Yearly archive for 2009

Apostando contra o tempo

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 21 de agosto de 2009

Quando comecei a alertar os leitores quanto ao Foro de São Paulo, mais de uma década atrás, ainda era possível fazer alguma coisa para deter, sem muitas dores ou traumas, o crescimento do monstro. Agora, que ele tem o apoio do governo americano e transformou a OEA em instrumento de suas ambições ilimitadas, só atos de bravura incomum, sustentados numa visão estratégica implacavelmente lúcida, podem livrar a América Latina do risco iminente – ou promessa segura – de uma ditadura socialista continental. Mas será concebível que duas décadas de adestramento contínuo na prática da covardia e da alienação produzam de repente uma explosão de coragem e lucidez?

Sei que, medido na escala mental da elite brasileira, o problema, ainda hoje, parece nem existir. Basta ler as palavras entusiásticas com que o presidente da Confederação Nacional da Indústria, deputado Armando Monteiro Neto, saudou o presidente da República ao homenageá-lo com o Grande Colar da Ordem do Mérito, conferido por aquela entidade:

“A abertura ao diálogo marcou sua história e, no presente, se consolidou como característica de seu governo… Com uma agenda de preservação dos fundamentos macroeconômicos e de inovação social, o Brasil se diferenciou. Ganhou confiança interna e transformou-se em exemplo para a América Latina e o mundo” (V. http://pt.org.br/portalpt/index.php?option=com_content&task=view&id=80330&Itemid=195).

Não digo que a “preservação dos fundamentos macroeconômicos” tenha sido de todo irreal. Digo, sim, que julgar só por ela o desempenho de um presidente, ignorando que a política econômica do presente governo se enquadra na estratégia maior de dominação continental do Foro de São Paulo, é coisa de um oportunismo imediatista imperdoável, voluntariamente cego para as conseqüências históricas de suas opções de momento.

Já expliquei e vou explicar de novo, com requintes de didatismo que normalmente só seriam necessários no ensino pré-escolar:

O Brasil foi o criador e é o centro de comando do Foro de São Paulo; como tal, fica na retaguarda, orientando e protegendo as vanguardas incumbidas das ações táticas mais imediatas, espetaculosas e arriscadas.

Acalmar e até contentar o empresariado local é a condição sine qua nonpara que o governo petista possa, sem risco de crises e hostilidades, ir fortalecendo discretamente a máquina de guerra do Foro de São Paulo, já hoje habilitada a ocupar manu militari o continente inteiro, só não o fazendo para não correr o risco de abortar um processo que, pelas vias mais indiretas da política, da subversão cultural e do fomento ao banditismo, se anuncia de sucesso praticamente inevitável.

Afinal, o governo que “preserva os fundamentos macroeconômicos” é o mesmo que acoberta a ação das Farc no Brasil, aplaude todos os arreganhos militaristas de Hugo Chávez, abre o nosso território à ocupação por organismos internacionais e sacrifica até os mais óbvios direitos da nação para favorecer o crescimento dos governos de esquerda nos países em torno. Quando um presidente explode de indignação e chega a desferir palavrões contra um de seus próprios ministros pelo simples fato de que este cedeu à tentação de defender os interesses nacionais em vez de sacrificá-los à cobiça estrangeira (v. http://congressoemfoco.ig.com.br/coluna.asp?cod_canal=14&cod_publicacao=29210), é óbvio que algo de muito estranho, para não dizer de abertamente criminoso, se passa nas altas esferas da República, transformadas em agentes locais de um esquema internacional de dominação.

Ajudando a consolidar o poder e prestígio desse governo, por simples gratidão a pequenas vantagens momentâneas que ele lhe oferece, a Confederação Nacional da Indústria contribui, involuntariamente decerto, para que em breve tempo o Brasil se transforme numa singularidade geopolítica jamais vista no mundo: uma nação capitalista cercada de regimes comunistas e governada pelo próprio agente que os criou. Quanto tempo durará esse capitalismo quando o processo da revolução continental em torno estiver completado, é pergunta inteiramente desnecessária: ele durará o tempo exato para que cada empresário escolha entre submeter-se a um comissário político ou transformar-se ele próprio em comissário político.

