José Nivaldo Cordeiro
6 de dezembro de 2001
A prefeitura da cidade de São Paulo começou a distribuir a chamada bolsa-escola, conforme fui informado por uma propaganda oficial ufanista e reconstrutivista, a mando da senhora prefeita. Ao mesmo tempo, estimativas da imprensa indicam que cerca de sessenta mil alunos ficarão de fora da rede de ensino público municipal por absoluta falta de vagas. O setor público municipal — e estamos falando aqui do ensino fundamental, sua missão constitucional — simplesmente não se equipou para atender a demanda. Em paralelo, a prefeita iniciou embate político na Câmara de Vereadores, objetivando reduzir a obrigatoriedade de alocar 30% da arrecadação tributária para a rubrica Educação, instituída pela Lei Orgânica do Município, reduzindo-a para 25%. E, de quebra, passando a considerar os gastos com inativos e pensionistas como elemento de cálculo para atingir o percentual, reduzindo ainda mais os recursos efetivos para o investimento e o custeio na estrutura educacional.
As contradições são gritantes. Como implantar um programa adicional (a bolsa-escola) para o conjunto privilegiado de alunos que têm a vaga e, supostamente por falta de recursos financeiros, não criar as sessenta mil vagas faltantes, penalizando duplamente os que não estão na escola, sem vaga e, portanto, sem o requisito para ter acesso ao benefício pecuniário? Qual é a hierarquia de prioridades, incluir benefícios para os incluídos e esquecer à danação os excluídos? Mas não é plataforma política da prefeita e do seu Partido denunciar a exclusão? Como então praticar efetivamente a exclusão? Parece coisa de um ser esquizóide: que não saiba a sua direita o que faz a sua esquerda, ora pois.
Quero declarar que por princípio sou contrário ao “carimbo” das verbas orçamentárias para o que quer que seja. Para mim 30 ou 25% continua sendo um número arbitrário. A cidade e as necessidades da população mudam ao sabor dos tempos e é bem provável que as mudanças nas variáveis demográficas, com o tempo, reduzam tanto a quantidade de crianças que a estrutura já feita não terá clientela. Por outro lado, a ponta oposta da escala etária será tão populosa – e provavelmente tão carente – que será merecedora da atenção especial do poder público, fenômeno que já se verificou em outros países. Pelo carência de vagas, seria o caso do município, no momento, investir até mais, quem sabe 35 ou 40% da receita tributária, porque não?
O ponto é que a prefeita e seu Partido acreditam na ossificação orçamentária como instrumento de garantia para as suas políticas e é nisso que reside a inconsistência: afinal, a Educação é, ou não, para eles, uma prioridade? A julgar pela peça que enviaram para a Câmara, não é, ou, como diria um recorrente candidato à Presidência da República, é menas prioridade.
O fato objetivo é que sessenta mil crianças pobres ficarão fora da escola e isso é algo imperdoável. É, para resumir numa palavra, incompetência. Nada justifica. O município de São Paulo é suficientemente rico para que suas crianças não fiquem fora da escola, desde que os governantes tenham como prioridade as reais necessidade de seus cidadão e que sejam movidos pelo propósito da inclusão social.
Lamentavelmente, os fatos gritam em sentido contrário. E continuamos a construir mais uma geração de analfabetos, párias sem lugar na sociedade, por culpa exclusiva de governantes despreparados. Isso no coração da cidade mais rica do Brasil.