José Nivaldo Cordeiro


5 de janeiro de 2002

A revista Exame que está nas bancas trás uma excelente reportagem de capa sobre o comportamento de diversos mercados, destacando o avanço de marcas pouco conhecidas no ranking dos mesmos, contrariando o manuais de marketing em uso nas academias e no comando das gigantes nacionais e multinacionais. A reportagem é assinada pelo editor executivo Nelson Blecher e é daquelas que deverão ser lida por muito tempo. É uma referência para a compreensão da dinâmica do mercado brasileiro.

Todas as análises listadas na reportagem sobre o fenômeno estão corretas e pertinentes. Mas penso que a reportagem deixou pelo menos quatro pontos importantes sem o devido aprofundamento: 1- Não há barreiras à entrada na maioria dos mercados de bens de consumo de massa, razão pela qual qualquer descuido das marcas líderes enseja o aparecimento de um enxame de novos concorrentes; 2- É falsa a visão dos executivos de marketing de que o esforço mercadológico, com ênfase na comunicação, é a condição para o triunfo no mercado, o que induz a uma postura arrogante por parte das indústrias líderes em relação aos concorrente e aos canais de distribuição; 3- A dependência de força de venda terceirizada, com a estrutura em cascata dos impostos, pode significar a diferença entre ter lucro ou prejuízo; e 4- A relação coma rede varejista tem que ser cultivada como a variável estratégica de qualquer negócio, sob pena de fracasso mesmo das melhores marcas e dos melhores produtos.

O primeiro ponto parece uma obviedade. O conhecimento tecnológico para a produção da maioria dos produtos está incorporado no maquinário e a mão-de-obra gerencial treinada para tocar a fábrica é relativamente abundante. Então não há barreiras significativas nem de conhecimento e nem de custos, de modo que pessoas empreendedoras e com faro empresarial podem se estabelecer com grande sucesso.

O segundo ponto é a arrogância dos executivos de marketing, hoje já bem menor do que no passado, mas não o bastante. Nas empresas de bens de consumo de massa esses executivos normalmente são o poder, relegando opiniões valiosas dos executivos de vendas a segundo plano. Eu mesmo tive uma experiência didática quando era gerente de vendas de uma grande indústria de iogurtes. Na época fomos procurados por uma grande cadeia de varejo para fabricar a sua marca própria , o que naturalmente nos daria uma vantagem competitiva formidável em relação aos concorrentes, pois essa era a segunda maior cadeia varejista do país, à época. A idéia foi vetada pelo diretor de marketing, sob o falso argumento de que assim estaria prostituindo-se o mercado. É claro que um concorrente menor topou a parceria e aumentou substancialmente a sua participação no mercado, em prejuízo da marca líder.

Qual foi o erro de análise de diretor de marketing? Que a sua tarefa não era vender a produção industrial enquanto tal, mas sim, uma marca, uma evidente bobagem. Um coisa não colide com a outra, muito ao contrário. Está claro que a razão estava com o diretor de vendas, que queria o negócio, mas não teve força para vencer um argumento falso.

A utilização de distribuidores e outros intermediários no processo de venda caducou em muitos mercados. A forte concorrência obriga a prática de margens pequenas sobre o custo de produção, do contrário o produto não vende, de modo que colocar intermediários significa agregar custo de impostos sem agregar valor. É suicídio. A estratégia correta é terceirizar a logística, mas preservar a força de venda. A logística deve ser entregue aos melhores operadores do ramo, que podem reduzir substancialmente os custos, mas tirar pedidos nos mercados, fazer o trabalho de merchandising e demais as ações nos pontos-de-venda tem que ser encarado como uma necessidade estratégica, algo como o coração do negócio. Produzir não é o mais importante; o essencial é vender.

Por fim, é preciso sublinhar que a rede varejista, desde aquelas pequenas com apenas um ou poucos pontos-de-venda, até aquelas gigantes, devem ser tratadas de forma personalizada, conhecendo-se toda a estrutura decisória e procurando antecipar-se aos movimentos estratégicos dessas empresas. Para isso é preciso uma força de venda muito bem treinada. Um perfeito conhecimento do setor varejista é a condição para uma ação de sucesso em qualquer indústria e não fazê-lo pode custar bem caro. Uma organizada inteligência de vendas é absolutamente essencial mas, diga-se, é algo mais fácil de dizer do que de fazer.

O varejo é o locus onde a vitória ou a derrota de qualquer negócio se consuma. É a lição mais relevante de mercado nos tempos atuais.

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