***

Em tempo: Kenneth Maxwell, aquele mesmo consultor do CFR segundo o qual o Foro de São Paulo não existe (v. www.olavodecarvalho.org/semana/11232002globo.htm), aparece agora na Folha (onde mais poderia ser?) jurando que “os latino-americanos são unânimes em seu apoio a Manuel Zelaya, o presidente hondurenho derrubado”.

Já desisti de pensar que o problema desse pretenso historiador é incompetência. Ninguém com diploma de curso primário pode crer seriamente que um governante foi derrubado por falta de inimigos. Maxwell é mentiroso, ponto final. É um desinformante profissional. Eis o único motivo pelo qual é tão apreciado pelo jornal do sr. Frias, órgão da mídia desconstrucionista que não acredita na existência da realidade.

A burguesia indefesa

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 17 de agosto de 2009

Quem quer que, mais de uma década atrás, estudasse com atenção as atas do Foro de São Paulo e as confrontasse com as ações de seus membros espalhados por duas dúzias de países teria chegado fatalmente, tal como eu mesmo cheguei, às seguintes conclusões:

1. O Foro era uma peça vital no esquema do terrorismo e do narcotráfico internacionais (não somente latino-americanos).

2. Criação quase que exclusivamente brasileira, ele tinha no Brasil o seu centro de comando estratégico e em outros países-membros as suas vanguardas incumbidas das ações táticas mais imediatas e espetaculares.

3. Isso bastava para demonstrar que a aparente distinção entre uma “esquerda revolucionária” e uma “esquerda democrática”, personificadas respectivamente por Hugo Chávez e Lula, não passava de uma camuflagem calculada para ocultar a unidade estratégica do conjunto.

4. No quadro do Foro, a articulação da esquerda com quadrilhas de delinqüentes, que já se preparava desde os anos setenta (v. meu livro de 1993, A Nova Era e a Revolução Cultural, Apêndice I, em http://www.olavodecarvalho.org/livros/neesquerdas.htm), sofreu um upgrade formidável, permitindo que as FARC se tornassem as senhoras absolutas do narcotráfico no continente e as controladoras de várias organizações criminosas menores, como o PCC e o Comando Vermelho.

5. A articulação perfeita da violência criminosa com a luta política legal (transformada ela própria, portanto, em instrumento do crime) estendia um manto de proteção continental sobre terroristas e narcotraficantes que operassem em países estrangeiros e tornava a América Latina inteira um território livre para a atuação desses delinqüentes.

Se essas obviedades permaneceram invisíveis até muito recentemente, foi pelas seguintes razões:

1. As organizações da esquerda legal tinham, em todas as redações de jornais e noticiários de TV e rádio, um número suficiente de representantes, inclusive nos mais altos postos, para desestimular e bloquear qualquer investigação séria sobre as atividades do Foro.

2. As vastas conexões internacionais da organização, envolvendo interesses financeiros gigantescos, davam-lhe os meios de ter à sua disposição, infiltrados em governos, think tanks, institutos de pesquisa, universidades e empresas privadas, um enorme contingente de experts e consultores habilitados a desviar atenções e, se preciso, a negar peremptoriamente os fatos, usando o peso do seu prestígio acadêmico como arma publicitária para cobrir de ridículo quem quer que tentasse averiguar a realidade por trás das mentiras e desconversas.

3. Através da estratégia gramsciana de “ocupação de espaços”, a esquerda conseguiu munir-se de todos os instrumentos para desmantelar preventivamente qualquer possibilidade de oposição ideológica. O instrumento mais usado para isso foram as denúncias espetaculosas de corrupção, que destruíram tantas lideranças ao mesmo tempo que davam aos partidos de esquerda, sob o manto da afetação de probidade, os meios para ir construindo discretamente esquemas de corrupção incomparavelmente maiores e mais eficientes do que os denunciados (dos Anões do Orçamento ao Mensalão o crescimento escalar foi de uma ameba para um dinossauro).

