Olavo de Carvalho

27 de junho de 2001

         Aos que ainda se interessem pelo episódio Fedelli, informo que da p. 305 do livro de Marie-France James, Ésotérisme et Christianisme Autour de René Guénon (Paris, Nouvelles Éditions Latines, 1981) constam as seguintes palavras:

         “Au nombre des habitués du Caire [i. e., freqüentadores da casa de René Guénon], rappelons le Sheikh Abdel Razel, professeur de Philosophie Mussulmane, Martin Lings, un certain Paterson, universitaire anglais islamisé sous le nom de Sheikh Abu Bakr... Parmi les guénoniens de passage, signalons dejà l’explorateur Marco Pallis, accompagné du fils de Ananda K. Coomaraswamy...”

         Na verdade o Seikh Abu Bakr não era “un certain Paterson”, mas o próprio Martin Lings, este sim um autêntico “universitaire anglais islamisé”.

         A identidade de Lings é novamente trocada na foto de capa, só que desta vez ele aparece como Titus Burckhardt. Para tornar as coisas ainda mais confusas, alguém com o nome de Burckhardt, mas que não me parece ser ele de maneira alguma, aparece na foto da p. 129 ao lado de Frithjof Schuon e Jean-Albert Cuttat.

         Obviamente a autora não conheceu Lings ou Burckhardt nem mesmo por fotografias, embora na época em que ela escreveu o livro o sr. Lings fosse um nome bem conhecido nos círculos acadêmicos europeus, como diretor da Seção de Manuscritos Orientais do Museu Britânico, e Burckhardt fosse um renomado editor de livros de arte.

         Outro personagem mencionado no parágrafo, o sr. Marco Pallis, teria podido, se consultado, desfazer todos esses erros. Como encontrá-lo? Fazendo o que eu próprio fiz quando precisei de uma informação dele: simplesmente pedi seu número à telefonista de Londres e falei com ele. É quase inverossímil que alguém empenhado numa investigação séria sobre o círculo de René Guénon no Cairo tivesse se omitido de tomar precaução tão elementar. O sr. Pallis era a pessoa mais gentil do mundo, e um homem capaz de perder horas ao telefone com um desconhecido do Terceiro Mundo não teria decerto se negado a receber uma pesquisadora acadêmica européia.

         Mais obrigatório ainda a um pesquisador católico seria consultar o filho de Ananda K. Coomaraswamy, o dr. Rama P. Coomaraswamy, citado pela srta. James como freqüentador, junto com Pallis, da casa de René Guénon no Cairo. O dr. Rama é um conhecido teólogo que nas décadas de 70 e 80 lecionou num seminário católico no Estado de New York e publicou vários artigos de polêmica anticonciliar. Por trás da ferocidade polêmica de seus livros, era um tipo bastante simpático e acessível, que sem nada saber de mim me recebeu em sua casa de New Haven em 1986 e teria feito o mesmo pela srta. James se ela consentisse em procurá-lo.

         O que me espanta na srta. James é que, tão meticulosa ao informar-se sobre os meios católicos franceses, que constituíam apenas o pano de fundo da sua narrativa, ela fosse tão desleixada ao tratar do círculo de René Guénon, que era o próprio miolo do assunto.

         Tal é o motivo pelo qual, desde o ponto de vista puramente historiográfico, e independentemente do que se pense pró ou contra René Guénon, julgo que o livro da srta. James não deve ser tomado às pressas como fonte confiável de informações a respeito.

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