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O suicídio do Equador

Olavo de Carvalho


Zero Hora, 28 de maio de 2006

Cedo hoje o espaço desta coluna a um convidado ilustre. Estive conversando com o dr. Edgar Terán, ex-ministro das Relações Exteriores do Equador e, é claro, pedi que me desse algumas explicações sobre o que está acontecendo no seu país. Eis as quatro perguntas que lhe coloquei e as respostas que obtive:

Qual o objetivo da encampação da Occidental Petroleum?

— O governo do Equador realizou dois atos que violam a Constituição e os tratados de investimentos com os EUA e com outros países: modificar os contratos de participação petroleira para obter mais recursos, não por ato contratual e sim por lei; e, quase de imediato, tomar a propriedade das instalações da companhia OXY (que exportava vinte por cento do petróleo equatoriano). Como tanto a Constituição quanto o Tratado Bilateral de Investimentos proíbem o confisco, a OXY apresentou uma ação arbitral contra o Equador ante o Centro de Arbitragem do Banco Mundial, no valor de pelo menos um bilhão de dólares. O efeito imediato da encampação foi bloquear a assinatura do Tratado de Livre Comércio (TLC) que os EUA já assinaram com a Colômbia e o Peru. Mais de metade das exportações equatorianas vão para os EUA, e aliás sem pagar impostos, dos quais estão isentas por uma lei americana, mas a continuidade da aplicação dessa lei depende de que seja assinado o TLC. Não firmar esse tratado é um suicídio econômico para o Equador. Parece, então, que o objeto foi duplo: confiscar a propriedade petroleira, ao estilo Evo Morales e impedir toda possibilidade de firmar o TLC. Tudo isso somente pela vontade de Hugo Chavez.

A China está se tornando o mais voraz importador de petróleo do mundo, provocando a escassez do produto e a alta dos preços. Há alguma relação entre esse fato e o que se passou no Equador?

— As companhias estatais chinesas compraram operações petroleiras no Equador. Firmaram acordos com o governo anterior de Gutierrez para expandir a exploração e a industrialização do petróleo. Não chegaram a consumar esses convênios porque eu os denunciei por não submeter-se a licitações internacionais. Sabe-se que Chavez pretende construir um oleoduto desde o Equador até o Panamá para exportar petróleo à China, mas

não sei se a China esteve pressionando por trás destas medidas do governo de Alfredo (Evo) Palacio.

Até que ponto a influência de Hugo Chávez foi determinante no confisco?

— São demasiadas coincidências: Chavez vocifera contra os tratados de livre comércio. Chavez pretende formar a Petroamerica, entidade que vincule as empresas estatais da América Latina. Chavez tem uma política de colaboração energética com a China (parte do petróleo venezuelano se refina na China) coisa que deve estar vinculada ao plano do oleoduto transandino até o Panamá. Chavez aplaudiu a confisco da OXY.

O ex-ministro da Economia, Correa (atual candidato presidencial), e o atual Diego Borja estão vinculados a Chavez e têm viajado à Venezuela para falar de temas de petróleo. É evidente que Hugo Chávez, por quaisquer meios que sejam, está por trás do suicídio do Equador.

Como lutar contra a ascensão do neocomunismo na América Latina?

— Somente mediante a regionalização da luta poderá deter-se o neocomunismo. O primeiro passo é denunciar publicamente as táticas do eixo Castro-Chavez-Morales-etc. (no “etc.” cabem Lula, Kirchner e talvez outros). Ao mesmo tempo é preciso a cooperação entre as pessoas que defendem a liberdade e a democracia. A luta deve ser orientada de modo a defender a segurança pessoal, porque um povo aterrado pela criminalidade é facilmente dominado; o império da lei, porque é a única garantia do Estado de Direito, o único o freio ao poder; a justiça independente; a imprensa livre e não vendida; o direito dos pais a educar seus filhos, e o direito de todos à saúde e à segurança social. E, além disso, que Deus nos proteja…

Duas notinhas

Olavo de Carvalho

Zero Hora, 30 de abril de 2006

A filosofia é uma aventura espiritual extrema, na qual você não obtém nada se não arrisca nela seu bem-estar, sua posição na comunidade e sua segurança psicológica. Mas estas são três coisas que em geral os brasileiros prezam demais, talvez por viverem  numa sociedade tão instável e precisarem desesperadamente de muletas psicológicas. 

