais. Se o governo do país x decidisse criar dinheiro além das reservas-ouro, o banco central baixava artificialmente a taxa de juros, criando moeda do nada via depósitos bancários. Em reação, as pessoas convertiam suas notas em ouro e mandavam o metal para o país y, onde os juros eram mais altos; por outro lado, a maior quantidade de dinheiro elevava os preços internos e, com isso, incentivava a importação de similares estrangeiros mais baratos, sendo que os estrangeiros passavam a trocar a moeda por ouro e transferi-la para seus países de origem. A contração das reservas do país x punha todo o seu sistema financeiro em cheque (pois havia cada vez menos ouro em relação a papel), e o seu banco central era obrigado a elevar a taxa de juros para atrair ouro de fora e recompor suas reservas.

Desde o fim do padrão-ouro internacional em 1914 os governos ficaram cada vez mais livres para inflacionar a moeda, inclusive “teorias” como o keynesianismo foram concebidas e popularizadas como forma de propaganda ideológica para justificar os “benefícios” da moeda gerenciada pelo governo e para pintar o padrão-ouro como velharia ultrapassada, “relíquia bárbara” etc. O monetarismo de Chicago não difere muito nesse aspecto. E os marxistas continuam pensando que o futuro comunismo inaugurará uma era de abundância tamanha que o próprio dinheiro será abolido. Desde então a inflação tornou-se uma praga mundial sem igual na História. O dólar americano desvalorizou-se em mais de 90%, enquanto que moedas de países mais bagunçados como o nosso perderam mais de um quatrilhão % de seu poder de compra. Com a inflação os governos, via cartelização do sistema bancário sob a batuta dos bancos centrais, podem beneficiar seus clientes (o estamento burocrático, empresários privilegiados, bancos etc) à vontade, enquanto surrupiam o poder aquisitivo da maioria da população (sobretudo os mais pobres).

Para ilustrar o processo pelo qual o governo rouba o povo via manipulação da moeda, imagine o leitor que o seu prédio é um país. Suponhamos que o síndico, o Seu Palhares do 402, é o governo desse país e dispõe do poder de criar dinheiro. Esse síndico-governo logo cede à tentação de criar moeda ex-nihilo para comprar as coisas que os outros moradores do “país” produzem. O “governo” está ganhando alguma coisa em troca de nada. Para criar um ambiente favorável a esse roubo sistematizado, o Seu Palhares alicia outras famílias, distribuindo o dinheiro novo entre eles. Surge um processo de depreciação acelerada do poder de compra da moeda do “país”, pois há cada vez mais dinheiro comprando as mesmas coisas de antes, mas nem todo mundo perde ao mesmo tempo. Quem recebe a grana inflacionária primeiro ganha mais do que quem recebe por último, pois para estes os preços já subiram quando a moeda nova circulou. A cereja do bolo é a ideologia legitimadora difundida pelos intelectuais do prédio, todos devidamente inseridos na folha de pagamento do Seu Palhares, a qual garante ao “povo” que o sábio e idôneo governo sabe o que é melhor para seus cidadãos e que a administração da moeda é assunto científico complexo que deve necessariamente ficar à cargo dos especialistas. Quando a coisa começa a dar muito na vista, o síndico e seus intelectuais de aluguel põem a culpa do aumento generalizado de preços na ganância de certos moradores, como a D. Maria do 301, que vende doces e salgados, e decreta um congelamento de preços. Quando o congelamento fracassa, o “governo” então contém um pouco a emissão e impõe o sistema de “metas inflacionárias”, que é um roubo generosamente auto-delimitado pelo próprio ladrão. Por outro lado, para financiar a boa vida do síndico e seus amigos e aliados, a taxa de condomínio (ou seja, os impostos) sobe para as alturas. Ninguém reclama, pois é consensual que o produto arrecadado será “investido no social”. Deu pra entender?

Outros fatores desastrosos na inflação são a falsificação da moeda como unidade de conta, com a conseqüente desorganização do sistema produtivo, bem como a descoordenação dos estágios da estrutura de capital, gerando os famigerados ciclos econômicos com suas fases de prosperidade artificial e posterior recessão ou depressão.

Solução: Despolitizar o Dinheiro

O absoluto controle estatal do dinheiro hoje reinante acarretou desgraças inenarráveis a povos inteiros. A inflação desbragada em nosso país é a principal responsável pela miséria de tantos de nossos compatriotas. Desde Hilferding, os marxistas juram que o “capital financeiro” se apossou do Estado para explorar a sociedade, inclusive o “capital produtivo”. A verdade é bem outra: o estado é que se assenhoreou do sistema financeiro em benefício próprio para explorar a sociedade. Enquanto nós, o povo, o mercado, não recuperarmos o nosso legítimo poder sobre o dinheiro, retornando ao padrão-ouro internacional (ou outro padrão qualquer não imposto pelos governos) e bancos com reservas de 100%, a instabilidade econômica global não terá solução e uma grande crise como a dos anos 30 pode sobrevir a qualquer momento. Trata-se antes de tudo de uma questão moral: não é justo (nem conveniente) que um grupo de indivíduos munidos do monopólio da violência e da coerção – ou seja, o Estado – detenha o privilégio socialmente catastrófico de determinar a oferta de moeda. Esse poder sempre será usado para o mal, como a experiência demonstra à saciedade.

Referências

The Value of Money, de B. Anderson;

A Desestatização do Dinheiro, de F. Hayek

From Bretton Woods to World Inflation e The Inflation Crises and How to Resolve it, de H. Hazlitt;

The Theory of Money and Credit e Ação Humana de L. von Mises.

Man, Economy and State, Power and Market e What the Government Has Done to Our Money?, de M. Rothbard;

The Age of Inflation, de H. Seinholz;

Lectures of Political Economy, vol. II, de K. Wicksell;

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