4. No campo cultural e psicológico, a progressiva substituição dos critérios morais de senso comum pelas chantagens “politicamente corretas” destituiu as possíveis oposições até mesmo do direito a uma linguagem própria, forçando-as a adaptar-se ao vocabulário e aos modos de pensar do adversário onipotente. Com espantosa facilidade, essa operação reduziu os liberais e conservadores aos protestos vãos de uma oposição castrada, voluntariamente apolítica, que se contentava, no máximo, com críticas administrativas e vagas denúncias de corrupção quase que literalmente copiadas do discurso “ético” da esquerda, as quais, nesse contexto, só faziam conceder ao inimigo o monopólio do combate ideológico.

5. Tão avassaladora foi a conquista do espaço psicológico pela esquerda, que nos próprios meios “direitistas” qualquer tentativa de descrever o real estado de coisas era recebida com extrema má-vontade, valendo ao atrevido o apelido de “teórico da conspiração”, senão a pecha de “extremista”. A obstinação de liberais e conservadores em não querer enxergar o que estava se passando permitiu que o germe da revolução latino-americana crescesse e se tornasse o monstro de mil braços que agora vai dominando o continente sem encontrar resistências senão locais e esporádicas, incapazes de fazer face a um perigo de tais dimensões.

Se algo aprendi nos dezesseis anos que decorreram desde meus primeiros avisos sobre a mais vasta e silenciosa trama revolucionária que já se viu no mundo, foi que a “burguesia” é a classe mais indefesa que existe. Acovardada perante o prestígio dos vigaristas intelectuais mais baixos e sórdidos, ela se apega a qualquer pretexto para enxergar, no inimigo que planeja assassiná-la, todas as virtudes mais róseas e fictícias e evitar assim o confronto com uma realidade temível. O famoso “aparato ideológico da burguesia”, de que falam os marxistas, jamais existiu. Ele é apenas uma projeção invertida do próprio aparato ideológico revolucionário, destinada a impedir, mediante a denúncia preventiva de maquiavelismos imaginários, que um dia um real aparato burguês de autodefesa venha a existir. Quando a burguesia, pelo menos brasileira, consente em dizer algo em seu próprio favor, ela o faz com tanta discrição e delicadeza que dá a impressão de estar disputando com o adversário mais bondoso e compreensivo do mundo, e não com as “máquinas de matar” que os revolucionários se orgulham de ser.

Micagens infernais

Olavo de Carvalho

Diário do Comércio, 10 de agosto de 2009

Quarta-feira, 6 de agosto, enviei à editoria de Opinião do DC um artigo com as seguintes observações: “Curiosamente, nenhum dos que denunciam como falsa a certidão queniana de Barack Obama chega a sugerir sequer a hipótese de que ela tenha sido forjada por algum obamaníaco para colocar os birthers numa enrascada – hipótese muito mais razoável do que supor que estes últimos acreditassem seriamente poder enganar a justiça com um documento falso. A rapidez fulminante com que apareceu na internet a certidão australiana alegada como modelo da forjicação sugere que eles já sabiam algo a respeito antes mesmo de que o papel queniano fosse entregue às autoridades. Prestidigitações desse tipo são coisa de rotina para os agentes comunistas e radicais islâmicos que superlotam as fileiras obamistas.”

Não houve nem tempo de publicar o artigo. Decorridas 24 horas, já aparecia a confissão de um blogueiro obamista, que admitia ter forjado a coisa para cobrir de ridículo a advogada Orly Taitz (http://confederateyankee.mu.nu/archives/290619.php e http://fearlessblogging.com/post/view/3037).

Não pensem, porém, que esse engraçadinho seja um caso isolado. A iniciativa dele combina perfeitamente com o tratamento que o establishment jornalístico supostamente respeitável tem dado ao caso.

