Olavo de Carvalho

Jornal da Tarde, São Paulo, 20 de julho de 2000

AVISO: Cometi neste artigo um medonho erro de concordância, que passou impune pelos meus olhos de lince bêbado e pela revisão, em geral competentíssima, do Jornal da Tarde: “o entusiasmo… não são”. Não liguem não. É apenas senilidade precoce. – O. de C.

Tenho dito e repetido que o entusiasmo “ético” por trás de CPIs, tentativas de impeachment e violentas campanhas de imprensa contra “os corruptos” não são nem serão jamais outra coisa senão manobras sórdidas para extirpar do cenário as lideranças políticas indesejáveis e preparar o caminho para um Estado policial.

Que democratas de velho feitio udenista se deixem iludir pelas aparências e se prestem a colaborar com um empreendimento que simula realizar seus elevados ideais de moralidade e transparência, isso não muda em nada a natureza profunda da operação, que é maliciosa e golpista até a medula e que terminará por destruir esses mesmos ajudantes quando a vitória os houver tornado inúteis.

A prova mais decisiva está na seleção nitidamente facciosa dos casos que devem ser investigados e dos que devem ser protegidos sob um manto de silêncio e paternal cumplicidade. Um exemplo já antigo foram os empréstimos irregulares ao governo comunista da Polônia, uma trapaça bilionária que meu amigo José Osvaldo de Meira Penna, de vez em quando, busca em vão desenterrar do esquecimento. Embora o prejuízo brasileiro no episódio fosse muito superior às quantias cujo sumiço resultou na deposição de um presidente da República, e embora todos os implicados pelo lado polonês tenham ido para a cadeia, seus cúmplices brasileiros foram poupados até mesmo de humilhações verbais, por serem protegidos da cúpula esquerdista que já começava a dominar e hoje domina completamente a máquina nacional de denúncias e investigações. Outro caso foi o dos “arapongas” do PT, infiltrados em todos os órgãos do governo, surrupiando documentos para minar reputações e criando – justamente nos anos em que o governo federal, fechado o SNI, ficara sem assessoria na área de informações – um vasto serviço secreto privado, a mando dos interesses de um grupo político. Malgrado as denúncias do governador Esperidião Amin, ninguém achou que a ação desse poder estatal paralelo fosse mais digna de investigação do que miseráveis desvios de verbas feitos por politiqueiros do interior.

Mas não é preciso ir buscar exemplos no passado. Há apenas três semanas o dr. Isaías Raw, do Instituto Butantã, denunciou que as famosas vacinas cubanas contra a meningite B, que já custaram ao Brasil nada menos de US$ 300 milhões, são perfeitamente ineficazes para o principal grupo de risco dessa doença, as crianças de 4 anos ou menos.

A denúncia não ecoou no Brasil. Saiu no Diário Las Américas, dos exilados cubanos em Miami, no dia 28 de junho, e circula pela Internet, o “samizdat” eletrônico a que têm de recorrer os portadores de notícias proibidas.

A compra desses medicamentos foi praticamente imposta ao Brasil pelo lobby fidelista no Congresso norte-americano, quando um grupo de 110 parlamentares persuadiu a secretária Madeleine Albright de que as vacinas, até então jamais testadas fora de Cuba, eram o máximo em matéria de prevenção da meningite B.

Confiando na palavra desses sujeitos e na de um ministro cubano “doublé” de garoto-propaganda, o governo brasileiro encomendou logo 15 milhões de doses.

É previsível que venha a encomendar mais ainda, porque a prestigiosa indústria farmacêutica Smith-Kline-Beecham anunciou que pretende entrar na produção das vacinas, de parceria com o Instituto Finlay, de Cuba.

Agora, quando o Centro de Vigilância Epidemiológica comprova que as vacinas simplesmente não funcionam, o que sucede? Indignação geral? Manchetes, discursos inflamados, comissões de inquérito, pedidos de cabeças? Nada.

Nada, absolutamente. Apenas uma solícita aliança de silêncios para varrer para baixo do tapete os riscos de escândalo. Afinal, os US$ 300 milhões não foram para os bolsos de execráveis capitalistas, mas para o fundo de auxílio ao paraíso falido do Caribe.

Observem e verão: sistematicamente, nos últimos dez anos, denúncias de corrupção, de crimes, de violências só são investigadas quando úteis para a destruição de líderes políticos que constituam um risco potencial para a estratégia da dominação esquerdista. As outras são ignoradas ou abafadas.

Há dez anos digo e repito: a “Ética na Política” e as outras duas campanhas nacionais encabeçadas pela intelectualidade esquerdista – primeiro, “contra a miséria”, agora “pela paz” – compõem, juntas, o mais vasto empreendimento de manipulação da opinião pública já tentado no Brasil, ou talvez em qualquer parte do mundo, para a conquista do poder por uma elite maquiavélica e sem escrúpulos.

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