Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 8 de março de 2010

Não há instrumento de controle social mais eficiente do que a imposição de novas normas de linguagem, que limitam o pensamento e modelam a conduta das multidões e mesmo das elites sem que estas ou aquelas, no mais das vezes, cheguem sequer a perceber que estão sendo manipuladas.

Nas altas esferas do movimento comunista, o emprego desse instrumento foi adotado como estratégia prioritária de guerra cultural para a destruição da civilização do Ocidente desde pelo menos a segunda década do século XX, entrando numa etapa de aplicação maciça, em escala mundial, a partir dos anos 60.

Obsessivamente devotados aos fronts mais materiais e vistosos da luta anticomunista – a defesa da economia de mercado e das instituições democráticas formais –, os liberais e conservadores em geral não deram a mínima atenção a esse aspecto da luta cultural, chegando mesmo a fazer troça do “politicamente correto” como se fosse apenas uma extravagância inofensiva e passageira, denunciando como paranóico alarmista quem quer que visse aí alguma ameaça real. Como sempre acontece em tais circunstâncias, a afetação de superioridade serviu apenas para mascarar a fragilidade inerme da vítima que nega o perigo por medo de enfrentá-lo e assim deixa que ele cresça até o ponto em que toda veleidade de combatê-lo já se tornou inútil.

Hoje em dia, o controle esquerdista do vocabulário é um fato consumado, e aqueles que riam dele vinte anos atrás são os primeiros a submeter-se à autoridade postiça que prescreve limites à sua liberdade não só de expressão, mas até de pensamento.

Dentre outros inumeráveis decretos baixados por essa entidade, um que desperta na mídia e nas classes falantes em geral um reflexo de obediência automática é aquele que proíbe chamar de assassino o psicopata que matou com fria crueldade um garoto de seis anos. Por ser apenas nove anos mais velho que a vítima na ocasião do delito, esse monstro deve ser polidamente designado como “o jovem envolvido no crime”.

Quem imagine que se trata de mera questão de palavras, por ignorar que os nomes dados às coisas determinam nosso modo de vê-las e de lidar com elas, terá a ocasião de despertar do seu sono semântico ao saber que um juiz federal concedeu ao criminoso o direito de morar no exterior, com despesas pagas por você e por mim, porque o desgraçado se sentia, coitadinho, inseguro e mal querido no Brasil (v. http://odia.terra.com.br/portal/rio/html/2010/2/
moradia_no_exterior_apos_pena_por_morte_de_joao_helio_64829.html
). Claro: se o fulano não é “um assassino”, e sim apenas “um jovem”, por que não conceder-lhe a afeição paterna, a ternura sem fim que o código moral hediondo do Estado brasileiro reserva aos membros mais violentos e brutais dessa faixa etária?

Nos EUA, o governo já reprime o uso do termo “terroristas” para designar os celerados que matam americanos e israelenses com vôos suicidas ou bombas em supermercados. Até a FoxNews, tida como “de direita”, passou a moderar gentilmente sua linguagem ao falar dessas criaturas, desde que o canal aceitou investimentos de um potentado árabe. “Assassinos”, em contrapartida, é como são rotulados por toda parte os onze heróis que, em boa hora, e sem pôr em risco a vida de mais ninguém, deram cabo de um autêntico assassino em massa, o líder da organização terrorista Hamas. Uma vez que a mídia universal subscreveu esse rótulo infamante, o salto da fala aos atos é instantâneo: aproveitando-se da gritaria geral, a Interpol, uma organização notoriamente pró-comunista a serviço do governo do Irã, mas que ainda posa aos olhos do público ignorante como instituição policial respeitável, desfechou uma caçada mundial aos onze, culpados tão somente de um ato de guerra contra um inimigo em guerra.

Mudar o valor e o peso das palavras é determinar, de antemão, o curso dos pensamentos baseados nelas e, portanto, das ações que daí decorram. Quem quer que consinta em adaptar seu discurso às exigências do “politicamente correto”, seja sob o pretexto que for, cede a uma das chantagens morais mais perversas de todos os tempos e se torna cúmplice do jogo de poder que a inspirou.

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