Toda a “grande mídia”, sem exceção visível, noticiou que Orly Taitz apresentara a certidão queniana como prova contra a nacionalidade americana de Obama. Isso é absolutamente falso. A advogada apenas solicitou ao tribunal que mandasse averiguar a autenticidade do documento, do qual ela mesma explicitamente afirmava não ter a mínima certeza. O que está sendo impingido aos leitores como notícia é pura invencionice difamatória. A orientação geral é recortar os fatos para fabricar uma aparência de loucura e depois, com o ar mais científico do mundo, emitir um diagnóstico psiquiátrico, sublinhado pelas chacotas mais fáceis e previsíveis. Quase que invariavelmente as entrevistas com birthers, entrecortadas de objeções insultuosas para impedi-los de falar, são seguidas de explicações sapientíssimas sobre as raízes sociológicas e psicopatológicas das “teorias da conspiração”. Mas ninguém explica o que há de teoria da conspiração em exigir que um candidato presidencial, antes ou depois de eleito, apresente os mesmos documentos que todos os seus antecessores e concorrentes apresentaram. O que me parece patológico, isto sim, é a proibição de investigar, a exigência prepotente, megalômana, de que um mentiroso compulsivo já mil vezes pego em flagrante seja crido sob palavra como se fosse um santo ou profeta, sem mais perguntas.

A trêfega disposição de impugnar como falsa a certidão queniana forjada expressamente para isso contrasta, no entanto, com a maciça recusa de examinar outros documentos forjados, muito mais decisivos. Meses depois que a certidão resumida de nascimento de Barack Obama apareceu no seu site de campanha, um especialista em peritagem forense publicou um relatório de duzentas páginas com uma quantidade enorme de provas de que o documento era falso (v. www.freerepublic.com/focus/f-bloggers/2136816/posts). A “grande mídia” fez total silêncio a respeito, ao passo que os sites obamistas da internet, sem examinar no mais mínimo que fosse o conteúdo do relatório, nem muito menos submetê-lo ao julgamento de outros peritos, limitavam-se a martelar e remartelar as duas únicas objeções que lhes ocorriam: o autor não revelava seu verdadeiro nome (assinava-se com o pseudônimo “Ron Polarik”) e não mostrava suas credenciais acadêmicas.

Essas pobres alegações, porém, tornaram-se inócuas quando outro profissional da área, com nome à mostra e credenciais sobrantes, Sandra Ramsey Lines (v. www.asqde.org/SRLines/SandraRLines.htm), confirmou integralmente as conclusões de Polarik. Desde então os críticos do perito nada mais disseram nem lhes foi perguntado a respeito. A única exceção foi uma blogueira que, não sem levar alguns aplausos esquerdistas por isso, contestou o currículo acadêmico de Polarik, sem explicar como se faz para averiguar a autenticidade de um diploma universitário sem saber o nome do diplomado.

É verdade que, nesse ínterim, a autenticidade da certidão resumida foi confirmada, oralmente, por funcionários do Registro Civil havaiano. Como, porém, a única prova possível da fidedignidade de um resumo é a exibição do documento original cujos dados ele compacta, e como os referidos continuaram obstinadamente se recusando a exibir esse original, tudo o que suas declarações faziam era reforçar o estímulo a que o público acreditasse em tudo sob palavra, abdicando das provas documentais.

Mais sólido ainda que o bloqueio em torno do laudo de Ron Polarik foi o muro de silêncio erguido em torno de um caso supremamente escabroso: o certificado de alistamento militar de Obama, assinado em 1988 num formulário que só viria a ser impresso em 2008. Como, ao contrário da certidão queniana, que surgiu de fonte anônima, a certidão havaiana resumida e a ficha militar viessem comprovadamente do próprio Obama, era preciso abster-se de examinar quaisquer provas da sua falsidade, por mais numerosas e auto-evidentes que fossem.

Para quem acompanha há décadas as micagens infernais da mente revolucionária, nada disso é novidade. Mentir, falsificar, fingir – tais são os procedimentos usuais, compulsivos e obrigatórios dessa gente há mais de cem anos. Quanto mais se sujam nessas manobras sórdidas, mais são obrigados a reprimir os protestos da sua própria consciência moral, sufocando-a sob encenações de autobeatificação delirante.

 

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