A maior parte das pessoas que imaginam querer estudar filosofia estão apenas em busca de uma profissão universitária, de uma identidade grupal ou de uma crença coletiva que lhes dê segurança. Jamais pagariam o preço da solidão intelectual necessária ao genuíno exercício da filosofia.

É muito bonito, por exemplo, discursar contra as certezas, simular independência mediante a apologia da dúvida. Isso tornou-se quase um cartão de ingresso nos círculos bem-pensantes. Mas outra coisa totalmente diversa é estar realmente mergulhado num mar de dúvidas, sem outro pólo de orientação senão o desejo firme de encontrar a verdade mais dia menos dia. Esta experiência é absolutamente inacessível à geração de estudantes que, desde a primeira aula, são anestesiados por injeções de marxismo-desconstrucionismo, uma mistura letal destinada a infundir nos cérebros a crença dupla e paralisante de que, por um lado, a verdade não existe e, por outro, de que já a possuem em dose suficiente para saber com precisão quais são os males do mundo, quem é o culpado por eles e o que se deve fazer para eliminar de uma vez os males e os culpados. Viciadas nessa dissonância cognitiva desde tenra idade, não é de espantar que as vítimas desse gabinete de horrores que é o ensino universitário brasileiro se tornem cronicamente incapacitadas para o exercício da filosofia e dispostas a aceitar por esse nome qualquer sucedâneo de terceira ordem que seus professores lhes forneçam.

***

Mediante uma torção verbal bem característica da malícia comunista, a autora de um insulto brutal e premeditado aos sentimentos religiosos dos brasileiros tem aparecido na mídia como vítima de censura e opressão clerical. Entre as almas caridosas que oferecem sua solidariedade a esse engodo, destacam-se o sr. Gilberto Gil – ministro de uma coisa que ele nem sabe o que é — e o criador de uma “Coleção de Vulvas Metálicas”, expostas ao lado do pênis da srta. Márcia X, e agora, para grande prejuízo cultural da humanidade, cobertas de luto em protesto contra a retirada daquele sublime objeto de prazer artístico. As vulvas metálicas só voltarão a mostrar-se em público quando o pênis expulso foi reintroduzido no saguão do Centro Cultural Banco do Brasil, Candelária, Rio de Janeiro. 

Vamos deixar uma coisa bem clara: há um constante e obstinado genocídio de cristãos no mundo. Nem por ser ocultado pela mídia ele deixa de ser uma realidade (quem quiser se manter informado a respeito, acompanhe o site www.persecution.com). No consenso jurídico mundial, a propaganda contra um grupo ameaçado de discriminações, perseguições e genocídio é cumplicidade moral com o crime. O que pesa contra a srta. Márcia X é esse delito abjeto, e não a simples infração de preconceitos moralistas. Ao apresentá-la como alvo de censura fundamentalista, a mídia porca tenta apenas camuflar a verdadeira gravidade do ataque feroz que ela dirigiu a uma comunidade vítima de discriminação crescente nos países ocidentais e ameaçada de extinção nas nações islâmicas e comunistas.

Cúmplices do mesmo delito são todos os que se solidarizam com a criadora do pênis de terços. E mais grave ainda é essa cumplicidade quando aquele que a encarna é um ministro de Estado. O fato de o sr. Gil ser um pseudo-intelectual de miolo mole, como num momento de rara lucidez ele próprio se admitiu, não constitui atenuante nenhum. Burrice e maldade jamais foram termos antagônicos.

