Por José Nivaldo Cordeiro
1 de Junho de 2002
A descrição que Roberto Godoy, jornalista especializado em questões de defesa do jornal “O Estado de São Paulo”, fez na edição de hoje sobre as conseqüências de possíveis explosões atômicas no conflito Índia/Paquistão, é apocalíptica. Detonar tais armas sobre centros urbanos não é apenas irracional, é uma afronta à espécie humana. E o que está em jogo naquela
disputa?
Objetivamente, o que vemos é um governo tribal – o Paquistão – confrontar uma democracia, alimentando de forma irresponsável um movimento separatista. Seu ponto de vista da revolução islâmica é um perigo, não apenas para a
Índia, mas para o mundo civilizado em geral. Dar a chefes tribais o poder de manejar artefatos com tal poder de destruição é algo que remete aos finais dos tempos.
A doutrina nuclear da Índia é sensata e responsável. Ogivas, mísseis e detonadores ficam em locais diferentes e só podem ser juntados para o respectivo disparo com decisão envolvendo inúmeros pessoas – incluindo todo o Parlamento. Dificilmente uma guerra nuclear de ataque pode ser gerada com
tal estrutura decisória.
Já o governo do Paquistão delegou aos chefes militares das suas unidades o poder solitário de decisão, algo muito perigoso, sobretudo se levarmos em conta a psicologia desses guerreiros islâmicos. Estão sempre com o dedo no gatilho.
Esse conflito me faz lembrar a ação de Israel, destruindo preventivamente a capacidade industrial que poderia fazer do Iraque uma potência nuclear.
Israel agiu muito corretamente, livrando o mundo da ameaça de um outro chefe tribal, muito mais irresponsável e arrogante, para manipular tais meios de destruição. Se a Índia tivesse feito o mesmo não estaria envolvida agora nesse pesadelo.
Isso coloca a responsabilidade das democracias ocidentais para mediar e prevenir tais conflitos. É inevitável imaginar que se aqueles dois países forem à guerra nuclear, o mundo jamais será o mesmo, pois os países mais poderosos terão que servir de polícia anti-nuclear. Acho até que já deveriam exercer tal papel. Até porque atentados com artefatos nucleares nos EUA e na
Europa só poderão acontecer a partir de artefatos fabricados nesses países, geridos como se fossem tribos no deserto. Prevenir a guerra nuclear em regiões distantes é também preveni-la no seu próprio território.
A questão crucial é se a eclosão de um conflito desse tipo será necessária para que seja feito o que é preciso de modo preventivo. Os líderes dos países mais importantes não poderão se omitir, sob pena de o mundo pagar um preço muito caro.