Cinto de castidade

Olavo de Carvalho

Zero Hora, 16 de abril de 2006

Não restando no idioma pátrio nomes de vícios, pecados, infrações, delitos, aberrações e iniqüidades várias que já não tenham sido usados com inteira propriedade para descrever a conduta dos presentes governantes do país, faz tempo que chegamos àquele ponto de exaustão lingüística em que qualquer outro povo, no nosso lugar, já teria parado de falar e partido para a ação decisiva.

Se não fazemos isso, é por um motivo muito simples: povos não agem, povos apenas sofrem, desejam, sonham e esperam. Quem age são elites organizadas, e no caso brasileiro nenhuma delas pode se mexer, porque todas têm rabo preso . Todas, sem exceção, colaboraram para a criação do presente estado de coisas e têm razões de sobra para temer que qualquer sacolejo mais vigoroso na fortaleza estatal de papier mâché trará à luz, junto com as culpas do governo petista, as suas próprias.

Mas há também um motivo mais sutil por trás dessa paralisia.

Quando o senador Arthur Virgílio, um dos mais veementes acusadores do governo, recua ante a possibilidade de um impeachment que ele próprio reconhece ser justo e fundamentado, a razão que ele alega para esse súbito ataque de covardia é inteiramente plausível – mas é isto mesmo o que a torna ainda mais repulsiva. “Falta de apoio popular”, diz ele. É verdade. Com acusações muito menos graves pesando sobre suas costas, o ex-presidente Collor atraiu contra si, da noite para o dia, uma mobilização nacional tão ruidosa e multitudinária quanto a das Diretas Já. Ninguém, na época, admitiu o óbvio: que nada nessa explosão de ódio foi espontâneo, que tudo consistiu apenas em convocar a rede de organizações militantes que já estava preparada desde muito antes para atender a qualquer chamado de seus líderes e saltar sobre a goela do primeiro que eles a mandassem esganar, linchar ou comer vivo.

Nada de similar existe para ser convocado a gritar nas ruas contra a gangue lulista.

Há 40 anos, a “direita”, ou o que quer que leve esse nome, cedeu ao esquerdismo o monopólio da organização popular, contentando-se com a política de gabinete suficiente para suas finalidades imediatistas e abdicando de todo discurso ideológico próprio.

Vazia de meios e de idéias, essa oposição, ao sentir-se estrangulada pela prepotência petista, não pôde apelar senão ao expediente das imputações criminais assepticamente apolíticas , preservando-se assim de merecer o temido rótulo de direitista (que nem por isso deixou de lhe ser aplicado), mas condenando-se a só poder combater num campo limitado o adversário que, enquanto isso, a atacava por todos os lados.

Ainda assim, a quadrilha instalada no poder foi tão auto-indulgente, tão bestamente confiante, que ultrapassou todos os limites da prudência criminosa e começou a delinqüir em plena luz do dia, tornando-se visível e vulnerável. Foi ferida num só ponto, mas a ferida foi funda o bastante para fazer o monstro balançar. Balançar, porém, não é cair. Vendo a dificuldade de derrubá-lo, seus atacantes começam a vacilar, entregando-se a temores dissolventes e considerações eleitorais desanimadoras, quando deveriam, ao contrário, corrigir seu erro de quatro décadas e ampliar a frente de ataque.

O círculo dos crimes petistas é mais vasto do que sugere a vã filosofia tucana. Vai muito além de encontros sorrateiros num bordel de Brasília. Investiguem o Foro de São Paulo, sigam a pista das conexões entre PT e Farc, e verão que a criminalidade petista não é avulsa nem é traição às raízes comunistas do partido. É conspiração revolucionária, é subversão total da ordem, é destruição fria e premeditada das leis, do direito e da fé pública em escala continental.

Só que, para ter a energia de lutar contra isso, é preciso quebrar o cinto de castidade que a própria hegemonia cultural petista afivelou em seus adversários, que eles tão docilmente aceitaram como prova de bom-mocismo e que acabou por se amoldar ao seu corpo como uma segunda natureza. Para combater um mal tão gigantesco, é preciso algo mais que legalismo, inquéritos e discursos. É preciso virilidade política. Antes de vencer o PT, é preciso superar a carência geral de testosterona.

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